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Sebadoh 2 (2011)

Bati um papo com Lou Barlow (à direita, com o rosto virado), líder do Sebadoh, por telefone no fim da tarde deste sábado – a banda tinha chegado pela manhã no Brasil. A banda se apresenta hoje e amanhã no Sesc Pompéia e os shows começam pontualmente às 19h.

Esta é a sua segunda vez no Brasil, na primeira você veio para cá como baixista do Dinosaur Jr. e teve a oportunidade de fazer um show solo. Quais lembranças você tem daquele dia?
O show solo foi muito bom, foi um dos momentos mais doces da minha carreira, acho (ri). Foi bem surpreendente pra mim, porque todo mundo estava sendo muito legal e o show foi organizado em, sei lá, umas seis horas. Muita gente foi e todos foram muito legais. O público no Brasil foi muito bom com o Dinosaur Jr. também. As pessoas amam música aqui, São Paulo é uma cidade absurdamente enorme (ri) e só uma porcentagem pequena deve ir ao show, como é o que acontece quando tocamos em Londres ou em Nova York. E sempre tive vontade de voltar e agora estou feliz de estar aqui com o Sebadoh.

Você tinha alguma idéia da quantidade de fãs que têm aqui no Brasil?
Não. Fiquei surpreso quando vi as pessoas no show solo da outra vez, mas não sei o que esperar com o Sebadoh. Acabamos de fazer uma turnê pela Austrália e Nova Zelândia que foi bem divertida, mas não teve muito público e ultimamente nossas turnês pelos EUA têm cada vez menos gente na platéia.

Acredito que o público do Sebadoh é o mesmo que pode, ainda nos anos 90, comprar CDs importados numa época em que isso começou a ficar mais barato por aqui, no início dos anos 90. Ao mesmo tempo foi uma época em que a cultura independente norte-americana começou a ser mais conhecida pelo mundo e isso acabou influenciando a música independente brasileira. Atualmente os limites entre música independente e mainstream estão cada vez mais misturados. Como você vê isso?
Eu acho que o que acontece com a maioria das pessoas, eu incluso, é que você tem que fazer as coisas você mesmo. Há um momento em que as pessoas se deixam levar pelo lado empresarial, querendo se tornar imensamente populares e isso não é muito realista. E as pessoas percebem isso. Acho que o maravilhoso da cultura independente é que ela sempre vai existir, em algum lugar. E que o underground sempre vai ser um vasto território para a música. Eu vejo as pessoas reclamando que a música está chata, que não tem coisa legal sendo feita, mas acho que é mais provável que essas pessoas que reclamam não estejam procurando. Elas não se importam. Elas não se importam com o que os moleques de 23 anos de hoje em dia estão ouvindo. Elas não se importam se tem um galpão abandonado fora da cidade que recebeu um show que reuniu mil pessoas pra ver uma banda que ela nunca ouviu falar. Isso não quer dizer que não esteja acontecendo. Está e sempre estará. Sempre haverá comunicação entre as pessoas em um nível bem básico e debaixo de toda essa lógica comercial e empresarial. Sempre acontecerá e isso é impressionante.

Mas as coisas estão bem mais misturadas hoje em dia. Era impensável que uma gravadora indie dos anos 90 teria uma música no topo da parada de discos mais vendidos na Billboard, como aconteceu com o Arcade Fire que é um artista da Merge.
Ao mesmo tempo a Merge é uma gravadora consciente de seu papel, de uma forma bem realista. É uma gravadora fundada a partir da integridade artística, o que também acontece com a Domino. Eles continuaram fazendo o mesmo por anos, os gostos musicais mudam e aconteceu que algo como o Arcade Fire se tornasse comercial. A Merge é formada por pessoas espertas e honestas e eu acredito que este é o grande fator que tornou possível que tivessem um disco no topo da parada, sua integridade artística. E depois de 25, 30 anos, isso torna-se uma habilidade de mudar a forma como as coisas funcionam.

É que eles são comerciais mas não tratam isso apenas como um negócio.
Sim. É exatamente isso. Isso acontece com a Merge, com a Domino, com a Sub Pop… Gente que pensa de forma realista o tempo todo.

O Sebadoh apareceu no final dos anos 80, uma época em que era muito difícil conseguir gravar seu próprio disco e você foi um dos pioneiros ao lançar gravações caseiras, que se tornou uma estética conhecida na época como lo-fi. Isso foi importante para mostrar que você não precisava ser superproduzido para soar bem. Hoje, com computador e acesso à internet, qualquer um consegue gravar músicas com um mínimo de esforço e espalhá-las para o mundo inteiro sem precisar fazer concessões sonoras para soar mais comercial e conseguir um público cada vez maior. O que você acha disso?
Acho que isso é verdade. Eu estava pensando num dia desses sobre como, nos anos 90, as bandas acabavam fazendo isso para ver se atingiam um público maior e seus discos acabavam vendendo menos que os anteriores (ri). Isso não ocorre com os discos independentes e eles acabam vendendo mais, porque as pessoas têm uma conexão pessoal com isso. É há uma diferença quando você não trabalha nisso como se estivesse lidando apenas com uma empresa, seja por uma decisão política ou porque a sonoridade acaba se tornando mais fria para deixá-la com uma cara mais corporativa. Algumas bandas são exceções, como, claro, o Nirvana. Mas bandas como o Arcade Fire ou o Spoon continuaram na Merge porque sabiam que era a coisa certa a ser feita, especialmente o Spoon, que já esteve numa gravadora grande e foi muito mal, passou por dificuldades. Mas aí eles voltaram para algo mais realista e tudo melhorou.

Ao mesmo tempo, estamos vivendo em uma época em que cada vez mais pessoas lançam seus trabalhos, nunca foi tão fácil se tornar um artista e ter sua obra publicada. Você acha que isso não vai acabar enfraquecendo esse lado mais corporativo do mercado da música, que faz as pessoas serem guiadas por quem está na capa da revista, no topo das paradas, com os discos mais vendidos…
Hm… Tem outra coisa também: as pessoas gostam de música pop porque ela é gigantesca. E a música pop passa por ângulo cultural que a torna onipresente, espalhada em cartazes, e isso é parte do negócio. Mas qualquer um que desconfie que há algo diferente acaba procurando outro tipo de música, claro, graças à internet, que tornou tudo mais fácil. Você pode passar a noite procurando por sua nova banda favorita.

Você soube do disco-tributo que bandas brasileiras gravaram com as canções do Sebadoh?
Ouvi falar, mas não ouvi ainda.

Não é improvável pensar em um tributo feito por bandas brasileiras?
Mas fazem tributos pra tantas coisas diferentes… Na verdade, umas bandas francesas já fizeram um tributo ao Sebadoh e outras bandas da Bélgica também, então não é tão improvável assim pra mim. Acho que nos anos 90 o Brasil realmente parecia distante. Mas, hoje, com a internet, você fala no Brasil e parece normal, não é como se estivesse falando de uma coisa completamente distante. E tem tantos brasileiros no Facebook… E na minha visão superficial do país, acho que é um lugar muito musical, onde as pessoas amam música e agem de forma muito passional em relação à música, vi isso na resposta dos shows com o Dinosaur Jr. quanto nas bandas brasileiras que tocaram junto com a gente e eram muito boas! E além de ter uma tradição musical incrível, as pessoas daí gostam de rock. Isso é tão incomum, porque na maior parte dos lugares há a presença da dance music, que é tão invasiva e está em todos os lugares e todo mundo gosta… Estávamos no aeroporto hoje, saímos do avião e estávamos sentados em um pequeno café e tá tocando Stooges, num café pequeno num aeroporto e isso é incomum (ri)! Não é um bar, é um lugar normal pra pessoas comuns… e tá tocando Stooges! E logo em seguida tocou uma canção melancólica qualquer. Foi tão estranho. Isso nunca aconteceria nos Estados Unidos. Você nunca vai ouvir os Stooges tocando num aeroporto. E não é por causa do que está sendo dito, mas pela sonoridade. Isso não é música para pessoas em seu dia-a-dia. E por aqui toca. Acho engraçado como as pessoas na América do Sul gostam mais de rock do que nos outros lugares que conheço.

Aproveitando a deixa, o que você conhece de música brasileira?
Não muito. Conheço os Mutantes porque fez parte de um onda nos anos 90, com coletâneas e relançamentos, são discos incríveis, que hoje fazem parte da coleção de qualquer fã de música, junto dos discos dos Zombies e dos Beatles, já são considerados um clássico. Não conheço o hard rock brasileiro, mas imagino que deva ser incrível (ri). Quando começou o hardcore tinham umas ótimas bandas de hardcore brasileira, como o Olho Seco, e também a cena de speed metal, principalmente por conta do Sepultura, que era a melhor banda do mundo naquela época. Quando morei em Boston, eu assinava TV a cabo e pegava a MTV Latina e eu via muita coisa da América Latina e adorava muita coisa. A versão latina do programa 120 Minutes, que era o programa de rock alternativo, sempre mostrava umas bandas indies latinas, tinha muita coisa legal.

Você vai sair por aqui pra comprar discos?
Não (ri). Sou um pai de família, não posso sair comprando discos o tempo todo.

E como é a primeira vez do Sebadoh por aqui vocês vão preparar alguma coisa diferente?
Eu não sei. Nós tocamos músicas novas mas sempre tocamos músicas velhas… Mas o melhor é tocar em um lugar onde nunca tocamos. É sempre incrível. Mesmo porque você não precisa se preocupar em tocar de outro jeito diferente da outra vez (ri).

20 Feet From Stardom, A Band Called Death, Narco Cultura, Muscle Shoals, American Interior, Finding Fela e documentários sobre o Napster, PirateBay, Pulp, The National, a secretária dos Beatles e Harry Dean Stanton são algumas das atrações da sexta edição do festival

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Não é exagero dizer que o festival de documentários sobre música In-Edit, que chega à sua sexta edição a partir do dia 1° de maio deste ano, já entrou na agenda cultural do paulistano. Ao buscar um nicho cinematográfico específico, o festival também atiça diferentes paixões musicais, mexendo com tribos e gêneros distintos, através de linguagens que flertam com a ficção e se espelham no noticiário. Por trás de filmes específicos, o evento consegue reunir tanto cinéfilos cricris quanto fãs xiitas de bandas obscuras – e uma renca de curiosos e gente disposta a se divertir e se emocionar vendo um filme. “Para nosso público, pode ser que já sejamos algo habitual na agenda cultural da cidade mas nossa fragilidade econômica nos lembra todos os dias que vivemos na corda bamba. Enquanto nossos irmãos espanhóis, chilenos, colombianos, por exemplo, tem contratos de patrocínio que duram alguns anos e podem fazer planejamento, nós aqui no Brasil estamos sempre pendentes de decisões de verba de última hora e nos faz correr demais e não ter tempo para pequenos detalhes. Esta é sem dúvida, nossa maior dificuldade e é presente em toda nossa história”, me contou em entrevista por email o cabeça do festival, Marcelo Aliche. Que, na entrevista abaixo, fala mais do evento de 2014, que ainda conta com a presença do cineasta holandês Frank Scheffer, que há 30 anos acompanha clássicos da vanguarda musical como Gustav Mahler, Edgar Varese, John Cage, Brian Eno e Frank Zappa. Ele também comenta a programação deste ano e lamenta o filme que não pode trazer em 2014. Além da entrevista, segue a programação completa do evento, que deve ter sessões realizadas em salas do MIS, da Cinemateca, do Cine Olido, da Matilha Cultural, do CineSESC e do Centro Cultural São Paulo.

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No finzinho de 2013, o prolífico Thiago França lançou sua homenagem ao livro de estréia e obra-prima do escritor paulistano João Antônio, Malagueta, Perus e Bacanaço. O livro, que completou 50 anos no ano passado, é um clássico do modernismo contemporâneo brasileiro que pertence a um cânone pouco difundido da cultura brasileira – o da marginália paulistana, uma cultura de rua de partidas de bilhar e ruas frias da metrópole quatrocentona que foi tornando-se cada vez mais influente à medida em que o século vinte passava. França reuniu velhos companheiros (Kiko Dinucci, Rodrigo Campos, Marcelo Cabral, Juçara Marçal, Daniel Ganjaman, Maurício Pereira, Ogi e Rômulo Fróes) para uma celebração ao passeio feito pelos três personagens que batizam o livro entre a Lapa, o centro, Pinheiros, Água Branca e a Barra Funda, numa jornada vertiginosamente saudosa e lírica, em que sax assume o papel de narrador e nos conduz naquela viagem. Ele liberou uma faixa pra cá:

O disco virou show há um mês e deve ganhar novas versões em breve, além de uma possível versão em vinil. Abaixo, o papo que tive com Thiago por email a respeito do disco-trilha-sonora-de-livro.

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Jamie XX e John Talabot se reuniram no primeiro dia deste mês para discotecar num back to back para o programa Beats in Space da nova-iorquina WNYU e o resultado é uma viagem daquelas, se liga:

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O pioneiro projeto de lei sobre legislação digital finalmente passou na Câmara dos Deputados depois de quatro anos desde sua concepção, mas mesmo ainda faltando ser aprovado pelo Senado para tornar-se uma nova forma de encarar a internet à luz da justiça, já é um senhor avanço. O Marco Civil da Internet começou como uma alternativa à Lei Azeredo, que punia os infratores de “crimes digitais” e chegava, em suas versões mais extremas, a exigir que qualquer um para se conectar à internet tivesse que digitar o CPF para acessar à rede (além dos cobrar que os provedores de acesso – servidores ou lan houses – guardassem os acessos de seus usuários por pelo menos seis meses). Não por acaso foi rotulado de “AI-5 digital”, devido à quantidade de restrições que impingia à rede.

A mudança de lógica começou com uma consulta pública proposta pelo Ministério da Justiça sobre o que realmente deveria tratar um projeto de lei – e assim foi lançado um site em que as pessoas poderiam palpitar nos principais temas relacionados ao assunto. Dei o assunto na capa do Link há exatamente quatro anos, em março de 2009, e por um bom tempo, o Link foi o único veículo na mídia tradicional a dar atenção ao tema, acompanhando o parto que foi chegar a um consenso sobre uma série de assuntos sem criar leis ou punições que diferenciavam quem cometesse alguma infração dentro e fora da rede. Nossa cobertura no Link aos poucos fez o projeto de lei ganhar vulto e vimos a discussão sendo aprofundando a partir do acompanhamento que fazíamos, mas foram as revelações feitas por Edward Snowden no ano passado – que os EUA vigiavam seus próprios cidadãos e estrangeiros pelo mundo através da internet – que o processo foi acelerado. O trabalho do deputado Alessandro Molon foi crucial para que o projeto conseguisse ser aprovado – principalmente após tirar o fardo imposto pelo PMDB que travava um dos principais pontos do projeto de lei, a neutralidade de rede.

O trabalho que comecei no caderno de cultura digital do Estadão há quatro anos rendeu bem e hoje vejo com orgulho, Tatiana de Mello Dias na Galileu e o Murilo Roncolato no Link, sob a batuta do atual editor do caderno, Camilo Rocha, darem uma verdadeira aula de cobertura sobre o tema além de frisar de forma didática o que é informação do que é desinformação. Os três foram da minha equipe no Link e tomaram consciência da importância deste tema a partir da cobertura que lá fizemos. Confirma os textos do Murilo e da Tati que explicam detalhadamente a importância do tema, são claros e bem elucidativos. E se ler tá difícil, o Marco Gomes desenhou via Twitter:

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Mas ainda temos chão pela frente e o Senado é a próxima parada antes de termos a legislação mais moderna e avançada no que diz respeito à internet no mundo. Claro que no meio do caminho ainda veremos o aumento do jogo de desinformação (como o desserviço que foi esta entrevista no Jornal da Record ou as vítimas desse tipo de análise enviesada reunidas neste tumblr Sabe de Nada, Inocente) e vamos voltar a ouvir falar em asneiras como “controle de mídia”, “cubanização” ou “o fim do Facebook”.

É preciso ter calma, afinal quanto mais perto algo está de ser mudado, mais quem vai sofrer esta mudança esperneia e grita. E isso não diz respeito somente a este tema, como vocês já devem ter percebido…

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É o fim de uma era. Foi-se o tempo em que a melhor sexta-feira de São Paulo acontecia no porãozinho da histórica Avenida São Luís. Diga adeus ao papel de parede de jogo da velha e à sequência de “No Scrubs” seguida de “Lose Yourself to Dance” ou “Lança Perfume”. Nunca mais o balde de gelo com a garrafa de uísque na cabine um degrau mais alta que a pista, com sua iluminação de camarim, o ar condicionado pingando, o calor insuportável e todo mundo sorrindo. As duplas de desconhecidos que até o fim da noite eram casais. O retorno que desligava sozinho. As pernas femininas descendo correndo a escada como termômetro de que aquela música funcionava mesmo. O volume cortado no refrão pra todo mundo cantar junto. A partir de hoje, oficialmente, as Noites Trabalho Sujo não acontecem mais na casa que viu a festa nascer.

Lembro quando o Ivan veio conversar comigo, em 2011, sobre a possibilidade de fazer uma festa semanal em sua recém-inaugurada casa. O Alberta #3, no centro, havia sido batizado a partir das músicas homônimas de Dylan e tinha suas paredes forradas com fotos de ícones de um rock bem roqueiro – Ramones, Stones – afinal era a casa do Ivan, um jornalista que sempre prezou pela estética transgressora do rock clássico. Já eu havia largado a ortodoxia do rock há muito tempo e, embora ainda fiel aos clássicos, sempre vi essa “atitude” como um fundamentalismo pop. Por outro lado, sempre tive vontade de ter uma festa semanal e fiz a ressalva: “Não é uma festa rock”. Ivan arregalou o olho já esbugalhado, como se não cogitasse a possibilidade que eu tocasse outros gêneros (e como se nunca tivesse me visto discotecar). “Tá bom, mas é uma festa do quê?”, perguntou. “De dance music”, respondi na galhofa. Ele não engoliu direito aquela história e nos primeiros meses foi realmente complicado – na primeira festa, ainda nos tempos da Gente Bonita, com o Kalatalo, já estávamos tocando funk carioca enquanto umas caras amarradas ficavam encostadas na parede, pedindo AC/DC através do celular. Na segunda noite, as meninas da Awe Mariah conseguiram fazer trenzinho no meio da pista quando tocaram axé music. A cara do Ivan era de pavor. A pista estava inteirinha sorrindo, fora os camisas-pretas encostados na parede. Eu sempre me divertia.

Comecei a chamar amigos, muitos deles que nunca haviam discotecado na vida (confiando apenas no bom gosto musical de cada um), para dividir a cabine comigo em longos sets que podiam ir para todos os lados, todos os gêneros, todas as épocas, todos os idiomas. A única regra era que o clima fosse pra cima e que a pista estivesse cheia e se divertindo. E não foi uma regra imposta, foi um clima que se instaurou a partir das pessoas que escolhi para fazer a festa comigo.

Depois de um ano tocando todas as sextas sem parar, precisei fazer uma cirurgia (pra finalmente consertar o braço, agora 100%) e convidei três amigos mais próximos para dividir a sexta-feira comigo. Danilo, Babee e Pattoli já haviam passado pela cabine do Alberta comigo mais de uma vez e sabíamos dos gostos em comum a ponto de saber que funcionaria dividir a festa entre nós quatro. E deu mais certo do que imaginávamos. Hoje a Noite Trabalho Sujo somos nós quatro e já estamos nos espalhando por aí, como vocês sabem.

Mas, no fim do ano passado, o Alberta teve problemas internos e ficou fechado por alguns meses (o que, no fim, deu origem às festas Sussa e Naites, já encubadas na minha cabeça, esperando sair) e agora neste começo de 2014 mais uma vez voltou a ser fechado. Ao mesmo tempo já vínhamos percebendo que o espaço do Alberta estava ficando pequeno para o nosso público, populoso o suficiente para causar as já infames filas na porta de nossas festas na Trackers. Ao mesmo tempo, recebemos uma proposta para mudar de casa. Essa série de fatores culminou no anúncio de que não haverá mais Noites Trabalho Sujo no Alberta #3.

Na memória, grandes momentos. Duas noites Beatles. Uma noite contando a história do rock em ordem cronológica. A noite do especial relâmpago Beastie Boys no dia em que o MCA morreu. A catártica discotecagem do saudoso Fred :~~~~. A Bia correndo para a pista quando tocava “Moves Like Jagger”. O Márvio dependurado na escada dublando “Don’t Stop Me Now”. Os pedidos de música no fumódromo. As meninas subindo nos totens quando tocava Britney Spears. “Sereia” do Lulu Santos. Tocar Pavement quando Mariana Neri aparecia. Aretha Frankin. Guilherme Arantes. LCD Soundsystem. Mutantes. Daft Punk. Neutral Milk Hotel. Rage Against the Machine. Led Zeppelin. Beyoncé.

Agradeço portanto a todos que tocaram comigo, a todos que foram às festas e vieram me cumprimentar pelo set ou pelo site, aos que se acabaram de dançar e aos que não dançaram mas ficaram num canto só sacando a convulsão pra cima daquela pequena multidão. Agradeço ao Ivan, à Thea, à Neiva, à Noemi e a todo mundo que conheci graças ao Alberta #3, sócios, funcionários, ex-funcionários e amigos em comum. E, claro, o agradecimento saudação ao trio Luiz, Babee e Danilo, formado durante esse período e que agora seguem junto comigo pra esse novo capítulo.

Porque a festa não pode parar – e as Noites Trabalho Sujo continuam a partir de abril em um novo endereço. Semana que vem eu falo mais disso. Enquanto isso, não esqueçam que neste fim de semana tem Naites no Neu e Sussa junto com a pool party Boogie Woogie no Telstar Hostel da Vila Mariana (sim, pool party = piscina liberada!). As sextas-feiras irão para um outro patamar ainda mais foda. Até breve.

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Estamos às vésperas de uma conclusão épica de True Detective, que termina hoje sua primeira temporada. A série estrelada por Matthew McConaughey e Woody Harrelson chega ao final de seu primeiro capítulo já anunciando que o segundo terá outra história, outros protagonistas, outros atores. Só o fato de zerar sua própria história a cada nova temporada permite que a série crie outra forma de lidar com suas histórias. True Detective é um tom, um gancho: histórias de detetive que fogem do comum. Como era a própria True Detective original, uma compilação de contos e casos policiais escritos por semianônimos (alguns deles, como Dashiell Hammett, tornaram-se clássicos no tema) publicados na aurora e primeira grande era do gênero policial, um dos principais gêneros do século 20. Assistiremos, portanto, nos próximos anos, pequenas histórias relacionadas a crimes e tentativas de resolvê-los.

E se o nível de envolvimento com o espectador for semelhante a esta primeira temporada, estamos diante de uma longa e importante série, que independe de personagens para continuar sendo importante – não precisamos ver Jack Bauer salvar os EUA pela milionésima vez nem cada detalhe da biografia de personagens densos e complexos em plena transformação (como as sagas de Tony Soprano, Walter White e Don Draper) nem a criação de ecossistemas ficcionais complexos (como os de Game of Thrones, Downton Abbey, The Wire e Battlestar Galactica). Tudo bem que não é a primeira série a cogitar esse formato (American Horror Story sobrevive porque nasceu assim), mas a forma como True Detective se apresentou foi determinante para atingir este patamar. Escrita por apenas uma pessoa (Nic Pizzolatto, não uma equipe liderada por ele) e dirigida por outra (Cary Joji Fukunaga), True Detective não é apenas uma história sobre um crime mal resolvido, mas fala sobre uma nova forma de consumir conteúdo audiovisual – ou o mais perto que a televisão chegou da literatura.

Ao se comprometer a contar uma história em oito capítulos divididos em oito semanas, o quarteto formado por Nic, Cary, Woody e Matthew nos conduziu em uma jornada contada em diferentes camadas. True Detective é sobre a investigação do assassinato de Dora Lange por dois detetives em 1995 e a volta do caso 17 anos depois, com depoimentos que aos poucos vão nos situando sobre quem são aqueles dois investigadores (Harrelson e McConaughey, em atuações brilhantes) e o que eles realmente fizeram no passado. Ao mesmo tempo, a série nos mostra uma série de relações, conexões e coincidências que criam uma mitologia ao redor de personagens recém-apresentados na série (muitos deles apenas um nome, um retrato, uma descrição) e a toda uma genealogia que interliga a história a cânones de literatura policial e de horror, permitindo a construção de uma mitologia em pouquíssimas semanas, viciando um público ávido por interligar dicas e buscar hiperlinks em qualquer palavra, qualquer olhar ou citação. O programa de TV também trata de uma atmosfera, uma tensão silenciosa que paira sobre rituais macabros, crimes inadmissíveis, perversões inconfessas, o Mal propriamente dito. Uma sensação de desconforto e curiosidade que torna True Detective tão irresistível quanto um vício. Junte isso a um texto que, ao mesmo tempo em que confronta a alma white trash americana a contrapõe a uma filosofia existencialista niilista, encarnada no personagem de McConaughey, Rusty Cohle.

True Detective não apenas a prova de que a conversa entre e TV e a internet é um fato – quem viveu buscando significado entre os sete primeiros episódios sempre terá uma sensação bem diferente em relação à série do que quem a assisti-la de uma vez só. Ela mostra que é possível ter sucesso – em diferentes níveis – apostando na inteligência. Sem mirar no entretenimento barato, a série prova que, em oito semanas, reputações sérias podem ser construídas, uma audiência criteriosa pode tornar-se fã instantaneamente e que é existe vida inteligente no público quando se aposta nele.

Tomara que o último episódio confirme isso.

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Juçara Marçal acaba de disponibilizar para download gratuito seu aguardado disco solo, batizado de Encarnado, em seu site oficial. Alicerçada pelas forças instrumentais (mínimas, há poucos instrumentos no disco) de Kiko Dinucci, Thiago França, Thomas Rohrer e Rodrigo Campos, ela lança seu primeiro disco solo depois de quase vinte anos de carreira, tocando em projetos como o conjunto vocal Vésper, o robusto Metá Metá composto ao lado de Kiko e Thiago e o grupo de pesquisa A Barca. Nestes trabalho pode construir uma personalidade ao mesmo tempo forte e delicada, uma persona comum às divas da música brasileira que tem se tornado artigo raro no último quarto de século. Em Encarnado ela desfila com leveza e graça sem perder o pulso firme e o sangue nos olhos – é um disco essencialmente guerreiro e por mais cru que possa parecer – tanto nas releituras de Tom Zé (“Não Tenha Ódio no Verão”) e Itamar Assumpção (“E o Quico?”), quanto na dolorida e gráfica “Ciranda do Aborto”, de Kiko Dinucci. O disco ainda conta com canções de Siba (“A Velha Capa Preta”), Douglas Germano, Rômulo Fróes, Gui Amabis (numa bela versão para “Pena Mais Que Perfeita”, composta com Régis Damasceno) e Rodrigo Campos, cuja faixa que abre o disco – a angular “Homem Amarelo” – escolhi como amostra deste trabalho. O disco inteiro pode ser baixado aqui.

Encarnado funciona tanto como a consagração de uma carreira em plena ascensão quanto como uma introdução a uma das melhores cantoras ainda desconhecida pelo resto do Brasil. Salve, Juçara!

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Se você não está vendo True Detective, a nova série da HBO que estreou no início do ano, pare o que está fazendo e corra para tentar acompanhá-la. A série, cuja primeira temporada conta com apenas oito episódios, está exatamente na metade de sua história e seus primeiros quatro capítulos foram fodas o suficiente para deixar o nível de expectativa altíssimo. História, elenco, direção, fotografia, trilha sonora – tudo contribui para tornar o clima denso e surreal. E desde o primeiro episódio sabemos que não estamos assistindo a uma série policial qualquer.

Acompanhamos dois momentos na vida de dois investigadores – Rustin “Rust” Cohle e Martin Hart (interpretados respectivamente por Matthew McConaughey e Woody Harrelson). Os dois seguem um padrão manjado de qualquer série policial – dois detetives que acabaram de começar a atuar como uma dupla, dois extremos opostos que têm de aprender a conviver com as excentricidades alheias para concluir uma investigação. Durante toda a série assistimos aos dois começando a puxar o fio da meada de um crime bizarro acontecido em 1995 e retomando-o através da memória em uma série de depoimentos dados em 2012.

Rust e Marty são parceiros improváveis. O policial vivido por Harrelson é conservador e tradicional, pai de família, religioso e correto, enquanto o de McConaughey é pragmático e pessimista, um solitário que saiu cético e desolado de um casamento destruído por uma tragédia familiar. Mas na medida em que os acompanhamos pela série vemos que essa dualidade não é tão maniqueísta assim. Por trás da fachada de bom moço de Marty, descobrimos um adulto infantilizado, irracional, emotivo e com surtos de agressividade. Enquanto Rust, um profeta niilista que demole qualquer esperança com um ponto de vista frio e racional demais, aos poucos mostra que é mais do que simplesmente um psicótico em trajes policiais.

O personagem de McConaughey é um dos principais pilares temáticos da série. Sua filosofia de vida considera a consciência humana um acaso da evolução e todo o sentido da vida torna-se um mero auto-engano para que possamos suportá-la. A cada fala de Rust, os parâmetros em que nos seguramos emocionalmente para garantir nossa sanidade mental são um a um destruídos: religião, família, relacionamentos, sentimentos e até a própria noção da morte. Rust afunda-se num existencialismo inevitável e denso, atraindo uma carga psicológica desagradável que infesta todo o seriado. O personagem ganha uma profundidade ainda maior pelo fato de ser interpretado por McConaughey neste exato momento de sua virada de carreira (assista a Killer Joe, Dallas Buyers Club e à sua ponta em O Lobo de Wall Street e perceba que ele deixou de ser o galã de comédia romântica que estávamos habituados a assistir). Woody Harrelson também não deixa por menos em um personagem avesso à caricatura do doidão que sempre acompanhou a biografia do ator. Seu Marty é um ser humano incompleto, instável e emotivo, que, aos poucos, começa a deixar sua máscara cair.

Os dois investigam um assassinato de uma garota, Dora Lange, encontrada morta nua no meio de uma fazenda, vítima do que parece ser um estranho ritual – chifres fincados em sua cabeça como uma coroa, corpo cheio de inscrições misteriosas. Rust, de cara, suspeita que aquele crime não é um simples assassinato, mas mais um dentro de uma série de mortes bizarras e começa uma investigação pessoal em torno dessa possibilidade, descobrindo pistas que tornam, pouco a pouco, o crime cada vez mais complexo e estranho.

Corta para 2012 e os dois investigadores estão sendo interrogados sobre o crime de 1995. Marty, já careca, de terno e gravata, trabalha com segurança particular. Rust, de cabelos compridos e bigode, rosto magro e olhar ainda mais perturbado, parece ter abandonado a polícia de acordo com sua lógica hiperrealista. Mas não sabemos muito sobre o que acontece em 2012. Por que eles estão dando aqueles depoimentos? Aparentemente, há um novo crime que parece ter ligação com aquele anterior, mas poucas pistas nos são dadas. Não sabemos por que os depoimentos são tomados em separado nem o porquê de uma possível ruptura entre os antigos parceiros.

Suas camadas de entendimento vão para além das falas existencialistas de Rust ou das paisagens desoladas de Louisiana e mexem com temas mais pesados, ainda que não tenha se aprofundado neles. A série tirou seu título da mais clássica publicação pulp policial dos Estados Unidos nos anos 20 e faz referência, em diferentes trechos, à coleção de contos The King In Yellow, escrita por Robert W. Chambers, em 1895, e que serviu de inspiração para autores como Raymond Chandler, Robert Heinlein, Neil Gaiman e, principalmente, H.P. Lovecraft. Os contos deste livro fazem referência a uma peça chamada The King In Yellow, que fala sobre uma cidade chamada Carcosa governada por uma entidade maligna chamada Hastur, o rei amarelo. Não sabemos de mais nada sobre essa peça além disso (e que os nomes Carcosa e Hastur apareceram primeiro nos trabalhos de Ambrose Bierce, autor do Dicionário do Diabo, que desapareceu durante a guerra entre México e Estados Unidos, no início do século passado) e sobre sua influência em seus leitores – os personagens do livro de Chambers que leem The King in Yellow simplesmente enlouquecem. As palavras “carcosa” e “Yellow king” aparecem em um diário encontrado em dado momento em True Detective, mas a citação não foi além disso.

Talvez seja apenas a dica inicial de que não estamos, de forma alguma, assistindo a uma série policial. A investigação da morte de Dora Lange pode ser só o ponto de partida para algo maior e mais bizarro, talvez sobrenatural. Afinal o pessimismo filosófico de Rust também pode ser entendido como a tétrica constatação que permeia toda a obra de H.P. Lovecraft – de que somos cobaias na mão de um deus perverso e que a humanidade apenas nasceu para sentir dor e desespero. O programa também faz citações a outro clássico da desesperança, Apocalypse Now de Francis Ford Coppola, quando somos apresentados ao vilão da série no final do terceiro episódio (que cita nominalmente o Vietnã) e quando Rust parte, num bote movido por hélice, rumo ao desconhecido, perto da espetacular sequência final do quarto episódio. Há uma caça a um coronel Kurtz em andamento e é claro que ele já viu “o horror”. A inspiração de Coppola, o livro Coração das Trevas, de Joseph Conrad, aprofunda as comparações com o niilismo de Rust, que também encontra eco em outro clássico da literatura, Crime e Castigo, de Dostoiévski.

Escrita apenas pelo criador da série – Nic Pizzolatto – e dirigida por apenas uma pessoa – Cary Joji Fukunaga, em seu primeiro trabalho na TV -, True Detective é um longo filme de oito horas, cuja ambientação dura e sufocante às vezes ganha ares de sonho ou alucinação. Sua segunda temporada contará outra história, com outro elenco e personagens. Esta que assistimos agora termina daqui a quatro capítulos e o quinto deles será exibido ainda hoje, nos EUA (e retransmitido pela HBO brasileira na meianoite do domingo para a segunda).

Sexo, drogas, violência e rock lúgubre e pesado (com toques de country music, cortesia de T Bone Burnett, que já tocou colocou Captain Beefheart, Lucinda Williams, Black Angels e Grinderman pra tocar no programa) dão a tônica de um seriado ímpar, que já é a melhor coisa na televisão em 2014 e tem tudo para se tornar uma forte referência para a TV do futuro, implodindo ainda mais os limites entre cinema e televisão. Só a cena final do quarto episódio – um take de seis minutos de tirar o fôlego até de Alfonso Cuarón – já mostra que estamos assistindo a um outro nível de série. Acompanhe enquanto é tempo, pois cada episódio pede para ver e ser revisto ao menos duas vezes. E descubra que não é preciso cogitar duelos entre casas reais de um passado fictício ou a tensão zumbi de um futuro apocalíptico para trazer o horror para a televisão – ele pode estar à espreita, na esquina.

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A foto ficou péssima, já tinha falado no Insta, mas é o único registro visual do papo que tive com o Miranda e com o Ricardo Alexandre sobre nosso período de formação – o meu e de Ricardo como jornalistas e o de Miranda, mais velho que nós dois, como produtor. Ricardo nos juntou ali no estúdio da YB na Vila Madalena pra falar sobre o período retratado em seu novo livro Cheguei Bem a Tempo de Ver o Palco Desabar – 50 Causos e Memórias do Rock Brasileiro (1993-2008), que será lançado em dois eventos nas próximas semanas. O que devia ser uma análise sobre como o mercado de discos desandou a partir do Plano Real para chegar à terra de ninguém que vivemos hoje virou uma bela conversa de boteco saudosista, com eu e Ricardo pilhando Miranda para contar suas histórias do início dos anos 90.

Cheguei Bem a Tempo… é o terceiro livro do Ricardo Alexandre e o título se refere não apenas à queda do palco no primeiro dia do segundo festival Juntatribo, em 1994, em Campinas, mas também à sua formação como jornalística no início da queda do sistema que havia se erguido décadas antes. Depois de usar o rock brasileiro dos anos 80 para falar da formação do mainstream pop no país em seu Dias de Luta e de contar a história de Wilson Simonal em Nem Vem que Não Tem, Ricardo abre mão de longas pesquisas e de temas delicados para lembrar de histórias de cabeça e escrever sem a pretensão de estar se referindo à história – embora esteja. Em tom de bate-papo, o livro foi publicado originalmente em posts em seu blog e exige uma leitura quase informal, de fácil grude, que o faz ser devorado rapidamente.

Estive ao lado de Ricardo em várias situações retratadas no livro – algumas nominalmente, quando o conheci na calçada do lado de fora do Hitchcock, em Santa Bárbara d’Oeste, quando saímos no meio de um show do Símbolo, quando o encontrava com o Emerson “Tomate” Gasperin na redação do Estadão, em que trabalharia dez anos depois, para irmos a shows ou coletivas de imprensa ou quando assistimos, às gargalhadas ao lado de Marcelo Ferla, ao Acústico MTV do Capital Inicial. Uma colaboração minha no Caderno Z que Ricardo havia criado no Estadão foi meu primeiro frila pago (uma matéria sobre o aniversário de Syd Barrett) e escrevi a primeira matéria de capa da volta da Bizz capitaneada por Ricardo, em 2005, sobre a volta dos Stones daquela época. Por isso passear pelas páginas do livro foi um reencontro com épocas da minha biografia que estavam encaixotados em prateleiras da memória. A melhor gargalhada do livro, a pergunta que outro bróder, Fabio Bianchini, faz ao baterista do Jota Quest, era dessas histórias que eu não me lembrava que lembrava.

Mas fora os bastidores da notícia, o livro fala da ascensão e queda de nomes que formaram o panorama pop brasileiro atual – dos Raimundos aos Los Hermanos, de Charlie Brown Jr. à Nação Zumbi, da Trama à Pitty, dos Racionais a Marcelo D2 -, explicando didaticamente como é que chegamos onde estamos. E, a meu ver, o principal trunfo do livro é contar essa história sem o pesar derrotista da maior parte dos contadores de história atuais. Seus ingredientes funcionariam como um prato cheio para quem quisesse detectar, nesses quinze anos retratados pelo livro (1993-2008), os motivos pelos quais o Brasil nunca vai dar certo. Mas a leitura de Ricardo redime o leitor e fechei o livro mais otimista do que quando o abri. Recomendo pacas.

Em São Paulo, o livro será lançado na Fnac de Pinheiros, dia 13, com show dos Charts. No Rio, o lançamento acontece na quinta seguinte, dia 20, na Livraria Cultura Cine Vitória, com show de Piu Piu e Sua Banda. Abaixo, uma hora e meia de papo furado entre eu, Ricardo e Miranda, que, diz, vai lançar seu próprio livro em breve. Aí eu quero ver!