Thiago França, Malagueta, Perus e Bacanaço

, por Alexandre Matias

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No finzinho de 2013, o prolífico Thiago França lançou sua homenagem ao livro de estréia e obra-prima do escritor paulistano João Antônio, Malagueta, Perus e Bacanaço. O livro, que completou 50 anos no ano passado, é um clássico do modernismo contemporâneo brasileiro que pertence a um cânone pouco difundido da cultura brasileira – o da marginália paulistana, uma cultura de rua de partidas de bilhar e ruas frias da metrópole quatrocentona que foi tornando-se cada vez mais influente à medida em que o século vinte passava. França reuniu velhos companheiros (Kiko Dinucci, Rodrigo Campos, Marcelo Cabral, Juçara Marçal, Daniel Ganjaman, Maurício Pereira, Ogi e Rômulo Fróes) para uma celebração ao passeio feito pelos três personagens que batizam o livro entre a Lapa, o centro, Pinheiros, Água Branca e a Barra Funda, numa jornada vertiginosamente saudosa e lírica, em que sax assume o papel de narrador e nos conduz naquela viagem. Ele liberou uma faixa pra cá:

O disco virou show há um mês e deve ganhar novas versões em breve, além de uma possível versão em vinil. Abaixo, o papo que tive com Thiago por email a respeito do disco-trilha-sonora-de-livro.

Fale sobre sua relação com o Malagueta, Perus e Bacanaço.
Conheci o livro através do Rodrigo Campos, ele que me indicou na época em que a gente fazia a Gafieira Nacional, que rolava toda segunda-feira no Ó do Borogodó, entre 2009 e começo de 2011. Sentei pra ler o Malagueta… e levantei com o livro terminado, tamanho o fascínio por ele. Tive uma identificação muito grande com os fatos, com a estética, me senti representado, me vi no livro, dentro do universo do JA que pra mim é muito familiar: o universo da rua, imperfeito, sem cosmético, sem photoshop; a relação entre as pessoas, a camaradagem.

Faltava música? Por que musicar um livro? Você já tinha pensado nisso para outras obras literárias?
Livros em geral me inspiram. O silêncio é a melhor inspiração, partir do zero, sem influências, puro. Por que não musicar um livro? Não foi pensado, mas muitas vezes, lendo, tenho uns estalos. Li o livro num domingo e na segunda-feira, cheguei na Gafieira com o primeiro tema “Malagueta, Perus e Bacanaço”, que pra mim, resume a história toda. Daí o Rodrigo pôs pilha pra eu continuar compondo em cima do livro, e o Kiko Dinucci, quando ouviu, também disse a mesma coisa. Isso foi em 2010. Compus também naquele mês “São Paulo de Noite”, “Tema do Carne Frita”, “De volta à Lapa” e uma melodia que se transformou no “Fome”. Quando vi que tinha assunto pra gravar um disco, esperei 2013 pra prestar uma homenagem aos 50 anos do livro, porque na verdade, esse disco é isso, uma homenagem. Quando a gente marcou a data pra gravar, encomendei as músicas com Kiko, Rodrigo, Romulo Fróes, e o Kiko sugeriu a participação do Ogi, que ficou incrível. As minhas outras composições pro disco também apareceram nessa época.

Qual tua preocupação em fazer essa adaptação?
A única preocupação foi em não ver o filme do Capovilla, que tem trilha do João Bosco e do Aldir Blanc, pra não ser influenciado. Fora isso não me preocupei muito, não fiquei pensando se o JA aprovaria, ou como ele faria, ou sei lá. Quis apresentar a minha leitura do conto, sincera, com a cabeça no conto, nos anos 60 mas os pés em 2013.

Como João Antonio encararia a São Paulo de 2014?
Acho que ele estaria bem puto, hehehe… A cidade virou um grande canteiro de obras, está perdendo sua identidade, sua história, suas esquinas. Mas acho que o JA ia acabar encontrando por aqui sua curriola.

Depois de disco, show… o projeto pode virar o que mais? Filme, documentário, exposição, DVD, aplicativo (haha)?
Xiii… não sei. No show de pré-lançamento, uma estudante de cinema disse que escreveu um roteiro inspirada nas músicas. Um livro que inspirou um disco que inspirou um roteiro que já é uma terceira coisa. Não sei onde isso vai dar, mas tô achando bom. Mas sinto que esse ciclo está completo, minha preocupação agora é com os próximos projetos.

Abaixo, o disco na íntegra:

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