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Anouk Aimée (1932-2024)

Uma das grandes musas do cinema moderno, Anouk Aimée nos deixou nesta terça-feira, anunciou a própria filha da atriz, Manuela Papatakis, em um post no Instagram: “Com minha filha Galaad e minha neta Mila, temos a enorme tristeza de anunciar a partida de minha mãe Anouk Aimée. Estava ao lado dela quando ela faleceu esta manhã em sua casa, em Paris.” Nascida Francoise Dreyfus e filha de atores, ela troucou seu nome artístico em referência à primeira personagem de sucesso que interpretou (aos 14 anos, no filme La Maison sous la Mer, de Henri Calef) e depois trocou o sobrenome por “Aimée” (“amada”, em francês) após o poeta e roteirista Jacques Prévert sugerir a mudança, quando escreveu o papel da protagonista do filme Les Amants de Vérone especialmente para ela. Foi musa de alguns dos principais diretores dos anos 60 e sua presença em filmes como Le Rideau Cramoisi (de Alexandre Astruc), La Dolce Vita e 8½ (de Fellini), Lola (de Jacques Demy) e, obviamente, Un Homme et une Femme (de Claude Lelouch) determina o rumo destas obras. Com Lelouch visitou a personagem que lhe consagrou, Anne Gauthier, outras duas vezes, em Un homme et une Femme: Vingt ans Déjà (1986) e Les Plus Belles Années d’une Vie (2019). Trabalhou ainda com Bernardo Bertolucci (La Tragedia di un uomo Ridicolo, 1981) e Robert Altman (Prêt à Porter, 1994) e foi definida por Fellini como “o tipo de mulher que faz você morrer de preocupação”, após comparar sua beleza com a de Greta Garbo, Marlene Dietrich or Cindy Crawford: “estas grandes rainhas misterioras, sacerdotisas da feminilidade”. Au revoir, chérie!

Nahim (1952-2024)

Ídolo pop nos anos 80, o cantor Nahim foi encontrado morto nesta quinta-feira. O paulista de Miguelópolis Nahim Jorge Elias Júnior, filho de pai libanês e de mãe baiana, sempre esteve envolvido com música, desde a adolescência, e foi descoberto pelo produtor Mister Sam, que o lançou com o nome de Baby Face e cantando músicas em inglês no início dos anos 80. Mas só se tornou conhecido ao passar a cantar em português, quando foi convidado para participar do programa de auditório Qual é a Música?, que Sílvio Santos exibia em seu SBT aos domingos, ficando invicto por 20 semanas e tornando-se um dos maiores vencedores do programa (atrás somente de Ronnie Von, Sílvio Britto e Gretchen). Ao tornar-se um popstar televisivo numa variação de um show de calouros, suas músicas começaram a fazer sucesso e a fama da TV fez que músicas bestas com títulos igualmente fúteis, como “Coração de Melão”, “Dá Seu Coração” e “Tacka Tacka”, tornou-se um dos principais astros daquela nova década. Ao terminar o contrato com o SBT, tornou-se jurado no programa Cassino do Chacrinha, na Globo, o que fez tornar-se ainda mais popular – mas como muitos de sua geração foi engolido quando as bandas de rock dos anos 80 atingiram uma popularidade muito maior. Nas décadas seguintes, Nahim passou a viver a vida como celebridade do passado e traçou um percurso feito pela maioria destas celebridades: participou programas do tipo reality show, foi preso e tentou a carreira como político, mas não foi eleito. Apesar de ter morrido por conta de uma queda, que resultou em traumatismo craniano, suspeita-se que ele tenha tido um enfarto ou mau súbito, o que lhe fez cair de uma escada em sua própria casa, em Taboão da Serra, em São Paulo.

Skowa (1955-2024)

Que triste a notícia da passagem do Skowa, uma lenda da cena musical paulistana, que sempre teve o suíngue como principal arma, para circular em territórios tão diferentes quanto o funk, o samba rock, o choro, o rock e ritmos latinos. Nascido Marco Antônio Gonçalves dos Santos ganhou o apelido devido ao penteado black power que por muitos anos foi sua marca registrada e tocava na noite da cidade ainda nos anos 70, quando montou o grupo de salsa Sossega Leão, que tinha em sua formação integrantes dos Titãs (Paulo Miklos e Nando Reis) e do Ira! (André Jung) que tocaram com Skowa antes mesmo das bandas que lhes deram fama existirem. Passou pelo Premeditando o Breque, pela Gang 90 e pela banda de Itamar Assumpção nos anos 80 e atingiu o sucesso nacional quando fundou sua banda Skowa e a Máfia ao lado de outras lendas da cena da cidade como Lelena Anhaia, Tonho Penhasco e James Muller, e entrou no inconsciente coletivo brasileiro com a imortal “Atropelamento e Fuga”, versão funky para uma música do grupo pós-punk Akira S & As Garotas Que Erraram. Foi um dos entusiastas do samba rock quando ninguém dava bola pro gênero ao criar o Grêmio Recreativo Amigos do Samba, Rock, Funk & Soul nos anos 90, que dividiu músicas com Jorge Ben. Além da versatilidade musical era um dos nomes mais queridos da cena paulistana, transitando por diferentes círculos e abrindo portas e possibilidades para vários artistas em início de carreira. Além da música, trabalhou com teatro, cinema, televisão e rádio e foi o responsável pela volta do Trio Mocotó no início do século, quando assumiu o lugar do fundador Fritz Escovão, quando este resolveu sair da banda, e, depois de uma pausa, estava aos poucos retornando para os palcos com o lendário trio que acompanhou Jorge Ben. Deixa uma lacuna enorme no coração de muita gente. Obrigado, mestre!

Françoise Hardy (1944-2024)

Com um post no Instagram em que dizia “mamãe se foi”, Thomas Dutronc anunciou ao mundo a morte de sua mãe, a grande dama da canção francesa Françoise Hardy, que há 20 anos era vítima de um câncer no sistema linfático, embora a causa de sua morte não tenha sido revelada. Nascida na Paris ocupada pelos nazistas durante um bombardeio, Françoise teve uma infância miserável e só aos 16 anos de idade teve contato com a música, quando aprendeu a tocar violão. Dois anos depois gravaria o primeiro disco, Tous les Garçons et Les Filles, cuja faixa-título foi um dos maiores sucessos da indústria fonográfica de seu país. Com uma música composta por ela mesma – algo raro naquele mercado naquela época – a jovem cantora conectou a juventude francesa com a música pop que começava a dominar o planeta, ao iniciar um movimento que seria conhecido como yé-yé, parente distante do iê-iê-iê da Jovem Guarda brasileira. Jovem musa durante os anos 60, foi cortejada pelos Rolling Stones, por Bob Dylan (que dedicou-lhe um poema na contracapa de seu segundo disco) e David Bowie, era uma das modelos preferidas de Yves Saint Laurent e atuou em filmes de Jean-Luc Godard, Roger Vadim, John Frankenheimer e Claude Lelouch, mas à medida em que tornava-se mais popular, tornava-se mais introspectiva, tanto pessoalmente quanto em termos musicais. Passou a gravar canções de Serge Gainsbourg e Leonard Cohen e ganhou uma aura madura que consagrou sua importância na história da música pop, tornando-se uma espécie de encarnação da canção francesa mais do que qualquer outro intérprete contemporâneo. E não custa reforçar a importância da música brasileira para sua música: depois de ter gravado “Sabiá”, de Tom Jobim e Chico Buarque, como “A quoi ça sert”, ela dividiu seu melhor disco, o soberbo, sexy e delicado La Question, de 1971, com a violonista Tuca – foi seu único disco em que ela envolveu-se com a produção musical, uma vez que Tuca compôs quase todas as músicas, que foram arranjadas a partir de sugestões de Hardy, ao contrário de seus outros discos, em que ela apenas gravava a voz após toda a parte musical ter sido feita (além de ter uma versão para uma música de Taiguara (!) – e “A transa” virou “Rêve” em francês). Em seus últimos anos parou de cantar devido ao câncer que enfrentava e tornou-se uma das principais vozes na França a advogar a favor da eutanásia, uma causa que ajudou a tirar do tabu para tornar-se uma pauta política. Sua voz e suas canções ajudam a manter seu nome vivo entre nós. Merci, madam.

Maria da Conceição Tavares (1930-2024)

A passagem de Maria da Conceição Tavares nos pega de surpresa porque, mesmo quase centenária, sua voz ainda ecoa entre nós como o peso da consciência social como farol básico na implementação de qualquer sistema gestor – não apenas em escala macro, como o governo de um país, alvo eterno de suas críticas, mas de qualquer organização de cunho político, por menor que seja (um partido, um grêmio estudantil, uma família). Se até hoje ainda falamos da importância de olhar para o lado humano das pessoas em vez de tratá-las como uma linha numa planilha de orçamento (coisa que muitos países já esqueceram), é porque ela vem levantando sua voz e influenciando cada vez mais gente por esse ponto, tão obviamente central que muitos preferem deixar na mão do infame “mercado”. Obrigado, professora!

Silvio Luiz (1934-2024)

Nesta quinta-feira morreu um herói. Sílvio Luiz era mais do que um dos melhores locutores de futebol da história do Brasil, ele me ensinou, ainda moleque, a sutil diferença entre reconhecer a importância e gostar. Cresci corintiano ouvindo-o empolgar-se pelo time que era do nosso coração e sendo severo quando precisava, sem que fosse preciso cornetar ou falar mal só pela paixão de torcer, me fez entender que a isenção é uma máscara malfeita, que todo mundo sempre vai ter o seu lado, o seu favorito, o seu querido. Mas seu Silvio mostrava que a paixão não podia ser cega e que não dava pra passar pano pra ninguém. Lições morais do futebol que carrego pra vida, inclusive profissional. E seu compromisso, jornalístico (afinal, um narrador de futebol deveria considerar-se um jornalista), era com os fatos, o que o fazia não gritar gol – e sim um de seus inúmeros bordões, o “foi, foi, foi, foi, foi, foi ele!”, que lhe dava tempo para conferir o nome e o número do jogador e dar mais detalhes sobre o que tinha acabado de acontecer. E se for falar em bordão, não tem pra ninguém: “olho no lance”, “eeeeeeeeu vi!”, “acerte o seu aí que eu arredondo o meu aqui”, “no gogó da ema”, “no paaaaaaau”, “manda o sapato daí”, “pelo amor dos meus filhinhos”, “balançou o capim no fundo do gol”, “o que é que só você viu?” e “no meio da caneta”, sempre com sua voz rasgada e grave, macia e estirada, costurando palavras improvisadas na hora misturando o tom informal da conversa na arquibancada do jogo com uma crônica bem humorada e ao mesmo tempo cética, que transformou expressões clássicas como “minha nossa senhora” e “pelas barbas do profeta” em suas. Ele já estava mal e foi internado duas vezes este ano, esta última, sem volta. Mas viveu quase 90 anos intensos, sempre reconhecido pelo público de pelas torcidas – não só a do nosso time. E a notícia de sua morte ainda nos lembra que ele foi o primeiro brasileiro a veicular um palavrão na TV brasileira, quando deu o microfone a um jogador, que xingou o juiz de “filha da puta” – isso em 1953. Obrigado, mestre! Vai em paz.

Fernanda Azevedo (1976-2024)

Arrasado com a notícia da passagem da Fer. Fernanda não era só a madre superiora da produção independente brasileira, ensinando gerações e gerações sobre a necessidade de manter-se em atividade, fazendo acontecer não importe o que custasse – era também uma das melhores pessoas do mundo. Conheci naquele fim de século quando a internet era um faroeste para os desbravadores da cena indie brasileira e ela apresentava-se como terceira integrante do choque de realidade que foi a Motor Music. A produtora mineira, idealizada pelo realizador Marcos Boffa e pelo zineiro Jefferson Kaspar, encontrou na Fernanda o motor de seu título – e ela, produtora à moda antiga, que ia aprendendo enquanto fazia, espalhava a palavra daquela nova realidade musical aos quatro ventos do Brasil. “Fernanda da Motor” foi responsável por consolidar a cena indie de Belo Horizonte na virada do século ao mesmo tempo em que participou das primeiras turnês de artistas independentes para o Brasil numa época em que ninguém acreditava nisso – e começamos a nos encontrar nos shows do Superchunk, Man or Astroman?, Stereolab, Yo La Tengo, Tortoise e tantos outros que a produtora mineira trouxe ao Brasil pela primeira vez. Depois que a Motor acabou ela não parou de produzir, fossem eventos, shows ou festas que ela idealizava ou que a chamavam para trabalhar – e gerações seguintes, tanto em Minas quanto no resto do país, reconheciam sua importância e a tinha como referência. Mineiramente, como de hábito, ela nunca puxou a sardinha pra própria brasa, preferindo o estilo baixo perfil que deixava pra lá quando nos encontrávamos pessoalmente – sempre disposta a ir até o final, aprontando todas, juntando todo mundo e se esbaldando, mesmo quando estava trabalhando. Perdi a conta de quantas vezes ela me chamou pra BH seja pra discotecar, cobrir eventos ou participar de debates e toda vez que caía na capital mineira sempre dava um jeito de encontrá-la – ver a Fer era mais importante do que visitar o mercado central. A mera lembrança de seu indefectível largo sorriso sempre me causou suspiros e, agora, lágrimas – e fica pra nossa história etérea a lendária entrevista que faria com ela quando fosse escrever o livro da Motor, que ela tentou emplacar em alguns editais. Dávamos largas risadas ao imaginar quantos dias duraria essa entrevista e o que poderia ser publicado de tudo que ela contasse, lembranças que, agora, ficam conosco, como o legado de manter tudo funcionando não importa o que acontecesse. Falei com ela na segunda agora, combinando de vermos o Pavement juntos. Que mundo injusto. Saudades, mulher, você já faz falta…

David Sanborn (1945-2024)

Morreu um dos maiores saxofonistas da história da música pop, senão o maior. Embora muitos torçam o nariz para essa combinação, o estilo específico de David Sanborn atravessou gerações e gêneros musicais e além de ter gravado discos como o disco de estreia dos Eagles, o Talking Book de Stevie Wonder, o Born to Run de Bruce Springsteen e Young Americans de David Bowie (discos em que sua participação é, por vezes, determinante), ele também tocou com James Brown, Eric Clapton, Rolling Stones, Carly Simon, Elton John, Steely Dan e Paul Simon, entre muitos outros. Ele tocou ainda adolescente com os bluesmen Albert King e Little Milton e foi integrante da Paul Butterfield Blues Band, com a qual tocou em Woodstock. É meio forçado dizer que ele foi o responsável por colocar o saxofone no rock (pois o instrumento estava ali desde o começo), mas ele é sem dúvida o principal ícone do sax durante o período áureo do rock, como a série de colaborações (e discos solo que gravou) acabam por deixar claro. Morreu de câncer de próstata, com o qual lidava desde 2018 e tinha shows marcados até o ano que vem, como sua família fez questão de anunciar no pronunciamento oficial sobre sua passagem.

Paulo César Pereio (1940-2024)

A vida de excessos do genial Paulo César Pereio chegou ao fim na tarde deste domingo, quando esse ícone do cinema brasileiro cedeu à complicações hepáticas que lhe levaram às pressas para o hospital neste fim de semana. Morando desde o início da pandemia no Retiro dos Artistas, no Rio de Janeiro, entidade gerida pelo amigo Stepan Nercessian, ele andava mais recluso e bem distante da imagem pública de boêmio incansável que o eternizou. “Construo este mito para ser pouco incomodado”, ele contou ao jornalista Geneton Moraes Neto em entrevista em 2010. É uma espécie de self-art. Pereio, na terceira pessoa, é obra minha. Posso ser considerado no Brasil uma celebridade. As pessoas me reconhecem na rua. Mas posso me dar ao direito de sair sozinho por aí, subir morro, andar na banda podre e na baixa sociedade, tranquilamente. Sei como não ser vítima disso. Conheço atores brasileiros que têm de fingir que são outra pessoa para sair na rua”.

Nascido em Porto Alegre, ele mudou-se para o Rio nos anos 50, onde participou de algumas montagens de teatro moderno (como Esperando Godot em 1958 e a clássica versão de Zé Celso Martinez Corrêa para a Roda Viva de Chico Buarque em 1968) e logo foi puxado para o cinema. Estreou em 1964 no filme Os Fuzis de Ruy Guerra e fez uma participação breve Terra em Transe de Glauber Rocha, em 1967. A partir dessa época e pelos anos 70, tornou-se uma constante em filmes brasileiros, atuando em produções como Os Marginais, O Homem Que Comprou o Mundo, A Lira do Delírio, Chuvas de Verão, Os Inconfidentes, Bang Bang, A Dama do Lotação, Lúcio Flávio – O Passageiro da Agonia, Rio Babilônia e Toda Nudez Será Castigada, entre dezenas de outros – foram quase 60 filmes.

Misto de Humprey Bogart com Jean Paul Belmondo, Pereio fazia personagens que se confundiam com sua persona pública, um galã da pesada, sensível e truculento, que criava problemas e despertava paixões por onde passava. Trabalhou com os maiores nomes de nosso cinema (Cacá Diegues, Andrea Tonacci, Hector Babenco, Neville de Almeida, Joaquim Pedro de Andrade e Arnaldo Jabor), além de circular tanto pela turma do Cinema Novo quanto da pornochanchada com a mesma desenvoltura. Também fez carreira na publicidade (com sua voz grave tornando-se sinônimo de algumas marcas) e na TV, quando trabalhou em produções da Globo como Gabriela, Roque Santeiro, Anos Dourados, A Viagem, Presença de Anita e Carga Pesada. Foi amigo pessoal de Nelson Rodrigues e dirigiu sua penúltima peça (O Anti-Nelson Rodrigues, 1974), além de ter sido o foco do documentário Peréio, Eu Te Odeio, dirigido por Allan Sieber e Tasso Dourado em 2013. Viveu como quis, morreu como pode. Um bastião da nossa cultura e também o retrato de uma época.

Não sou propriamente fã do saudoso Pereio, mas é inevitável reconhecer seu talento. Sua atuação intensa e indomável transforma qualquer cena em que ele atue num épico dramático de proporções simultaneamente caricatas e gigantescas – esteja em um filme clássico brasileiro ou batendo boca em um boteco qualquer. E em nenhum filme ele está tão bem quanto no clássico Bang Bang, que Andrea Tonnaci dirigiu em 1971, que figura entre os melhores filmes brasileiros na minha opinião. Só a cena de abertura, um clássico em si mesma, em que ele discute com um taxista de forma completamente improvisada, já vale o filme inteiro e funciona como uma analogia do que Tonnaci – e o próprio Pereio – estava fazendo no cinema (a anarquia completa do personagem principal) em relação à formalidade da linguagem no Brasil (o monte de explicações dadas pelo coadjuvante para não conseguir fazer o que está sendo pedido). Um momento único da sétima arte, puro delírio. Obrigado, Pereio.

Assista à íntegra de Bang Bang abaixo:  

Roger Corman (1926-2024)

Morreu um pilar do cinema moderno. Roger Corman foi conhecido como o grande nome dos filmes B, produções de baixo orçamento que serviam tanto para manter o público nos cinema quando a TV começou a crescer na virada dos anos 50 e 60 quanto para explorar novas possibilidades artísticas, que às vezes convergiam com a questão comercial, às vezes não. E assim ele fazia seus filmes compulsivanmente, realizando quase 400 produções entre 1954 e 2008, quando resolveu aposentar-se. Ao fazer filmes baratos, trabalhava fora do sistema de Hollywood e tornou-se um dos principais nomes do cinema independente do mundo. Fazendo filmes baratos em gêneros considerados de segundo escalão (como horror, ficção científica e aventura), ele também foi o responsável por distribuir uma nova geração de diretores estrangeiros nos EUA, o que também ajudou a moldar a cara da nova Hollywood, a partir dos anos 70, quando conseguiu os direitos para distribuir filmes de Fellini, Bergman, Truffaut e Kurosawa, entre outros. O epíteto “papa do cinema pop” que batiza um documentário de 2011 sobre sua carreira acaba limitando sua importância. Mais do que o progenitor do cinema norte-americano como o conhecemos hoje, ele o fez que, ao contrário do cinema industrial de Hollywood na época, a linguagem cinematográfica de seu tempo – a nouvelle vague francesa, o neorrealismo italiano e o cinema japonês, para ficar em alguns exemplos – conseguisse atingir uma geração de atores e diretores que mudariam a cara do cinema como o conhecemos. Abriu as portas para novos profissionais, oferecendo as primeiras oportunidades no cinema para diretores como Francis Ford Coppola, Martin Scorsese, Jonathan Demme, James Cameron, Peter Bogdanovich, Ron Howard e Joe Dante e atores como Peter Fonda, Robert DeNiro, Jack Nicholson, William Shatner, Dennis Hopper, Bruce Dern e Diane Ladd, além de colocar mulheres em empregos executivos no cinema quando este era uma indústria formada apenas por homens. Morreu com quase cem anos, em sua própria casa, cercado pela família, que emitiu um comunicado explicando que perguntou como ele gostaria de ser lembrado: “Fui um cineasta, só isso”, contou.