C6Fest: Dia 2 – agora sim!

, por Alexandre Matias

Agora sim o C6Fest disse a que veio. Depois de um primeiro dia irregular (pouco público, atrações que não empolgaram tanto e pouca circulação entre o público de diferentes palcos, o que não valorizava a ótima estrutura do evento), o festival feito pelo time que criou o Free Jazz e o Tim Festival em outras aeons mostrou não só que está disposto a entrar de vez no mapa cultural de São Paulo como superou quaisquer outros festivais realizados por aqui desde os tempos do saudoso Planeta Terra. A utilização dos espaços do Parque Ibirapuera e um elenco ousado e pouco trivial transformou o festival em uma experiência única, que talvez só pecasse pela falta de sinalização entre o Auditório do parque e a área comum em que se localizavam outros dois palcos, maior distância a ser percorrida pelo público – ou será que monitores humanos usando lâmpadas e megafones para apontar o caminho são mais eficazes do que placas bem posicionadas?

Leia o resto do texto e assista aos vídeos abaixo:

Foi o primeiro dia em que a área externa do Auditório foi utilizada, usando a enorme parede do prédio de Niemeyer como telão gigantesco acima do palco. Só esse palco era um perfeito festival à parte. O Model 500 do inventor do techno Juan Atkins passou por alguns dos pilares do gênero, entre eles a imortal “Clear”, quando Atkins assinava como Cybotron.

Uma boa apresentação antes do mesmo show maravilhoso de sempre do Kraftwerk – foi a sexta vez que assisti aos papas alemães da música eletrônica ao vivo e foi o segundo melhor show deles que vi por um simples motivo: tirando a histórica apresentação que fizeram num Free Jazz vinte e cinco anos atrás (quando trouxeram todo seu equipamento analógico para o palco no Jockey), todos os outros shows que o grupo fez no Brasil foi em sua versão digital e em vez usarem sintetizadores, eles estavam tocando notebooks, o que causava uma sensação de que ou eles não estavam tocando de fato (essa mantra antieletrônico que ainda sobrevive) ou que eles estavam de saco cheio de estar no palco. Desta vez, os laptops foram aposentados e bancadas iluminadas funcionavam como mesas de som – e era possível ver os quatro mexendo as mãos para girar botões, aumentar frequência e tocar melodias, o que causava uma sensação maior de comprometimento com o show.

E para não dizer que foi uma apresentação idêntica a todas as outras, o show deste sábado foi o primeiro do grupo no Brasil sem um de seus fundadores originais, Florian Schneider (dupla eterna do último remanescente, Ralf Hutter), que morreu em 2020 e o primeiro em que eles incorporaram elementos locais à apresentação (projetando um disco voador que planava sobre São Paulo e depois pousava em frente ao Auditório Ibirapuera – que cena maravilhosa!), mas infelizmente sem os robôs que sempre voltavam para o bis no lugar dos humanos.

A última atração deste palco foi a dupla inglesa Underworld, que puxou uma catarse eletrônica noventista, conectando saudosistas do auge da dance music do final do século passado e novos fãs – e como dança o vocalista Karl Hyde, vai dizer…

Enquanto isso, em outro palco, a Nômade Orquestra pegou pesado ao reunir BNegão, Kaê Guajajara e Russo Passapusso, tocando antes do fenômeno Jon Baptiste, uma espécie de Prince do século 21 (perdi o Mdou Moctar pra ver o Kraftwerk): um showman fulminante e um multiinstrumentista de tirar o fôlego com um carisma que é pura dinamite – além d ter a humildade de ter chamado a mestra Lia de Itamaracá para fechar sua apresentação, enquanto ele se jogava no público tocando escaleta (teve até paulistano fazendo roda de ciranda, que momento!).

No palco pista, finalmente lotado, a festa Luna passeou por hits indie dance certeiros deste século enquanto temperava com flashbacks radiofônico dos anos 80 – e todo mundo que estava nos outros palcos foi avisado que poderia cair na festa. Depois foi a vez da festa Pista Quente, com aquele BPM de house clássico enfileirando clássicos da dance music com pérolas obscuras de artistas desconhecidos, sem perder o jogo de cintura. O C6Fest redefiniu os parâmetros de como fazer um senhor festival de música em São Paulo justamente na época em que mais eventos desse tipo parecem pipocar em cada esquina. A regra do jogo agora é outra – e domingo tem mais.

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