Um dos principais jornalistas do Brasil contemporâneo morreu neste domingo de manhã. Claudio Julio Tognolli trabalhou nas principais redações do Brasil, foi autor de livros importantes como O Século do Crime, A Sociedade dos Chavões e A Falácia da Genética, além de ter sido fundador da da Associação Brasileira da Jornalismo Investigativo (Abraji) e de ser professor na Escola de Comunicação e Artes da USP. Infelizmente, nos últimos anos de vida enveredou pelo antipetismo de forma ferrenha a ponto de comprometer sua biografia ao pavimentar o caminho que levou o país ao bolsonarismo, subindo em carro de som a favor do impeachment de Dilma, declarando-se fã de Sergio Moro, escrevendo a biografia de Lobão e participando dos quadros da Jovem Pan em sua fase mais de extrema-direita. Por pouco não foi integrante do RPM um pouco antes da explosão do grupo nos anos 80 e seguia tocando guitarra.
Morreu um dos grandes. Só a história da entrada de Damo Suzuki no Can já valeria seu lugar na história. Nascido no Japão nos anos 50, mudou-se para a Europa no meio dos anos 60, quando ficou vagando a esmo por diferentes lugares, fazendo todo tipo de trabalho – e de arte. Até que encontrou os integrantes do Can na rua, quando o quarteto, prestes a começar mais um show, souberam da saída do antigo vocalista. Encontraram aquele japonês andando e cantarolando na rua, começaram a conversar com ele e, do nada, ele topou fazer improvisar os vocais nos shows daqueles caras. Foi o começo de uma curta e definitiva a carreira: os quatro discos em que Damo foi o vocalista do Can (na ordem – Soundtracks, Tago Mago, Ege Bamyası e Future Days) não só colocaram o grupo alemão no topo de um novo movimento musical como estabeleceu sua reputação para o resto da vida – a ponto de Mark E. Smith, do Fall (justo quem!), ter escrito uma música chamada “I Am Damo Suzuki”. Desde sua saído do Can, em 1973, ele vaga pelo planeta se juntando com músicos improvisadores não importando de onde eles vêm: música eletrônica, rock, jazz, noise, funk, ambient. Em cada lugar que passava montava um grupo para tocar junto e alguns deles sobreviviam e continuavam existindo, outros duravam apenas a noite do show. Foi o que aconteceu em São Paulo, no dia 14 de maio de 2005, quando reuniu cobras da cena experimental de São Paulo para um show inacreditável no Sesc Pompeia – um dos melhores que já vi na vida, sem dúvida, e muito pela forma como ele regia os músicos – ao lado de Miguel Barella, Paulo Beto, Ian Dolabella, Renato Ferreira, Carlos Issa, Gustavo Jobim, Maurício Takara e Sergio Ugeda. Há dez anos foi diagnosticado com um câncer, quando lhe deram 10% de chances de sobreviver – e mesmo assim ele seguia reunindo músicos de naturezas distintas e fazendo shows únicos. Um mestre, uma luz.
Carlos Issa, Mauricio Takara e Gustavo Jobim
O antiherói do rockabilly norte-americano, mais conhecido pelo quase-hit “Elvis is Everywhere”, que o lançou em 1987, ao lado do compadre Skid Roper, já não está entre nós. Nascido Neill Kirby McMillan Jr, ele foi encontrado morto a bordo do cruzeiro Outlaw Country no dia seguinte de sua apresentação. “Você deveria morrer como você vive”, escreveu sua família no Facebook, confirmando a passagem do ícone, que também era radialista, ator e humorista. Ele preferia se rotular como um artista cult.
Morreu o maior baixista da história do reggae – o que não é pouca coisa, uma vez que o instrumento é praticamente a âncora do gênero. Aston Barrett já teria seu lugar na história só pelo fato de ter tocado nas primeiras formações montadas pelo papa do dub, Lee “Scratch” Perry, quando ele começou a experimentar em seu estúdio na virada dos anos 60 para os anos 70. Mas a partir de 1974, quando foi convocado por Bob Marley para assumir o instrumento em sua banda, os Wailers, ele passa a dirigir musicalmente a banda do velho Bob, gravando em todos seus discos até sua morte, em 1981. É o integrante mais constante da banda de Marley ao lado de seu irmão, o baterista Carlton (que também tocou com Lee Perry). Além de Marley, também gravou discos clássicos de Bunny Wailer e Peter Tosh, ex-integrantes da banda de Bob que ganharam sua própria magnitude, além de ter sido mentor do segundo maior baixista da história do reggae, Sly Dunbar, da dupla Sly & Robbie. O apelido – homem de família – vinha da extensa prole que havia feito desde a adolescência, contabilizando mais de quarenta filhos. Um deles, justamente o Junior, primogênito, foi quem anunciou, via Instagram, que o pai havia morrido após “uma longa batalha médica”, sem especificar qual seria a causa da morte. Vai em paz, mestre!
Outro que nos deixa neste início de fevereiro é o mestre Wayne Kramer, fundador do MC5 e um dos progenitores do punk rock. Com sua banda seminal, abriu um talho na cabeça do rock dos anos 80 ao colocar Detroit no mapa do rock norte-americano ao lado dos conterrâneos Stooges e Alice Cooper. Com o MC5, colocou o rock de garagem dos anos 60 numa britadeira elétrica e junto com o compadre Fred “Sonic” Smith (que anos mais tarde tornaria-se marido de Patti Smith) transformou a guitarra elétrica em um instrumento ao mesmo tempo barulhento e agressivo, como nenhum outro músico daquele período havia feito. E o rugido de suas guitarras ecoavam os gritos politizados incitados pelo empresário do grupo, o ativista John Sinclair. E por mais que o impacto musical de sua influência não tenha sido registrado com eficácia (à exceção do primeiro disco da banda, o imortal Kick Out the Jams, gravado ao vivo), sua influência atravessou os anos 70, mesmo que neste período tenha se afastado da música por conta das drogas e se envolvidos com pequenos delitos que o levaram à cadeia. Ao sair do xilindró, em 1979, mudou-se para Nova York e tocou com um sem número de bandas punk iniciantes, já na segunda leva do punk nova-iorquino. Sua carreira foi ressuscitada de fato nos anos 90, quando o líder do Bad Religion, Brett Gurewitz, o assinou em sua gravadora Epitaph. Aos poucos foi sendo reconhecidos por gerações ainda mais novas até que, no começo deste século, reativou o MC5 com uma série de colaborações ilustres, tocando inclusive no Brasil (com Mark Arm, do Mudhoney, nos vocais). Além da carreira musical também tinha um trabalho social sério voltado à reabilitação tanto de usuários de drogas quanto de ex-presidiários. Sua passagem foi anunciada nessa sexta-feira em suas mídias sociais, mas não há notícias sobre a causa da morte.
Carl Weathers é mais um que nos deixa neste início do ano. Ex-jogador de futebol norte-americano, tornou-se mais conhecido justamente pelo papel que lhe transformou em ator, Apollo Creed, antagonista do personagem que lançou Sylvester Stallone como ator no filme Rocky – Um Lutador. Mas Weathers não ficou preso a um só personagem (que interpretou por quatro filmes) e a fama como Apollo lhe deu papéis como o coronel Al Dillon no filme Predador, o brinquedo Combat Carl da franquia Toy Story, o caçador de recompensas Greef Karga na recente série de Guerra nas Estrelas, Mandalorian, além de interpretar uma versão fictícia de si mesmo na série Arrested Development.
Triste a notícia da morte de Wanessa Dourada, violinista e rabequeira virtuose em plena ascensão, que havia acabado de lançar seu primeiro disco solo, Em Volta da Fogueira, no final do ano passado. Vinda do choro e da música erudita, ela desbravava diferentes fronteiras musicais à medida em que conquistava fãs tanto no público quanto entre seus pares artistas. Pude conhecê-la há uma semana do lançamento de seu disco, quando ela participou do último show da temporada que Chicão fez no Centro da Terra. Ela estava contando os dias para o lançamento do disco e estava muito animada com os desdobramentos do ano novo – lamentavelmente o tema de seu último post no Instagram, em que ela comemorava o ótimo ano que teve para saudar o 2024 que parecia ser promissor. Infelizmente ela sofreu um acidente de carro há alguns dias, que a colocou em um inesperado coma. Os amigos estava organizando shows para arrecadar fundos para custear suas despesas hospitalares, mas ela infelizmente nos deixou neste sábado.
Apesar de ter uma certa estabilidade em seus primeiros anos de profissão, a diva soul Marlena Shaw, que nos deixou neste sábado, não chegou a desfrutar do sucesso comercial de seus discos na época em que foram lançados, sendo descoberta tardiamente por duas gerações de entusiastas da música negra norte-americana no Reino Unido. Primeiro quando a cena dance nothern soul dos anos 70, precursora da cultura do DJ e das festas intermináveis muito antes da música eletrônica, descobriu seu maior hit, “California Soul”, gravado em 1969. Depois, nos anos 80, a cena rare groove pinçou a excelente “Yu Ma / Go Away Little Boy”, de seu marailhoso álbum Sweet Beginnings, de 1977. As duas músicas – entre outras – foram sampleadas e tocadas por DJs por todo o planeta a tempo da própria Marlena saborear seu sucesso ainda em vida, embora não na época em que elas foram lançadas. Esse flow foi o responsável por trazê-la ao Brasil há dez anos, quando ela dividiu o palco com o Bixiga 70, na edição de 2014 do festival Sesc Jazz.
Mais conhecido com o personagem coadjuvante “Crazy” Joe Davola que durou cinco episódios na clássica série Seinfeld, o ator Peter Crombie circulava bem por pequenos papéis no mundo do entretenimento dos EUA participando de filmes como Natural Born Killers, Se7en e Nascido a Quatro de Julho, além de aparecer em séries como NYPD Blue, Walker, Texas Ranger, Law & Order, L.A. Law, entre outras. Morreu na quarta passada, após adoecer rapidamente.
Outro ícone do futebol-arte que nos deixa neste início de ano, o Kaiser foi o maior nome do futebol alemão e ganhou duas copas – uma como jogador (em 1974) e outra como técnico (em 1990). Morreu dormindo.