Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.
Mais uma música – e um clipe – do próximo disco de Kim Gordon, The Collective, que sai no começo do mês que vem (e já está em pré-venda). Como a primeira faixa (“Bye Bye“), esta “I’m a Man” mantém o clima de trap com beats insistentes, timbres distorcidos e vocal falado na sua cara e também tem um clipe estrelado pela filha de Kim, Coco Gordon Moore. Assista abaixo:
Cows in the Pasture ainda nem tinha nome quando estava sendo cogitado, mas o disco de country que Brian Wilson estava fazendo enquanto gravava o Sunflower dos Beach Boys em 1970 parece que finalmente verá a luz do dia. Instigado pela paixão do empresário do grupo pelo gênero musical, o líder dos Beach Boys resolveu dirigir um disco dedicado à country music que tivesse ninguém menos que o próprio agente da banda, Fred Vail, nos vocais. Naquela época Brian já não fazia mais shows com sua banda, dedicando-se apenas à composição e às gravações do material que depois sairia em turnê, e a ideia de tocar um disco em que não precisasse ser o principal artista mexeu com o velho beach boy. Fred, que nunca havia cantado profissionalmente na vida mas era um fã ardoroso de música country, comprou a ideia e juntos fizeram gravações junto a músicos com quem Brian nunca havia gravado, todos de raiz caipira (os guitarristas James Burton e Red Rhodes e o pianista Glen D. Hardin) e juntos compuseram e gravaram 14 músicas que ficaram esquecidas no arquivo do grupo, como uma pitoresca nota de rodapé na história da banda. Mas a equipe de Brian descobriu essas fitas há dez anos e entrou em contato com Fred, que quis mantê-las. E agora ele conta à revista Rolling Stone que, ao lado do produtor de Nashville Sam Parker, com quem desenvolveu uma amizade há poucos anos, irá recuperar este disco, provavelmente para lançar no ano que vem. Fred regravará os vocais, mesmo com sua voz envelhecida, e o disco contará com participações especiais. “Há lendas do country e lendas do rock’n’roll, nomes do country contemporâneo e alguns popstars”, antecipou Parker, sem revelar os nomes, que ainda estão sendo negociados. O único que pode antecipar é o envolvimento de T Bone Burnett com o projeto. Vail foi empresário dos Beach Boys desde os primeiros anos da banda e cresceu junto ao grupo como um irmão mais velho, além de ter uma trajetória que mistura-se com a própria história do rock, nos anos 50, que será contada em uma série documental que acompanhará o lançamento no ano que vem. É mais um aceno para o gênero voltar ao centro da música pop dos EUA, depois das pesadas adesões de Lana Del Rey e Beyoncé.
Imagine se você pudesse ver, numa mesma noite, shows de Lionel Richie, Diana Ross, Al Green, Gladys Knight, os Isley Brothers, Smokey Robinson, Dionne Warwick, Nile Rodgers e seu Chic, os Animals de Eric Burdon, Chaka Khan, Charlie Wilson, os O’Jays, George Clinton e seu & Parliament Funkadelic, o War, Los Lobos, os Stylistics, os Delfonics, os Manhattans, os Chi-Lites, o Zapp, o Cameo, Kool & the Gang, Rose Royce, a Dazz Band, o Time do Morris Day, as Pointers Sisters e o Mayer Hawthorne, entre outros artistas? Pois este é o pesadíssimo elenco da primeira edição do festival Fool in Love, que acontecerá no 31 de agosto, em Los Angeles, nos EUA, no Sofi Stadium. É o terceiro evento histórico que a cidade recebe no mesmo mês, além da volta dos Head Hunters de Herbie Hancock e o primeiro show em anos de Joni Mitchell. Os ingressos começam a ser vendidos pelo site do festival a partir dessa sexta-feira, dia 16. Quem vai?
Pra quem não conseguiu ver o Roda Viva desta segunda, em que participei da bancada de entrevistadores para falar sobre carnaval em São Paulo com o compadre Thiago França, segue o programa abaixo:
Beyoncé começou oficialmente o segundo ato do seu disco de 2022. Ainda sem anunciar o título do álbum – ainda não sabemos se será apenas o segundo ato de Renaissance ou se terá um novo título, como já foi especulado -, ela aproveitou a audiência do jogo da final de futebol norte-americano que aconteceu neste domingo para cravar a data do próximo lançamento, que acontecerá no dia 29 de março. A data foi marcada após ela apresentar uma propaganda que fez para uma operadora de celular dos EUA brincando com as possibilidades em que ela poderia “quebrar a internet”, misturando referências ao seu Lemonade, inteligência artificial, eleições presidenciais, viagem espacial e até à Barbie, terminando a propaganda anunciando não apenas uma, mas duas canções. E tanto “Texas Hold ‘Em” quanto “16 Carriages” apontam que o disco se aprofunda em um território que é caro, porém pouco frequentado, por Beyoncé – a música country. Nascida no Texas, ela já havia dado uma piscadela para o gênero quando fez sua “Daddy Lessons”, de seu clássico Lemonade ao lado das Dixie Chicks – que agora assinam apenas como The Chicks.
As duas novas faixas apontam rumos distintos dentro deste universo: enquanto “16 Carriages” é uma balada mais introspectiva, “Texas Hold ‘Em” é mais expansiva e aponta para ser um dos hits deste ano. Esta última foi apresentada com o início de um clipe que fez muita gente especular sobre uma participação de Lady Gaga em seu disco, pois traz Beyoncé dirigindo um táxi, o qu seria uma referência à parceria que as duas fizeram há mais de dez anos, “Telephone” (em que Bey dá uma carona para Gaga). O vídeo também cita nominalmente hits country de autores negros, como “Laughing Yodel” de Charles Anderson, “Grinnin’ in Your Face” de Son House e “Maybelline” de Chuck Berry.
Essa pegada já vinha sendo insinuada desde que ela apareceu vestida à caráter no último Grammy, com chapéu e tudo, e parece seguir o rumo do disco anterior, só que trocando de estilo musical. Enquanto o ato I sublinhava a relação da música negra com a música de boate pós-disco music, abraçando techno, funk e house music. ela agora parece querer mostrar que mesmo o branco azedo country tem dívidas com a música negra. Curioso esse movimento acontecer ao mesmo tempo em que Lana Del Rey anuncia seu próprio disco country, batizado de Lasso, mas parece ter a ver com o momento crítico que os Estados Unidos atravessam, especificamente devido ao fato de 2024 ter eleições para presidente por lá.
Finalmente saudei minha dívida com a Ana Frango Elétrico e pude ver o melhor disco brasileiro de 2023 ao vivo neste sábado, no Sesc Ipiranga, depois de perdê-lo no Sesc Pompeia no fim do ano passado e no Circo Voador no fim de janeiro (até fiz planos, mas infelizmente não rolou). Não tinha dúvida que seria um showzaço, mas Ana entregou ainda mais que esperávamos, passando a íntegra de seu Me Chama de Gato Que Eu Sou Sua além de várias músicas de seus dois discos anteriores, Mormaço Queima e Little Electric Chicken Heart, ambos acondicionados à nova realidade sonora projetada pela sensação carioca. A começar pela banda que ela reuniu, um time de peso que traz alguns dos principais músicos brasileiros da atualidade: Sérgio Machado na bateria, Alberto Continentino no baixo, Guilherme Lírio na guitarra, Thomás Jagoda nos teclados, Dora Morelenbaum nos vocais de apoio e Pablo Carvalho na percussão, e a luz sempre deslumbrante da Olívia Munhoz. Além de ter sido um show mais longo dos que ela tem feito até aqui, a banda estava tinindo de tão entrosada, deixando Ana completamente à vontade não só para se jogar em cima do público como a soltar sua voz maravilhosamente e fazer até um solo de Moog arrastando a cabeça nas teclas (sério!). Abrindo o show perfeito com a música mais alheia do repertório – a stereolabiana “Let’s Go To Before Again” -, a apresentação pesa no groove e na dance music, atingindo um pico na fusão que ela fez entre “Não Tem Nada Não” (o encontro dos gênios Eumir Deodato, João Donato e Marcos Valle) e “Gypsy Woman” (aquela da Crystal Waters). Mas, como no disco, meu momento favorito foi quando ela emendou as três baladas espetaculares – “Camelo Azul”, “Nuvem Vermelha” e “Insista em Mim” – num bloco de derreter corações e mentes. Obrigado, Ana! Quero ver mais!
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Sempre reconheci que a breve passagem de Damo Suzuki por São Paulo em 2005, quando participou da quarta edição do festival Hype, que aconteceu no Sesc Pompeia, como um dos grandes acontecimentos da minha vida. Além do eterno vocalista do Can, o festival reuniu, entre os dias 12 e 14 de maio daquele ano, artistas tão distintos quanto a volta da banda Akira S & As Garotas que Erraram, o produtor austríaco Fennesz, o duo Wolf Eyes, a produtora norte-americana DJ Rekha, o pernambucano DJ Dolores, o DJ escocês Kode9, o rapper Black Alien e a dupla Drumagick. Damo apresentou-se no último dia do evento, no sábado, quando eu faria a mediação de duas conversas na parte da tarde, a primeira com o próprio Damo e a segunda com Steve Goodman, mais conhecido como Kode9. Mas conversamos os três um pouco antes do papo e em vez de fazermos uma hora de conversa com cada um deles, misturei as experiências dos dois numa longa e riquíssima conversa de duas horas com discussões que ecoam na minha cabeça até hoje, contrapondo arte e experiências pessoais às noções de sucesso comercial que, como reforçava o próprio Damo, eram artificiais e vazias. Não bastasse essa conversa maravilhosa, no fim do dia ainda pudemos assistir a mais de uma hora de improviso intenso reunindo nomes de diferentes fases do pop experimental paulistano – Miguel Barella, Paulo Beto, Ian Dolabella, Renato Ferreira, Carlos Issa, Gustavo Jobim, Maurício Takara e Sergio Ugeda – regidos pelo decano vocalista japonês, num descarrego energético que mudou a vida de quem esteve no teatro do Sesc Pompeia naquele sábado. Encontrei uns poucos registros em vídeo dessa noite no canal do compadre Paulo Beto, mas torço para que o Sesc tenha gravado a íntegra desta apresentação e sonho com a possibilidade de encaixá-la nessa excelente série Relicário, em que o Selo Sesc finalmente abre seu acervo de shows para o público.
Morreu um dos grandes. Só a história da entrada de Damo Suzuki no Can já valeria seu lugar na história. Nascido no Japão nos anos 50, mudou-se para a Europa no meio dos anos 60, quando ficou vagando a esmo por diferentes lugares, fazendo todo tipo de trabalho – e de arte. Até que encontrou os integrantes do Can na rua, quando o quarteto, prestes a começar mais um show, souberam da saída do antigo vocalista. Encontraram aquele japonês andando e cantarolando na rua, começaram a conversar com ele e, do nada, ele topou fazer improvisar os vocais nos shows daqueles caras. Foi o começo de uma curta e definitiva a carreira: os quatro discos em que Damo foi o vocalista do Can (na ordem – Soundtracks, Tago Mago, Ege Bamyası e Future Days) não só colocaram o grupo alemão no topo de um novo movimento musical como estabeleceu sua reputação para o resto da vida – a ponto de Mark E. Smith, do Fall (justo quem!), ter escrito uma música chamada “I Am Damo Suzuki”. Desde sua saído do Can, em 1973, ele vaga pelo planeta se juntando com músicos improvisadores não importando de onde eles vêm: música eletrônica, rock, jazz, noise, funk, ambient. Em cada lugar que passava montava um grupo para tocar junto e alguns deles sobreviviam e continuavam existindo, outros duravam apenas a noite do show. Foi o que aconteceu em São Paulo, no dia 14 de maio de 2005, quando reuniu cobras da cena experimental de São Paulo para um show inacreditável no Sesc Pompeia – um dos melhores que já vi na vida, sem dúvida, e muito pela forma como ele regia os músicos – ao lado de Miguel Barella, Paulo Beto, Ian Dolabella, Renato Ferreira, Carlos Issa, Gustavo Jobim, Maurício Takara e Sergio Ugeda. Há dez anos foi diagnosticado com um câncer, quando lhe deram 10% de chances de sobreviver – e mesmo assim ele seguia reunindo músicos de naturezas distintas e fazendo shows únicos. Um mestre, uma luz.
Carlos Issa, Mauricio Takara e Gustavo Jobim
Carnaval já estava aí faz tempo, mas começou oficialmente nessa sexta-feira, quando a Casa de Francisca recebeu a Espetacular Charanga do França pra mais um baile à fantasia. Quem conhece sabe como é a avalanche de boas vibrações disparada pela Charanga, que mistura Queen com “Alalaô”, Beth Carvalho com Daft Punk, Benito di Paula com axé music deixando todo mundo de pernas e garganta doendo de tanto dançar e cantar. Thiago ainda temperou o já tradicional coro de “prende… prende prende prende o Bolsonaro” (mais quente que nunca) com um providencial “fora Nunes” que também deveria fazer parte da folia paulistana, afinal o atual prefeito que ninguém sabe quem é parece que é contra o carnaval. Fiz a minha parte na abertura e no final, mas fiquei devendo “Macetando”, que a Carol, lá da Francisca, veio me pedir. Na próxima não falta!
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