Outro ao vivo – tem alguma coisa vindo aí…
Tatá Aeroplano – “Alucinações”
Pink Floyd – “Remember a Day”
Rolling Stones – “Jigsaw Puzzle”
Kiko Dinucci – “Olodé”
Erasmo Carlos – “Mané João”
Suede – “Everything Will Flow”
Massive Attack – “Dissolved Girl”
Bonifrate – “Lady Remédios”
Cidadão Instigado – “Como As Luzes”
Beatles – “I’m So Tired (Esher Demo)”
Spoon – “Rhthm & Soul”
Mopho – “Não Mande Flores”
Trapalhões + Lucinha Lins – “Hollywood”
Lana Del Rey – “Venice Bitch”
Screaming Jay Hawkins – “Monkberry Moon Delight”
Little Richard – “Born on the Bayou”
Karnak – “Alma Não Tem Cor”
Anelis Assumpção – “Segunda a Sexta”
Céu – “Falta de Ar”
N*E*R*D – “Things Are Getting Better”
Mayer Hawthorne – “A Long Time”
Gorillaz – “Empire Ants (Miami Horror Remix)”
Arctic Monkeys – “On a Mission”
Radiohead – “Separator”
Sexy-Fi – “Looking Asa Sul, Feeling Asa Norte”
Goldroom + Chela – “Fifteen”
Elga Flanger – “W.T.K.U.B.L”
“Desde que eu ouvi o disco pela primeira vez – e que disco! -, ‘Veneno’ chamou a minha atenção”, me explica Carlos Costa, sobre o edit que fez em cima de uma das músicas mais marcantes do segundo disco solo de Kiko Dinucci, o ótimo Rastilho. “Ela tem um pulso que é quase mágico: o riff do Kiko na parte do verso é praticamente um loop e o flow do Ogi é meio percussivo. Toda vez que eu ouvia, eu só conseguia imaginar era um bumbo 4×4 em cima desse pulso. Primeiro tinha pensado em fazer uma coisa mais do zero, só pegar a parte do “o rapaz é belzebu” – que tá ali na versão final – e construir uma música em torno desse sample, meio inspirado nos remixes do Soulwax. Mas eu gosto tanto da letra que fui por esse caminho do edit e uso a faixa quase inteira, colocando bateria e percussão em cima. Diminui um pouco o andamento, botei um baixo e o synth que é a coisa mais outsider do caminho orgânico que a faixa tem.” Carlão publicou com seu pseudônimo Cacos, ficou demais:
O edit sai junto com o minidocumentário que o diretor pernambucano Luan “Casinha” Cardoso fez durante as gravações do disco no ano passado. Bem foda:
“Em São Paulo fiz como faço normalmente quando vou pra algum lugar pela primeira vez, costumo pedir pra muita gente muita música – e na bagunça que isso gera, alguma mágica começa a acontecer”, lembra o francês Vincent Moon, que está lançando uma gravação que fez com Kiko Dinucci e Thiago França em 2010 como o EP batizado com o nome dos dois, lançado por seu selo Petites Planètes e apresentado em primeira mão aqui no Trabalho Sujo. “Vou chamar isso de criar ordem através da técnica do caos. E assim o nome do Kiko aparecia bem no alto das recomendações de muita gente. Não me lembro nem se o Metá Metá já existia. Mas era bem óbvio, eu ouvia o nome dele na voz de todos, por isso decidi gravar algo com ele e na gravação ele chegou com o Thiago.”
O registro flagra Kiko e Thiago passeando pelo camelódromo do Brás enquanto improvisa entre os transeuntes, captando toda a cacofonia do ambiente. “Esse dia foi muito louco”, lembra Kiko, “o Vincent foi lá em casa, eu dividia o apartamento com o Serginho Machado, e ele queria fazer esse vídeo, sugerindo o camelódromo do Brás. A gente se encontrou na Pinacoteca e foi andando até lá, desceu a rua das noivas ali na São Caetano e na Avenida do Estado já tinha uma entrada no camelódromo. Daí a gente entrou na feira e tocamos no meio das barracas, com a participação de ruídos e gritos, falas e sons do ambiente…”
Kiko vinha com seu violão pendurado no pescoço e um amplificador de pilha a tiracolo e Thiago o acompanhava de perto, mas não do lado, sendo seguido por Vincent, que registrava o áudio e uma de suas alunas que filmou o percurso. O vídeo não funcionou, mas o registro sonoro é preciso: “”Alguém me disse ‘minhas memórias são minhas gravações’ – talvez tenha sido eu mesmo. Por isso não me lembro muito além os barulhos do mercado, o passeio bagunçado por aquela área, o fluxo incrível da música – quero dizer, que músicos extraordinários esses caras são! Parecia tão fácil para eles, tocar, captar a vibe ao redor e integrá-la à sua própria música…”, lembra Vincent. Kiko se empolga com a memória: “Eu lembro que eu me perdia do Thiago pelas barracas e depois reencontrava. Aí tem uma criança que sopra uma cornetinha no meio da música, gente gritando… O bagulho é caótico e a gente fez umas músicas mais agitadas, pelo camelódromo inteiro tocando – ninguém entendia nada. Foi bem louco.”
A passagem de Vincent por São Paulo à época foi bem frutífera e rendeu ótimos vídeos, capturando o calor da cena paulistana há dezx anos. “Fui convidado para dar aulas numa escola de cinema, que foi também o motivo de gravarmos essa sessão”, lembra o cineasta. “Obviamente tudo era pretexto pra outra coisa – nesse caso, era uma fantástica oportunidade para circular, gravar todas aquelas pessoas ao redor desta cidade insana – me apaixonei à primeira vista por SP, mas foi mais uma febre urbana na época, mudei um pouco depois disso… Terminei indo pros melhores lugares de samba com a Dona Inah, filmei com Thiago Pethit no Minhocão, passeei numa noite mágica com José Domingos, fui a festas insanas com o Holger, explorei o centro da cidade com M. Takara, filmei Lulina em seu apartamento, dancei na laje do prédio de Tom Zé… Cara, foi pura mágica, sabe? Eu não acredito que tudo isso aconteceu em tão pouco tempo. Mas, mais uma vez, é a excitação do desconhecido que motiva nossas almas aos feitos mais puros.”
Mas logo Vincent se apaixonou pelo Brasil onde viveu por quatro anos até o ano passado, com base no Rio, fazendo registros de rituais transcendentais por todo o país, fazendo o projeto Híbridos, ao lado de sua esposa, Priscilla Telmon. “Exploramos profundamente a relação entre a música e o transe, a música e o sagrado em várias formas de rituais, em todo o país. Acho que filmamos cerca de 60 rituais diferentes, alguns bem pouco conhecidos – como o Almas e Angola no sul – ou bem novos – como a Fraternidade Kayman. Não dá pra se decepcionar em termos de música…”, diz, explicando porque não acompanha mais a cena contemporânea brasileira.
“Eu lembro que uma vez, durante uma sessão de Umbandaime na praia, todo mundo sob a influência do ayahuasca, incorporando espíritos de animais”, ele lembra, traçando um paralelo entre o mundo ancestral e o moderno. “Foi maravilhoso e completamente maluco ao mesmo tempo e, de repente, eles começaram a tocar uma música do Metá Metá! Foi fantástico – nós ouvimos muito sobre a música sair do uso ritualístico para os chamados usos profanos, mas o movimento contrário é algo que está me fascinando no Brasil – e uma grande inspiração para nossa geração híbrida global, claro.”
Pergunto sobre como anda a quarentena na França e ele responde aliviado que as coisas vão bem: “Tenho sorte, a situação na França parece razoavelmente fácil de se lidar, pois a sociedade vem desenvolvendo um sistema de saúde pública forte pelas últimas décadas, mesmo que boa parte de nossas riquezas venham da exploração de outras terras por muito tempo. E também não temos um maluco completo no comando”.
Mas ele é cético em relação à volta para a vida que levávamos antes. “Não acho que iremos voltar ao normal, mas quem seria estúpido suficiente para desejar tal coisa? Eu acabei de publicar um pequeno ensaio sobre isso – The Nyépi-Demic – que discute as muitas questões relacionadas a possíveis evoluções da cena artística, etc.”
Ele aproveita para explicar o que está acontecendo hoje à luz de sua pesquisa de rituais. “Muitos anciãos por todo o mundo, de diferentes origens indígenas, têm sido muito caros a passar, nas últimas décadas, para nossa geração, este conhecimento profundo – que a realidade externa e material é só um espelho do nível interior da consciência de toda nossa sociedade. É o conhecimento mais antigo da humanidade, provavelmente, você pode ler isso formulado de diferentes formas em todas os caminhos espirituais ancestrais, da Índia a Grécia, do Egito aos xamãs…”
“O que isso quer dizer?”, prossegue. “Que a imaginação é muito mais importante do que pensamos neste nosso mundo pós-industrial. Que a imaginação é o CENTRO da realidade nesta terceira dimensão. Então é bom que imaginemos o amanhã. Para fazer isso, sugiro que paremos de ler tudo que venha da mídia de massas e que inventemos nossas ficções alternativas.”
Enquanto a pandemia não passa, ele fala sobre o projeto que vinha trabalhando antes do surto, que quer retomar logo em seguida. “Estou tentando explorar a relação entre o cinema e os estados de transe, vibrações e o código da realidade e criar alguns protocolos de cura para longe do mundo do cinema mas mais com cara de híbridos – nós estamos começando o Teatro da Cura assim que essa pandemia começar a diminuir – uma experiência faça-você-mesmo em que as pessoas, qualquer um, nos convida para suas casas para uma sessão de música, cinema e cura. Vamos continuar a publicar todos nossos trabalhos na internet, sob licenças de código aberto, através de nosso selo de música digital e você pode conferir algumas performances recentes no site da Petites Planètes.
Uma das minhas primeiras decisões de ano novo foi matar o #CliMatias, hashtag que eu mantinha no Instagram como uma espécie de saudação do dia: uma foto do céu e uma frase que remetesse ao clima – seja interior ou exterior – do dia que começava. Matei a seção como parte da minha decisão de abandonar as redes sociais até o fim do ano, sacrificando o sacerdócio diário para me ver livre destas atualizações.
Mas veio a pandemia e com ela a necessidade de entrar em confinamento, uma autoquarentena voluntária para não esperar que as autoridades brasileiras comecem a tomar alguma providência. Aos poucos as pessoas têm se conscientizado que o problema é grave e resolvi criar um programa em vídeo – tanto no IGTV do Instagram quanto num segundo canal do YouTube – para dar dicas do que fazer nestes dias de isolamento social. As dicas vão desde livros, filmes, séries e discos para curtir no tempo livre como dicas para não enlouquecer ou cair em depressão uma vez recluso num mesmo ambiente. O programa é diário e vai ao ar sempre de manhã – e aqui neste mesmo post vou colocando as dicas do dia bem como os links para os itens que indico – além das sugestões dos convidados, que sempre tento trazer.
E pra espantar esse frio bizarro.
Nightmares on Wax – “Morse”
Beta Band – “Squares”
Electrelane – “The Valleys”
Tops – “I Feel Alive”
Bruno Schiavo – “Orestes”
Vovô Bebê – “Saparada”
Coriky – “Clean Kill”
Napalm Death – “White Kross”
Kiko Dinucci – “Rastilho”
Jessy Lanza – “Lick In Heaven”
Thundercat + Steve Lacy + Steve Arrington – “Black Qualls”
Justin Timberlake + SZA- “The Other Side”
Desire – “Bizarre Love Triangle”
Nill – “Jive (Dro Remix)”
Tame Impala – “It Might Be Time”
Letrux – “Cinco Bombas Atômicas”
Tá sendo bonito acompanhar os textos que estão saindo a partir do Rastilho de Kiko Dinucci, uma prova que tanto o jornalismo quanto a crítica musical brasileiros vão bem, embora tudo esteja espalhado, dificultando o contato com o público. Não seja por isso, vale a pena ler a crítica que o Vina e a Amanda fizeram do show no Sounds Like Us, a crítica e a entrevista que o Ramiro fez pro Radiola Urbana, o texto que o Lucas fez para a Ilustríssima (bem como a entrevista que fez com Kiko pra Rádio Batuta), bem como a entrevista e a crítica que GG fez em seu Volume Morto, a entrevista que Amadeu Zoe fez com Kiko no seu Aqui e Agora, a ótima crítica que o Fred fez no Objeto Sim Objeto Não. Minha contribuição pra esse rol está na entrevista que fiz pra Trip – que foi editada até encolher em um quarto seu tamanho (um dia publico a íntegra).
Transcendental sem tirar os pés da terra – assim Kiko Dinucci elevou o público a outra dimensão emocional no show que fez neste sábado, no Sesc Pompeia, quando África, rua e roda de samba surgiram como vultos vivos à espreita, esperando só o toque de seu violão e o canto de sua voz ao lançar efetivamente seu Rastilho ao vivo.
Seja sozinho no palco ou com a ilustre presença de verdadeiras entidades musicais – Juçara Marçal intocável, o mago Rodrigo Ogi e o deslumbrante coro formado por Dulce Monteiro, Maraísa, Gracinha Menezes e a própria Juçara -, ele chama para si uma ancestralidade que sobrevive nas esquinas, bares e terreiros e coloca-a onde ela deveria estar, no centro.
E do mesmo jeito que transforma seu instrumento num tambor de terreiro, ele erige um monumento à música popular, buscando seu DNA a partir de seu pulso. O batuque, as palmas, o pé na terra e o canto livre transformaram o teatro concebido por Lina Bo Bardi em uma catedral de uma música brasileira moderna, que abole resquícios barrocos em busca de uma brasilidade real e sobrevivente, aquela que se esgueira pelas frestas para contar sua história de boca a boca.
Kiko canta manso, sua voz erguida pela alavanca do toque ríspido em seu instrumento e abraçada no ar por um coro angelical. Um samba secular, sacro e mundano, forte e delicado, melancólico e sorridente, um antídoto para o tétrico 2020 que este país atravessa – que nos mostra o único horizonte possível.
Porque Rastilho é, como tudo que Kiko faz, um manifesto político. Mas também é um gesto poético, um grito de guerra e uma oração, um chamado às armas e um acalanto.
Esbarrei nessa mixtape Samba Obscuro que o Kiko Dinucci fez em 2011 em seu blog de cinema e que foi ressuscitada no canal do YouTube do Garimpo Sound System. “Mas isso não é um blog de cinema? Sim, mas esse mixtape tem um Q de filme, seja nos climas, na montagem ou no poder narrativo dos sambas escolhidos”, explica o então futuro Metá Metá, listando Paulinho da Viola, Adauto Santos, Nelson Cavaquinho, Itamar Assumpção, João Bosco, Alaíde Costa e Milton Nascimento, Jards Macalé, entre outros e alguns diálogos de filmes nacionais. “Boa viagem aos porões da alma humana através da música popular brasileira”, anuncia o compositor.
Paulinho da Viola – “Roendo as Unhas”
Jards Macalé- “E Daí?”
Adauto Santos – “Cravo Branco”
Nelson Cavaquinho – “Pode Sorrir”
Itamar Assumpção e banda Isca de Policia – “Você Está Sumindo”
João Bosco – “Bodas de Prata”
Alaíde Costa e Milton Nascimento – “Me Deixa Em Paz”
Jards Macalé – “Rua Real Grandeza”
Paulo Vanzolini – “Alberto”
Paulinho da Viola – “Comprimido”
Aproveitando o lançamento de seu ótimo Rastilho, bati um papo com o jovem mestre Kiko Dinucci para a revista Trip e embarcamos numa longa jornada rumo a seu passado musical, passando do metal ao samba, do hardcore à música eletrônica, dois batismos de fogo (um tocando “One” do Metallica e outro cantando “Se você jurar” de Ismael Silva), diferentes bairros de São Paulo, entre clubes de choro, brigas de punks, terreiros e encontros preciosos – lê lá!