Bob Mould no Brasil

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O Flesh crava mais uma no Destak: a vinda de Bob Mould para o Rio e São Paulo no próximo mês de outubro. Sem local definido, o show deve ser parecido com o que vi no Primavera na Espanha há pouco mais de um mês, quando, acompanhado do baixista Jason Narduc e do baterista Jon Wurster (o mesmo do Superchunk), o velho indie desfilou músicas do novo disco, canções do Sugar e do Hüsker Dü. Showzaço. Fiz uns vídeos, olhaê embaixo:

 

“Speak, See, Remember”: Como foram os dois shows de Stephen Malkmus em São Paulo

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É a terceira vez que Stephen Malkmus vem para São Paulo. Suas duas vindas anteriores foram inevitavelmente marcadas pelo trabalho com o Pavement. Natural: na primeira vez, em 2002, dava início a uma carreira solo com músicas que haviam sido compostas para o Pavement, gravadas com uma banda – os Jicks – que só não passou a existir desde aquele disco porque a gravadora Matador preferiu lança-lo com o nome do cantor e compositor; e a segunda, em 2010, quando tocou no festival Planeta Terra com o próprio Pavement, no ano em que a banda resolveu voltar a existir.

Não foi nesta terceira vez que Malkmus veio livre do nome de seu velho conjunto, mas, por outro lado, veio com uma carreira solo na bagagem que já equipara-se, ao menos em idade, ao trabalho com sua outra banda dos anos 90 – são cinco discos com o Pavement e outros cinco com os Jicks, banda que formou ao lado da baixista Joanna Bolme e do guitarrista e tecladista Mike Clark desde o primeiro disco creditado apenas a ele.

Em pleno 2013 e aos 47 anos de idade, submeteu-se uma turnê à moda antiga, fazendo sete shows em duas semanas, percorrendo diferentes estados do Brasil, em vez de só passar por uma ou duas cidades, como nas outras duas vezes. Podia pagar de diva indie e pedir os melhores hotéis e cachês altos, mas preferiu vestir os trajes do operário-padrão do indie rock para passar pelo Rio de Janeiro, São Paulo, Maringá, Belo Horizonte, São Paulo, Porto Alegre e Floripa. Quase 15 anos depois da produtora mineira Motor Music fazer turnês desse tipo com artistas como Seaweed, Man or Astroman? e Superchunk (ah, os anos 90…), um dos principais representantes da primeira divisão deste universo (“bring on the major leagues…”) repete um percurso semelhante. Não irei me espantar se, nos próximos anos, outros grandes nomes do rock alternativo americano e inglês dos anos 90 se submeterem a maratonas do tipo (imagina uma turnê dessas feitas pelo Yo La Tengo, pelo Lee Ranaldo ou pelo Lou Barlow…).

É uma atitude bem mais louvável do que as centenas de bandas (Pavement inclusive) que voltam à ativa apenas para revisitar uma série de canções que fizeram sucesso no passado e lançar um disco fraco com músicas novas (não o Pavement) que é só um souvenir-desculpa da turnê feita apenas para faturar um troco em cima do passado. Nos dois shows de São Paulo este ano, Malkmus fez duas concessões ao antigo grupo, uma em cada show: no primeiro tocou “Speak, See, Remember” do último disco da banda, Terror Twilight; e no segundo tocou “in The Mouth a Desert”, um dos hits que pôs o Pavement no radar norte-americano e, posteriormente, do mundo. No resto das duas noites e em todos os shows da semana passada, dedicou-se apenas à carreira que consolidou nos últimos dez anos.

“Vocês vieram ao show cool, amanhã não vai ser tão cool”, brincou Malkmus logo no início do primeiro show. O show de segunda-feira, no entanto, foi o segundo show do artista marcado na cidade, logo depois que o primeiro, que aconteceria no dia seguinte, teve seus ingressos ingressos. E como boa parte dos fãs já havia garantido ingresso para a noite de terça (que ainda por cima era véspera de feriado) e o preço da noite extra era o dobro da primeira noite, o primeiro show de Malkmus no Beco 203 foi praticamente um sarau para pouco menos de uma centena de felizardos. A ausência de público tornou a dinâmica do show mais intimista e relaxada, enquanto Malkmus conversava constantemente com as pessoas da platéia (alguns bebadaços), quase todas grudadas no palco. Na noite seguinte, tomada por uma pequena multidão umas seis vezes maior, o clima foi mais intenso e elétrico e os diálogos com o público eram dirigidos a todos ao mesmo tempo, com algumas brincadeiras individuais, como contraponto.

Duas noites distintas que tiveram apenas sete músicas em comum, sendo seis do último disco do grupo, Mirror Traffic, e uma “Vanessa from Queens”, do segundo disco, Pig Lib. As músicas restantes, no entanto, não foram divididas de acordo com o clima da noite – “Jo-Jo’s Jacket”, que abriu a primeira noite, poderia tranquilamente estar no meio das faixas curtas e rápidas que abriram a segunda noite – “Tune Grief”, “Senator”, “Planetary Motion”, “Cold Son” e “Tigers” – enquanto “Real Emotional Trash”, da noite de terça, funcionaria magicamente no show para poucos de segunda. Era apenas a mesma banda em duas condições diferentes – um show vazio e um show lotado. E que banda!

Pois é inegável que, mesmo com a presença magnética e assinando todas as composições, Malkmus não está sozinho no holofote – e os Jicks são, de fato, uma banda. É claro como ele se apoia musicalmente na escada armada por Mike Clark e como Joanna Bolme funciona contraponto à guitarra do líder do Pavement, todos seguindo o pulso preciso de Jake Morris, o quarto baterista da banda (que já teve nomes como Joen Moen dos Decemberist, Joel Plummer do Modest Mouse e Janet Weiss, ex-Quasi e Sleater Kinney, nesta posição). O entrosamento dos quatro é natural e fácil de ser notado, deixando Malkmus à vontade inclusive para se exibir como músico. É impressionante perceber o quanto ele evoluiu como guitarristas nos anos, mesmo tocando sem palheta e sem dar tanta ênfase aos solos nos discos – o contrário do que faz ao vivo.

Ao ouvir o público brasileiro cantando músicas que nem eram as faixas de trabalhos de discos anteriores dos Jicks, não é difícil imaginar que Malkmus esteja conseguindo distanciar-se do Pavement a ponto de sua carreira solo se tornar equivalente à de sua primeira banda. Suas composições não têm mais o ar juvenil da outra banda porque ele não tem mais vinte e poucos anos – o que deixa suas músicas menos sarcásticas, mau humoradas ou temperamentais, mas elas não perdem o brilho. Pelo contrário, realçam novas qualidades de seu autor, como um lado mais cronista que protagonista, com ênfase a uma guitarra que ecoa o rock dos anos 70, mas sem o tom épico e reverente. Ao final do segundo show, cansado mais visivelmente satisfeito, Malkmus avisou que nos revê no ano que vem, possivelmente para o lançamento do disco que mostrou nas inéditas “Houston Ladies”, “Flower Children” (no primeiro show) e “Scategories” (no segundo). E nesta vez possivelmente virá livre do estigma de sua banda anterior.

Filme parte dos dois shows, veja abaixo:

 

Épico mundano: Como foi o show do Television em São Paulo

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Tudo bem que, fora Jimmy Rip – o segundo guitarrista que assumiu o posto depois que Richard Lloyd deixou a banda em 2007 -, o Television que se apresentou na quarta passada no Beco era o mesmo que havia gravado Marquee Moon. Era o mesmo Billy Ficca de cabelo descolorido e comprido firme na bateria e o mesmo Fred Smith, que a idade transformou num tiozão do churrasco, com o mesmo baixo forte e preciso. Mas o show era – como sempre foi – de Tom Verlaine. É ele quem ergue a banda a um nível extraterreno, que disse o célebre Ahmet Ertegün, da Atlantic, ao se recusar contratá-los por considerá-los música de outro planeta. Seus épicos urbanos são cantados com uma voz ao mesmo tempo doce e resmungona e ele floreia estas composições que remetem a um Bob Dylan indie com uma guitarra magistral, de ângulos improváveis, tocada com o polegar, sem palheta.

No show desta semana, a terceira passagem da banda por São Paulo, não foi diferente. Embora a harmonia entre os quatro seja incandescente e do substituto Jimmy Rip faça jus às frases originais de Richard Lloyd, o holofote naturalmente cai sobre Verlaine. Isso acontece justamente pelo instrumental de sua banda orbitar ao redor da força gravitacional gerada pela alternância dos versos de suas canções mundanas e de seu timbre elétrico ímpar. É a mistura improvável de canções mundanas e solos transcendentais que formam o coração e o cérebro do grupo. E o fato do homem Television ter o dobro da idade da média da platéia do Beco não o torna tão distante daquela realidade – a fauna da rua Augusta em 2013 não é muito diferente da Nova York do final dos anos 70, talvez mais populosa. Mas descer a rua paulistana antes de assistir aos nova-iorquinos foi uma experiência complementar ao show. Grisalho e de cabelo curto, Verlaine parecia mais um velho punk disposto a cantar as glórias de seu tempo, mas bastou a banda começar a tocar e suas duas vozes – a da garganta e a da guitarra – pareciam estar falando sobre a rotina daquele lugar, em São Paulo.

Entre clássicos e músicas menos conhecidas, a banda começou o show pontualmente às 11 da noite e segurou quase duas horas de apresentação, com poucas músicas durando menos que cinco minutos. O grupo até arriscou uma música nova e uma versão de “Persia” com vocal e letra, fazendo jus à sua lenta tradição de moldar canções com o passar das décadas. Afinal, lá vão quase quarenta anos desde o primeiro disco e a discografia oficial do Television, sem contar os discos ao vivo, tem apenas três discos de inéditas. O público, mais velho e mais intenso que o que assistiu ao Toro y Moi duas semanas antes naquele mesmo lugar, pedia músicas da clássica estréia da banda no grito e fechava os olhos em transe durante os longos solos de guitarra. E depois dos doze minutos de “Marquee Moon” ao vivo, a banda ainda voltou para um bis com “Psychotic Reaction” do Count Five, um clássico do protopunk psicodélico, fechando a experiência como se o Television fosse uma banda adolescente.

Fiz uns vídeos, confira abaixo.

 

Porque o show do Cure em Buenos Aires foi melhor que o de São Paulo

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O show foi um tico mais longo que o de São Paulo (15 minutos a mais), abriu com “Plainsong” e “Pictures of You”, teve “Primary” no lugar de “Shake Dog Shake” e a primeira parte terminou com “Disintegration” em vez de “End”. O bis do meio foi idêntico ao que rolou em SP () e o final – entre “Dressing Up” e “Killing an Arab” – foi aquela explosão de hits na mesma ordem de toda esta turnê sul-americana. Mas

não foi a ordem das músicas que vez do show de Buenos Aires ser melhor que o de São Paulo, mas as diferentes condições ao redor do palco. Principalmente o fato de não ter área vip – como no Brasil -, que colocou os fãs de verdade na cara de Robert Smith. Era visível a animação da banda inteira ao ver seu público se descabelando a cada hit ou b-side.

Precisamos rever urgente essa obsessão brasileira por área vip (a área vip argentina ficava num canto do estádio, quem pagava a mais assistia ao show com ótima visão do palco e sentado, mas longe da grade). O show também teve direito à já clássica fama do público argentino de entoar os riffs das canções como se fossem hinos de torcida e os porteños ganham ainda mais pontos por não ficarem conversando o tempo todo durante as músicas e na educação ao pedir passagem (isso sem falar na maconha, onipresente, e no álcool, ausente). Os vídeos que fiz já aí embaixo (e a foto lá de cima também é minha):

 

Três horas e quinze minutos de The Cure

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Suspendo as atividades por hora pois vou ali pra Argentina tomar outra overdose de Cure em comemoração a uma data linda – o aniversário da minha mulher. Deixo vocês com os vídeos que fiz durante o show que a banda de Robert Smith fez aqui no sábado passado – e não foram poucos. Até a volta!

 

Como foram os três shows do Cure que assisti em Nova York, em 2011

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Em 2011, pude presenciar três shows da banda de Robert Smith na última vez em que eles tocaram seus três primeiros discos na íntegra. As apresentações aconteceram no suntuoso Beacon Theatre, em Nova York, e como deverão ser as apresentações do grupo na nova turnê sul-americana, os shows tiveram mais de três horas, cada. Na sexta-feira foram 46 músicas, no sábado e no domingo, 48 em cada dia. Os shows saíram da sequência dos três primeiros discos da banda e a formação do grupo ia mudando a cada novo disco: nas músicas de Three Imaginary Boys, de 1979, estavam no palco apenas Bob Smith, Simon Gallup e Jason Cooper; nas de Seventeen Seconds, de 1980, este trio era acompanhado de Roger O’Donnell nos teclados; e quando começaram Faith, de 1981, Lol Tolhurst junta-se ao quarteto tocando teclados e instrumentos de percussão.

A primeira parte dos shows era composta pelos três discos tocados na íntegra. A segunda parte – um extenso bis dividido em três partes – era composto pelos lados B da banda na época destes três discos e, em seguida, literalmente por toda a coletânea Standing on a Beach, de 1986, fora as músicas que extras de cada show (o sábado teve “Do the Hansa” tocada pela primeira vez desde 1979 e o domingo teve “Close to Me”). Mais de dez horas de Cure num único fim de semana memorável, que registrei nos vídeos que posto abaixo e sirvo de aperitivo para o show de amanhã em São Paulo. O primeiro show eu filmei inteiro, o segundo quase todo e, do último, só gravei as três últimas músicas.

Mas o melhor é comparar os setlists daqueles shows e ver o proposto para o Brasil e descobrir que 70% do que vão tocar aqui eu não assisti ao vivo. E preparem-se: mesmo gordo e com o cabelo seco, Robert Smith segue com voz intacta e como um dos maiores guitarristas vivos – e sempre conversando, simpático, com seus fãs.

 

Coisa fina: como foi o show do Toro y Moi em São Paulo

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Que beleza foi o show do Toro y Moi na noite desta quarta-feira. Auxiliado por uma banda precisa, Chaz Bundick mostra como está evoluindo seu som, que originalmente era feito sozinho num quarto, para algo mais orgânico e arredondado, deixando a eletrônica mais como ferramenta que conteúdo. Enquanto revezava-se entre teclados, efeitos e vocais, era acompanhado de perto pelo pulso firme do baterista Andy Woodward. Ao segurar timbres, melodias e ritmos, Chaz e Andy deixavam o guitarrista e tecladista Jordan Blackmon e o baixista Patrick Jeffords livres para explorar seus instrumentos – enquanto Jordan, que também fazia os vocais de apoio, preferia uma guitarra mais ruidosa e rítmica que melódica (ecos inevitáveis do pós-punk – é um guitarrista indie), Patrick deslizava linhas de baixo que às vezes eram firmes às vezes esparsas e fluidas (um músico que veio do conservatório).

E no equilíbrio entre estes dois músicos, Chaz destilava suas canções doces e tímidas, que, contrastadas ao groove cada vez mais intenso de seu grupo, ganham uma nova dimensão (“High Living”, que infelizmente não filmei, ganhou até um inusitado, mas coerente, peso de rock clássico, perto do final). O som da banda está cada vez mais soul com toques de jazz elétrico, fazendo o black power e o vocal macio do senhor Toro y Moi me lembrar do R&B do final dos anos 90. Mas há uma feliz estranheza que não deixa o som soar fácil ou descartável – é música de pista, mas há ênfase nos trabalho humano e na presença dos músicos, portanto é um show para ser assistido e não apenas curtido.

Embora houvesse ênfase natural em relação ao material de seu disco mais recente, Anything in Return desce cada vez mais suave, o show percorreu as diferentes fases da curta carreira do Toro y Moi, como se fosse a primeira vez que a banda tocasse em São Paulo. E levando em consideração que suas outras apresentações foram em festivais para dezenas de milhares de pessoas (no Terra em 2011 e no Lollapalooza deste ano), um show feito para poucas centenas de felizardos talvez tenha sido o melhor cartão de visitas que Chaz Bundick poderia deixar no país. Muito prazer e venha mais vezes.

Abaixo, umas músicas que filmei.

 

MarginalS + M. Takara

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A Soma está começando a lançar as gravações dos shows que os Marginals fizeram no espaço da revista Vila Madalena entre 2010 e 2011, uma série de apresentações em que o trio formado por Thiago França, Marcelo Cabral e Anthony Gordin tocou ao lado de bacanas como Guizado, Lurdez da Luz e Criolo, Thomas Rohrer, DJ Marco, entre outros nomes. A estréia conta com a participação do jovem mestre Maurício Takara e o encontro volta a acontecer neste domingo, na Casa do Mancha. Pedi pro Thiago escolher uma música pra lançar aqui no Trabalho Sujo ele pediu pra colocar a terceira: “groovezão bacana, melodia chicletona, sucesso!”. Pois sente só:

O disco pode ser baixado neste link. Há um tempo já dá pra ouvir o único show destes que vi desta série, quando eles entraram em alfa ao lado do Thomas Rohrer. Veja os vídeos que fiz abaixo:

 

Mostra Prata da Casa: A maturidade do rap paulistano

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E a última noite da Mostra Prata da Casa teve duas novas autoridades do hip hop de São Paulo: o trio Elo da Corrente, que chamou crianças para dividir o palco com eles, e o avassalador Rodrigo Ogi, que fez todo mundo cantar os refrões de suas crônicas, veja nos vídeos abaixo. Os shows foram demais e quem foi a qualquer dia da Mostra sabe como ela foi legal. Semanaça!

 

Mostra Prata da Casa: Todo o Pernambuco

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Dois shows incríveis na noite deste sábado consagraram aquela que pode ter sido a melhor apresentação da Mostra Prata da Casa do ano. Abrindo os trabalhos, Rodrigo Caçapa visitou gêneros ancestrais com violas e percussão, apontando para um futuro moderno e nada deslumbrado. Depois foi a vez da incendiária Dona Cila do Coco transformar ao choperia do Sesc num imenso bailão, que culminou com a presença de Caçapa e Alessandra Leão ajudando a diva de 85 anos a fechar seu show – veja os vídeos abaixo. E domingo é dia de hip hop na Mostra.