Liana Padilha (1963-2024)

Que barra essa notícia, ainda difusa, sobre a passagem de Liana Padilha. Mais conhecida como a metade do duo eletrônico No Porn, era uma artista com A maiúsculo, transitando entre diferentes disciplinas (artes plásticas, música, audiovisual, poesia) e questionando os limites impostos pela hipocrisia da sociedade em projetos que eram protestos, transformando cada pequeno gesto seu em um minimanifesto, vivendo plenamente o artivismo. A conheci dos tempos que a internet (outra seara que ajudou a desbravar, ainda nos anos 90) era mato e pude realizar uma apresentação de seu Tintapreta na mítica sala Adoniran Barbosa, quando fui curador de música do Centro Cultural São Paulo. Ainda não há notícias sobre a causa de sua passagem, mas sua ausência é sentida desde já. Muito triste, muito nova.

Eric Carmen (1949-2024)

Quem nos deixa agora foi Eric Carmen, um dos heróis do power pop à frente de sua banda os Raspberries, que, entre 1970 e 1975, forjou pérolas como “Go All The Way”, “I Wanna Be With You”, “Tonight”, “On The Beach”, “Don’t Want To Say Goodbye”, “Overnight Sensation (Hit Record)”, “I Don’t Know What I Want” e “Let’s Pretend”. Sua carreira solo foi deixando esse frescor de lado com os anos, aproximando-o daquele tenebroso terreno em que o soft rock se encontra com o hard rock, gerando as famigeradas power ballads, não sem antes emplacar dois hits imortais nessa seara, ambos inspirados em obras do compositor russo Sergei Rachmaninoff: a inesquecível “All By Myself” e “Never Gonna Fall in Love Again”. Ainda emplacou “Hungry Eyes” na trilha sonora de Dirty Dancing, gravando mais espaçadamente a partir dos anos 80, além de tocar na banda de Ringo Starr. Sua morte aconteceu no fim de semana e a sua esposa Amy Carmen acaba de anunciá-la no site oficial de Carmen.

Karl Wallinger (1957-2024)

Mais um que se vai cedo: Karl Wallinger, tecladista do grupo irlandês Waterboys e ele mesmo dono do grupo de um homem só World Party, despediu-se deste plano no domingo. De origem galesa, ele foi um dos primeiros diretores musicais da versão em palco da peça de glamour decadente Rocky Horror Picture Show antes que ela virasse um filme. Entrou para os Waterboys em 1983, depois da formação da banda, mas é um dos autores de seu maior hit, a irresistível “The Whole of the Moon”. Montou seu projeto paralelo World Party em 1986 e com ele emplacou mais um hit, a ótima “Ship of Fools”, e seguiu com o grupo mesmo após o fim dos Waterboys, no início dos anos 80. Colaborou com o primeiro disco de Sinéad O’Connor, que por sua vez participou dos dois primeiros discos de sua banda, e fez a trilha sonora do clássico indie Caindo na Real, que revelou uma nova geração de atores norte-americanos, como Winona Ryder, Ethan Hawke, Janeane Garofalo, Steve Zahn, Ben Stiller, Renée Zellweger e Andy Dick. Também envolveu-se com a produção do filme Patricinhas de Beverly Hills, também cuidando da trilha sonora. Sofreu um derrame em 2001, o que fez com que o World Party não lançasse mais discos, embora continuasse fazendo shows. A causa de sua morte não foi revelada.

Luisão Pereira (1968-2024)

Triste a notícia da passagem prematura de Luisão Pereira, um dos principais nomes do novo pop independente baiano neste século 21. Nascido em Juazeiro, logo mudou-se para Salvador quando, depois tocar em outras bandas, passou a integrar o grupo Penélope, liderado por Érika Martins. Depois, ao lado da violoncelista Fernanda Monteiro, montou a dupla Dois em Um e sempre esteve ligado às movimentações da cena soteropolitana, atuando inclusive na produção de discos de artistas locais e de grandes nomes da música brasileira, como Los Hermanos, Nação Zumbi, Elza Soares, Paralamas do Sucesso e Tom Zé, entre outros. Lutando contra um câncer desde 2017, lançou seu primeiro disco solo no ano passado, cantando justamente sobre o impacto da doença em sua vida. Fogo no Mar teve a participação de Mãeana, Marcelo Jeneci e Zé Manoel e foi sua última obra, antes de nos deixar no início deste domingo. Pra sempre fico com a lembrança de discussões sobre os rumos do mercado da música no Brasil, além de antecipar novidades e tendências de seu estado. Uma alma aberta. Vai em paz, compadre.

Akira Toriyama (1955-2024)

Triste a notícia da morte prematura de um dos maiores nomes da história da cultura pop japonesa. Akira Toriyama apareceu nos anos 80 com o mangá Dr. Slump, mas conseguiu fama com sua criação mais famosa, ainda nos anos 80, a saga Dragon Ball, protagonizada pelo heroico Goku, que deu origem a outras sagas, sendo a segunda a mais famosa delas, Dragon Ball Z. A princípio publicada apenas como mangá, tornou-se um anime de sucesso e mudou a paisagem desta cultura em seu país de origem. Mas a influência de Toriyama foi além – sua arte ilustra o primeiro videogame de RPG do Japão, Dragon Quest, e, ao lado do criador de Dragon Quest, Yuji Horii, e do criador de Final Fantasy, Hironobu Sakaguchi, fez o jogo Chrono Trigger, até hoje considerado um dos melhores jogos de todos os tempos. Sua morte aconteceu no dia primeiro deste mês, mas só nessa sexta-feira foi tornada pública, através da conta oficial do Dragon Ball no Twitter.

Claudio Julio Tognolli (1963-2024)

Um dos principais jornalistas do Brasil contemporâneo morreu neste domingo de manhã. Claudio Julio Tognolli trabalhou nas principais redações do Brasil, foi autor de livros importantes como O Século do Crime, A Sociedade dos Chavões e A Falácia da Genética, além de ter sido fundador da da Associação Brasileira da Jornalismo Investigativo (Abraji) e de ser professor na Escola de Comunicação e Artes da USP. Infelizmente, nos últimos anos de vida enveredou pelo antipetismo de forma ferrenha a ponto de comprometer sua biografia ao pavimentar o caminho que levou o país ao bolsonarismo, subindo em carro de som a favor do impeachment de Dilma, declarando-se fã de Sergio Moro, escrevendo a biografia de Lobão e participando dos quadros da Jovem Pan em sua fase mais de extrema-direita. Por pouco não foi integrante do RPM um pouco antes da explosão do grupo nos anos 80 e seguia tocando guitarra.

Damo Suzuki (1950-2024)

Morreu um dos grandes. Só a história da entrada de Damo Suzuki no Can já valeria seu lugar na história. Nascido no Japão nos anos 50, mudou-se para a Europa no meio dos anos 60, quando ficou vagando a esmo por diferentes lugares, fazendo todo tipo de trabalho – e de arte. Até que encontrou os integrantes do Can na rua, quando o quarteto, prestes a começar mais um show, souberam da saída do antigo vocalista. Encontraram aquele japonês andando e cantarolando na rua, começaram a conversar com ele e, do nada, ele topou fazer improvisar os vocais nos shows daqueles caras. Foi o começo de uma curta e definitiva a carreira: os quatro discos em que Damo foi o vocalista do Can (na ordem – Soundtracks, Tago Mago, Ege Bamyası e Future Days) não só colocaram o grupo alemão no topo de um novo movimento musical como estabeleceu sua reputação para o resto da vida – a ponto de Mark E. Smith, do Fall (justo quem!), ter escrito uma música chamada “I Am Damo Suzuki”. Desde sua saído do Can, em 1973, ele vaga pelo planeta se juntando com músicos improvisadores não importando de onde eles vêm: música eletrônica, rock, jazz, noise, funk, ambient. Em cada lugar que passava montava um grupo para tocar junto e alguns deles sobreviviam e continuavam existindo, outros duravam apenas a noite do show. Foi o que aconteceu em São Paulo, no dia 14 de maio de 2005, quando reuniu cobras da cena experimental de São Paulo para um show inacreditável no Sesc Pompeia – um dos melhores que já vi na vida, sem dúvida, e muito pela forma como ele regia os músicos – ao lado de Miguel Barella, Paulo Beto, Ian Dolabella, Renato Ferreira, Carlos Issa, Gustavo Jobim, Maurício Takara e Sergio Ugeda. Há dez anos foi diagnosticado com um câncer, quando lhe deram 10% de chances de sobreviver – e mesmo assim ele seguia reunindo músicos de naturezas distintas e fazendo shows únicos. Um mestre, uma luz.

Carlos Issa, Mauricio Takara e Gustavo Jobim

Mojo Nixon (1957-2024)

O antiherói do rockabilly norte-americano, mais conhecido pelo quase-hit “Elvis is Everywhere”, que o lançou em 1987, ao lado do compadre Skid Roper, já não está entre nós. Nascido Neill Kirby McMillan Jr, ele foi encontrado morto a bordo do cruzeiro Outlaw Country no dia seguinte de sua apresentação. “Você deveria morrer como você vive”, escreveu sua família no Facebook, confirmando a passagem do ícone, que também era radialista, ator e humorista. Ele preferia se rotular como um artista cult.

Aston “Family Man” Barrett (1946-2024)

Morreu o maior baixista da história do reggae – o que não é pouca coisa, uma vez que o instrumento é praticamente a âncora do gênero. Aston Barrett já teria seu lugar na história só pelo fato de ter tocado nas primeiras formações montadas pelo papa do dub, Lee “Scratch” Perry, quando ele começou a experimentar em seu estúdio na virada dos anos 60 para os anos 70. Mas a partir de 1974, quando foi convocado por Bob Marley para assumir o instrumento em sua banda, os Wailers, ele passa a dirigir musicalmente a banda do velho Bob, gravando em todos seus discos até sua morte, em 1981. É o integrante mais constante da banda de Marley ao lado de seu irmão, o baterista Carlton (que também tocou com Lee Perry). Além de Marley, também gravou discos clássicos de Bunny Wailer e Peter Tosh, ex-integrantes da banda de Bob que ganharam sua própria magnitude, além de ter sido mentor do segundo maior baixista da história do reggae, Sly Dunbar, da dupla Sly & Robbie. O apelido – homem de família – vinha da extensa prole que havia feito desde a adolescência, contabilizando mais de quarenta filhos. Um deles, justamente o Junior, primogênito, foi quem anunciou, via Instagram, que o pai havia morrido após “uma longa batalha médica”, sem especificar qual seria a causa da morte. Vai em paz, mestre!

Wayne Kramer (1948-2024)

Outro que nos deixa neste início de fevereiro é o mestre Wayne Kramer, fundador do MC5 e um dos progenitores do punk rock. Com sua banda seminal, abriu um talho na cabeça do rock dos anos 80 ao colocar Detroit no mapa do rock norte-americano ao lado dos conterrâneos Stooges e Alice Cooper. Com o MC5, colocou o rock de garagem dos anos 60 numa britadeira elétrica e junto com o compadre Fred “Sonic” Smith (que anos mais tarde tornaria-se marido de Patti Smith) transformou a guitarra elétrica em um instrumento ao mesmo tempo barulhento e agressivo, como nenhum outro músico daquele período havia feito. E o rugido de suas guitarras ecoavam os gritos politizados incitados pelo empresário do grupo, o ativista John Sinclair. E por mais que o impacto musical de sua influência não tenha sido registrado com eficácia (à exceção do primeiro disco da banda, o imortal Kick Out the Jams, gravado ao vivo), sua influência atravessou os anos 70, mesmo que neste período tenha se afastado da música por conta das drogas e se envolvidos com pequenos delitos que o levaram à cadeia. Ao sair do xilindró, em 1979, mudou-se para Nova York e tocou com um sem número de bandas punk iniciantes, já na segunda leva do punk nova-iorquino. Sua carreira foi ressuscitada de fato nos anos 90, quando o líder do Bad Religion, Brett Gurewitz, o assinou em sua gravadora Epitaph. Aos poucos foi sendo reconhecidos por gerações ainda mais novas até que, no começo deste século, reativou o MC5 com uma série de colaborações ilustres, tocando inclusive no Brasil (com Mark Arm, do Mudhoney, nos vocais). Além da carreira musical também tinha um trabalho social sério voltado à reabilitação tanto de usuários de drogas quanto de ex-presidiários. Sua passagem foi anunciada nessa sexta-feira em suas mídias sociais, mas não há notícias sobre a causa da morte.