Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.

Seis décadas do sonho californiano

Um dos principais acontecimentos dos anos 60 na história da cultura pop foi a transformação de uma região em ascensão dos Estados Unidos em marco central daquela década. Por mais que Hollywood já estivesse aberto as portas da Califórnia para o resto do mundo, só com a música que o estado da costa oeste dos EUA tornou-se reconhecido – mais que isso, desejado – pelo resto do planeta. Suas principais cidades, Los Angeles e São Francisco, tornaram-se pontos de referência para toda uma geração que cresceu lendo os beats e depois cairia de cabeça na psicodelia e no LSD, mas quem começou essa história foi uma banda de irmãos chamada Beach Boys, cuja história finalmente é repassada num documentário batizado apenas como o nome do grupo, produzido pela Disney, que estreia no próximo dia 24 de março no canal de streaming da produtora. Dirigido por Frank Marshall e Thom Zimny, o documentário conta com entrevistas com os integrantes da banda que ainda estão vivos – Brian Wilson, Mike Love, Al Jardine, David Marks e Bruce Johnston -, além de trazer cenas inéditas e muito material raro sobre o grupo que mudou a cara da música pop nos Estados Unidos. O trailer do filme, que ainda traz depoimentos de fãs como Lindsey Buckingham, Janelle Monáe e Don Was, acaba de dar o ar de sua graça, veja abaixo:  

Começando miudinho

E a temporada de abril no Centro da Terra começou devagarinho, como quem não quer nada, e aos poucos dominou o público que saiu de casa numa segunda-feira chuvosa para encher o teatro do Sumaré. Rodrigo Campos, Rômulo Froes e Thiago França começaram pelo projeto mais recente dos dois primeiros (o ótimo Elefante, lançado no ano passado), contando com a presença de Marcelo Cabral e Anna Vis como convidados. Cabral esteve no palco desde o início, quase um quarto integrante da temporada, e enquanto Rômulo e Rodrigo dividiam-se nos violões, ele e Thiago alternavam de instrumentos a cada nova canção: Thiago ia do sax pra flauta pro surdo pro cavaco e pra caixinha de fósforos, enquanto Cabral alternava seu contrabaixo acústico (tocado com ou sem arco e com ou sem efeitos) com outros instrumentos de percussão. Da metade da apresentação em diante, Anna Vis veio sem instrumentos para o centro do quarteto, dobrando vozes com os outros dois vocalistas, que expandiam o repertório para além do disco de 2023, puxando músicas em comum aos envolvidos, desde canções solo de Rômulo e Rodrigo (que estreou uma inédita, “Cadê o Dinheiro?”) a uma natalina fora de época (e triiiiste) “Boas Festas” de Assis Valente até “Da Vila Guilherme até o Imirim”, do Passo Torto, e “Dono da Bateria”, do disco Conversas Com Toshiro, de Rodrigo, que encerraram a apresentação.

Assista abaixo:  

Billie Eilish 2024: “Hit Me Hard and Soft”

Hit Me Hard and Soft é o nome do terceiro disco de Billie Eilish que ela acaba de revelar pelo Instagram em caps lóki. O disco sai no dia 17 de maio e não há nenhuma novidade sobre primeiro single, nome das músicas ou participações especiais, mas deve ser questão de tempo pra que isso aconteça.

Veja abaixo:  

Rodrigo Campos, Rômulo Froes e Thiago França: 3 na Ribanceira

Eita que abril já começou desequilibrando tudo – e a temporada das segundas-feiras no Centro da Terra reúne um trio da pesada que só aumenta a responsa do mês. Imensa honra receber Rodrigo Campos, Rômulo Froes e Thiago França, que brilham em quatro datas diferentes no nosso querido teatro do Sumaré em uma temporada em que cruzam e misturam obras e canções feitas em várias mãos na temporada 3 na Ribanceira. A primeira noite, dia 8, vê os três passeando pelas canções do disco que Rômulo e Rodrigo lançaram no ano passado, como Anna Vis e Marcelo Cabral como convidados da apresentação chamada Elefante, O Oráculo da Noite. Na próxima segunda, dia 15, eles recebem Victória dos Santos, Fernanda Sangirardi e Bia Falleiros para uma roda de samba montada no palco do teatro, batizada de Samba de Tablado. Na terceira segunda-feira, os três apresentam apenas músicas inéditas sem convidados na noite chamada Sem Paralelo e encerram a temporada chamando mais uma vez Marcelo Cabral e desta vez Juçara Marçal para desfilar seus repertórios conjunto na noite chamada Coisas Nossas. Os espetáculos começam pontualmente às 20h e os ingressos para todas as noites já estão à venda neste link.

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Vida Fodona #807: Demorei, né?

Muita coisa acontecendo.

Ouça abaixo:  

Billie Eilish 2024: “I try to live in black and white but I’m so blue”

Depois de tornar-se a pessoa mais jovem a ganhar dois prêmios no Oscar (pelas canções “No Time to Die” do filme de James Bond, 007 – Sem Tempo para Morrer e “What Was I Made For?”, que ela fez para o filme Barbie), Billie Eilish parece estar contando os dias para lançar seu terceiro álbum – e como no lançamento do disco anterior, está usando suas redes sociais para chamar atenção dos fãs. Primeiro ela pintou de azul seu avatar no Instagram e nessa sexta-feira pegou a todos de surpresa ao incluir seus 110 milhões de fãs no círculo “closed friends” reservado apenas para seus melhores amigos – causando surpresa a todos os fãs que viram o ícone de sua conta aparecendo com um círculo verde na sua linha de stories, como se você pudesse estar dentro dos poucos que seguem a cantora mais de perto.

A estratégia deu certo e em 24 horas ela ganhou seis milhões de novos fãs, que começaram a receber mensagens cifradas indicando possíveis novidades a caminho, desde uma nova tatuagem da cantora em seu quadril quanto a trecho de uma música que ela só tocou em shows antes do sucesso mundial, que os fãs mais antigos conhecem como “True Blue”. Agora uma série de outdoors começam a aparecer em Los Angeles, Nova York, Sydney e Londres trazendo frases, como “I try to live in black and white but I’m so blue”, para as ruas dessas cidades, e provocando curiosidade nos fãs que esperam ansiosos pelo novo disco.

Essa mesma frase surgiu em outro stories, que ela publicou neste sábado, cantando a letra em si, veja abaixo:  

Ziraldo (1932-2024)

Morreu, dormindo na tarde deste sábado, um dos maiores. Ziraldo era mais do que o pai do Menino Maluquinho, best-seller que lançou depois de sua fase áurea como cartunista e quadrinista e selou sua reputação como um dos maiores nomes do traço no Brasil, mas foi um dos principais artistas da contracultura brasileira e incansável defensor das causas sociais. Além de fundador e diretor do Pasquim, jornal de oposição à ditadura militar em plenos anos 70 (o que o levou à prisão por três vezes), o mineiro também foi autor da primeira história em quadrinhos feita por um único autor no Brasil, a eterna Turma do Pererê, lançada em 1960, que foi proibida de circular com o golpe de 64, devido à reputação de seu autor, declaradamente comunista. Seu traço personalíssimo e sua assinatura emblemática eram a tradução gráfica de uma personalidade intensa e implacável, de gênio esquentado e frases fortes, que moldou parte da personalidade brasileira em seus cartuns, nas histórias de seus personagens como a Supermãe, o Mineirinho e Jeremias O Bom e livros infantis imortais como Flicts, O Planeta Lilás, O Bichinho da Maçã, O Menino Marrom, A Fábula das Três Cores, além do já citado Maluquinho, que deu origem a outros livros, filmes e séries, sendo um dos livros brasileiros de maior número de reedições na história. Também é autor dos cartazes clássicos de dois filmes de Ruy Guerra, Os Cafajestes e Os Fuzis, e fez mascotes para os principais times de futebol brasileiros, além de ter incentivado a busca pela identidade nacional brasileira quando foi diretor da Funarte, nos anos 80 (fazendo-o ser rotulado como defensor da “cultura da broa de milho”). Sua influência mexeu até em nosso idioma ao livrar palavrões proibidos pela censura militar, mesmo como interjeições, em expressões reduzidas usadas até hoje (“pô” em vez de “porra”, “ih cacilda” em vez de “ih caralho”, “duca” em vez de “do caralho”, “é ford” em vez de “é foda”) e até pariu uma palavra ao reduzir o termo indicação para apenas “dica”. A importância de sua obra para nossa cultura é gigantesca. Só nos resta louvá-lo.

De volta ao Opinião

Híbrido de peça e apresentação musical, o espetáculo Pega, Mata e Come: 60 anos de Opinião, que foi exibido em duas sessões neste fim de semana no Sesc Vila Mariana, foi concebido por Paulo Tó ao lado do Instituto Augusto Boal antes mesmo do período pandêmico, que acabou por adiar sua existência. Retomada dentro da programação Territórios do Lembrar que aquela unidade do Sesc está fazendo para que não esqueçamos da tragédia política e cultural que foi o golpe empresarial-militar de 1964, a peça musical aproveitou a infame efeméride para realçar a importância de um espetáculo que hoje é lembrado mais como o palco para os primeiros passos das carreiras de Nara Leão e Maria Bethania do que como o que realmente foi: a primeira obra artística a se revoltar contra o revolução de araque que as forças armadas e parte do empresariado brasileiro deu contra a democracia brasileira sob o pretexto de “interromper o avanço comunista”, mentira repetida até hoje por seus agentes até para justificar crises políticas do país neste século. Montado pelo herói do teatro brasileiro Augusto Boal, Opinião foi revisitado por seu filho Julian Boal e a dramaturga Mariana Mayor, companheira de Tó, que assina a direção musical do espetáculo, dirigido por Jé Oliveira. À frente da apresentação, Xis, Ellen Oléria, Xeina Barros, Alessandra Leão e o próprio Tó, apresentavam-se como os integrantes da montagem original, assumindo personalidades que ajudavam o público entender o contexto da época ao mesmo tempo em que desfilaram tanto as canções do espetáculo original (“Peba na pimenta” de Dominguinhos, “Guantanamera” que foi cantada pela viúva de Boal, Cecília Boal, “Borandá” de Edu Lobo e, claro, a faixa de Zé Kéti que batizou o espetáculo original e a de João do Valle que trouxe o verso que batiza esse novo espetáculo) quanto músicas contemporâneas que conversam com a alma do espetáculo, como “História Para Ninar Gente Grande” (samba-enredo da Mangueira em 2019), “Lama” (de Douglas Germano), “Zumbi” (de Jorge Ben) e “Obá Iná” (do Metá Metá), além de músicas dos próprios intérpretes: Tó (contemplado em “Samba do Perdoa” e “De Cara no Asfalto”), Ellen (que trouxe “Testando” e sua versão para “Miss Celie’s Blues”), Xis (“De Esquina” e “Us Mano e As Mina”) e Alessandra (com “Exu Chega”, “Atirei” e sua versão para “Xangô”). Na banda que acompanhou o grupo de perto, um grupo pesado formado por Marcelo Cabral, Thiago Sonho, Lua Bernardo e Rodrigo Caçapa. Pena só terem rolado duas apresentações, temporada curta para uma apresentação deste porte ganhar corpo e lacear entre os intérpretes. Vamos torcer para outras edições pintarem em outras unidades do Sesc.

Assista abaixo:  

O encontro de Kamasi Washington com Andre 3000

Há alguns anos, se ouvíssemos falar que o rapper Andre 3000, metade do Outkast, participaria de um disco do saxofonista Kamasi Washington, a notícia seria recebida com a mesma medida de empolgação e estranhamento – o primeiro pela volta do MC à música, algo que não acontecia há muito tempo, a segunda pela conexão com um artista denso e bem menos pop. Mas desde o período pandêmico, ele voltou a dar sinais de vida, primeiro num single com Kanye West (“Life of the Party”) em 2021 e depois com outro (“Scientists & Engineers”) ao lado de Killer Mike, Future e Eryn Allen Kane no ano passado. Foi o mesmo ano em que deu sua maior guinada artística ao lançar o soberbo e abstrato New Blue Sun, disco instrumental composto ao redor de sua nova obsessão por flautas, jazz e música ambient. Neste sentido, a colaboração que Kamasi acaba de revelar com o amigo (o instrumental de lenta combustão “Dream State”, que faz parte do seu próximo disco, Fearless Movement) provoca reações menos adversas e igualmente admiradas, mostrando que o encontro ao mesmo tempo em que aproxima duas personalidades únicas da música norte-americana atualmente, mostra que a fase flautas de 3000, mesmo que seja só uma fase, não é o trabalho de um único disco.

Ouça abaixo:  

Coração aquecido à base de indie rock

O primeiro show do ano dos Pelados, minha banda indie brasileira favorita, aconteceu nesta quinta-feira no Fffront e a sensação de ver um grupo de amigos afiados tanto musicalmente quanto em termos de empatia num ambiente minúsculo repleto de fãs é dessas energias que me ajudam a seguir a longa estrada da vida. Focando todo seu repertório nas músicas de seu segundo disco, o excelente Foi Mal, o quinteto paulistano fez a laje do clube da Vila Madalena sacudir em músicas tortas e retas, entre baladas e faixas pra dançar, todas cantadas pelo público em êxtase por estar compartilhando da sensação que descrevi no início. O show, como sempre, chega ao auge quando eles cantam o hino composto para essa situação, a épica “Yo La Tengo na Casa do Mancha” que fez todo mundo gritar o refrão, que pede justamente pra gritar e ser gritado. Showzão!

Assista abaixo: