Como gravar um disco de um grupo instrumental que baseia seu trabalho no improviso livre num período em que os músicos não podem se encontrar pessoalmente? O grupo paulistano Música de Selvagem responde essa questão com o projeto O Pensamento Selvagem, que será lançado nesta terça-feira, em que partiram do livro homônimo do antropólogo francês Claude Lévi-Strauss para criar um banco de samples de sons pinçados da internet em uma extensa tabela sonora em que repassam o movimento contínuo do cru para o cozido em uma sequência de 94 faixas de 30 segundos – antecipando um destes trechos em primeira mão para o Trabalho Sujo, ouça abaixo.
O grupo instrumental Música de Selvagem encerra o ciclo de seu disco Volume Único, seu disco de 2018 que contou com a participação de Tim Bernardes, Luiza Lian, Sessa e Pedro Pastoriz como vocalistas convidados ao lançar, em primeira mão no Trabalho Sujo o registro que fizeram da única vez que os quatro tocaram ao mesmo tempo, na sala Adoniran Barbosa do CCSP, quando eu era curador de música de lá.
São quatro vídeos em que cantam músicas compostas pelos vocalistas convidados: Sessa canta sua “Música”, Luiza vai de “Dois Blocos” (que mistura suas “Cadeira” e “Tem Luz (Úmido V)”), Pedro Pastoriz canta “Assovio” e o vocalista do grupo O Terno canta “Morto”. Os quatro são acompanhados pelos músicos do grupo, o baixista Arthur Decloedt, os saxofonistas Filipe Nader e Oscar “Cuca” Ferreira, o baterista Guilherme Marques e o trumpetista Amilcar Rodrigues.
“Esse show foi o único show que fizemos com os quatro compositores convidados durante esses dois anos de vida do disco”, me explica o baixista Arthur. “É realmente muito difícil juntar todo mundo, principalmente por conta das agendas, por isso a gente fez alguns shows com somente alguns convidados. O fato de ter todos os quatro fez desse show muito especial, ainda por cima porque ele rolou em um verdadeiro templo da música de São Paulo, que é a sala Adoniran Barbosa do CCSP.”
Ele antecipa que o grupo está começando a preparar o sucessor deste álbum, batizado de O Pensamento Selvagem, que ainda está sendo discutido por seus integrantes em videoconferências durante essa interminável quarentena. “Ainda estamos definindo as bases, mas já posso adiantar que teremos a participação da artista sonora Luísa Puterman e da cantora Inés Terra. Estamos buscando incessantemente fazer algo que ainda não fizemos como grupo”, conclui Arthur.
O grupo instrumental finalmente junta os quatro vocalistas com quem gravou o disco Volume Único – Luiza Lian, Pedro Pastoriz, Tim Bernardes e Sessa – numa apresentação inédita nesta quinta-feira, no Centro Cultural São Paulo, a partir das 21h (mais informações aqui).
Maior satisfação anunciar meu primeiro projeto como diretor artístico, que concebi ao lado dos novos compadres Arthur Decloedt, Charles Tixier e João Bagdadi. O espetáculo Professor Duprat – Maestro da Invenção, que acontece nos dias 6 e 7 de setembro, no teatro do Sesc Pompeia, começou como a ideia de uma celebração dos 50 anos da Tropicália que fugisse do trivial. Chamei João, do selo RISCO, para me ajudar a estruturar a produção, que por sua vez chamou Arthur (do Música de Selvagem) e Charles (do Charlie e os Marretas) para fazer a direção artística. Originalmente havia pensado na recriação do disco que o maestro Rogério Duprat havia lançado naquele 1968 – A Banda Tropicalista do Duprat -, mas logo ampliamos a homenagem para além da efeméride, contemplando todo o alcance de uma obra ainda desconhecida pela maioria do público, diferente de grande parte das músicas que arranjou.
Duprat, que entrevistei para a falecida revista Bizz no segundo semestre do ano 2000 ao lado do Fernando Rosa, mexeu nas bases de canções que hoje fazem parte do imaginário brasileiro: além das tropicalistas “Domingo no Parque” e “Baby”, grande parte das músicas d’Os Mutantes e de Gilberto Gil no início de suas carreira, “Construção” de @Chico Buarque, todo Ou Não de Walter Franco, “Maria Joana” de Erasmo Carlos, todo o Tropicália ou Panis et Circencis e outras tantas. Também foi pioneiro na música eletrônica no Brasil (estudou com Karlheinz Stockhausen e John Cage e foi colega de classe de Frank Zappa), célebre na música erudita contemporânea brasileira e trabalhou com trilha sonora para o cinema, publicidade e até tradução de livros.
A banda montada para apresentação inclui, além dos diretores musicais no baixo e bateria, André Vac (do Grand Bazaar), Mariá Portugal, Rafael “Chicão” Montorfano e Maria Beraldo (do Quartabê), Filipe Nader (também do Música de Selvagem e Trupe Chá de Boldo) e o mestre Thiago França, e o espetáculo ainda conta com Curumin, Tiê, Luiza Lian, Tim Bernardes, Jonas Sá e Jaloo como intérpretes das músicas imortalizadas com arranjos do maestro, morto em 2006. Mas como um espetáculo não é só música, convidamos Gui Jesus Toledo para fazer o som, Caio Alarcon para operar o monitor, Olivia Munhoz para cuidar da direção cênica e iluminação, Gabriela Cherubini e Flávia Lobo de Felício para ficar com o figurino e Maria Cau Levy para criar a identidade visual e a Francine Ramos para a assessoria de imprensa. Abaixo, o texto que escrevemos para apresentar o espetáculo, orgulhosos que estamos da homenagem que estamos fazendo para este farol de nossa música, que muitos ainda não conhecem (mais informações aqui).
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Há meio século o Brasil conheceu o trabalho de um compositor erudito e professor acadêmico que revolucionou a música brasileira. O maestro Rogério Duprat é mais conhecido por sua imagem iconoclasta na capa do disco-manifesto Tropicália ou Panis et Circensis, onde, entre os jovens multicoloridos Gil, Caetano, Mutantes, Tom Zé e Gal Costa, aparecia adulto e monocromático segurando um penico como se fosse uma xícara de chá. A representação – referindo-se ao mictório de Duchamp – talvez seja a melhor tradução para a colossal contribuição deste músico não apenas ao movimento tropicalista quanto à música brasileira desde sua aparição.
O espetáculo Professor Duprat – Maestro da Invenção parte desta efeméride para jogar luz na biografia musical do maestro paulista. Influente não apenas no movimento que ajudou a conceituar (a Tropicália), como na história da música brasileira, Duprat é um dos principais compositores eruditos contemporâneos brasileiros, um dos grandes nomes na música para a publicidade do país, compositor de trilhas sonora para filmes como O Anjo da Noite e Marvada Carne, pioneiro na utilização de computadores na música (há mais de 50 anos), tradutor do único livro de John Cage publicado no Brasil, aluno e colega de nomes como Karlheinz Stockhausen, Pierre Boulez, Gilberto Mendes e Frank Zappa. E, claro, arranjador e maestro de obras de diferentes artistas como Mutantes, Caetano Veloso, Gal Costa, Chico Buarque, Gilberto Gil, O Terço, Nara Leão, Walter Franco, Sá, Rodrix e Guarabyra, Frenéticas, Erasmo Carlos, entre muitos outros.
A proposta da apresentação é trazer parte do repertório produzido por Duprat interpretado por artistas atuais que foram diretamente influenciados por seus feitos criativos. Concebido pelo jornalista, curador e crítico musical Alexandre Matias, do site Trabalho Sujo, com direção musical dos produtores Arthur Decloedt e Charles Tixier e produção executiva de João Bagdadi do Selo RISCO, para o palco do Teatro do Sesc Pompeia. O espetáculo costura músicas conhecidas do grande público (como”Domingo no Parque”, “Cabeça”, “Ave Lúcife”, “Construção”, Tuareg”, “2001”, “Irene”, “Não identificado”, “Índia”, “Futurível” e “Baby” entre outras) com arranjos ousados e a influência comercial e erudita de Duprat.
As canções serão apresentadas de forma não-linear e não-cronológica, ecoando diferentes épocas da biografia do maestro através de artistas como Curumin, Tiê, Jaloo, Tim Bernardes, Jonas Sá e Luiza Lian acompanhados por uma banda formada por Charles Tixier (Charlie e os Marretas), Arthur Decloedt (Música de Selvagem), Filipe Nader (Trupe Chá de Boldo), Thiago França (Metá Metá), Maria Beraldo Bastos, Mariá Portugal e Rafael “Chicão” Montorfano (Quartabê) e André Vac (Grand Bazaar).
Ficha técnica
André Vac: guitarra, violão e violino.
Arthur Decloedt: contrabaixo e MPC.
Charles Tixier: bateria, synths e MPC.
Curumin: vocal e bateria
Filipe Nader: sax alto e barítono, clarinete alto e souzafone.
Jaloo: vocal
Jonas Sá: vocal
Luiza Lian: vocal
Maria Beraldo: vocal, clarinete e clarone
Mariá Portugal: vocal, bateria e MPC
Rafael “Chicão” Montorfano: piano, synths e teclados.
Thiago França: sax tenor e flauta.
Tim Bernardes: vocal e guitarra
Tiê: vocal
Equipe:
Direção artística: Alexandre Matias, Arthur Decloedt e Charles Tixier.
Concepção e curadoria: Alexandre Matias
Direção musical: Charles Tixier e Arthur Decloedt.
Produção executiva: João Bagdadi.
Som: Gui Jesus Toledo.
Monitor: Caio Alarcon
Luz: Olivia Munhoz
Figurino: Gabriela Cherubini e Flavia Lobo de Felicio
Identidade visual: Maria Cau Levy
Assessoria de Imprensa: Francine Ramos.
SERVIÇO:
Professor Duprat – Maestro da Invenção
Dias 6 e 7 de setembro. Quinta, às 21h, e sexta, às 18h
Teatro
Ingressos: R$9 (credencial plena/trabalhador no comércio e serviços matriculado no Sesc e dependentes), R$15 (pessoas com +60 anos, estudantes e professores da rede pública de ensino) e R$30 (inteira).
Venda online a partir de 28 de agosto, terça-feira, às 12h.
Venda presencial nas unidades do Sesc SP a partir de 29 de agosto, quarta-feira, às 17h30.
Classificação indicativa: Não recomendado para menores de 12 anos.
Sesc Pompeia – Rua Clélia, 93.
O laboratório Segundamente parte para um novo tipo de experimento ao apresentar a sessão Sem Palavras, dedicadas a trabalhos instrumentais de diferentes artistas, que tomarão as segundas-feiras de junho no Centro da Terra. São quatro apresentações que captam o ótimo momento da cena em São Paulo – e no Brasil. Para esta primeira sessão serão quatro shows diferentes com artistas que expandem os limites desta cena para diferentes lugares. A primeira segunda-feira, dia 4, é de improviso livre com os músicos Victor Vieira-Branco, Mariá Portugal, Arthur DeCloedt e Thomas Rohrer. Na segunda segunda-feira temos a colisão do jazz com o rock do grupo Vruumm, no dia 11. No dia 18 é a vez do projeto Solaris, incursão individual do vibrafonista e baterista Richard Ribeiro. E o mês termina com o grupo Música de Selvagem, dia 25, tocando músicas de seu novo disco, Volume Único – e é a única noite que deve contar com vocais, do músico Sessa, convidado pelo grupo. As apresentações começam sempre às 20h (mais informações no site do Centro da Terra) e eu conversei com os responsáveis por cada noite para saber o que podemos esperar deste novo formato do Segundamente.
Rohrer + Decloedt + Portugal + Vieira-Branco, por Victor Vieira-Branco
https://soundcloud.com/trabalhosujo/sem-palavras-2018-rohrer-decloedt-portugal-vieira-branco
Vruumm, por Anderson Quevedo
https://soundcloud.com/trabalhosujo/sem-palavras-2018-vruumm
Solaris, por Richard Ribeiro
https://soundcloud.com/trabalhosujo/sem-palavras-2018-solaris
Música de Selvagem, por Arthur DeCloedt
https://soundcloud.com/trabalhosujo/sem-palavras-2018-musica-de-selvagem
Prestes a lançar seu segundo disco, batizado de Volume Único, na próxima semana, o grupo de improvisação instrumental paulista Música de Selvagem se entrega às canções a partir de uma temporada que fizeram com compositores como Tim Bernardes, Pedro Pastoriz e Sessa na Associação Cultural Cecília há dois anos. O trabalho começa a ser revelado com a colaboração que o grupo fez com Luiza Lian, quando ela ainda produzia o trabalho que depois se tornaria o vídeo-álbum-instalação Oyá Tempo. À época, o grupo registrou os rascunhos que se tornariam as faixas “Cadeira” e “Tem Luz” numa pequena peça chamada “Dois Blocos”, mostrada pela primeira vez no Trabalho Sujo. Filipe Nader, o Chile, saxofonista e cofundador do grupo ao lado de Arthur Decloedt, fala sobre a concepção da música: “Lembro que na época que fizemos a residência na Associação Santa Cecília a Luiza estava fazendo a pré-produção do Oyá Tempo. Pedimos umas músicas para ela para fazermos uma versão e o que acabou rolando foi que ela mandou dois poemas. Daí juntamos os dois e fizemos essa música em três partes com dois blocos de poemas e uma improvisação à quatro vozes no meio – dois saxofones barítono, eufônio e canto. A coisa toda foi gravada em dois takes lá na Voz do Brasil. De todas as faixas do disco que sai na semana que vem essa é a que mais tem improvisação vocal, a Luiza deu um show improvisando junto com a gente.” Sente só: