CFest: Balanço final

O C6Fest terminou neste domingo estabelecendo um novo padrão de realizar festivais de música em São Paulo. Conseguiu provar que é possível fazer um bom festival com boa estrutura e curadoria equilibrando-se entre o comercial e o pouco previsível trazendo tanto artistas novos e relevantes quanto nomes consagrados – e, principalmente, dissociar a ideia de festival de música estar atrelada a dia de perrengue, como o que fizeram os festivais realizados em São Paulo na última década. Obviamente a questão do preço extorsivo do ingresso é um ponto central nos poucos contras do evento: não bastasse ser caro pra cacete, só era permitido que se frequentasse um dos três palcos em que se realizavam os shows, algo que é uma irrealidade longe da vida de qualquer fã de música que não nasceu em berço de ouro. Eu mesmo já estava conformado em não ir caso não estivesse credenciado. Mas falo disso abaixo.  

Tapando o Big Buraco

Jadsa encerrou seu Big Buraco no Centro da Terra com duas sumidades no palco: primeiro chamou Juçara Marçal, que trouxe sua kalimba, e depois Alessandra Leão, no toque de seu tambor. As surpresas ficaram por conta da vinda do compadre e conterrâneo João Milet Meirelles, metade do projeto Taxidermia que os dois têm juntos, que pilotou efeitos nas vozes e instrumentos do palco desde as primeiras músicas (que Jadsa fez sozinha com sua guitarra), e da surpresa da vinda de Fernando Catatau, que subiu para fazer as últimas músicas da noite. De brinde, Jadsa saiu do palco sem fazer o bis, como é de praxe, e deixou Juçara e Catatau tocando juntos pela terceira vez “Lembranças que Guardei”, que o compositor cearense escreveu para o disco mais recente da cantora paulista. Uma noite milagrosa.

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Vida Fodona #780: Mais um domingo frio

Outono chegou chegando…

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Jadsa: Big buraco

Quem toma conta das noites de segunda-feira no Centro da Terra é a baiana Jadsa, que completa dois anos de lançamento de seu disco de estreia, o lírico-paulistânico Olho de Vidro, olhando para o que construiu neste início de carreira e como isso misturou-se com o nefasto período pandêmico. Ela reúne a velhos e novos compadres e comadres para revisitar o disco em encontros que prometem ser históricos. No primeiro deles, dia 3 de abril, ela convida o conterrâneo Giovani Cidreira para mergulhar em seu passado comum. Na segunda que vem, dia 10, é a vez de se encontrar com o guitarrista Kiko Dinucci. Na semana seguinte, dia 17, ela junta-se às cantoras e compositoras Marcelle, Josyara e Marina Melo, e termina a temporada, chamada de Big Buraco, no dia 24, quando recebe, na mesma noite, Alessandra Leão e Juçara Marçal. Vai ser lindo e intenso, como só Jadsa sabe fazer. Os espetáculos começam sempre pontualmente às 20h e os ingressos podem ser comprados antecipadamente neste link.

Centro da Terra: Abril de 2023

Prontos pro mês de abril no Centro da Terra? Porque nem a gente tá acreditando. A temporada das segundas-feiras fica por conta da Jadsa, que agitou essa seleção chamada Big Buraco em que revê sua obra recente a partir dos pontos de vistas de convidados muito especiais: na primeira segunda, dia 3, ela convida Giovani Cidreira; na semana seguinte, dia 10, ela vem com Kiko Dinucci; depois, no dia 17, ela chama Marcelle, Marina Melo e Josyara; para, finalmente, encerrar com Alessandra Leão e Juçara Marçal! Tá achando muito? Pois a primeira terça-feira, dia 4, é o dia em que o Guaxe, dupla formada pelo eterno supercorda Bonifrate e pelo boogarinho Dinho Almeida, estreia nos palcos pela primeira vez. Na semana seguinte, dia 11, vem o Guizado apresentar-se com uma nova formação, chamada A Realeza. E nas duas últimas terças do mês, dias 18 e 25, Alessandra Leão vem acompanhada de Rafa Barreto para apresentar seu Punhal de Prata, com convidados-surpresa. Tá achando muito? Pois lembre-se que toda quarta nosso teatro agora exibe documentários sobre música brasileira em parceria com o festival In Edit – e em abril a programação traz Paulo César Pinheiro – Letra e Alma (dia 5), O Piano Que Conversa (12), Toada para José Siqueira (19) e O Fabuloso Zé Rodrix (26). Os espetáculos começam pontualmente às 20h e os ingressos já estão à venda online, não deixa pra comprar em cima da hora porque tem show que já tá se esgotando…

Vida Fodona #778: Muita vida acontecendo

E não dá pra ficar parado.

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Uma amizade e dois discos soberbos

Muito feliz de ter presenciado o encontro de duas facetas de dois dos maiores nomes da música brasileira contemporânea numa mesma noite, quando Kiko Dinucci e Juçara Marçal encontraram-se, nesta quinta-feira, no palco da Casa Natura Musical para apresentar, pela primeira vez em São Paulo, seus respectivos Rastilho e Delta Estácio Blues em uma sessão dupla de tirar o fôlego. A noite começou com Kiko chamando as cantoras que reuniu para acompanhá-lo na versão ao vivo do melhor disco brasileiro de 2020 – além da própria Juçara, as sensacionais Dulce Monteiro, Maraísa e Gracinha Menezes – e, como sempre elas encantaram o público e adoçaram o toque ríspido e percussivo de Kiko em seu instrumento. Depois, sozinho no palco, segurou a audiência que lotava a casa tocando várias canções apenas com seu violão de cordas de nylon e a empolgação fez com que ele quase quebrasse o instrumento – mas foi só um susto. Chamou primeiro Juçara para acompanhá-lo em outras canções e, finalmente, encerrou a apresentação com a premonitória faixa que batiza seu disco, puxando o coro kamikaze “vamos explodir” pouco antes de entrar na cantoria balsâmica que encerra o disco – e o espetáculo.

Pouco depois da apresentação de Kiko Dinucci na Casa Natura Musical nesta quinta-feira, foi a vez de Juçara Marçal assumir o comando, deixando Kiko, produtor do melhor disco brasileiro de 2021, como coadjuvante e braço direito. Ancorados por uma cozinha pesada e precisa – os baixos de Marcelo Cabral e os beats de Alana Ananias -, os dois ressurgiam no palco com outro figurino e outra direção – em vez de vozes e um único violão, instrumentos elétricos, sintetizadores e a única voz, de Juçara, claro, distorcida por ela mesma com vários efeitos e pedais de distorção. A versão ao vivo de Delta Estácio Blues segue sendo o melhor show no Brasil atualmente e é impressionante como a cada nova apresentação, eles aumentam ainda mais os decibéis – a dobradinha entre “La Femme à Barbe” e “Oi Cats” (em que Juçara enfiou até um “oi sumido”) subiu com uma parede de ruído avassaladora e se o show já tinha cara de pós-punk, neste momento entraram no modo Sonic Youth. Duas apresentações distintas que selam uma amizade que deu origem a dois discos soberbos e complementares: enquanto Kiko olha para o passado para tentar antever o futuro, Juçara não tira os olhos do futuro, sem pensar em olhar para trás. Noite incrível.

Assista abaixo:  

C6Fest traz Kraftwerk, War on Drugs, Weyes Blood, Arlo Parks, Dry Cleaning e Underworld para o Brasil

Depois de já ter anunciado Kraftwerk (pela primeira vez no Brasil sem um de seus fundadores, Florian Schneider, que morreu em 2020), Weyes Blood e Tim Bernardes tocando Gal Costa em sua escalação, o festival C6Fest, produzido pela Dueto de Monique Gardenberg que fazia o Free Jazz e o Tim Festival, acaba de anunciar sua formação completa. O evento acontece no Vivo Rio, no Rio de Janeiro, entre os dias 18 e 20 de maio, e no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, entre os dias 19 e 21 do mesmo mês e traz, na escalação final, nomes novíssimos como Arlo Parks, Black Country New Road, Samara Joy e Dry Cleaning, grandes nomes da última década como War on Drugs. Christine and the Queens, The Comet is Coming e Jon Batiste e veteranos como Underworld e Juan Atkins, entre várias outras atrações. No time brasileiro, há um tributo a Zuza Homem de Mello (que foi curador do Free Jazz e do Tim Festival) com a Orquestra Ouro Negro, Fabiana Cozza e Monica Salmaso, Russo Passapusso com a Nômade Orquestra, Caetano Veloso e uma homenagem musical ao ano de 1973 com Kiko Dinucci, Juçara Marçal, Arnaldo Antunes, Tulipa Ruiz, Linn da Quebrada, Giovani Cidreira e Jadsa. Os ingressos começam a ser vendidos a partir do próximo dia 5 e separei mais informações sobre horários e preços abaixo.  

Anna Vis Sem vacilação

Confesso que não entendi nada quando vi Anna Vis tocando suas canções ao violão. Ainda estávamos no primeiro semestre da pandemia, quando caiu a ficha que não eram alguns dias ou semanas e que a peste ia durar meses, talvez anos. E esta tragédia, como sabemos, obrigou a todos que viviam de apresentações ao vivo passar por transformações que mexiam em suas atividades originais. E de repente lá estava Anna, que conhecia como técnica de som de shows, empunhando seu violão e dedilhando composições próprias como se sempre tivesse feito aquilo – longe de todos. Passei acompanhar mais de perto essa mudança de papel e aos poucos a vi se envolvendo com Rômulo Froes, chamando Marcelo Cabral e Maurício Takara para acompanhá-la na gravação de seu primeiro disco, que ainda contou com participações de Juçara Marçal, Ná Ozzetti, Mbé, Clima e Juliana Perdigão. E neste processo, não só pude conversar com a nova cantora e compositora sobre sua nova carreira, como a instiguei sobre como traduzir este novo trabalho para o palco. Seu disco de estreia, Como um Bicho Vê, será lançado nas plataformas na próxima quinta-feira, o mesmo dia em que faz o primeiro show deste álbum no Sesc Vila Mariana (os ingressos estavam quase acabando, corre que ainda dá pra comprar). E ela topou mostrar seu disco antes de seu lançamento em primeira mão aqui no Trabalho Sujo, este que é o primeiro grande lançamento brasileiro de 2023.

Ouça aqui.  

Delta Estácio Blues pra entrar direito em 2023

Juçara Marçal fez aniversário dia 27 (essa data mágica que também viu o nascimento de Alessandra Leão) e puxou sua comemoração trazendo o melhor show do ano passado para o ano novo neste domingo, no Sesc Bom Retiro. A parede pós-moderna erguida pelo choque inexorável da linguagem eletrônica com a energia pós-punk segue ainda mais sólida, à medida em que cada vez mais o som da apresentação ganha mais volume. Assim, a nuvem de pulsos elétricos conduzida por Kiko Dinucci, Alana Ananias e Marcelo Cabral – todos percorrendo timbres analógicos e eletrônicos, às vezes na mesma música – coloca Juçara no topo do céu, cavalgando o peso atmosférico como uma entidade sobrenatural: impiedosa e implacável ainda que atenta e clemente. Aliada às canções de seu Delta Estácio Blues, ela eletrifica o público enquanto o conquista com sua voz inabalável, crua ou distorcida por efeitos ou encorpada pelo soco sonoro de seus três amigos. Agora sim dá pra dizer que 2023 começou.

Assista ao show aqui.