Mítico disco do Television, Marquee Moon continua como um segredo escondido quatro décadas após seu lançamento, completas nesta terça-feira. Escrevi sobre o disco no meu blog no UOL.
Há 40 anos, o Television encerrava uma era e iniciava outra com seu clássico Marquee Moon
Entre os anos 60 e 70, a maior cidade dos Estados Unidos havia se tornado o inferno na terra. A especulação imobiliária, uma crise fiscal inédita e o braço dado dos políticos com as grandes corporações haviam sacrificado vizinhanças inteiras, transformando Nova York em uma cidade violenta e destruída. Um antro decadente que empilhava seus pobres nas periferias e transformava o metrô num centro nervoso da insegurança que espalhava-se por suas ruas, abandonadas pelo poder público – “Bem-vindo à cidade do medo”, dizia um panfleto que recepcionava os turistas da época. Era o cenário que inspiraria distopias como os filmes Fuga de Nova York, Blade Runner e Warriors – Guerreiros da Noite e daria origem a movimentos culturais que redefiniriam a cultura ocidental do final do século passado, como o hip hop, a cultura gay e, claro, o punk rock. Mas no coração deste último, especificamente na espelunca que viu nascer o movimento urbano que salvou o rock da autoindulgência, havia um palácio de luz que unia toda a importância do rock até o meio dos anos 70 transformando-se em um farol para a criatividade de artistas nas décadas seguintes. Estas qualidades tornaram-no uma das obras mais importantes da história da música popular, embora Marquee Moon, o disco de estreia da banda Television, lançado há exatos 40 anos, seja passado de geração em geração como um segredo bem guardado.
Mas não há segredo algum. Num álbum esplendoroso com parcas oito canções somando menos de cinquenta minutos, Tom Verlaine conduz seu pequeno exército de instrumentistas reunindo lições aprendidas no jazz experimental, no folk e no rock clássico que abririam o rumo para artistas que redefiniriam a música nos anos seguintes a partir da grande transformação provocada pelo punk. Não é exagero dizer que Marquee Moon é o primeiro disco de rock alternativo, aquele que cogita uma nova relação com a música produzida a partir do casamento de guitarras, baixo e bateria com o ímpeto adolescente de se fazer percebido. O disco de 1977 não apenas consolida o arquétipo da banda nova-iorquina que reúne predecessores como o Velvet Underground, os Modern Lovers e os New York Dolls, contemporâneos como Patti Smith e os Talking Heads e sucessores como o Sonic Youth e os Strokes. Ele também abre possibilidades novas e improváveis para um gênero musical entusiasmado com o próprio virtuosismo que fucionariam como alicercespara carreiras inteiras de grupos como Joy Division, R.E.M., Pixies, Echo & the Bunnymen, Wilco e Radiohead.
Foi Tom Verlaine que descobriu o CBGB’s. Thomas Miller era um moleque de Nova Jérsei que havia se mudado para Nova York para reinventar-se como artista seguindo os passos de Dylan dez anos antes – trocando, como Dylan, seu sobrenome original por o de um escritor clássico, o poeta simbolista francês Paul Verlaine. Sua formação musical havia começado no jazz quando era aprendera a tocar saxofone quando era criança, mas foi “19th Nervous Breakdown” dos Rolling Stones que o fez abraçar a guitarra elétrica. Músico dedicado, Verlaine vinha na contramão do gênero que ajudaria a colocar no mapa. Sua principal ligação com o punk clássico não era musical e sim autoral – foi sua convicção em tocar do jeito que queria que o levou a bater na porta do bar de Hilly Kristal, um bar de motoqueiros que só tocava rock tradicional, pedindo para que lhe cedesse o palco para sua nova banda.
O Television era a segunda versão da banda que Verlaine havia fundado com seu conterrâneo Richard Meyers, com quem havia fugido para Nova York. Como Tom, Richard mudara seu sobrenome para Hell e em Nova York começaram a tocar como Neon Boys, ao lado do baterista Billy Ficca, que conheceram na cidade. Tom queria um segundo guitarrista para alternar solos de guitarra, enquanto Hell segurava um baixo tão impreciso e sem compromisso como a personalidade que reinventava com seu novo sobrenome. Foi Hell o primeiro daquela turma a usar roupas rasgadas, pendurar alfinetes, medalhas e broches aleatórios em casacos do exército com furos de bala, coturnos com solas descolando, calças jeans remendadas. Seu visual é a assumida inspiração do inglês Malcolm McLaren – que à época tentava recriar o New York Dolls atrelando-o ao imaginário comunista – para a cara não apenas do Sex Pistols mas de todo o punk inglês. Depois de tentar nomes como o futuro Dee Dee Ramone e Chris Stein (que formaria o Blondie em seguida) para a vaga de segundo guitarrista, Tom encontrou seu músico em Richard Lloyd, amigo da banda que viu a primeira formação dos Neon Boys surgir.
A obsessão da banda em tocar bem a colocou em ensaios contínuos que duravam até seis horas todos os dias da semana à exceção do domingo. Foi esta necessidade de tocar que levou Verlaine ao CBGB’s, um bar cujos gêneros musicais apreciados – country, bluegrass e blues – eram representados em sua sigla de batismo. A banda não queria apenas fazer um show e sim um lugar em que pudessem tocar com frequência para treinar. Quando apresentaram-se pela primeira vez em março de 1974, o grupo já havia construído uma reputação no underground nova-iorquino a ponto de levar os habitués de casas noturnas como o Max’s Kansas City e do Mercers Arts Center a visitar aquele novo lugar no East Village. A terceira apresentação do Television, em abril, trouxe Patti Smith e Lenny Kaye pela primeira vez ao local, onde tocariam a primeira vez com o Patti Smtih Group meses depois. Depois era a vez dos Ramones, dos Stilletos que mais tarde se tornariam o Blondie e dos Talking Heads. Estava formada a base do punk nova-iorquino, que, a partir de 1975, começaria a materializar-se em disco – primeiro veio o seminal Horses de Patti Smith no final daquele ano, seguido do explosivo primeiro dos Ramones, no ano seguinte.
O Television, no entanto, demoraria para sair do papel. A perseverança da banda rumo a uma musicalidade exímia havia transformado o show do grupo em um transe absoluto movido por guitarras. Verlaine e Lloyd alternavam-se nos papéis de guitarristas base e solo e reinventavam aos poucos o papel do instrumento na história do rock. Assim solos de guitarra não eram meras exibições de virtuosismo nem demonstrações de força. Havia uma dramaticidade parente do blues e do folk nos solos dos dois guitarristas, mas que traziam aquele sentimento para a cidade grande, para a noite em uma metrópole. Achados e perdidos ao mesmo tempo, o cruzamento daquelas duas guitarras bebiam da escola dos Rolling Stones, de Jimi Hendrix, do Pink Floyd e do Grateful Dead ao mesmo tempo em que enveredavam pelos altos improvisos de jazzistas como Miles Davis, Albert Ayler e Ornette Coleman. A obsessão pela técnica fez Verlaine expulsar Hell, cada vez mais problemático, da banda e em seu lugar veio Fred Smith, que havia acabado de formar o Blondie, mas que era fã de ir em todos os shows do Television.
A demora em lançar o primeiro disco não era descaso das gravadoras e sim capricho de Verlaine. A banda foi cortejada ainda em 1974 pela gravadora inglesa Island, que colocou-os no estúdio com Brian Eno, que produziu “Friction”, “Venus”, “Prove It” e “Marquee Moon”, mas o guitarrista não ficou satisfeito com o som da produção, considerando-o frio. A gravadora Arista tentou contratar a banda no ano seguinte, mas só em 1976 que o grupo assinaria o contrato para seu primeiro disco, desta vez com a Elektra. A gravadora atendeu a exigência de Verlaine para produzir seu primeiro disco, mesmo nunca tendo produzido nenhum outro disco na vida, e deixou-o contratar o engenheiro de som que quisesse. Verlaine e Lloyd escolheram Andy Johns, que já havia trabalhado com o Humble Pie, o Free, Jethro Tull e o Led Zeppelin, especificamente pelo som de guitarras que havia tirado no disco Goat’s Head Soup, dos Rolling Stones.
Gravado em setembro de 1976 nos estúdios A&R em Nova York, Marquee Moon não demorou para ser concluído, mesmo com a banda tendo tempo à vontade para passar no estúdio. Mas o grupo estava tão afiado devido a anos de shows e ensaios ininterruptos que algumas músicas, inclusive a emblemática faixa-título, com seus solos magistrais e mais de dez minutos de duração, foram gravadas ao vivo, sem superpor instrumentos ou refazer determinadas partes. O próprio Billy Ficca achou que estivessem apenas ensaiando a canção quando a gravaram, que o co-produtor Johns tentou regravar – mas Verlaine não deixou.
O disco foi lançado no dia 7 de fevereiro de 1977 com a banda estampando a capa com uma foto tirada por Robert Mapplethorpe. Mas a imagem foi manipulada posteriormente numa máquina de Xerox, quando Richard Lloyd levou a foto para fazer cópias e espalhá-las pela cidade. As cópias originalmente seriam em preto e branco, mas o operador tirou uma versão colorida e Lloyd gostou do resultado artificial das tonalidades. Pediu para o garoto tirar mais cópias enquanto mexia nos controles da máquina de olhos fechados. Entre as várias fotos de cores saturadas uma delas foi parar na capa do disco.
A capa parece contradizer o conteúdo. Marquee Moon é uma viagem romântica e beat por uma cidade decadente, Verlaine contrapondo seus solos com vocais quase falados, por vezes gritados, pouco cantados, que descreviam “olhos como telescópios” e uma “Broadway medieval”, como se os prédios espelhados fossem paredões geológicos de uma nova era, fria e quase robótica, essencialmente desumana. Verlaine age como o bardo desta nova era, arauto de uma transformação brutal mas comodista, violenta a ponto de não provocar reação. As guitarras costuram uma paisagem vertiginosa como as torres do então recém-inaugurado World Trade Center, obelisco gêmeo de uma nova era faraônica, mas cheias de detalhes barrocos e ornamentos mouriscos, como plantas que atravessam o concreto.
E do moquifo que deu origem ao punk, do sovaco elétrico da boemia nova-iorquina, surgia um disco épico e heróico, mas ao mesmo tempo introspectivo e existencialista, que questionava não apenas o niilismo da cidade que viu aquele novo movimento cultural nascer mas também o próprio papel do rock nesta nova fase. Consciente de sua importância, Marquee Moon é o divisor de águas que encerra a fase clássica do rock e abre o novo testamento pós-punk, mas sem precisar tripudiar ou negar o passado. E mesmo assim segue à miúda, em segredo, quase como um código que vai sendo transferido de geração em geração.
Novo trailer do seriado Stranger Things, exibido no comercial da transmissão da final de futebol americano nos EUA, traz novidades sobre o mundo invertido e anuncia data de estreia – falei mais disso lá no meu blog no UOL.
Com um trailer com meio minuto de duração exibido nos comerciais da final do campeonato de futebol americano nos EUA neste domingo, a série Stranger Things deu pistas importantes sobre sua segunda temporada. Olha só:
Eleven está de volta, o mundo invertido está ainda mais presente, há um novo monstro e as fantasias de Caça-Fantasmas usadas pelos meninos têm uma explicação: a nova temporada será disponibilizada na íntegra no Dia das Bruxas deste ano, dia 31 de outubro. É sintomático principalmente pelo fato da série ter inventado a fantasia de Halloween mais popular do ano passado – justamente a da personagem vivida pela atriz Millie Bobby Brown.
A primeira imagem divulgada da segunda temporada de Stranger Things chama os Caça-Fantasmas à ativa – falei mais sobre isso no meu blog no UOL.
Depois de muito mistério finalmente teremos mais pistas sobre a segunda temporada de Stranger Things neste domingo, quando acontece a final do campeonato de futebol americano, o famoso Super Bowl. A transmissão é conhecida pois vários comerciais de TV ganham atenção global pelo simples fato de que este jogo é um dos programas de TV mais assistidos nos EUA.
E a imagem acima, trazida em primeira mão pela Entertainment Weekly, mostra parte do elenco infantil – o Mike de Finn Wolfhard, o Dustin de Gaten Matarazzo e o Lucas de Caleb McLaughlin (Lucas) – vestidos com o uniforme dos Caça-Fantasmas em uma festa de Halloween da escola. A imagem mexe tanto com as referências aos anos 80 que ajudaram a impulsionar a fama do seriado quanto resume a primeira temporada ao transformá-los nos caçadores de fantasmas de uma pequena cidade do interior dos EUA. Mas a fantasia não é gratuita, repare ao fundo: é dia das bruxas.
O pouco que se sabe sobre a nova temporada do seriado produzido e escrito pelos irmãos Duffer é que ele terá uma cara de continuação, como se fosse a sequência de um filme, e se passará em 1984, um ano após os incidentes da primeira temporada. No elenco duas presenças mais conhecidas de outros papéis também estão entre os atores por terem feito sucesso também nos anos 80: Paul Reiser é mais conhecido como o marido da série Mad About You, sucesso nos 90, mas também atuou no filme Aliens, dirigido por James Cameron. Já Sean Astin é mais reconhecido por viver Samwise Gamgee nos filmes O Senhor dos Anéis mas também é o jovem Mikey Walsh, dos Goonies.
Sobre a história da nova safra de episódios, o produtor Shawn Levy já deu declarações falando que a nova temporada ser “maior e mais sombria”. E esta semana ele também anunciou o que pode ser um dos slogans da nova série, algo como “o Demogorgon foi destruído mas o mal não foi”.
Vinte anos após sua morte, o legado de Chico Science está mais vivo do que nunca. Escrevi sobre isso no meu blog no UOL.
“Modernizar o passado é uma evolução musical
Cadê as notas que estavam aqui?
Não preciso delas!
Basta deixar tudo soando bem aos ouvidos
O medo dá origem ao mal
O homem coletivo sente a necessidade de lutar
O orgulho, a arrogância, a glória
Enchem a imaginação de domínio
São demônios, os que destroem o poder bravio da humanidade
Viva Zapata! Viva Sandino! Viva Zumbi!
Antônio Conselheiro!
Todos os Panteras Negras
Lampião, sua imagem e semelhança
Eu tenho certeza, eles também cantaram um dia”
Não importa o que poderia ter acontecido com Chico Science se ele não tivesse morrido vinte anos atrás no trágico acidente daquele 2 de fevereiro, um dia de domingo, entre Olinda e Recife. Todas as hipóteses cogitadas são meros exercícios de imaginação e o personagem criado por Francisco França para sublinhar sua mensagem poderia seguir destinos bem diferentes, como cada um de nós, independentemente de sua vontade. O que importa é o que Chico Science fez enquanto esteve vivo, sua marca emblemática nos rumos da música – e da cultura – brasileira desde que entrou no imaginário mental do Brasil. Ele hoje é mais importante do que nunca.
Pois vivemos num mundo – e num país – antevisto por Chico em sua versão brasileira do cyberpunk. O movimento de ficção científica criado pelos escritores William Gibson e Bruce Sterling nos anos 80 cogitava um futuro próximo completamente distante do futuro Jetsons imaginado pela geração anterior. A crise ambiental, a superpopulação, as megalópoles e, claro, a presença do computador e da internet como sistema nervoso de um planeta decadente, tornava a aurora do século 21 sombria e aquela distopia unia obras que adubaram o inconsciente coletivo vindo de diferentes artistas em diferentes mídias – do Akira de Katsuhiro Otomo ao Blade Runner de Ridley Scott, passando pelo Tron da Disney, o Incal de Jodorowsky e o Robocop de Paul Verhoeven -, criava uma realidade totalitária e alienante como a que vivemos hoje. Uma mistura do 1984 de George Orwell com o Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley embebedida pela internet e por dispositivos de vigilância portáteis (nossos celulares).
O mangue beat, criado no Recife por Chico Science, sua Nação Zumbi, e pelo Mundo Livre S/A de Fred Zero Quatro, trazia este futuro para o sol de rachar da linha do Equador. O cyberpunk era urbano, sombrio, meio gótico, meio romântico (impossível não notar a semelhança entre o movimento musical liderado pelo Duran Duran – o New Romantic – com o marco-zero do cyberpunk – Neuromancer). O mangue beat era diurno, à praia, pés na areia – e na lama -, o horizonte é o mar. Ao criar um personagem que funcionava como um narrador daquele novo universo, Chico Science conectava a distopia cyberpunk ao terceiro-mundismo sonoro que une o reggae ao bhangra, o raï ao hip hop. Plugava o Brasil à aldeia global de Marshall McLuhan antes mesmo da ascensão da web – e pela cultura da favela global, de países subdesenvolvidos.
Conheci Chico um pouco antes de ele tornar-se um nome nacional, quando a importância do movimento que puxava a partir do Recife ganhava reconhecimento em todo o país, mas ainda nas entranhas, no meio independente que outrora conhecíamos como underground. Estava começando minha carreira no jornalismo quando pude entrevistá-lo pouco antes do lançamento de seu primeiro CD, lançado pela Sony. A gravadora havia o contratado ao lado de sua Nação Zumbi sem nem entender direito o que estava acontecendo e a prova disso é que a primeira vez que os encontrei foi no camarim da boate Pachá, em Campinas, quando o grupo pernambucano foi escalado para abrir o show da banda de eurodance Culture Beat, cujo hit robótico e sem alma “Mr. Vain” era o extremo oposto do groove vivo, intenso e de protesto puxado por Chico. A banda divertia-se com o choque dos extremos, enquanto Chico ficava tentando entender quem era o público que estava assistindo àqueles dois shows tão diferentes.
Era uma característica que pude perceber nele das outras vezes que nos encontramos – ele sempre estava tentando entender algo que não entendia. Buscava o contexto, tornava-se aluno. Gostava de conversar e de contar histórias, mas, diferente da maioria dos artistas, também gostava de ouvi-las. Arregalava os olhos e arqueava as sobrancelhas, concordando com a conversa enquanto ouvia.
Depois botava aquilo tudo pra fora. Ao colocar os óculos escuros, tirar a camisa, botar o chapéu e abrir o sorriso de lado, Chico virava o arquetípico mangue boy, criava o b-boy nordestino cujo semblante hoje é tão forte quanto os de Bob Marley, Che Guevara e Raul Seixas – um personagem que certamente foi influenciado pelos de Angeli, repare. A partir deste púlpito, narrava sagas de vida e morte pelo sertão, crônicas violentas nas favelas, dias de preguiça na praia. E aos poucos redesenhava um país de contrastes, que já havia sido desenhado pelos modernistas nos anos 20 e pelos tropicalistas dos anos 60. Repensava a Casa Grande e a Senzala com um satélite na cabeça, contextualizava globalmente os tristes trópicos.
Chico viu, há mais de vinte anos, o país que vivemos hoje. As caricaturas dos contrastes, a truculência no traquejo social, a violência sob a superfície fanfarrona, o sorriso aberto que fecha-se num segundo em uma carranca. Suas letras são alegorias que usam arquétipos e ícones estabelecidos para falar sério em frases de efeito cujo significado vai além do mero slogan. É só prestar atenção. “Há fronteiras nos jardins da razão”, “em cada morro uma história diferente que a polícia mata gente inocente”, “cerebral, é assim que tem que ser”, “o de cima sobe e o debaixo desce”, “no caminho é que se vê a praia melhor pra ficar”, “é o povo na arte, é arte no povo e não o povo na arte de quem faz arte com o povo”.
Líder de uma banda de protesto para dançar, Chico Science foi ele mesmo a antena cravada no mangue, no caso, o Brasil. O impacto de sua breve passagem por nossas vidas não deve ser lembrado apenas com tristeza ou saudade, mas pela importância e força representadas nos poucos anos que viveu conosco durante os anos 90. Sua influência é presente, contínua. Chico está vivo.

(O diretor Rian Johnson mostra o início do próximo filme em sua conta no Instagram)
Junte os dois títulos dos episódios mais recentes de Guerra nas Estrelas e temos uma frase – falei sobre o significado disso no meu blog no UOL.
As especulações correm soltas desde que a Lucasfilm anunciou o título do Episódio VIII de Guerra nas Estrelas, que estreia no final deste ano. O nome The Last Jedi, em inglês, não entrega nem gênero nem quantidade de Jedi – palavra que, na mitologia da série, não tem a letra “s” em seu plural – que podem estar sendo mencionados no título? Das quatro variações possíveis – O Último Jedi, A Última Jedi, Os Últimos Jedi e As Últimas Jedi – só a a última não parece fazer sentido. As três primeiras são possíveis e apontam primeiro para Luke Skywalker, depois para Rey (que ainda não sabemos o sobrenome) e finalmente para os dois juntos.
Se o último Jedi for mesmo Luke, isso significa que nenhum novo personagem poderia ser o protagonista que batiza o novo filme. Muitos apostam nessa hipótese e usam como referência o letreiro do O Despertar da Força, que menciona literalmente Luke como sendo “o último Jedi”. É um bom argumento.
Mas a referência a Luke como tal acontece antes dos fatos de O Despertar da Força – portanto, antes de um possível renascimento Jedi que é um dos grandes mistérios do Episódio VII. Quem despertou? Rey quando encostou no sabre de luz que foi de Darth Vader? Ou Finn, o primeiro stormtrooper rebelde? Ou talvez até mesmo Kylo Ren, possa estar voltando para o lado certo da Força? Quem sabe o despertar aconteceu com os três?
Mas alguns fãs perceberam a possibilidade dos dois títulos dos novos episódios indicarem algo em conjunto – e aí novamente esbarramos com uma questão de tradução. O Despertar da Força é uma adaptação – e não uma tradução literal – do título original do sétimo episódio, The Force Awakens. A tradução correta deveria ser A Força Desperta – ou A Força Acorda. Desta forma, quando colocamos os nomes dos episódios VII e VIII lado a lado, vemos mais do que dois títulos e sim uma frase completa:
“A Força desperta o último Jedi”
Ou “A Força acorda a última Jedi” ou “…os últimos Jedi”, você entendeu. Ao transformar os dois títulos em uma frase, o argumento que firma Luke como sendo o último Jedi perde um pouco a força (hehe) e pode incluir a própria Rey – ou outro novo personagem além do irmão da general Leia – como o possível personagem que batiza o novo filme. E abre a especulação inclusive para que o terceiro filme possa ter um título que complemente ainda mais a frase, fazendo os três filmes da terceira trilogia serem reunidos por uma única mensagem. Sei lá, A Força Desperta o Último Jedi Para Sempre ou A Força Desperta o Último Jedi Antes do Fim – use sua imaginação (Star Wars: Forever ou Star Wars: Before the End são títulos brega, mas teriam um grande impacto, diz aí). Ou seu humor, como alguns têm feito online:
https://twitter.com/outstarwalker/status/824238111722967045?ref_src=twsrc%5Etfw%7Ctwcamp%5Etweetembed%7Ctwterm%5E824238111722967045&ref_url=https%3A%2F%2Fmatias.blogosfera.uol.com.br%2F2017%2F01%2F28%2Fthe-force-awakens-the-last-jedi-e-uma-frase%2F
“A Força desperta o último Jedi de seu cochilo”
A cor vermelha do logo da série no novo filme também é um mistério: é a primeira vez que o nome Star Wars não aparece pintado de amarelo.
Outra especulação que corre a internet diz respeito especificamente ao letreiro de abertura do novo filme, pois o ele começaria exatamente no ponto em que o filme anterior terminou – com Rey finalmente encontrando Luke Skywalker. Se isso for verdade, o que restaria para ser contado no clássico letreiro de abertura, uma vez que ele sempre narra fatos que aconteceram meses entre os diferentes filmes da série?
Em todo caso, é demais poder estar vivenciando o desenrolar desta história novamente com empolgação. Parece até que os episódios I, II e III nunca existiram!
O ator David Harbour faz um apaixonado discurso anti-Trump ao receber o prêmio em nome do elenco de Stranger Things na premiação SAG deste ano. Veja o discurso lá no meu blog no UOL.
A série de ultrajes políticos que o presidente norte-americano Donald Trump tem cometido diariamente desde que assumiu o cargo no meio de janeiro tem servido de combustível para toda uma sorte de discursos e ações contra as intenções mesquinhas deste vilão de desenho animado da vida real. Não foi diferente no palco da 23ª premiação do Screen Actors Guild, mais conhecido como SAG, que aconteceu no domingo passado no Shrine Auditorium em Los Angeles, nos Estados Unidos. E entre discursos pesarosos e tiradas fortes, os apresentadores e vencedores da premiação mostraram o quanto são contra o perigoso rumo político para onde os EUA caminham.
O destaque ficou para o discurso do ator David Harbour, que falou em nome do elenco da excelente série Stranger Things. Visivelmente emocionado, o ator, que na série faz o policial Jim Hopper, parecia não acreditar ter desbancado os elencos de pesos pesados como The Crown, Game of Thrones, Westworld e Downton Abbey. Mas ele deixou a emoção de lado e leu um discurso forte e emotivo, que mesmo sem mencionar nominalmente o novo presidente norte-americano, funcionou como uma convocação para aqueles que trabalham com comunicação e cultura. Vale a transcrição na íntegra:
“À luz de tudo o que está acontecendo no mundo hoje, é difícil celebrar a já celebrada Stranger Things. Mas este prêmio vem de vocês, que levam seu ofício a sério e sinceramente acreditam, como eu, que uma grande atuação pode mudar o mundo, é uma convocação de nossos colegas artistas homens e mulheres para ir mais fundo e, através da nossa arte, lutar contra o medo, o egocentrismo e a exclusividade de nossa cultura predominantemente narcisista. E através do nossa arte, cultivar uma sociedade mais compreensiva e com mais empatia, que revela verdades íntimas que funcionam como um forte lembrança para as pessoas de que, quando elas se sentem mal ou com medo ou cansadas, elas não estão sozinhas. ”
“Estamos unidos, no sentido em que somos todos seres humanos e estamos todos juntos neste passeio horrível, doloroso, alegre, emocionante e misterioso que é estar vivo. Agora, enquanto agimos na narrativa contínua de Stranger Things, nós, os moradores do meio-oeste de 1983 brigaremos contra os valentões, abrigaremos os esquisitos e estranhos – aqueles que não têm nenhuma esperança. Vamos ultrapassar as mentiras. Vamos caçar monstros! E quando estivermos perdidos em meio à hipocrisia e à violência casual de certos indivíduos e instituições, vamos, como o chefe Jim Hopper, dar um soco na cara de algumas pessoas quando elas tentam destruir os fracos e os desamparados e os marginalizados. E faremos tudo com alma, com coração e com alegria. Agradecemos por essa responsabilidade.”
A reação da Wynona Rider ao discurso é uma atração à parte. E ele tem razão: é disso que precisamos.
Postei um vídeo no meu blog no UOL que recria o clássico e hilário clipe de “Dancing in the Streets” com David Bowie e Mick Jagger em Lego.
A música “Dancing in the Streets“, escrita por Marvin Gaye e imortalizada por Martha and the Vandellas nos anos 60, também é histórica por registrar em uma canção a relação entre dois dos maiores nomes da música pop, David Bowie e Mick Jagger. A relação dos dois é bem anterior ao 1985 em que gravaram esta versão e tem como momento central uma das grandes passagens da história do rock, quando, durante os anos 70, Angela Bowie pegou seu marido e o vocalista dos Rolling Stones juntos na cama.
A colaboração musical entre os dois foi lançada pouco antes do megaevento de caridade Live Aid e a intenção era fazer que Jagger e Bowie cantassem o dueto ao vivo, cada um em um dos palcos do evento gigante, um deles em Wembley, no Reino Unido, e o outro no John F. Kennedy Stadium, nos EUA, mas problemas técnicos impediram que o dueto acontecesse pois o menor segundo de atraso entre as duas apresentações poderia colocar tudo a perder. “Dancing in the Streets” não foi tocada ao vivo como planejado, mas gerou um clipe que se tornou um ícone dos anos 80, principalmente devido à coreografia da dupla. Que agora foi homenageado em forma de Lego pelo animador amador William Osbourne. O resultado é hilário:
Não é a primeira vez que o clipe é alvo de paródia. Uma versão que já é um clássico online é o clipe revisto apenas com os sons ambientes, sem a música nem os vocais:
E, claro, a impagável versão brasileira que mistura o clipe com a sensacional “Babydoll de Nylon”, de Robertinho do Recife:
Clássico é clássico.
Publiquei no meu blog no UOL um vídeo em que o ex-baixista do Pink Floyd, Roger Waters, aponta sua munição para o recém-eleito presidente dos EUA, Donald Trump.
Desde os tempos do Pink Floyd, o músico e compositor Roger Waters usa sua música para fazer comentários sobre política – tanto sobre a natureza política do ser humano (em discos como Dark Side of the Moon e Animals), quanto sobre a classe política em si (especificamente em The Wall, quando comparou o conceito do astro de rock a um ícone fascista). Mas desde que saiu em carreira solo, ele é mais proeminente sobre questões específicas, desde a recontextualização de seu The Wall no local da queda do Muro de Berlim quanto à discussão em relação à questão palestina. E, na sexta passada, dia da posse de Donald Trump como novo presidente norte-americano, o baixista postou em sua página do Facebook um vídeo para lembrar que “a resistência começa hoje.
O vídeo traz a apresentação do músico na Cidade do México, no ano passado, quando, em frente a 300 mil pessoas, comparou o personagem descrito em sua “Pigs (Three Different Ones)”, do disco Animals, a Donald Trump. A faixa faz parte do antepenúltimo disco da formação clássica Pink Floyd, lançado há quarenta anos, inspirado no livro A Revolução dos Bichos, de George Orwell, e descreve um personagem “palhaço” e “que é quase uma piada”. Donald Trump apareceu projetado nos telões do show, sempre ridicularizado e comparado a Adolf Hitler.
A briga promete, pois Roger Waters dá início à nova Us and Them, que atravessa a América do Norte entre maio e setembro. E, como avisou, não deve diminuir o tom.
Escrevi no meu blog no UOL sobre a série que James Cameron irá produzir sobre a evolução da ficção científica.
A importância de James Cameron para a ficção científica ainda não pode ser medida exata pois ele está em pleno processo de criação. Ao entrar no cânone com uma obra-prima realizada como um filme B (o primeiro Exterminador do Futuro), o diretor canadense deu alguns dos principais passos de sua carreira dedicando-se a contar histórias fantásticas que se passam no futuro ou no espaço com embasamento científico. Aliens – O Resgate, o segundo Exterminador do Futuro, o subestimado O Segredo do Abismo e, claro, o universo em expansão de Avatar são exemplos perfeitos de como o gênero pode cativar multidões e render rios de dinheiro sem necessariamente simplificar histórias ou fazer pouco da inteligência do espectador. Claro que Cameron é reconhecido por outras obsessões (como o navio Titanic, filmes de James Bond e explorações submarinas), mas sua paixão pela ficção científica e sua maestria em transformá-la em ouro pop o tornam um dos principais autores vivos do gênero.
Por isso, ele é uma escolha mais do que apropriada para contar a escalada ascendente deste tipo de narrativa, que começou no ocaso da era vitoriana, embrenhou-se em livros baratos no início do século passado e descobriu no cinema o melhor parceiro para atingir o grande público. É isso que ele vai fazer em uma série de seis episódios de uma hora encomendada pelo canal AMC ao diretor, segundo o site Hollywood Reporter. O nome de trabalho do seriado é James Cameron’s Story of Science Fiction (A história da ficção científica de James Cameron), deve estrear só no ano que vem e será centrado nas grandes questões levantadas pelo gênero.
“Quando eu era garoto, eu basicamente lia qualquer livro com uma nave na capa e vi 2001 – Uma Odisseia no Espaço muitas, muitas vezes. O filme me inspirou a ser cineasta. Eu gostei dos efeitos especiais mas o que eu amei foram as ideias e as questões por trás deles: como o mundo vai acabar? A tecnologia irá nos destruir? O que significa ser humano?”, disse o diretor em entrevista ao site. “A ficção científica nunca temeu lidar com estes temas. Com esta série, nós vamos voltar às origens da ficção científica, seguindo o DNA destas ideias até a fone. Sem Júlio Verne e H.G. Wells não teríamos Ray Bradbury ou Robert A. Heinlein e, sem eles, não haveria (George) Lucas, (Steven) Spielberg, Ridley Scott nem eu. Como um cineasta que se especializou em ficção científica, eu estou interessado em contar as lutas e os triunfos que tornaram possíveis estas histórias incríveis e ver como a arte imita a vida, bem como a ficção científica imita e algumas vezes informa a ciência.”
No dia da posse de Donald Trump, Netflix anuncia a data da volta de Frank Underwood. Postei lá no meu blog no UOL junto com um teaser da nova temporada.
O serviço de vídeos em streaming Netflix esperou passar a posse do novo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para anunciar a data de estreia de sua quinta temporada, que acontece no dia 30 de maio deste ano. O teaser que anuncia a nova safra de episódios ergue a bandeira norte-americana de cabeça pra baixo sob um céu completamente cinzento.
Não custa lembrar que em sua quarta temporada, a série fechou o tempo de uma forma surpreendente, reunindo tensões que envolviam imprensa, corrupção, política internacional e terrorismo, atingindo um patamar de tensão que nunca havia chegado perto nas temporadas anteriores. Resta saber se Frank Underwood, o presidente norte-americano fictício vivido por Kevin Spacey, é páreo para o personagem que agora senta no Salão Oval na Casa Branca da vida real.