Jornalismo

Fui no último show da temporada de reencontro que os Titãs originais fizeram no estádio do Palmeiras neste domingo e a sensação da primeira apresentação, na sexta-feira, manteve-se intacta: o grupo é protagonista de um novo paradigma de entretenimento ao vivo no Brasil. A bem-sucedida turnê que o grupo fez neste primeiro semestre ainda não terminou: além de umas datas-extra que surgiram quando estavam fechando as principais capitais (próximos dias 23 em Vitória e 30 em Ribeirão Preto) e três datas no exterior (3 de outubro na Flórida, 6 de outubro em Nova York e 3 de novembro em Lisboa), o grupo ainda volta para mais um show em São Paulo, desta vez no tal do Vibra, o antigo Credicard Hall, em uma apresentação no próximo dia 27. Mas além destas, todas oficiais, Paulo Miklos deixou escapar algo que já é comentado nos bastidores – que o grupo fará outra rodada de shows no segundo semestre pelo Brasil.

O que nos leva a uma questão exatamente ao redor deste novo paradigma estabelecido pelo grupo no Brasil de 2023. Os Titãs surgiram na mesma década em que o mercado de diversão no país começou a se profissionalizar de fato. Clássicos causos envolvendo equipamentos precários, procedimentos amadores e o heroísmo de raros artistas internacionais que se aventuraram por aqui antes daquela época só maquiam o fato de que não havia uma indústria cultural no Brasil até o momento em que as gravadoras tornaram-se empresas multinacionais e provocaram transformações que tornaram aquela década tão memorável. A cena do rock brasileiro daquele período é fruto específico do momento em que as gravadoras estrangeiras começaram a tomar conta de vez do mercado fonográfico brasileiro.

Não por acaso é o mesmo período em que estas gravadoras criaram artistas de escala gigantesca, fazendo os shows em estádio dos anos 60 e os festivais dos anos 70 parecerem brincadeiras. A safra que transforma Michael Jackson, Madonna, George Michael, Prince, Bruce Springsteen e U2 em gigantes numéricos maiores que os Beatles ou o Led Zeppelin foram em seu tempo transforma o mercado da música em palco muito mais amplo que a compra e venda de discos. É o momento em que os shows ganham estaturas cênica e imagética que se contrapunha ao impacto do videoclipe naquela década. É quando os shows internacionais cruzam uma barreira e atingem um outro paradigma de entretenimento ao vivo – o mesmo que os Titãs atingiram nestes shows, só que em escala nacional.

O problema é que estes shows, por mais emocionantes e vivos que possam parecer, são uma enorme peça de teatro. Não que a emoção de seus atores não seja real, mas quem assistiu a mais de um dos shows desta turnês assistiu a shows praticamente idênticos. A única mudança em todo o repertório da turnê foi a inclusão de “Ovelha Negra” de Rita Lee no show de Salvador na semana em que a mãe do rock brasileiro nos deixou e sua repetição, por três vezes, nos shows em São Paulo, e a troca de posição entre “Marvin” e “Família” da primeira para a segunda metade da turnê. Fora isso, os shows tiveram exatamente as mesmas músicas na mesma ordem – bem como o assunto de todos os interlúdios falados, com a mesma mensagem repetida de formas diferente a cada nova apresentação. Isso faz com o que o show seja pontual e preciso, que tudo possa ser lapidado no decorrer da turnê para chegar à excelência da performance, mas tira o elemento-surpresa de uma apresentação ao vivo: era possível acompanhar música a música em cada um dos dias a partir das listas de músicas dos shows anteriores publicadas no site Setlist.fm.

Esta transformação de um show em um parque temático sobre o momento atual daquele artista tem suas vantagens e desvantagens, mas é possível chegar a um equilíbrio, como fazem Paul McCartney e os Rolling Stones (dois mestres dos shows idênticos que surfaram esta onda dos artistas gigantescos dos anos 80) propondo surpresas nas turnês vez ou outra, tocando ao vivo músicas próprias do passado ou versões que nunca foram tocadas nos palcos. Os shows de São Paulo poderiam ter convidados e houve até quem cogitasse que eles poderiam homenagear o recém-falecido tecladista do RPM Luiz Schiavon, que fazia parte da mesma cena musical que revelou os TItãs, mas além da menção à Rita Lee, foi tudo mais do mesmo. A performance catártica, o som perfeito, os telões de cair o queixo, a extensão da noite – tudo perfeito para uma única apresentação. A banda torna-se um relógio que funciona exatamente como se prevê.

(Cabe comentar a reação dos bolsonaristas na plateia ao discurso que Nando Reis – que baixista, pqp – fez lamentando os quatro anos de destruição que atravessamos há pouco ou quando o mesmo músico trocou um dos nomes da letra de “Nome Aos Bois” para incluir o nome do ex-presidente de merda. Houve vaias esparsas – embora os aplausos fossem mais intensos – e dedos em riste, algo que funciona pra lembrar que essa choldra ainda está entre nós.)

Daí o questionamento sobre esta segunda fase da turnê. Será que eles irão manter exatamente o mesmo roteiro dos próximos shows, ou podem prometer shows novos, com novas músicas? Nem tô pedindo para eles tocaram músicas de discos que são simplesmente ignorados pela turnê (toda a discografia da banda a partir dos anos 90, à exceção da fase acústica), mas há canções dos discos clássicos que nem deram as caras, como “Corações e Mentes”, “Insensível”, “Saia de Mim”, “Querem Meu Sangue”, “Mentiras”, “Armas pra Lutar”, “Clitóris”, “Massacre”, “Deus e o Diabo” e até mesmo “A Face do Destruidor”. Há também a possibilidade de chamar novos convidados – e não faltam candidatos para músicas de diferentes fases da banda – e até mesmo de tocar versões de músicas de artistas contemporâneos ou que foram influência para o grupo. Nem precisava mexer na estrutura dos telões (impecável), mas quem sabe mudar as animações – algumas funcionam bem, como as de “Flores”, “Jesus Não Tem Dentes…”, “Sonífera Ilha” e “Televisão”; outras (“AAUU”, “Comida”, “Bichos Escrotos”) são dispensáveis ou superficiais, quando não vergonhosas.

Não sei nem se isso é um esforço extra desnecessário, uma vez que nunca foi intenção do grupo passar mais tempo junto do que as datas que já foram anunciadas da turnê. Mas é uma possibilidade esticar ainda mais esse momento sem que ele caia na mera repetição mecânica do que já foi feito. E mesmo que isso aconteça, é inevitável que o grupo tenha mais datas lotadas em várias cidades do Brasil, mas seria tão mais interessante se eles mudassem um pouco a máquina que afiaram para esse semestre, justamente para seguir rompendo as barreiras atravessadas nessa primeira série de shows e não servir apenas como demarcação de uma nova fase. Depois desta primeira fase, os Titãs têm moral para seguir essa jornada.

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Pude assistir neste sábado à primeira exibição de Elis & Tom – Só Tinha de Ser Com Você, um dos principais títulos da edição deste ano do festival In Edit. O documentário de Roberto de Oliveira já seria um objeto de estudo por si só, afinal seu diretor, responsável por registrar a gravação desta obra-prima, sentou-se sobre estas imagens por mais de cinco décadas e transformou a expectativa em relação ao filme quase um personagem coadjuvante de sua criação.

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Dragão feminino

Nos últimos anos, as comadres Alessandra Leão, Isaar e Karina Buhr vêm selando uma amizade de décadas, que remonta às origens do mangue beat em seu Pernambuco e um movimentação feminina e feminista no mundo da música mesmo a contragosto de seu status quo. O novo passo do trio foi dado neste sábado, no Sesc Pinheiros, quando reuniram-se ao guitarrista Régis Damasceno e à tecladista Sofia Freire para celebrar esse laço comum no espetáculo Dracena, em que repassaram músicas de suas respectivas carreiras solo em conjunto. “Não tem macumba sem planta, não tem macumba sem folha”, Alessandra explicou o nome da apresentação a partir da planta que o batiza no momento central do show, quando só as três entregam-se às suas vozes e instrumentos de percussão, “dracena também quer dizer ‘dragão feminino’. Dracena é planta que limpa, abre caminho e aponta para a frente como uma lança”. Axé!

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Mal chegamos à metade de junho, mas já temos aí a programação musical do Centro da Terra neste mês de julho. A temporada das segundas-feiras fica com Maria Beraldo, que mergulha em conexões afetivas e musicais numa série de apresentações que batizou de Manguezal. Na primeira segunda da temporada, dia 10, Beraldo recebe sua irmã de Quartabê Mariá Portugal para uma noite de improviso livre. Na segunda, dia 17, é a noite em que Maria escolheu para reverenciar Cássia Eller num encontro com Josyara. Depois, dia 24, ela junta-se a Rodrigo Campos abraçando o pagode para finalizar dia 31 com músicas novas que poderão estar em seu próximo disco, tocadas com os compadres Lello Bezerra e Marcelo Cabral. E como julho tem cinco segundas-feiras, a primeira delas, dia 3 de julho, ficou para o encontro dos duos Retrato e Antiprisma que apresentam a noite Reflexvs em que recebem participações diferentes (Raquel Diógenes nas projeções Debbie Hell na performance, narração dpoeta Rodrigo Qohen e synths de John Di Lallo, além de algumas surpresas). No dia seguinte, dia 4, a cantora Tila mostra o que virá a ser seu primeiro álbum no espetáculo Estelar, que conta com a participação de Izzy Gordon. Na segunda terça do mês, dia 11, o músico e produtor pernambucano Rodrigo Cøelho mostra o espetáculo Six Sines, uma performance, que, como ele mesmo descreve, “é um estudo sobre caos e dualidade, baseado no álbum composto sem instrumentos musicais, apenas com seis filtros ressonantes que se auto influenciam”. No dia 18, é a vez do músico, produtor, compositor e sócio do selo Desmonta, Luciano Valério mostrar seu trabalho solo MNTH, em que compõe peças ambient a partir de ruídos e texturas que cria com seus convidados. Às vésperas de lançar o disco Lume Púrpuro, ele testa essas novas composições ao lado de Paula Rebellato, Sarine, Aline Vieira e Nathalia Carvalho. E fechando julho, na última terça-feira do mês, dia 25, a banda Glue Trip, liderada pelo paraibano Lucas Moura, revê sua primeira década de carreira repassando diferentes momentos de sua discografia num novo espetáculo, 10 anos de psicodelia. Os espetáculos começam sempre pontualmente às 20h e os ingressos já podem ser comprados neste link.

A primeira apresentação da turnê de reencontro dos sete fundadores dos Titãs em São Paulo foi o que deveria ser: um espetáculo impecável de entretenimento pop. O grupo poderia ter optado por inúmeros recursos cênicos e musicais para lapidar ainda mais as expectativas em relação a esta volta histórica aos palcos. Mas preferiu optar pela própria presença e a grande atração para além do grupo no palco era um telão espetacular que esfregava o rosto de qualquer um dos integrantes na cara de todo o público, não importasse se você estivesse na pista vip (e este show ainda tinha uma pista vip da pista vip, acredite) ou na última arquibancada. O impacto audiovisual que as imagens do grupo causavam ao espetáculo acentuavam ainda mais o principal aspecto desta nova leva de shows: a carga emocional do reencontro.

Acompanhados do compadre produtor e mutante Liminha, substituindo a guitarra do saudoso Marcelo Fromer (cuja presença foi celebrada com a participação de sua filha Alice no intervalo acústico do show), os sete Titãs originais estavam visivelmente emocionados e aquilo se traduzia tanto em texto quanto em música. A cada vez que um deles pegava o microfone para comentar essa sensação, praticamente se repetiam – mesmo porque a sensação é única e fazia o grupo voltar a ser a hidra de multicabeças que enfeitiçou os anos 80. Arnaldo Antunes pulava no palco com um sorriso de orelha a orelha, Paulo Miklos suava carisma e Branco Mello encheu os olhos do público de lágrimas ao falar de sua volta por cima.

O repertório foi o mesmí(ssi)ssimo de todos os shows da turnê, sem tirar nem por, o que repete o elemento mecânico de como colocar uma máquina de entretenimento daquelas sem que nada saia do lugar, mas isso não é propriamente um problema. O encadeiamento das músicas repassa quase todos os clássicos dos quatro clássicos da banda, costura hits new wave dos dois primeiros discos, sobrevoa superficialmente o início dos anos 90 para jogar luz na fase acústica – e mais popular – da história do grupo, no fim do século passado. O entrosamento dos caras entre si e com as câmeras que projetam seus corpos no telão é de tirar o fôlego e são quase duas horas e meia com poucos intervalos para todos tomar fôlego. Caberia alguma participação especial diferente ou música inédita pelo fato de estarem tocando em sua cidade-natal, mas pelo menos revisitaram “Ovelha Negra”, que tocaram em Salvador em homenagem a Rita Lee. Mas ainda tem outros dois shows e surpresas podem vir…

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E São Paulo 2023 é assim: você pisca e surge um show grande do nada. Agora é a vez da Alanis Morissette bater cartão por aqui comemorando os 25 anos de seu primeiro disco no único show na América do Sul, no dia 14 de novembro, no Allianz Parque. As vendas começam semana que vem primeiro para clientes do banco patrocinador do show (dias 20 e 21 de junho, a partir das 10h), depois pra geral, a partir do dia 22. Mais informações neste link.

A primeira edição do Inferninho Trabalho Sujo no Picles pegou fogo e quem foi sabe como foi a temperatura – e a colisão de corpos, tribos e faixas etárias. Mas não vou resenhar minha própria festa e sim me ater à breve e passional explosão de calor que fez o ar do sobrado-resistência de Pinheiros pesar mesmo antes de Sopha Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo subir no micropalco. Num dos últimos shows antes do lançamento de seu aguardado segundo disco, o quarteto lotou a casa e trouxe camadas intensas de emoção sobre novos clássicos que em breve sairão dos shows recorrentes da banda – os quatro cogitavam quais músicas iriam parar de tocar ao vivo a partir do segundo semestre -, todos cantados a plenos pulmões por um público mais jovem do que a própria banda, que por sua vez já é jovem pacas. Depois, eu e a Fran seguimos madrugada adentro transformando o público de um show de rock em uma pista suada de música pop de todos estilos, épocas e nacionalidades em que só uma regra era determinante: botar todo mundo pra dançar. E se você foi ou perdeu essa noite, já anote aí que a próxima é no dia 30 de junho, uma sexta-feira, por isso não tem conversa… Mas antes vai pintar outra festa – o que você vai fazer no próximo sábado?

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Morreu o antigo tecladista do RPM, que dava àquela banda pós-punk do underground de São Paulo, os ares new wave e hi-tech que a transformaram num dos grandes fenômenos fonográficos do Brasil.

“Sim, cê acertou, eu gostei”, assim a carismática Amélia do Carmo nos apresenta à nova cara da banda mineira Varanda, ela que é parte crucial deste novo momento, uma vez que assumiu os vocais do grupo de Juiz de Fora há menos de um ano. “Gostei”, que o quarteto de Juiz de Fora lança nesta sexta-feira (e antecipa em primeira mão para o Trabalho Sujo), é o primeiro passo dessa transformação. “É o primeiro single da banda comigo nos vocais”, continua Amélia, “entrei pra banda no fim do ano passado e esse é um trabalho de apresentação, digamos que mais formal, com arranjos de banda completa”, explica a nova vocalista, que cantou no segundo EP da banda, lançado no começo do ano com versões acústicas de músicas que já haviam sido lançadas no disco anterior com a vocalista original. Paula Mendes. Assista abaixo o clipe da música: Continue

Mais do que ser o criador de personagens clássicos da Marvel como Wolverine, Mary Jane Watson, Luke Cage e o Justiceiro, o grande John Romita Sr., que nos deixou esta semana, é o criador de um estilo de desenho que ecoa até hoje nos quadrinhos e fora do meio é o padrão identificado como arte de HQ. Um mestre.