Kid Koala foi convidado como principal atração da festa de nove anos do blog Só Pedrada Musical e eu bati um papo com ele sobre vinis, CDs e música digital lá pro meu blog no UOL: http://matias.blogosfera.uol.com.br/2015/05/08/o-dj-kid-koala-um-malabarista-dos-vinis-esta-entre-nos/
O líder do Superchunk e dono da gravadora Merge Mac McCaughan vem ao Brasil pela quarta vez lançar o primeiro disco que lança com seu próprio nome. O disco Non-Believers também está sendo lançado pelo selo brasileiro Balaclava Records, que organiza seu primeiro festival no Centro Cultural São Paulo com direito a shows dos norte-americanos Shivas, dos brasileiros Shed e Soundscapes, além do show de Mac, que acontece no sábado. Conversei com ele por telefone há alguns dias e a íntegra do papo saiu no site da Ilustrada.
‘Papa’ do indie e líder do Superchunk, Mac McCaughan lança disco em SP
Um dos papas da cultura indie norte-americana apresenta-se em São Paulo no próximo sábado (25). Mac McCaughan, 47, atravessou os anos 1990 como a voz e uma das guitarras do Superchunk, uma das bandas mais autossuficientes do underground. E, ao lançar seus próprios discos, consolidou a reputação de sua gravadora, a Merge, no século atual.
A Merge entrou nos anos 2000 colhendo os frutos plantados na década anterior e atingiu o topo das vendas ao emplacar o grupo Arcade Fire como um dos principais nomes do música pop – e não apenas indie – atual.
A gravadora ainda conta com outros nomes de peso, como Spoon, Caribou e She & Him, além de queridinhos da crítica como M. Ward, Lambchop, Neutral Milk Hotel e Camera Obscura. Sem falar dos veteranos do rock alternativo, como Lou Barlow, Stephin Merrit, Dinosaur Jr. e Robert Pollard.
É nesta última categoria que McCaughan entra para o elenco da própria gravadora, ao lançar o primeiro álbum com seu próprio nome, depois do último disco do Superchunk, “I Hate Music” (2013) e de seu projeto solo, Portastatic.
“Non Believers” acaba de sair nos EUA e será lançado primeiro no Brasil no Balaclava Fest, que acontece neste final de semana (25 e 26) no Centro Cultural São Paulo.
Em entrevista por telefone à “Ilustrada”, Mac falou da quarta vinda ao Brasil – a primeira sem o Superchunk – e da evolução da cena indie no Brasil, além de falar sobre a sonoridade de seu primeiro disco solo e a busca por autenticidade fora da internet. Leia, abaixo, os principais trechos da conversa.
O Superchunk veio ao Brasil pela primeira vez em 1998, quando pouquíssimas bandas indies de fora daqui se arriscavam a fazer turnês no país – algo que se tornou corriqueiro nos últimos 15 anos. Você consegue perceber essa evolução?
É bem interessante notar isso, na verdade. Fomos ao Brasil pela primeira vez graças aos esforços do Jefferson [Santos] e Marcos [Boffa] da Motor Music, que ficava em Belo Horizonte. Eles haviam levado o Fugazi para aí e o Ian [McKaye], falou que a gente precisava ir também, mas devíamos saber que era como excursionar com uma banda punk nos Estados Unidos em 1978. Ele disse que não havia lugares específicos para tocar. Às vezes eram casas de shows de rock, mas às vezes eram restaurantes, cafés, bares, o que fosse. E ele disse que isso era incrível, e é claro que queríamos ir.
Nos sentimos com muita sorte por termos tocado aí da primeira vez, acho que foi em 1998. Voltamos logo em 2000, e depois em 2011. Sempre nos divertimos aí. Estou feliz por ir a São Paulo nesta semana, mas gostaria de voltar e tocar em alguns dos lugares que tocamos há muito tempo, em cidades pequenas, que não são tão pequenas e sim grandes, mas de que eu nunca tinha ouvido falar.
Acho que agora é bem mais comum ter bandas excursionando por aí em todo tipo de festival. Muitas bandas da Merge já tocaram aí desde que nós tocamos no Brasil pela primeira vez. E agora acho que as coisas estão bem mais, digamos, profissionais.
Mas o que nos deixou mais impressionados desde a primeira vez foi o entusiasmo das pessoas em nossos shows. Não tínhamos nenhuma expectativa em relação a saberem nossas músicas, mas as pessoas sabiam todas as letras, basicamente por causa da internet, e isso foi muito cedo em relação ao acesso mundial das pessoas à rede. Foi ótimo.
Você já havia pensado em como a internet poderia mudar a relação entre músicos e fãs?
Acho que uma das primeiras vezes que pensamos nisso foi após o primeiro show que fizemos em São Paulo. Ficamos impressionados porque era tão difícil comprar nossos discos aí e mesmo assim as pessoas sabiam todas as letras. O lado ruim disso é que você pode saber todas as músicas sem nunca ter comprado um disco [risos], o que torna difícil ter uma banda. O mesmo aconteceu há alguns anos, quando voltamos depois que gravamos o disco “Majesty Shredding”.
Por que lançar um disco com seu próprio nome quando você já tem o Superchunk e lançava discos como Portastatic?
Acho que a resposta fácil é que quis tornar as coisas mais simples. Quando comecei a gravar com o nome de Portastatic, o Superchunk estava fazendo seu próprio som. Mas eu queria poder gravar outro tipo de som, em casa, um som mais calmo, fazer coisas diferentes que não eram definidas como sendo de uma banda de rock.
E assim o Portastatic me serviu com o bom propósito de ser uma existência paralela ao Superchunk nos anos 1990 e 2000. E quando o Superchunk parou em 2002, o Portastatic tornou-se uma banda de rock. Mas ainda era um bom lugar para experimentar músicas e sons diferentes.
E, nos últimos anos, quando o Superchunk voltou à ativa, gravando discos e fazendo shows, comecei a fazer apresentações solo com meu próprio nome, porque cheguei num ponto em que posso tocar músicas do Superchunk e do Portastatic, todas misturadas no mesmo setlist.
Acho que sem ter essa regra que adotava, que separava o que era para o Superchunk e o que era para o Portastatic, cheguei a um ponto mais divertido e mais simples para mim se eu as tocasse solo. E se eu estava fazendo shows com meu próprio nome, deveria gravar discos com meu próprio nome também, em vez de continuar com essa coisa à parte do Portastatic.
Resisti a essa ideia por muito tempo, acho que ter um nome de banda é mais cool [risos], mas cheguei num ponto em que eu tenho de aceitar que é o meu nome. Mesmo que ninguém vai aprender a soletrá-lo ou pronunciá-lo corretamente, é o nome que eu tenho.
Quando você começou a gravar o disco?
Comecei a trabalhar nele no ano passado, provavelmente na primavera [do hemisfério norte, entre março e junho], bem no começo. Fui terminá-lo no outono. Gravei e mixei todo o disco em casa, além de tocar tudo exceto em uma música, “Our Way Free”, em que eu não consegui fazer a bateria soar como eu queria que ela soasse.
Tentei diferentes baterias eletrônicas, tentei eu mesmo tocar bateria, mas não estava me sentindo satisfeito e quase tirei essa faixa do disco. Porém, mandei a música para o Michael Benjamin Lerner, da banda Telekinesis, que também grava pela Merg. Perguntei se ele podia ser o baterista naquela música. Ele me mandou de volta um mix em que basicamente havia acertado de primeira. Ele meio que salvou essa música. A Annie Hayden, que era do Spent, e Jenn Wasner, do Why Oak, cantam em uma música.
Mas no fundo era só eu mesmo, o que é um dos motivos para levar tanto tempo em um disco solo, em que você pode trabalhar em seu próprio ritmo. É uma das coisas legais disso. Eu tinha bem mais músicas do que as que acabaram no álbum, mas quando eu entendi qual era o mundo sonoro que eu estava fazendo, tirei as faixas que não se encaixavam nele. Ao fazer discos eu ainda quero ter um sentimento unificado – não que todas as músicas tenham que soar iguais, mas elas têm de funcionar juntas.
Li que você havia gravado o disco falando de uma sentimento nostálgico em relação a uma determinada época na música…
Não é propriamente nostalgia, mas poder explorar um tipo de música que descobrimos a uma certa idade e que ainda tem algum tipo de ressonância ou ainda criam uma emoção a que você ainda se apega. A maioria das coisas que você ouvia quando tinha 14, 15 anos e que ficam por toda a sua vida.
Já ouvi falar que o gosto musical das pessoas amadurece aos 23 anos.
Acho que isso tem uma certa verdade, porque quando eu tinha 23 anos era 1990, mas eu estava ouvindo muitos discos de 1985 em vez dos de 1990 [risos]. Mas acho que o disco explora esse período de tempo do início dos anos 80, quando houve muita transição na música e as pessoas começaram a sair do punk rock para outro lugar, mas eles não sabiam para onde e por isso experimentavam sons e instrumentos diferentes, a que não tinham acesso antes.
Quando eu estou gravando um disco e pego um instrumento que não sei tocar – ou mesmo uma guitarra ou teclado que nunca havia usado –, quase sempre isso funciona como um ótimo ponto de partida para compor uma música . E sinto a mesma coisa em relação a esse período, essa época em que as pessoas tinham essa nova tecnologia, mas não sabiam como dominá-la. E assim muita música interessante foi criada. Era nessa época em que eu pensava quando gravei o disco.
Um tipo de som que não tinha rótulo antes dos anos 1990, que depois começou a ser referido como “alternativo” ou “indie”.
É engraçado, quando eu estava no segundo grau, se referiam a bandas como R.E.M. como sendo “college rock”, porque as rádios college [universitárias] eram os lugares em que era possível ouvir essas bandas. Depois, isso virou “rock alternativo” ou outra coisa do tipo. Mas eu não me importava que nomes teriam, porque nessa época eu vinha ouvindo bandas que ainda gosto, como o The Who, os Rolling Stones, o AC/DC.
Eram essas bandas que eu ouvia quando tinha 12 anos. E quando você começa a ouvir punk rock ou new wave, tudo soava totalmente radical e novo que você não precisava de um nome especial para isso. Era apenas tudo diferente, sabe? Para nós, talvez por morar em uma cidade pequena [o Superchunk é de Chapell Hill, na Carolina do Norte], nunca nos prendemos a um rótulo ou outro.
Gostávamos de tudo: das bandas hardcore, R.E.M., Smiths, New Order. Gostávamos de tudo porque era tudo bem diferente do que tínhamos acesso antes
Mas me referia ao fato de que, antes destes rótulos, os fãs dessas bandas se reconheciam por identidade estética. As pessoas ficavam amigas porque gostavam dos mesmos discos que pouca gente escutava
Sim, era muito importante para a gente, especialmente por viver em um lugar que não era Nova York. Você não podia ir lá ver qualquer banda ou comprar qualquer disco, você tinha que ir lá e descobrir as coisas no boca a boca, como você está falando, por meio de uma comunidade que gostava das mesmas bandas.
Você acha que essa sensação de comunidade que existia antes na música acabou?
Acho que em algum nível isso ainda existe, mas você tem que trabalhar ainda mais pesado para descobrir. Porque tudo está disponível o tempo todo on-line. Então, para descobrir coisas no meio disso tudo, você precisa encontrar pessoas comprometidas com a música, que mantêm um certo entusiasmo por alguma banda. Não acho que tenha desaparecido, acho que só é mais difícil de encontrá-las. De alguma forma isso pode ser expressado on-line, no Tumblr ou no blog de alguém. E tudo bem, mas quando essa comunicação acontece pessoalmente é mais eficaz.
E como você trabalha com isso, sendo dono de uma gravadora?
Temos que usar todas as ferramentas, o que inclui a internet, para encontrar as pessoas que achamos que irão gostar do disco e poderão trazer o máximo de pessoas para aquele trabalho.
Mas gerar esse entusiasmo e essa conexão ainda é algo muito pessoal. Há duas bandas da Merge que acabaram de lançar discos – Waxahatchee e Moutain Goats – e elas são exemplos de artistas que, quando você vai vê-los, percebe que as pessoas que estão os assistindo não ouviram falar da banda num site e foram ver o show.
São fãs, muito leais, muito envolvidos. Ouviram muito os discos, estudaram as letras e tudo mais. Acho que isso é uma emoção importante de manter entre as pessoas engajadas e apoiando artistas e bandas de que gostam.
Para terminar, como é o formato do show aqui em São Paulo? Pode pedir para tocar Superchunk?
O show é basicamente eu sozinho, só que estarei tocando guitarra. Então será um show solo elétrico e eu vou tocar músicas do disco novo e do Superchunk. Provavelmente esta semana vou perguntar para as pessoas no Twitter se elas têm pedidos e vou tentar tocar o que elas querem ouvir. Toco muitas coisas, tanto músicas novas quanto velhas.
BALACLAVA FESTIVAL
Quando sáb. (25) e dom. (28).; Mac McCaughan se apresenta no sábado
Onde Centro Cultural São Paulo – r. Vergueiro, 1.000, Paraíso, São Paulo, tel. (11) 3397-4002
Quanto de R$ 10 (meia) a R$ 20
Conversei com o Tricky, um dos papas do trip hop, que finalmente põe os pés no Brasil durante o festival paulistano Nublu, que acontece neste fim de semana no Sesc Pompéia. Confira a entrevista lá no meu blog do UOL: http://matias.blogosfera.uol.com.br/2015/03/28/tricky-como-antidoto-ao-lollapalooza/
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Se você não tem pique nem paciência para encarar as dezenas de horas e artistas que desfilam pelo Lollapalooza Brasil neste fim de semana, uma alternativa de porte menos adolescente é o Nublu Jazz Festival, que chega a sua quinta edição neste fim de semana, com apresentações em unidades do Sesc em São Paulo (no Sesc Pompeia) e em São José dos Campos.
O Nublu é um pequeno clube de jazz em Nova York que realiza festivais itinerantes na cidade, em São Paulo e em Istambul na Turquia, cidade-natal de seu seu dono, o saxofonista Ilhan Ersahin. Ele é o idealizador do evento que reúne titãs do groove do passado e novos talentos da música brasileira. Em edições anteriores desfilaram, lado a lado, nomes como Headhunters, o DJ Nuts, a Sun Ra Arkestra, Tulipa Ruiz, o trio Marginals, o baterista Karriem Higgins, Kassin, Guizado, Roy Ayers e o Marcos Paiva Sexteto, além dos projetos de Ersahin, como Love Trio e Wax Poetics.
A grande atração deste ano, no entanto, não vem propriamente do jazz. Desconhecido pelo seu próprio nome, Adrian Thaws é um dos pioneiros da cena de música urbana negra que começou a despontar em Bristol, na Inglaterra, no final dos anos 80. Entre o início do jungle e um hip hop cada vez mais desacelerado, com acento no jazz e funk dos anos 70 e larga reverência à toda a música jamaicana, esta cena deu origem ao soundsystem Wild Bunch que, influenciado pela nova cena dance do segundo verão do amor londrino, virou o Massive Attack. Adrian começou a rimar e participou do primeiro disco do Massive Attack, o clássico Blue Lines, de 1991. À época ele já assinava seus trabalhos como Tricky.
No ano seguinte deixou o Massive Attack e em 1995 lançou seu primeiro disco, Maxinquaye, batizado a partir do nome de sua mãe, e atingiu o nível dos mestres, fechando, ao lado do Massive Attack e do Portishead, a santíssima trindade do trip hop. O gênero, que evolui da desaceleração da acid house dos anos 90 e da absorção de referências mais orgânicas serviu como contraponto à cada vez mais veloz música eletrônica daquela década.
Vinte anos depois de Maxinquaye, Tricky finalmente chega ao Brasil, um ano após lançar um disco batizado com seu próprio nome, o festejado Adrian Thaws. “Sempre quis ir para o Brasil e algumas vezes quase fui”, me conta em entrevista por email. “Eu tenho muitos amigos que estiveram aí e me dizem que é um lugar incrível, por isso estou realmente animado de conhecer e descobrir. Não tenho nenhuma expectativa, série, só quero eu mesmo ver, sabe.” Uma ponte já foi feita, pois o rapper regravou a canção “Something in the Way”, que havia gravado com Francesca Belmonte no ano passado, com a brasileira Mallu Magalhães. Ele comentou sobre a parceria e seu último disco, entre outros assuntos, na entrevista abaixo.
Seu último disco tem seu próprio nome.
Sabe, eu venho usando o nome Tricky por anos e meu primeiro disco foi lançado com o nome da minha mãe, então é como se eu fechasse um ciclo, voltasse ao começo. Tirei cinco anos de folga quando fui morar em Los Angeles, então estou de volta agora. É como se fosse o próximo capítulo. Maxinquaye me pariu e também pariu a minha carreira, porque foi a base de toda a minha carreira. Minha mãe me deu, Adrian Thaws, a luz, e com isso eu fecho o ciclo e começo o segundo capítulo.
Como serão seus shows no Brasil?
Todo tipo de música, velha, nova, um pouco de tudo. Sou eu, minha vocalista Kamila Bleax, um baterista e um guitarrista.
Você gravou uma música com a Mallu Magalhães. Vai gravar mais algo com ela?
Sim, eu adoraria. Ela tem uma voz incrível. É tão… delicada. Uma voz linda. Desta vez ela me mandou os vocais, mas eu adoraria ir para o estúdio com ela. Seria ótimo.
O que você gosta na música pop atual?
Sabe, tudo é muito comercial. Mas tem um cara, Sam Smith. Eu não curto essa música muito comercializada, mas Sam Smith está trazendo a música pop de volta, dando um nome ao pop. Ele não é um Sam Cooke, não me entenda mal, não é um Bob Marley, nada desse tipo, mas ele tem canções lindas. Ele é bom para o pop, acho. Prefiro ele que o Justin Timberlake.
Eu escuto muito hip hop velho, quase nada novo. Muito do hip hop atual é música pop e eu não curto isso. Sabe, quando escuto hip hop eu não quero ouvir pop. Eu não quero ouvir o 50 Cent. Eu ouço hip hop underground, ou mais hardcore. Nunca gostei de música pop.
E como você escuta música atualmente?
Eu escuto CDs ou ouço no YouTube, com fones de ouvido. Quando escuto música, tenho que ouvir muito alto – ou com fones. Não tem meio-termo. Música pra mim é como uma conversa, é uma coisa muito pessoal.
E o que você tem achado deste novo cenário da música digital?
É bom, mas também é ruim. Por exemplo, se as pessoas baixam música de graça. Sabe, tem gente que não entende, mas é assim que você tira seu sustento, como você consegue fazer sua música. As pessoas deviam ao menos apoiar isso. Sabe, podem até baixar músicas de graça, mas então apoia de alguma outra forma, compra algumas músicas no iTunes ou coisa do tipo, sei lá…
As pessoas deviam apoiar mais os artistas. Eles têm a ilusão que os artistas estão ganhando dinheiro o tempo todo. Quer dizer, se você é enorme, você ganha sim. Mas aí, pra começar, você tem que que tocar no rádio. Eu não toco no rádio, não sou milionário nem nada. Se quiser baixar de graça, baixa a Madonna. Não é um grande problema pra ela, ela tem tanto dinheiro que não precisa. Mas artistad como eu, que colocam tudo em seu próprio trabalho, acho que deveriam ser apoiados.
Dois anos depois de Gabriela Deptulski começar a emanar vibrações de Colatina, no Espírito Santo, dá pra ver como seu My Magical Glowing Lens cresceu. Não é mais uma menina num quarto cheio de pedais e guitarras ligadas num computador, virou uma banda, tem gravadora (a gaúcha Honey Bomb Records), fez shows pelo Brasil e agora lança sua primeira música em 2015 com exclusividade no Trabalho Sujo. “Windy Streets” é a faixa-titulo de seu primeiro EP e conta com uma mão do grupo nova-iorquino Post Nobles na parte final da canção.
“Nos conhecemos por causa da banda Tame Impala, no grupo do Facebook relativo a eles. Somos fascinados por essa banda. Kieran O’Leary, o baixista do The Post Nobles, é um multi-instrumentista completamente apaixonado por produção musical. Nos identificamos assim que nos conhecemos e resolvemos lançar dois singles: um comigo fazendo uma participação em uma música deles, que foi lançada semana passada, e outro single com eles fazendo uma participação em uma música minha”, conta Grabriela.
2015 é o ano de transição de seu trabalho, quando ela começa a compor e gravar com a nova banda, que ainda apenas toca as faixas compostas por Gabriela. “Os planos pra esse ano são continuar a fazer show com a banda e dar início à gravação das músicas novas. Dessa vez, quero incluir os novos integrantes do MMGL nesse processo. A produção ainda será minha, mas quero que eles participem das gravações”, explica. Além dela, o MMGL agora conta com Pedro Moscardi (baixo e teclado), Raími Leone (guitarra) e RafaelBorges (bateria).
Tocar ao vivo também tem sido uma novidade pra Gabriela: “Está sendo quase uma experiência mística, o show tem uma vibe absurdamente mágica. O entrosamento entre todos da banda foi praticamente imediato. Todos nós gostamos muito de improvisar, então desde o primeiro ensaio já começamos a transformar os finais de três músicas em jams, de modo que o show é diferente a cada vez. Os meninos são demais, eles tocam muito, mas muito bem. E não só isso, são completamente apaixonados pela intensidade que a música nos fornece quando a tocamos ao vivo, então o show é bem intenso!”
Ficamos esperando ela aparecer em São Paulo. Enquanto isso, aumenta o som e boa viagem:
No fim do ano passado entrevistei o Guilherme Fontes pra Trip sobre o Chatô e, apesar da entrevista ainda não estar disponível na íntegra online (quando estiver eu colo aqui), dá pra ver um trecho dela no programa de TV deles, que já está no YouTube. O programa ainda tem um papo sobre o Rio Pinheiros, entrevistas com a Marjorie Estiano e o Rodrigo Amarante – e a conversa com o Guilherme começa a partir do minuto 14. Veja só::
Uma das capas da edição Trip desta virada de ano é o ator, produtor e diretor Guilherme Fontes, que entrevistei para a seção Páginas Negras que abre a revista. 2015 é o ano que marca os 20 anos do projeto que consagrou a fama de Guilherme, que deixou de ser visto como um galá de novela para ir parar nas páginas de polícia como pária do cinema nacional, ao desviar milhões de reais que deveriam ser gastos na produção de seu filme Chatô – O Rei do Brasil, baseado na biografia do magnata brasileiro das comunicações do meio do século passado Assis Chateubriand. Na entrevista, dada no dia seguinte à decisão judicial que exigia que Fontes devolvesse mais de 80 milhões de reais aos cofres públicos, o ator diz estar tranquilo e que é vítima de uma conspiração por ter querido crescer demais no showbusiness brasileiro. Mas ele disse também que o filme está pronto e deve ser lançado em 2015, quando ele começa a provar que não deve nada a ninguém. Um trecho da entrevista pode ser lido no site da revista:
Que grande lição você tirou dessa história toda, da filmagem do Chatô?
Jamais faria um filme sem o dinheiro todo na conta. Foi meu único problema. O dinheiro tem que estar 100% na conta. A lei permite usar mesmo que você não tenha 100%, isso está errado. Sair pra captar é legal e você envolve outros personagens no processo. Por outro lado, você coloca pessoas que não têm nada a ver com o processo pra decidir sobre o negócio. Tudo bem que você precisa de anunciantes, mas não pode condicionar à existência desses patrocinadores a obra cultural do país. As pessoas já estão começando a usar dinheiro próprio e esquecendo do incentivo.O que podemos esperar do filme?
Estou encantado com o lançamento do Chatô. Acho que fizemos um grande trabalho. Como disse o Cacá Diegues, quando viu o material bruto: “É o último filme tropicalista do cinema brasileiro”. É uma grande homenagem ao cinema novo, ao modernismo, a tudo que admiro. Ao Fernando Morais pelo grande livro que escreveu. Não sei por que os figurões do cinema vieram me satanizar. Eu sou produtor pra brigar por mais espaços, mais empregos para a nossa classe. Fui até o fundo do poço por esse filme. Mas tinha mola lá embaixo. Valeu a pena.
O resto, só na edição impressa.
Na última edição da Galileu em que fui diretor de redação, entrevistei o filósofo italiano Domenico de Masi – e, agora, no fim do ano, lembrei que não a havia republicado aqui. Segue então a entrevista completa, além da edição enxuta que saiu na revista.
A vez do Brasil
Em seu novo livro, Domenico de Masi fala sobre o papel de nosso país
Estamos no rumo certo – pelo menos é o que diz o filósofo italiano Domenico de Masi em seu novo livro, O Futuro Chegou – Modelos de Vida para uma Sociedade Desorientada (Casa da Palavra, R$ 69,90). Nele, ao autor do já clássico O Ócio Criativo debruça-se sobre a história da humanidade para analisar seus principais modelos sociais e como a forma que os cidadãos são tratados foi crucial para o sucesso de sistemas tão diferentes quanto a sociedade grega e o estado comunista, por exemplo.
Mas a empolgação de De Masi é com o Brasil, que ele acredita finalmente ter superado o estigma de “pais do futuro”, cogitado originalmente de forma irônica e depois assumido pela ditadura militar como lema ilusório. Ele crê – e dedica o último capítulo do livro à tal crença – que o Brasil tem o melhor modelo social para este início de século.
Com a chegada da tecnologia digital e do computador, há uma sensação de que o futuro ficou obsoleto. O que você acha disso?
Não concordo. O advento da tecnologia da informação coincide com o da sociedade pós-industrial, que é baseada precisamente em uma projeção de futuro, que consiste de um padrão de vida que, no momento, não existe. Esta é a especificidade da sociedade pós-industrial. Enquanto as anteriores – a grega, a romana, a cristã, a liberal, a comunista, etc. – nasceram a partir modelos pensados anteriormente por profetas, filósofos, economistas ou políticos, a sociedade atual foi criada a partir da superposição de inovações rápidas e espontâneas em todos os setores. Isto resultou em uma desorientação geral, pois já não sabemos o que é bom e o que é mau, o que é direita e o que é esquerda, o que foi e o que é o mercado, que é o homem e o que é a mulher, o que está vivo e o que está morto. Nossa sociedade não apenas espera o futuro, o projeta. Enquanto respondo esta entrevista milhões de criativos, no mundo todo, estão inventando coisas, criando leis, espalhando ideias.
Há uma frase do escritor de ficção científica William Gibson que diz que “o futuro já chegou, só não foi distribuído”.
Concordo plenamente. O futuro depende de inteligência, criatividade, recursos econômicos, honestidade, solidariedade. Separar estes fatores entre si é caprichoso e injusto.
Mas a ficção científica não parece conseguir prever um futuro devido ao excesso de transformações que estão acontecendo agora. Você acha que isso restringe nosso conceito de futuro?
Sim. As transformações ocorridas nas últimas décadas, quando ocorreu a passagem da era industrial para a pós-industrial da sociedade, não dependem apenas de progressos científicos e de tecnologia, mas também da globalização, da disseminação dos meios de comunicação, de educação em massa e de mudanças culturais. Novos progressos futuros afetarão não só a tecnologia e a estrutura econômica, mas também as idéias, o comportamento, a cultura material e social.
O Brasil por muito tempo foi perseguido com a pecha de “país do futuro”. Você acha que isso pode ter causado problemas para a autoestima do país?
Sim. Por um lado isso deu esperança ao povo, mas por outro serviu para que fossem adiadas reformas que só agora foram realizadas. Isso serviu como álibi ilusório para o governo militar alcançar um maior consenso popular. Há uma enorme diferença entre a frase “Brasil, o país do futuro” dita por Jorge Amado com ironia em 1930, a dita com entusiasmo por Stefan Zweig em 1941 e a dita com astúcia por Emilio Garrastazu Médici, no final dos anos sessenta.
Mas você acha que o Brasil é o país do futuro?
Não, acho que o Brasil é o país do presente. Por 120 anos, vocês criaram o melhor modo de vida válido para a sociedade pós-industrial. Não é o melhor de todos os modelos possíveis, mas o melhor modelo já testado. Ainda não é um modelo para o futuro, mas é um modelo válido para já.
O que o Brasil pode ensinar ao resto do mundo?
Infelizmente, o contágio do consumismo nos Estados Unidos já poluiu muitos aspectos da vida urbana no Brasil. A isso devemos acrescer a tentação de ceder às exigências incultas do mercado externo que ceifam aspectos da brasilidade: o excesso de cor e som, a sensualidade desenfreada, o exotismo, a dissipação provinciana do patrimônio natural, que pode ser associada à falta de autoestima, a falta de compromisso público, a astúcia como substituta da inteligência, a falta de confiabilidade.
No entanto, apesar da colonização feita pela Europa e pelos Estados Unidos, o Brasil continua sendo original e os melhores aspectos da brasilidade ainda prevalecem sobre aqueles que são importados.
Escreve Gilberto Freyre: “A mentalidade brasileira não é ofendida pelo jogo de contrastes, comparações, paradoxos, contradições, misturas e sincretismo, a conjugação dos opostos, o Brasil vive um casamento que é irreconciliável à primeira vista”. Essa mistura de muitos fatores diferentes, que em outros contextos seria destrutiva, em seu caso, é benéfica. O conceito de “brasilidade” vem da reunião e remete imediatamente ao relacionamento interpessoal. de relações abrangem indivíduos. E viver significa “ter relações sociais.”
A harmonia do corpo, a sensualidade e a saúde, além de habilidades psicológicas, como a socialização, a simpatia, o senso de hospitalidade, a simpatia, a generosidade, o bom humor, a alegria, o otimismo, a espontaneidade, a criatividade e a fé, como a vida, estão relacionados aos conceitos de tolerância e curiosidade. A paciência, a capacidade de mover-se entre diferentes códigos de conduta e de reinterpretar regras e normas, são atitudes comuns no Brasil, bem como a tendência a considerar fluidas as fronteiras entre o sagrado e o profano, o formal e o informal, o público e o privado, a emoção e a regra.
A sociedade brasileira é unificado pela “língua geral”: o sincretismo cultural, de grandes festivais civis e religiosos incorporados no modo de vida das pessoas, a música, o papel das mulheres na vida social, a sensualidade sem culpa – “Não existe pecado do lado de baixo do Equador “, canta Chico Buarque. Um nível mais intelectual é unificado pela notável capacidade de reciclar atividades culturais através de uma assimilação, adaptação e releitura permanentes – a antropofagia.
O Brasil é aberto ao novo e à mudança. E mesmo nos piores momentos enfrenta a realidade com sentimento positivo. Em comparação com o passado, os brasileiros têm dois novos elementos: sua consciência dos próprios desafios internos – a corrupção, a violência, a desigualdade, os déficits educacionais – está mais difundida e há a percepção de ser um país de ponta, diferente e positivo, mesmo fora sua própria maneira de ser.
Hoje, o Brasil vive uma situação única em relação a seus passado e futuro. Depois de copiar, a Europa por 450 anos e os Estados Unidos por 50 anos, vê esses dois modelos míticos em crise profunda – e pela primeira vez deve pensar, por conta propria, sobre seu futuro. É uma situação que pode parecer perturbadora, mas é o modelo de vida necessário para todas as sociedades pós-industriais.
Quando você acha que as pessoas irão abandonar as regras do trabalho criadas no século 18, como horas de trabalho, dias úteis e horas-extra?
Não sei. Essas regras, que hoje prejudiciais, estão enraizados em nosso inconsciente individual e coletivo. Talvez elas caiam quando a indústria for completamente substituída pela geração digital.
Até quando vamos continuar misturando progresso e prosperidade com crescimento?
Embora Adam Smith tenha descartado a possibilidade de uma ligação direta e automática entre riqueza e felicidade, o liberalismo e o neo-liberalismo sempre focaram na melhoria da qualidade de vida ao considerar ilimitada a disponibilidade de recursos naturais. Da minha parte, concordo com o Kennet Building, que diz que “aquele que acredita no possível crescimento infinito num mundo finito ou é louco ou economista”.
No ano passado, o Instituto Gallup compilou um ranking de 148 países em que pessoas com a idade superior a 15 anos que foram entrevistados a respeito de seu dia anterior – se sentiram satisfeitos, respeitados, revigorados, se sorriram ou aprenderam algo interessante. Os dez países no topo deste ranking são Panamá, Paraguai, El Salvador, Venezuela, Trinidad e Tobago, Tailândia, Guatemala, Filipinas, Equador e Costa Rica. Como você pode ver, oito são da América Latina e todos têm PIB baixo.
O resultado de dois séculos de liberalismo é que um sexto da população mundial foi capaz de crescer às custas do resto do planeta, das gerações futuras, dos consumidores, dos trabalhadores e do terceiro mundo. Hoje, no entanto, todo o planeta está se transformando rapidamente em um grande sistema interligado e o rápido crescimento dos países emergentes – como o Brasil – obriga os países ricos a inverter a sua direção para onde marcham.
Para recuperar o que foi perdido, nos lembra de Serge Latouche, precisamos de “tempo para exercer a cidadania, prazer para a produção livre, o sentido de ter tempo para si, para o jogo, a contemplação, a meditação, a conversa artística e artesanal – ou, simplesmente, a alegria de viver”. Para além destas dimensões Cornelius Castoriadis nos lembra o amor à verdade, o senso de justiça, a responsabilidade, o respeito pela democracia, o elogio à diferença, o dever de solidariedade, o uso da inteligência. Em poucas palavras, a magia da vida.
Entrevistei o Guilherme Fontes para as Páginas Negras da Trip no mesmo dia em que ele voltou ao noticiário – não de cultura -, quando o Tribunal de Contas da União definiu que ele deveria devolver R$ 71 milhões aos cofres públicos. O dinheiro seria relativo aos gastos com o filme Chatô – O Rei do Brasil, um dos maiores épicos da história do cinema brasileiro mesmo sem ainda ter sido lançado. Segundo Guilherme, produtor e diretor do filme, suas contas estão corretas e o filme, finalmente, está pronto para ser lançado, quase 20 anos depois de ter sido idealizado. O inferno do ator/diretor, ele explica, é culpa de uma campanha pessoal contra ele – e dá mais detalhes na edição de fim de ano da revista. Confere lá.
Acompanho o trabalho da Juliana de Faria mesmo antes de ela lançar o site Think Olga, que faz parte de um novo movimento feminista no Brasil que aos poucos consegue voz usando a internet como plataforma. Foi através do Think Olga que a Ju fez a pesquisa Chega de Fiu Fiu, sobre a tênue linha entre a cantada e o assédio sexual, mostrando como esse tipo de abordagem é mais frequente do que imaginávamos e transformando a pesquisa em campanha. Há menos de um mês ela lançou um convite via crowdfunding para transformar o resultado da campanha em um documentário e em menos de 24 horas conseguiu bater a primeira meta – mas ainda há outras metas pela frente.
Conversei com a Ju por email sobre o Think Olga, o Chega de Fiu Fiu e sobre jornalismo.
Queria que você começasse falando de como começou o Think Olga e como vocês chegaram à conclusão que deu origem à pesquisa do Chega de Fiu Fiu.
Wow! Essa é uma longa história. Hehe. Vou tentar resumir. Sou jornalista e me especializei em jornalismo feminino. Em determinado ponto da minha carreira, senti que minhas ideias de pautas já não tinham mais espaço nos veículos femininos tradicionais. Decidi então criar a Olga não apenas para publicar as matérias que tinha vontade de escrever, mas também queria criar um espaço para discutir o espaço da mulher na sociedade, o feminismo e, principalmente, a forma como a representatividade na mídia. Bem, e como falei minhas propostas de pautas eram rejeitadas por não conversar com a linha editorial das revistas. E uma delas era sobre assédio sexual. Eu havia até mesmo sugerido criar, gratuitamente, a Chega de Fiu Fiu para uma revista. Como foi rejeitada, achei que valia a pena tocar por conta própria mesmo.
A internet foi crucial para a divulgação e realização da pesquisa, mas vocês esperavam a resposta do jeito que ela aconteceu?
Ao longo de toda a jornada da Olga e da Chega de Fiu Fiu, fui constantemente surpreendida por reações cada vez maiores e mais engajadas das participantes. No entanto, quando você para para pensar, não é tão surpreendente assim. Estamos atacando um problema que atinge muitas mulheres, mas que sempre foi tolerado. E conectar em torno de um mesmo problema, de uma mesma questão é basicamente a essência da internet.
Queria que você falasse um pouco também de como os temas começam a ser postos de forma extrema quando discutidos textualmente na internet. Presumo que vocês tiveram que lidar com radicais de todos os tipos. Como é lidar com isso?
Pessoalmente, sempre é muito difícil. Você tenta fazer um trabalho que pode de alguma forma mudar a situação da violência contra as mulheres e precisa enfrentar pessoas, algumas delas conceituadas, que distorcem sua mensagem e muitas vezes te ofendem. Mas é claro que você não vai conseguir tirar o privilégio de milênios de alguns grupos sem incomodar algumas pessoas. O interessante é ver como homens supostamente inteligentes e liberais se transformam rapidamente em conservadores ao perceber que há sim gente batalhando para equiparar os privilégios de uma minoria com o da maioria em que estão inseridos.
Por que fazer um documentário?
Foi o desenvolvimento natural da campanha. Acreditamos que o documentário pode ser uma chance de nos aprofundarmos no tema, assim como usa-lo, quando pronto, como ferramenta de informação acessível e gratuita para a população.
E depois do documentário feito, como vai ser sua divulgação?
Queremos que o documentário seja uma ferramenta acessível a todos. Nossa ideia é disponibilizá-lo gratuitamente na internet, de forma a ser exibido por escolas, universidades, ONGs e instituições públicas. Queremos também que ele seja utilizado em formações de advocacy. Além disso, já há canais de TV interessados também em exibi-lo. 🙂
Vocês já ultrapassaram a cota sugerida. Quanto tempo demorou para isso ser atingido entre a divulgação e o cumprimento da meta?
Em 19 horas, batemos nossa meta. Nosso financiamento coletivo para o documentário foi o 4º projeto que mais arrecadou nas primeiras 24 horas de existência em toda a história do Catarse – e o 1º no ranking da categoria Cinema & Vídeo. É uma conquista enorme, pois se trata de um projeto feminista, que fala sobre violência contra a mulher — tópicos que normalmente geram polêmica, não geram o interesse que merecem ou causam uma resposta extremamente violenta por pessoas mais, digamos, conservadoras. Além disso, oferecemos pouquíssimas recompensas materiais. Ou seja, as pessoas estão apoiando, pois sabem que é um assunto que deve ser debatido e solucionado com urgência. Ficamos muito felizes!
Quais os próximos projetos do Think Olga?
Nosso próximo passo é começar a trabalhar com empresas, ONGs e instituições governamentais para aumentar a representatividade das mulheres. Sentimos que em todos os meios de comunicação a mulher costuma ser retratada de uma maneira tradicional que não condiz mais com a realidade.
Isso é jornalismo? Como você vê o jornalismo que está sendo produzido no Brasil hoje, dentro e fora das redações?
A Olga lida com colaboração, comunidades online, conteúdo em várias midias e com um propósito muito honesto e bem definido. Sem dúvida, pro público que a segue, é uma publicação relevante e confiável. Não sei se é o futuro do jornalismo, mas acredito que podemos tirar boas lições disso que estamos fazendo 🙂
Começou esta semana o festival Novas Frequências, organizado pelo vizinho dOEsquema Chico Dub, que em quatro anos conseguiu consolidar o melhor evento de música avançada no Brasil – que, por incrível que pareça, acontece no Rio de Janeiro, deixando São Paulo na poeira. A edição deste ano reúne 33 artistas, se espalhou por vários lugares da capital fluminense – indo do Oi Futuro Ipanema à Casa Daros, do Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto ao Audio Rebel e vai até o dia 14 deste mês. Bati um papo com o Chico sobre as dificuldades e o prazer de fazer um evento de música contemporânea em pleno balneário carioca (a programação completa dá pra ver no site oficial).
Antes a música de vanguarda era restrita a um gueto bem pequeno, mas com a internet esse conceito ganhou um público global – com players espalhados pelo mundo todo, em constante contato. Você já se considera parte dessa rede? Como o Novas Frequências é visto por essa comunidade?
Temos duas marquinhas na barra de logos da nossa comunicação visual que respondem à sua pergunta. Uma delas é a revista inglesa The Wire, sem dúvida a principal publicação do gênero no mundo todo, a Bíblia da música experimental. Ter a The Wire como media partner do Novas Frequências é uma espécie de prêmio, um puta respaldo que de alguma forma diz que estamos no caminho certo. Outra marquinha que me deixa muito orgulhoso e deveras animado com o futuro próximo é a marca de apoio do ICAS, sigla para International Cities of Advanced Sound. Somos o mais novo membro dessa rede que reúne alguns dos mais importantes festivais de culturas sonoras avançadas, música de vanguarda e artes relacionadas como o Mutek (Montreal, Canadá), Unsound (Cracóvia, Polônia), CTM (Berlim, Alemanha), Future Everything (Manchester, Inglaterra) e TodaysArt (Haia, Holanda). Estimular o diálogo, a troca de conhecimentos e o apoio mútuo entre organizações internacionais envolvidas com música e sons avançados são algumas das missões do ICAS.
Qual é a maior dificuldade em fazer uma curadoria de um evento dessa natureza?
São duas dificuldades relacionadas entre si: atrair o público e conquistar a atenção da mídia. Trabalhar com artistas desconhecidos do grande público é bem complicado! Muitas vezes o repórter quer escrever sobre o festival mas o editor veta a pauta por achar que “a programação do Novas Frequências é experimental demais para o seu público”. É claro que nunca iremos sair no Fantástico – e essa nem é a ideia, nunca foi -, mas na maioria dos casos tenho certeza que os editores acabam subestimando o público de uma maneira em geral. Conhecer coisas novas faz parte da natureza humana, não?
Sendo um recorte mais difícil, uma noite vazia não é necessariamente um noite fracassada. Como é lidar com essa contradição entre o sucesso comercial – para viabilizar um festival anual – e a dificuldade de atingir um público maior?
O festival passa hoje por um estágio muito complexo, mas ainda assim muito interessante de ser trabalhado. Muito desafiador. Que é o seguinte: como crescer? No ano passado vendemos todos os 6 dias no Oi Futuro Ipanema em 4 horas e muita gente ficou de fora. Ou seja, já existe uma demanda por espaços maiores. Só que o Rio de Janeiro é extremamente carente de palcos médios, espaços com boa infra para 300, 400 pessoas. Aqui é 8 ou 80, sabe? Ou é para 100 ou para acima de 1.000/ 1.500. Então o crescimento esse ano aconteceu de forma horizontal: muitos dias, 14 no total, para públicos que vão de 100 a 600 pessoas em vários lugares da cidade.
Mas é importante falar uma coisa. Não temos pressa para crescer, esse é um universo novo no Brasil que precisa ser trabalhado com muita calma, com muita estratégia. Queremos – e precisamos – formar público antes de dar saltos maiores. Só vamos crescer substancialmente se o mercado crescer: mais artistas locais, mais casas abertas a esse tipo de proposta sonora, mais interesse de iniciativas públicas e privadas, mais produtores, mais selos, mais jornalistas e veículos dispostos a cobrir essa cena e por aí vai.
Por outro lado, nos dá uma baita segurança ter tantos parceiros que acreditam no Novas Frequências e que de cara sacaram a importância do festival, principalmente a Oi, o Oi Futuro, o Governo do Rio de Janeiro e a Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro. São parceiros que cultivamos desde a primeira edição do Novas Frequências em 2011.
Você acha que essa música experimental terá um público ainda maior à medida em que o século passar? As pessoas estão ficando fartas da música pop?
As novas gerações são muito mais curiosas e exploradoras que as gerações passadas. Pra elas o conceito de nicho não existe. Tem um cara que trabalha com a gente que adora k-pop, saca tudo de indie e ama Sunn O))). A tendência por tanto não é as pessoas enjoarem do pop. A tendência é uma pequeníssima parcela desse público gigantesco estar mais aberto a ouvir e a descobrir novos sons e novas propostas.
Quais os seus maiores orgulhos na escalação deste ano?
De verdade mesmo? O maior orgulho é estar em 6 espaços da cidade – 8 contando com os espaços reservados para as oficinas – durante duas semanas com 33 artistas de 11 países. Sendo que dos 20 gringos, nenhum deles havia pisado em solo brasileiro antes.
Qual é o seu Novas Frequências dos sonhos? Um só com nomes vivos e outros com nomes que já morreram. Dá pra pensar nisso?
Prefiro não pensar em nomes que já morreram – para o Novas Frequências, o “passado” é muito menos interessante que o presente e que o futuro. Earth, Swans, Moritz Von Oswald Trio, Shackleton, Charlemagne Palestine, Pauline Oliveros, Lonnie Holley, The Caretaker e Chris Watson são nomes que sonho dia sim, dia sim.
E por que o festival não vem inteiro para São Paulo, já que você traz todo mundo até o Rio?
Levar o festival inteiro pra São Paulo nunca foi uma ideia, sabe? Porque se já é difícil levar dois ou três artistas para uma espécie de “showcase” ou “edição pocket”, imagina o festival inteiro… Existe um interesse muito grande do público paulistano pelo Novas Frequências, isso é fato. E diversos produtores locais independentes já tentaram levar artistas daqui do Rio pra SP. O que acontece é que o festival tem patrocínio no Rio, uma verba que precisa ser gasta aqui; para realizar o festival na cidade. Para acontecer aí de forma minimamente robusta, precisaríamos de outros parceiros, algo que infelizmente ainda não se concretizou. Já tive conversas com o Sesc (diversas unidades), com o MIS, com o CCSP e com as principais casas de shows alternativos de São Paulo. Mas por motivos de agenda, verba ou (falta de) interesse, as coisas nunca foram pra frente. Sigo tentando. Mas sozinho definitivamente não consigo levar o festival pra SP – ainda mais agora, que ele cresceu bastante.