Lei de Murphy

Depois do show do Clã e de discotecar na Livraria Cultura, sábado ainda dei um pulo no Smirnoff Experience, mas só consegui assistir ao set do James Murphy. O lugar não era dos melhores, o público era essencialmente o mesmo da Pachá, mais interessado em ser visto do que no evento em si, e, pra piorar as coisas, choveu. Vazei depois do Mr. Murphy e perdi o show do Yatch e o set do Joe Goddard, do Hot Chip. Paciência.

Que Clã?

Caí de paraquedas no show da banda portuguesa Clã no sábado passado e tive uma boa surpresa. Lançando a coletânea Catalogue Raissoneé pelo selo Allegro Discos no Brasil, o quinteto fez dois shows no Sesc Pompéia que contaram com participações especiais: o de sexta contou com as presenças de Arnaldo Antunes e Zeca Baleiro e no que eu fui o casal John e Fernanda, do Pato Fu, eram os convidados. Se fosse brasileiro, o Clã provavelmente seria uma banda indie que, além de tocar no Studio SP, no Inferno e em alguns festivais independentes do Brasil, também conseguiria datas no Sesc para lançar seu disco. Talvez não contasse com as presenças da primeira noite, devido ao abismo que existe entre a música pop brasileira e a MPB (as coisas estão mudando aos poucos, vide a presença de Arnaldo no disco do Cidadão Instigado). O Pato Fu está mais próximo da realidade indie do que daquela da MPB, por isso as bandas conversaram bem – a ponto do próprio Clã ter gravado “Depois” da banda mineira (que eles tocaram no show). Mas se existe uma lacuna enorme entre a música pop feita no Brasil e em Portugal, ela aumenta ainda mais pela distância entre dois “gêneros” que insistem em separar adultos de adolescentes, como se faixa etária determinasse gosto musical. Felizmente, como eu disse, as coisas estão mudando.

Quequefoiaquelo…

Alguém anotou a placa desse show do Franz Ferdinand em São Paulo? Se não fosse o do Radiohead, teria sido show do ano, fácil, fácil. Mas há quem espere o Faith No More, o Sonic Youth ou o Primal Scream.

E o show do Franz, hein…?


Franz Ferdinand – “This Fire”

Foi bom.


Franz Ferdinand – “Tell Her Tonight”

Foi bem bom.


Franz Ferdinand – “Ulysses”

Foi bem foda.


Franz Ferdinand – “40′”

Melhor show de rock no Brasil do ano – e só não foi o melhor show porque o Radiohead (que já ultrapassou esse formato, “rock”) deu as caras por aqui. Só “Lucid Dreams” (que começou funk rock e depois descambou numa electera entre o antônimo do Justice e a resposta européia ao LCD Soundsystem – alguém viu se tem vídeo disso? Foram mais de 10 minutos, quase 20) valeu a noite, mesmo com todo aperto, sufoco e o fato de pelo menos um terço do público presente não estar ali pelo show – e sim pela social. Nesse sentido, o show dos caras no Motomix foi mais contangiante – o espaço era maior, dava pra dançar. Mas, na boa, maior privilégio ver os caras ainda no ano de lançamento de Tonight, que não saiu dos meus 10 melhores discos do ano desde que foi lançado, em janeiro. Ano que vem eles voltam.

Fogo na pista


Friendly Fires – “Lovesick”

Friendly Fires @ Studio SP
17 de agosto de 2009


Friendly Fires – “Jump in the Pool”

Bem bom o show dos Friendly Fires em São Paulo, que rolou nesta segunda, abrindo a semana. Já tinha ouvido que a banda tocava mal ao vivo e que, aos poucos, eles foram pegando o jeito da coisa. Nem parece. O entrosamento dos quatro principais músicos e a empolgação dos três titulares da banda (a saber: o baixista Rob Lee é músico convidado) garantiram uma explosão de excitação e adrenalina que mais têm a ver com uma pista de dança do que com um show de rock.


Friendly Fires – “Skeleton Boy”

Porque os Friendly Fires, dance ou não, são uma banda de rock – uma cruza inglesa de Talking Heads com Gang of Four com o gingado do Rapture (mentira, o vocalista Ed Macfarlane rebola mais do que todo o Rapture reunido). Se tivessem nascido em outra época, certamente não trabalhariam com grooves cavalares e percussão comendo solta nem incluiriam uma dupla de metais no show. Sorte nossa. Assim, a banda deixa de ser mais um roquinho genérico para incendiar a pista (como muitas outras bandas desta Nova Dance Music – um dia eu escrevo melhor sobre essa cena).


Friendly Fires – “Kiss of Life”

(O Copacabana Club chegou a dar o clima na mesma medida, botando no palco a mesma comoção de pista de dança dos Friendly Fires. Tá certo que eu cheguei no show na hora em que “Just Do It” transformava a platéia numa turba descontrolada, mas mesmo na última faixa eles mantiveram o público em ponto de bala para o incêndio que foi o show dos FF.)


Friendly Fires – “In the Hospital”

E incendiar Brazilian-style. Desfilando a íntegra de seu disco de estréia, o trio se jogou no palco. Além do requebro de boneco de posto do vocalista, o guitarrista Edd Gibson encarnava o guitar hero pós-punk enquanto o baterista Jack Savidge derrubava a bateria – amparado, vez ou outra, pela percussão do baixista (que, vez ou outra, assumia as baquetas para tocar tarol e vários cowbells) ou pelo agogô de Macfarlane. O público não ficou por menos e a massa pulava feliz ao assistir a um show que soava como uma discotecagem perfeita.


Friendly Fires – “Photobooth”

Ponto pro Lucio, que, na segunda edição de seu festival/festa, o Popload Gig, mostrou que dá pra trazer um artista que não é muito conhecido para o Brasil, fazer shows de médio porte (o Bruno também gostou do show dos caras no Rio) e deixar tanto público quanto crítica felizes. Que venham outros.


Friendly Fires – “Paris”

Wandula x Burro Morto

Esqueci de colocar aqui os vídeos que eu fiz no show que as duas bandas fizeram aqui em São Paulo no mês passado. Do Wandula, só consegui filmar uma (e essas meninas só conversam no comecinho do vídeo, depois elas param):


Wandula – “Borges”

A banda curitibana parece que vai dar um tempo porque um dos integrantes (ou mais de um) vai cuidar do lado não-banda de sua vida e a banda entra em suspensão criogênica por um ano ou mais. Depois deles teve o show do Burro Morto, da Paraíba, um filhote de Hurtmold, Nação Zumbi e Instituto, um Mombojó menos MPB e uma das melhores bandas novas no Brasil hoje, se liga:


Burro Morto – “Nicksy Groove”


Burro Morto – “Cabaret”


Burro Morto – “Colomentality (Colonial Mentality)” (do Fela Kuti)

Enquanto isso, em Los Angeles…

Escapuli pra ir no show dos Amigos Invisibles. Coisa fina:


“Sexy” e “Amor”


“Everybody Everybody”, “Mentiras” e “Diablo”


“All Day Today” e “Ponerte en Cuatro”


“Que Rico”

Alguém se dispõe a trazer os caras pro Brasil? Eles são da Venezuela, afinal de contas… E certamente lotam um Sesc Pompéia por uns três dias, só no boca a boca.

Tommy Guerrero em São Paulo

Esqueci de comentar o show do Tommy Guerrero no domingo passado – e não tem nem muito o que falar, tirando o fato de ter sido fodão. Instrumental e groovezeiro, o show do guitarrista e sua banda ainda contou com a participação dos brasileiros Curumin e Guizado no apoio. Os quatro vídeos aí em cima foram feitos no ótimo espaço da revista +Soma, na Vila Madalena – a iluminação pra filmar tava ruim, mas deixa a imagem de lado e se liga no som.

A Anti-Britney

Lily Allen @ Roseland Ballroom
Nova York, 20 de abril de 2009

“Cara, olha como isso tá cheio! E hoje é segunda-feira e tá chovendo!” – não, quem fez esse comentário não foi qualquer pessoa da platéia e sim de um segurança do clássico Roseland Ballroom. A enorme casa de shows na rua 52 de Nova York quase na Broadway (“que metido ele, citando endereço em Nova York”) já foi palco de pelo menos um disco ao vivo histórico (o terceiro álbum da discografia oficial do Portishead) e é vizinho do Ed Sullivan Theatre, onde os Beatles começaram a conquistar o mundo. Por fora, parece um cinema; por dentro, lembra uma versão melhorada do velho Olympia em seus melhores dias.

E, como salientou o segurança, estava lotada – e em plena segunda-feira. Chegamos no meio do show da banda de abertura, o Natalie Portman’s Shaved Head, uma banda empolgadíssima que tocava umas músicas bem mais ou menos, uma espécie de sub-Franz Ferdinand com um pezinho na eletrônica (bem de leve) sem um pingo de noção para compor um refrão válido – “Me & Yr Daughter”, a música com que eles encerraram o show, era o mais perto disso que eles conseguem fazer. O público gostou, mas apenas como aperitivo para o show da musa da noite.

Musa? Lily Allen comporta-se como o oposto disso. Seu show em Nova York foi o segundo “último show da turnê” que assisti da cantora – o primeiro foi no festival Planeta Terra, quando ela encerrou sua primeira turnê mundial num show completamente bêbada, esquecendo as letras das músicas e divertindo-se mais no palco do que a platéia. Era o final de 2007, o ano que consagrou a aparição de Lily Allen não apenas no rol de popstars surgidos graças à web como uma aspirante à liga júnior do mundo de celebridades. Quase dois anos se passaram desde sua primeira aparição e aquele show no Brasil foi uma espécie de terapia em público, com a cantora falando sem parar sobre qualquer assunto, como se expurgasse os próprios fantasmas num porre em que repassou, com banda, seus hits até ali.

Corta para 2009 e lá está Lily, um pouco mais velha, falando, bebendo e fumando sem parar, mas sem o clima de fim de feira do show no Brasil. Pelo contrário – ela está em Nova York e seu show de despedida da cidade não pode ser de qualquer jeito, mesmo porque pode ser o último na América do Norte, mas a turnê de It’s Not Me, It’s You, seu segundo disco, ainda está pela metade. Mas é bom descobrir que cigarros, bebedeira e a falação desembestada não são a exceção – e sim a regra de suas apresentações. E mesmo que ela esteja com mais pose de popstar do que de menininha, mesmo que o palco escreva seu nome com letras grandes três vezes, mesmo que metade das meninas da platéia sejam miniclones de Lily (franjinha, saltões, sainhas, leggings, casaquinhos sobre camisetas compridas, blusas soltas, cores fortes), mesmo que abertura de seu show projete sua silhueta batendo os pezinhos no chão como uma marca registrada, ela não está nem aí para o papel de exemplo a ser seguido ou de ícone cultural. E em vez de fazer-se de diva intocável, equilibra suas músicas com uma faceta pouco explorada entre as manchetes de tablóide – a de que suas frases que às vezes viram manchetes deslocadas por partirem de monólogos que estão mais próximos da comédia stand-up do que da música pop. Não é acaso o fato de ela fazer dois fãs participarem de um concurso para ver quem come mais rápido antes de começar mais uma faixa, “It’s Not Fair”.

E antes de cada música ela alongava uma pequena introdução e contava uma história, explicava uma situação ou falava um pouco sobre a música a seguir. “Essa (“Him”) é para o cara lá em cima”, “essa (“He Wasn’t There”) é sobre o meu pai”, “essa (“Chinese”) parece ser sobre um namorado, mas é sobre a minha mãe”, “essa (“Fuck You”) pode ser sobre qualquer pessoa, mas na verdade é sobre um cara que já era”. Antes de “22” dedicou a faixa às meninas da sua geração (Lily nasceu em 1985) que querem um namorado mas passam o tempo todo ficando com os caras errados (sem mencionar que ela disse isso usando a expressão “sucking cocks”). Antes de “It’s Not Fair” desculpava-se ter dito “fuck” quando queria dizer “making love”.

Ao seu redor, uma banda formada por baixista, guitarrista, baterista e tecladista, acompanhava a garota para onde ela fosse – e se sua segunda coleção de faixas lançada num disco de plástico começou a existir parecendo habitar o território de uma new wave açucarada ou um tecnopop com gosto do girl power das Spice Girls, ele logo a ampliou em um leque de canções de gêneros musicais diferentes, como se estivesse exercitando, musicalmente, o mesmo tipo de terapia/fantasia que inclui em suas letras. O que permitiu até um infame “momento acústico” e uma hilária reação da platéia – sugerida pela própria Lily – que acompanhou “Fuck You” (que era mais sutil quando foi lançada no MySpace ano passado como “GWB (Guess Who Batman)”) erguendo os dedos do meio para a cantora, adolescentes de diferentes idades expurgando suas frustrações num jazzinho pseudo-cabaré cujo potencial de hit parece ter sido boicotado só pelo palavrão do refrão.

E a banda a segue para além das demonstrações de versatilidade embaladas em forma de canção que formam It’s Not You It’s Me. Um dos melhores momentos do show foi no bis, quando a banda brincou de drum’n’bass e dub em cima do reggaeinho original de “Smile” – com Lily disparando efeitos sonoros graças a um dispositivo portátil, que funcionou como uma ótima introdução a “The Fear” (homônima e por que não sobrinha da faixa que abre o classudo e denso This is Hardcore, do Pulp), que também vira parque de diversões instrumental para a banda – desta vez numa jam puxando mais para o eletrônico.

Mas o grand finale aconteceu com um cover – e a segunda versão para “Womanizer” apresentada por Lily Allen ficou longe da primeira tentativa engraçadinha que fez ao lado de Mark Ronson no final do ano passado. Em um arranjo idêntico ao original de Britney Spears em 2009, a canção mostra sua força de chiclete robótico existindo num formato essencialmente rock (o cover do Franz também ressaltou esse aspecto) e reintegra a crítica ao “mulherengo” que batiza a faixa ao universo de Lily. E por mais que tenha ironizado o próprio sucesso em “The Fear”, ela mesma se põe ao lado de Britney Spears (nascida em 1980) para lembrar que mesmo que cantem sobre facetas diferentes de camadas distintas do século 21, ambas coexistem e atravessam situações semelhantes em escalas paralelas. E assim ela não se acanha em assumir o papel de anti-Britney – uma musa pop imperfeita por definição, ao contrário de Britney que encarou a imperfeição como um karma inevitável à condição perfeccionista. E, ao optar por ser uma resposta ao fenômeno popstar do que mais uma releitura, Lily Allen é uma das personagens mais interessantes do cenário pop atual. Ela se dispôs a atravessar o furacão de mídia, fama e celebridade para conseguir seu lugar ao sol – e até hoje vem lidando bem com o desafio. Se continuar assim, pode realmente tornar-se importante.

Un poco más de Nueva York

Olha a música com que a Lily Allen fechou seu último show da turnê deste ano nos EUA:

E a menina é uma popstar nata: além de boa compositora pop fica o tempo todo fazendo brincadeiras com o público, falando besteira sem se preocupar com pose, fumando cigarros e bebendo vinho, enquanto escancara suas relações pessoais em canções. Seus dois primeiros discos são mais importantes do que os últimos quinze anos da carreira de Madonna e ela prova isso no palco.

Tem mais vídeos lá na TV Trabalho Sujo, pra quem estiver a fim de ver.

Já o Sonic Youth com o John Paul Jones e Takehisa Kosugi fazendo barulho como trilha sonora para a apresentação de noventa anos da sumidade da dança moderna Merce Cunningham eu não pude filmar (afinal, foi no Opera Hall do BAM e o público era tão metido a sisudo quanto o lugar). Mas, tudo bem – você não perdeu muita coisa – essa menina, filmou o que ela conseguiu, sente o drama. O espetáculo de dança em si só serviu para eu ter certeza de que dança contemporânea não é a minha praia mesmo – embora o bom e velho SY tenha feito o ruído necessário para valer o preço do espetáculo. A Kim até cantou…


Agradecendo o público: os bailarinos, o coreógrafo (na cadeira de rodas), o Sonic Youth (vestidos que nem gente), Kosugi (à esquerda, de suspensórios) e John Paul Jones (à direita, de suspensórios)

Enquanto não volto à ativa (4 de maio, hein…), fiquem com a cobertura que o Bruno está fazendo do Coachella, com os cartuns que o Arnaldo fez pro G1 e que pouca gente viu e com a carta que o Mini escreveu para os anos 90. E você já baixou o disco do Dodô? Que achou, hein?