A comissão de música da Associação Paulista dos Críticos de Arte, da qual faço parte, revelou nesta semana, os indicados às principais categorias da premiação neste ano. Devido ao ano estranho que atravessamos, reduzimos a quantidade de premiados, focando nas categorias Artista do Ano, Revelação, Melhor Live e Disco do Ano. Além de mim, também fazem parte da comissão Adriana de Barros (editora do site da TV Cultura e colunista do Terra), José Norberto Flesch (do canal JoseNorbertoFlesch), Marcelo Costa (Scream & Yell), Pedro Antunes (colunista do UOL e Tem um Gato na Minha Vitrola) e Roberta Martinelli (Radio Eldorado e TV Cultura). A escolha dos vencedores deve acontecer de forma virtual no dia 18 de janeiro. Eis os indicados às quatro principais categorias:
Os 5 artistas do ano
Caetano Veloso
Emicida
Luedji Luna
Mateus Aleluia
Teresa Cristina
Os 5 artistas revelação
Flora – A Emocionante Fraqueza dos Fortes
Gilsons – Várias Queixas
Guilherme Held – Corpo Nós
Jadsa e João Milet Meirelles – Taxidermia vol 1
Jup do Bairro – Corpo sem Juízo
As 5 melhores lives
Arnaldo Antunes e Vitor Araujo (03/10)
Caetano Veloso (07/08)
Emicida (10/05)
Festival Coala – Coala.VRTL 2020 (12 e 13/09)
Teresa Cristina (Todas as Noites)
Os 50 melhores discos
Àiyé – Gratitrevas
André Abujamra – Emidoinã – a Alma de Fogo
André Abujamra e John Ulhoa – ABCYÇWÖK
Arnaldo Antunes – O Real Resiste
Baco Exu do Blues – Não Tem Bacanal na Quarentena
Beto Só – Pra Toda Superquadra Ouvir
BK – O Líder Em Movimento
Bruno Capinam – Leão Alado Sem Juba
Bruno Schiavo – A vida Só Começou
Cadu Tenório – Monument for Nothing
Carabobina – Carabobina
Cícero – Cosmo
Daniela Mercury – Perfume
Deafkids – Ritos do Colapso 1 & 2
Djonga – Histórias da Minha Área
Fabiana Cozza – Dos Santos
Fernanda Takai – Será Que Você Vai Acreditar?
Fran e Chico Chico – Onde?
Giovani Cidreira e Mahau Pita – Manomago
Guilherme Held – Corpo Nós
Hiran – Galinheiro
Hot e Oreia – Crianças Selvagens
Ira! – Ira
Joana Queiroz – Tempo Sem Tempo
Jonathan Tadeu – Intermitências
Josyara e Giovani Cidreira – Estreite
Julico – Ikê Maré
Jup do Bairro – Corpo sem Juízo
Kiko Dinucci – Rastilho
Letrux – Letrux aos Prantos
Luedji Luna – Bom Mesmo É Estar Debaixo D’água
Mahmundi – Mundo Novo
Marcelo Cabral – Naunyn
Marcelo D2 – Assim Tocam Meus Tambores
Marcelo Perdido – Não Tô Aqui Pra Te Influenciar
Mateus Aleluia – Olorum
Negro Leo – Desejo de Lacrar
Orquestra Frevo do Mundo – Orquestra Frevo do Mundo
Pedro Pastoriz – Pingue-Pongue com o Abismo
Rico Dalasam – Dolores Dala Guardião do Alívio
Sepultura – Quadra
Seu Jorge & Rogê – Seu Jorge & Rogê
Silvia Machete – Rhonda
Tagua Tagua – Inteiro Metade
Tantão e os Fita – Piorou
Tatá Aeroplano – Delírios Líricos
Thiago França – KD VCS
Wado – A Beleza que Deriva do Mundo, mas a Ele Escapa
Zé Manoel – Do Meu Coração Nu
É oficial: Festa-Solo agora acontece sempre às sextas. Esta foi a edição surpresa que marcou a mudança.
Arctic Monkeys – “Do I Wanna Know?”
Radiohead – “Daydreaming”
Sonic Youth – “Incinerate”
Postal Service – “Such Great Heights”
Grandaddy – “The Crystal Lake”
Girls – “Honey Bunny”
!!! – “Heart of Hearts”
LCD Soundsystem – “One Touch”
Cut Copy – “Hearts on Fire (Holy Ghost Remix)”
Daft Punk – “Get Lucky (Drop Out Orchestra Edit)”
Miami Horror – “Love Like Mine”
Modjo – “Lady (Kaytranada Remix)”
Music Go Music – “Warm in the Shadows”
Lana Del Rey – “Blue Jeans (Penguin Prison Remix)”
Funkadelic – “One Nation Under a Groove”
Pink Floyd – “Money”
Temptations – “Papa was a Rolling Stone”
Bob Dylan – “The Man In Me”
Big Star – “The Ballad of El Goodo”
David Bowie – “Young Americans”
Queen – “Don’t Stop Me Now”
Portishead – “All Mine”
Massive Attack – “Unfinished Sympathy”
Stevie Wonder – “I Wish”
Scissor Sisters – “Laura”
Rádio Taxi – “Garota Dourada”
Tulipa Ruiz – “Prumo”
Pepeu Gomes – “Sexy Yemanja”
Rita Lee – “Mamãe Natureza”
Sandra de Sá – “Olhos Coloridos”
Daft Punk – “Lose Yourself to Dance”
Haim – “The Steps”
Fleetwood Mac – “Dreams”
Fiona Apple – “Shameika”
Alanis Morrissette – “Ironic”
Smashing Pumpkins – “1979”
Cure – “One Hundred Years”
Joy Division – “Transmission”
Fellini – “A Melhor Coisa Que Eu Fiz”
Pedro Pastoriz – “Janela”
O último Festa-Solo de agosto está aqui – e nesta segunda rola o primeiro de setembro lá no twitch.tv/trabalhosujo, a partir das às 21h.
Stranglers – “Golden Brown”
Washed Out – “Too Late”
Boogarins – “Água”
Cut Copy – “Like Breaking Glass”
Ladyhawke – “Paris is Burning”
Kaytranada + Kali Uchis – “10%”
Prince – “1999”
LCD Soundsystem – “One Touch”
Knife – “We Share Our Mother’s Health”
Tame Impala – “Nothing That Has Happened So Far Has Been Anything We Could Control”
Doors – “Horse Latitudes” / “Moonlight Drive”
Mutantes – “Caminhante Noturno”
Sérgio Sampaio – “Não Tenha Medo Não (Rua Moreira 64)”
Ana Frango Elétrico – “Promessas e Previsões”
Negro Leo – “Eu Lacrei”
Billie Eilish – “My Future”
Daft Punk – “Giorgio by Moroder”
Evinha – “Esperar pra Ver (Poolside & Fatnotronic Edit)”
Can – “Vitamin C”
Stereolab – “Metronomic Underground”
Kavinsky + Lovefoxxx – “Nightcall”
Mahmundi – “Nova TV”
Pelados – “O Fim”
Pedro Pastoriz – “Janela”
Tatá Aeroplano – “Deusa de 67”
Tika + Kika + João Leão + Igor Caracas – “Astronauta”
Bob Dylan – “Black Rider”
Jenny Lee – “I’m So Tired”
Michael Stipe + Big Red Machine – “No Time For Love Like Now”
Whitest Boy Alive – “Serious”
Michael Jackson – “Rock With You”
Madonna – “Lucky Star”
Marcos Valle – “Estelar”
Marina Lima – “Fullgás”
Lana Del Rey – “Blues Jeans (Penguin Prison Remix)”
Lipps Inc. – “Funkytown”
Lincoln Olivetti & Robson Jorge – “Eva”
Autoramas – “Garotos II”
Sharon Van Etten + Josh Homme – “(Whats So Funny Bout) Peace, Love and Understanding”
O Sesc Pinheiros está começando um projeto chamado Radar Sonoro, que irá registrar a movimentação da música brasileira durante a quarentena de 2020. O projeto trará textos e vídeos que dissecam como anda nossa produção nesta época tão estranha e para inaugurar a série, me chamaram para escrever um panorama de como foram estes primeiros quatro meses de clausura e como artistas de diferentes cidades e gêneros musicais estão conseguindo trabalhar neste período. Escrevi sobre esta intensa quarentena e pincei vinte artistas que lançaram seus trabalhos desde que entramos neste estado de suspensão. Confere lá no site do Sesc. E na sexta, às 11 da manhã, entrevisto o Felipe S., do Mombojó, sobre seu disco Deságua, cujos planos de lançamento tiveram que ser redesenhados por conta da pandemia.
O grupo instrumental Música de Selvagem encerra o ciclo de seu disco Volume Único, seu disco de 2018 que contou com a participação de Tim Bernardes, Luiza Lian, Sessa e Pedro Pastoriz como vocalistas convidados ao lançar, em primeira mão no Trabalho Sujo o registro que fizeram da única vez que os quatro tocaram ao mesmo tempo, na sala Adoniran Barbosa do CCSP, quando eu era curador de música de lá.
São quatro vídeos em que cantam músicas compostas pelos vocalistas convidados: Sessa canta sua “Música”, Luiza vai de “Dois Blocos” (que mistura suas “Cadeira” e “Tem Luz (Úmido V)”), Pedro Pastoriz canta “Assovio” e o vocalista do grupo O Terno canta “Morto”. Os quatro são acompanhados pelos músicos do grupo, o baixista Arthur Decloedt, os saxofonistas Filipe Nader e Oscar “Cuca” Ferreira, o baterista Guilherme Marques e o trumpetista Amilcar Rodrigues.
“Esse show foi o único show que fizemos com os quatro compositores convidados durante esses dois anos de vida do disco”, me explica o baixista Arthur. “É realmente muito difícil juntar todo mundo, principalmente por conta das agendas, por isso a gente fez alguns shows com somente alguns convidados. O fato de ter todos os quatro fez desse show muito especial, ainda por cima porque ele rolou em um verdadeiro templo da música de São Paulo, que é a sala Adoniran Barbosa do CCSP.”
Ele antecipa que o grupo está começando a preparar o sucessor deste álbum, batizado de O Pensamento Selvagem, que ainda está sendo discutido por seus integrantes em videoconferências durante essa interminável quarentena. “Ainda estamos definindo as bases, mas já posso adiantar que teremos a participação da artista sonora Luísa Puterman e da cantora Inés Terra. Estamos buscando incessantemente fazer algo que ainda não fizemos como grupo”, conclui Arthur.
Alegria que o grande Pedro Pastoriz finalmente vê seu Pingue-Pongue com o Abismo ver a luz do dia, três meses depois da data que havíamos pensado originalmente, em abril, devido, claro, à quarentena e à pandemia. Neste processo, com o qual trabalho venho trabalhando como diretor artístico do lançamento junto ao cantor e compositor gaúcho, repensamos como o disco poderia ser apresentado nos meses seguintes e Pedro começou a explorar outros caminhos longe do palco, especialmente a partir de entrevistas Linha Cruzada feitas através Instagram ou do programa de humor Comitê. Tais ações conversam com o clima onírico e inquieto do disco, qualidades que parecem contraditórias mas que, a partir dos novos horizontes enxergados por Pedro, é um saque com efeito contra as expectativas. Abaixo, o release que escrevi para o lançamento, que foi produzido pelos mesmos músicos que o acompanham no disco (Arthur Decloedt, do Música de Selvagem, e Charles Tixier, produtor que trabalha com Luiza Lian) e ainda conta com participações de Fausto Fawcett, Lydia Del Picchia e Tomas Oliveira. Discão.
Pingue-Pongue com o Abismo é um lugar imaginário, uma metrópole de papelão, uma tarde ensolarada numa paisagem cinzenta, um brinquedo sério. Como em seus discos anteriores, Pedro Pastoriz condensa sensações e situações em canções que soam como crônicas, contos ou conversas, que descrevem relacionamentos, memórias e ansiedades. Mas neste terceiro álbum, o cantor e compositor gaúcho, que também é vocalista do Mustache e os Apaches desbrava fronteiras conceituais e invade outros territórios narrativos, como a poesia, a publicidade, o teatro, a comunicação institucional, a auto-ajuda, o jingle, o rap, o esquete de comédia e outras possíveis formas de texto musicado que nunca havia cogitado em seus discos anteriores, num disco influenciado por outras disciplinas, por acontecimentos pessoais e seu próprio subconsciente. É um salto que consolida sua carreira solo e aumenta seu espectro de atuação para muito além da canção.
O título – meio niilista, meio dadaísta – foi emprestado de uma referência do poeta beat Allen Ginsberg a uma de suas inspirações, o escritor Carl Solomon, tema da terceira parte de sua obra mais importante, Uivo, a quem ele dedicou todo o poema. Seu trabalho foi reunido pela primeira vez no meio dos anos 60 em dois livros, Mishaps, Perhaps (1966) e More Mishaps (1968), que formaram a base de seu único livro publicado no Brasil, De Repente Acidentes (lançado em 1989). Ginsberg citava-o nominalmente na terceira parte de Uivo (“I’m with you in Rockland / where you scream in a straight jacket that you’re losing the game of the actual ping pong of the abyss”, “Estou contigo em Rockland / Onde você grita numa camisa-de-força que está perdendo o jogo do verdadeiro pingue-pongue com o abismo”) e esta imagem, além de outras levantadas por este livro, grudou no inconsciente de Pedro desde que ele o conheceu, ainda em sua adolescência, quando apaixonou-se pela obra a ponto de andar com ela para cima e para baixo e ser reconhecido como seu leitor apaixonado.
A lógica daquele livro renasceu no fazer deste terceiro disco e sua apresentação não-linear, com textos de diferentes tamanhos, humores e intensidades, funcionou como inspiração inconsciente para seu novo álbum, principalmente na utilização de vinhetas, pedaços de textos musicados que não chegam a se tornar canções, acentuando a natureza polifônica do disco.
Outra influência crucial foi a mutação da banda que o acompanhou em seu disco anterior, Projeções (2016). Originalmente um quarteto formado por Pedro, o baixista Arthur Decloedt (Música de Selvagem), o guitarrista Artur Vac (Grand Bazar) e o vocalista do grupo O Terno, Tim Bernardes, fazendo as vezes de baterista, ela passou por duas mudanças de formação que trouxeram o produtor Charles Tixier (Luiza Lian) para a bateria, metamorfoseando o quarteto em um novo trio, que ainda contava com Arthur e Pedro.
Foi este trio que decantou o repertório escolhido para o disco, enxugando bastante o número de canções e materializando as vinhetas a partir das ideias que o autor tinha de outros formatos musicais. A improvável união de violão, contrabaixo elétrico e MPC firmou-se durante as gravações no estúdio Canoa, sob os auspícios do produtor Gui Jesus Toledo, grande entusiasta do trabalho de Pedro e sócio do selo RISCO, que apostou nessa aventura. Juntos, Pedro, Arthur e Charles, que também produziram o disco, passearam por outros instrumentos, tocando synths, mellotrons, teclados de baixa fidelidade, harpa paraguaia, fazendo colagens, usando samples e enfileirando efeitos sonoros, criando esse lugar mental ao mesmo tempo verdadeiro, artesanal e artificial. Todas as vozes são de Pedro Pastoriz.
Durante a produção, Pedro soube da morte da sua mãe e a perda inevitavelmente abalou o disco – e sua cabeça. Em pouco tempo, ele viu-se num lugar em que espiritualidade, meditação, luto, misticismo e saudade misturavam-se de forma tão díspar e sintética quanto a linguagem que estava desenvolvendo para o disco. Isso não tirou o disco do prumo, e sim acentuou sua natureza plural, forçando Pedro a um amadurecimento artístico que não previa, mas que consolida-se no resultado, cuja sonoridade parece o tempo todo muito familiar e incomum.
Neste processo, Pedro entrou num buraco de minhoca que o lançou de volta à sua adolescência e passou a buscar respostas racionais para seu drama pessoal em diferentes fontes: a meditação, a psicologia, a espiritualidade e a arte foram veículos nesta busca infrutífera, que só foi render algo quando Pedro regurgitou tudo aquilo em seu inconsciente. Pingue-Pongue com o Abismo é um disco que foi composto quase todo em sonhos.
“Eram sonhos loucos que ressignificavam todas as informações de um jeito improvável, absurdo, geralmente beirando a comédia”, lembra Pedro, citando como o texto de Freud “Recordar, Repetir, Elaborar” parece ter originado um sobre um serviço que encenava memórias antigas com atores em um palco, tema de uma das canções. Neste processo, houve a constatação de que a repetição funcionava como uma prisão, uma dificuldade de se quebrar um comportamento, um vício, um hábito – e o disco passou a ser encarado como o desafio de sair deste loop.
De sonoridade ímpar, Pingue-Pongue com o Abismo é tanto um disco de variedades da metade do século passado quanto uma colagem pós-moderna no início do século 20 e uma provocação conceitual aos limites da canção neste novo século. Usando a repetição como conceito e tentando, paradoxalmente, não se repetir, ele passeia por baladas idílicas, chavões, levadas latinas, timbres retrô, frases assobiáveis, refrães pegajosos, instrumentos improváveis, copy and paste absurdistas, palavras de ordem, mensagens subliminares e propagandas surreais. As presenças da atriz Lydia Del Picchia, do poeta Fausto Fawcett e do tocador de taças Tomas Oliveira soam tão improváveis quanto familiares fazendo o disco aprofundar o cancioneiro de Pedro para além da linhagem trovadora que atravessou seus dois discos, criando um universo sonoro próprio, jocoso e introspectivo, irônico e minimalista, melancólico e palhaço, expondo contradições que descortinam um novo compositor, pronto para iniciar uma nova fase de sua carreira.
Pingue-Pongue com o Abismo, por Pedro Pastoriz
“Dolores”
“Foi uma das primeiras do novo repertório, fiz a melodia dela no quarto de um hotel no Rio de Janeiro em uma noite tocando assistindo TV sem volume. Foi uma busca de tentar reproduzir aquele mundo praiano pintado em aquarela, uma espécie de mundo da doçura do Harry Belafonte, do Henri Salvador, e aquela coisa das harpas bolivianas do Pájaro Campana, que Charles conseguiu traduzir na maestria, com harpas sintetizadas. A letra fala de uma maneira naïf de alguém que se foi sem avisar e deixou pra trás memórias e objetos, algo que pode ter relação com os dias que vivi arrumando as coisas da minha mãe depois de sua morte. Foram dias que fiquei sozinho em sua casa, li cartas e abri caixinhas de uma pessoa que eu amava tanto, e que pude conhecer ainda mais enquanto organizava esses objetos. “
“Fricção”
“Começamos a tocá-la no início da ser turnê do Projeções, meu disco anterior, ainda com Tim na bateria e Vac na guitarra. A intenção é que ela tivesse essa coisa cool francesa, meio Françoise Hardy, um tanto Burt Bacharach. Um ponto alto são as linhas vertiginosas de baixos do Arthur e as taças, instrumento criado e tocado pelo meu parceiro de Mustache e os Apaches, Tomas Oliveira.”
“Sessão das Sete”
“Foi a música que veio por último. Eu e minha namorada, Talita, pegamos algumas sessões das sete em semanas seguidas no Belas Artes e isso me lembrou uma época dos meus 20 anos lá em Porto Alegre, onde tinha esse hábito semanal de ir no cinema. Achei que precisava puxar esse clima pro disco, e ela tem essas referências de uma noite que parece que já foi vivida, de um filme que já foi visto. Me surpreendi com a combinação dos arranjos com os elementos que pintaram, usei um violão de 12 cordas nessa música, e achei que casou com o MPC do Charles, a sonoridade ficou bem nova pra mim.”
“Chicletes Replay”
“Essa música foi feita a partir de um poema curtinho que tinha escrito, em uma volta de show na madrugada, dia nascendo. Deixei uma cidade na noite anterior, dormi na van depois de um show, dormi, acordei naquela solidão ancestral e contemplativa de quem viaja no escuridão de uma estrada no meio da noite. Dormi de novo, sonhei profundamente, acordei no susto, parei em um posto, voltei pra estrada. E chegando na cidade tive essa revelação de como as coisas se repetem consecutivamente desde sempre – grandes manchetes, possíveis novos finais de mundo, novas eleições, novas promessas de esperança, que é justamente o que possibilita que as coisas continuem sendo como são. Acredito que em Roma ou na China antiga as coisas e os sentimentos e as expectativas eram muito parecidas com as de agora. Os personagens e as ações estão aí desde sempre, e a gente se limita com essas cobranças complicadas e repetidas de apego a uma identidade, uma história que a gente imagina serem únicas, essas coisas. Ela tem esse discurso publicitário e traz esse produto que promete unir histórias tão dissonantes, experiências de vida tão diferentes a partir do consumo de algo fácil, rápido e descartável, um chiclete. Foi uma música feita em sonho, em parte. “
“Lydia Réplica”
“Nós e Outros foram duas peças que vi no ano passado e que me pegaram muito. Vi mais de uma vez e levei caderninhos pra anotar várias coisas, no escuro do teatro. Depois de algum tempo achei as anotações e eram totalmente incompreensíveis. As duas peças são uma parceria do Grupo Galpão de Minas Gerais, com o diretor Márcio Abreu. Nós tem elementos de repetição no texto, quase um remix de palavras, e uma história de despedida amarga e engraçada, e queria trazer isso pro disco de alguma forma. Então convidei a Lydia Del Picchia, diretora e atriz do Grupo, pra participar e “remixar” um texto comigo, uma réplica / reprise / continuação de Chicletes Replay. E foi de primeira, fácil como descobri que as coisas podem ser.”
“Alzira”
Quando componho uma música raramente falo da minha vida pessoal de forma direta, pelo menos. E essa música saiu espontaneamente, é sobre minha mãe. Tinha uma conexão muito forte com ela, e durante os meses de composição pra esse disco eu tinha muita dificuldade de sentar pra compor. As idéias vinham em sonhos, quando meu superego cochilava. Minha mãe morreu um acidente de carro, e muita coisa mudou na minha vida, noites ficaram muito longas e dias muito curtos. Essa música eu levei num ensaio já me desculpando, achando que não devia entrar e que gostava mais da melodia, algo assim. E foi Charles quem me falou: ‘justamente por ser uma história tão pessoal que tu deveria cogitar trazer ela pro repertório, pensa nisso’. Acho que se eu quisesse escrever uma música pra uma coisa tão forte e tão complexa, iria querer florear demais. E isso é impossível, então aceitei essa música como ela veio, porque é importante pra mim.”
“Cachorro Replay”
“Essa vinheta fala por si, do meu animal com o animal em si.”
“Janela”
“Na rua onde eu moro – ou melhor, na rua onde minha janela está presa – conheço quase todos os personagens, vendedores das lojas de música, algumas pessoas que esperam o ônibus barulhento sempre na mesma hora, alguns casais reincidentes que brigam na entrada do hotel, um sujeito que entrega água de bicicleta e todos os dias desce o pequeno declive com uma excitação admirável, gritando: ‘Eu vou morrer, eu vou morrer!’ Todos gritam, aplaudem, jogam qualquer tipo de energia de volta pra esse sujeito. E são raros os momentos, infelizmente, que eu desejo ver essas pessoas. Então geralmente fumo um cigarrinho e ouço um som ao final do dia, quando as pessoas já voltaram pra casa. Essa música foi feita em um desses, dias, um exercício de composição. Fumava meu cigarrinho e olhava pra rua, e assisti alguém que ficou embaixo da minha janela, excessivamente imóvel, uma figura híbrida de existencialismo e alienação total, o que me sugeriu muitas possibilidades possíveis pro futuro e pro passado daquela pessoa. No final das contas é tudo um tanto de projeção, achei justo ela estar no disco.”
“Replay Esportes”
“Li sobre budismo e espiritismo e outros ismos, seguindo a vida depois do trauma da perda da minha mãe. Fiquei mais tempo interessado na meditação transcendental. A idéia de ficar em silêncio, entrar em contato com os pensamentos de outra forma, e de aceitar alguns vazios que estão ali. É relativamente difícil entrar em contato com a informação do como fazer, com a prática e os exercícios. São muitos livros falando sobre os benefícios, como pode mudar sua vida. Mas não ensinam muito sobre a prática. Tem aplicativos que jogam uma ansiedade estranha na prática, com programas de metas e de desempenho, o que pra mim é o oposto de ouvir sua própria respiração e investigar o que está acontecendo em seu corpo. E em algum momento meditando voltei com essa cena do esporte de alto rendimento no abismo na meditação e uma mistura totalmente improvável de tudo isso.
“Teatro Replay”
“Fazendo terapia no ano passado, conheci um texto do Freud que fala sobre Recordar, Repetir e Elaborar, e em alguns momentos minha terapia foi em um caminho de como tendemos a repetir ações na intenção de superá-las. Racionalmente era isso. Mas então algo bem mais legal aconteceu. Sonhei com esse serviço de uma companhia de teatro que prometia ajudar as pessoas a reviverem melhores momentos de suas famílias através de atuações em um teatro, e achei que que tinha algo ali. Foi uma das primeiras músicas do disco e foi outra música feita em sonho, em grande parte.”
“Resposta sobre Hostel Replay”
“Esse é um reclame do meu disco anterior, misturado com um comercial. É também importante afirmar o que não se é.”
“Faroeste Dançante”
“Essa música é uma parceria com o Fausto Fawcett, que admiro muito e que mensalmente acompanho suas participações nos sarau Trovadores do Miocárdio. Em uma das edições levei meu exemplar do livro Santa Clara Poltergeist pra ele e disse que estava fazendo uma música que eu estava tentando emular algo Fausto Fawcett. Ele riu e me falou pra mandar a música pra ele. O processo foi fácil, todo a distância. Foi minha primeira parceria com outro letrista, ouço e ainda fico maravilhado com a idéia de ter um fonograma com o man. Tem um solo de MPC cabuloso do Charles, eu uso um violão de 12 cordas nessa faixa, e Arthur toca um controlador synth bass.”
“Sol”
“Essa veio de um desses exercícios de meditação, tem qualquer coisa de influência naquela linguagem do Instituto Dharma, do seriado Lost.”
“Boogaloo”
“Essa música era uma das preferidas do público na turnê de 15 shows que fiz na Alemanha em setembro de 2019. Ela surgiu a partir da idéia de eu ensinar português pros alemães, formando uma grande miniorquestra junto com as palmas e os calcanhares batendo no chão. E eu gritava “Napoleão”, e eles repetiam, e eu mandava “A egiptologia!”, e eles morriam de rir com os fonemas. Ela fecha o disco, com solo de liquidificador.”
Segunda é dia de Vida Fodona ao vivo no twitch.tv/trabalhosujo, a partir das 21h – Esse foi o programa da semana passada.
Arnaldo Baptista – “Vou Me Afundar na Lingerie”
Haim – “Up From A Dream”
Blind Melon – “Three is a Magic Number”
Deee-Lite – “Good Beat”
Antonio Carlos & Jocafi – “Kabaluerê”
Wado – “Alagou As”
Mundo Livre S/A – “Bolo de Ameixa”
Def – “Alarmes de Incêndio”
Lulu – “The Man Who Sold The World”
Video Hits – “(Vo) C”
Beck – “Sexx Laws”
Pedro Pastoriz – “Fricção”
Ana Frango Elétrico – “Promessas e Previsões”
Bruno Schiavo – “Orégano”
Trupe Chá de Boldo – “Jovem-Tirano-Príncipe-Besta”
Unknown Mortal Orchestra – “So Good At Being In Trouble”
Sá, Rodrix & Guarabyra – “Mestre Jonas”
Roxy Music – “Love is the Drug”
Ben Hughes – “You Stood Me Up”
Legião Urbana – “A Montanha Mágica”
Sexy Fi – “Keep Cooler”
Imperial Teen – “Imperial Teen”
Lou Reed + John Cale – “Style it Takes”
LCD Soundsystem – “Never as Tired as When I’m Waking Up”
Lulina – “Nós”
Stereolab – “Metronomic Underground”
Gil Scott Heron – “The Revolution Will Not Be Televised”
Curtis Mayfield – “Superfly”
Bill Withers – “Everybody’s Talking”
Stevie Wonder – “All Day Sucker”
Booker T. & The MGs – “I Want You (Shes So Heavy)”
Blues Brothers – “She Caught the Katy”
Tim Maia – “Batata Frita, o Ladrão de Bicicleta”
Miguel de Deus – “Black Soul Brother”
Funkadelic – “One Nation Under A Groove”
Rapture – “Get Myself Into It”
Cut Copy – “Hearts on Fire (Holy Ghost Remix)”
Daft Punk – “Get Lucky”
No Doubt – “Hella Good”
Sister Sledge – “We Are Family”
Aretha Franklin – “Rock Steady”
Kylie Minogue – “Slow”
Queens of the Stone Age – “Make it Wit Chu”
Spandau Ballet – “True”
Chromatics – “Into the Black”
Esse não é mais ao vivo.
Led Zeppelin – “Dancing Days”
Kassin + 2 – “Bow Road”
Trupe Chá de Boldo – “Jovem-Tirano-Príncipe-Besta”
Spoon – “Don’t You Evah”
Supercordas – “Ruradélica”
The Band – “This Wheel’s On Fire”
Ava Rocha – “Mar ao Fundo”
Brockhampton – “Sugar”
Saskia – “27 Sabiás fala Brasilês”
Luiza Lian – “Sou Yabá”
Pedro Pastoriz – “Fricção”
Maglore – “Me Deixa Legal”
Red Hot Chili Peppers – “Mellowship Slinky in B Major”
Kiko Dinucci – “Desmonto sua cabeça”
Specials – “Nite Klub”
The Comet is Coming + Kate Tempest – “Blood Of The Past”
Como já disse, tenho trabalhado na direção artística do lançamento do terceiro disco do cantor e compositor gaúcho Pedro Pastoriz, Pingue-Pongue com o Abismo, que está na reta final do financiamento coletivo para bancar seu disco. E ele me chamou para participar, nesta quinta-feira, do programa de entrevistas Comitê Linha Cruzada, que está fazendo em sua conta no Instagram – e o tema da conversa é criação e inspiração. O papo acontece nesta quinta, às 16h – cola lá! Tá aí o papo com o Pedro:
Gravado no meio do ano passado, o terceiro disco do gaúcho Pedro Pastoriz, Pingue-Pongue com o Abismo, finalmente começa a ver a luz do dia. O disco, produzido por ele, Arthur Decloedt (baixista do Música de Selvagem) e Charles Tixier (que toca com a Luiza Lian), deveria ter sido lançado no mês passado, com shows em São Paulo e Porto Alegre, mas, como a maioria dos discos previstos para este período, foi adiado para um futuro próximo e só agora dá a cara a tapa.
Os trabalhos começaram com o lançamento do primeiro single, “Dolores” (abaixo), que saiu em primeira mão na Noize, e com a capa (acima), que foi revelada para o blog do jornalista Mauro Ferreira, no G1, e o disco todo deve surgir nos próximos meses.
Enquanto isso, Pedro inventou um programa semanal de comédia chamado Comitê, em que começa a explorar os temas do disco, além de abrir uma campanha de financiamento coletivo para bancar a finalização do disco. Venho trabalhando com ele há mais de um ano fazendo a direção artística deste lançamento e penamos para inventar uma nova forma de apresentar o disco, uma vez que não há previsão para o retorno dos shows. Mas Pedro tirou de letra e vem mostrando como o trabalho realmente expande seus horizontes para além da música – de cara, ele é muito engraçado. Se liga:
https://youtu.be/aV75PQpmtks