Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.
“Me lembro de passar por essa sala com um grande amigo, o artista Alex da Corte”, explica a cantora e compositora St. Vincent, falando sobre quando a inspiração para seu disco mais recente, o ótimo All Born Screaming, lhe encontrou na sala de número 67 do Museo Nacional del Prado, em Madri, na Espanha. “Entramos e nosso sangue congelou. O primeiro que foram os olhos de Saturno Devorando Um Filho; nos olhamos e dissemos: ‘Isso resume tudo'” A referida sala é o lar das famosas Pinturas Negras que o clássico pintor espanhol Francisco de Goya criou entre 1819 e 1823, quando chegou à fase final de sua vida, traduzindo em quadros ermos e desesperançosos a desilusão com a humanidade após ter visto horrores entre o final da Santa Inquisição e a Guerra Peninsular entre o Reino Unido, Espanha e Portugal no início do século 19. Para fechar o ciclo iniciado com a primeira visita da artista norte-americana àquela sala, a Radio 3 estatal espanhola a convidou para apresentar-se exatamente naquele mesmo lugar, trazendo vida às músicas criadas a partir do encontro com a desilusão de Goya com a humanidade. “Muito nessa sala me lembra da condição humana, que tem muito sofrimento, confusão, caos e violência, mas eu também acho que há muita esperança, por isso é muito emocionante está aqui no meio destas telas tocando estas músicas”. Além de três músicas do novo disco (“Hell is Near”, “Flea” e “Violent Times”, ela também tocou “Somebody Like Me”, do disco Daddy’s Home, e “New York”, do disco Masseducation. Assista abaixo:
E o Cure não só lançou um discaço nessa sexta-feira como o lançou em grande estilo – e em grande estilo Cure – ao apresentá-lo na íntegra ao vivo em uma transmissão que o próprio grupo fez pela internet no mesmíssimo dia, tocando-o na íntegra em uma apresentação realizada na casa de shows Troxy, em Londres, no Reino Unido – e deixando online para quem não pudesse assisti-la ao vivo (veja abaixo). E além de mostrar todo o novo disco com as faixas exatamente na ordem do álbum (incluindo as estreias de “Warsong”, “Drone:Nodrone” e “All I Ever Am”, Robert Smith e sua gangue ainda tocaram por mais de duas horas, enfileirando músicas antigas que vão na mesma vibe do novo disco (várias delas do irmão mais velho deste, o pilar fundamental da banda Disintegration), um bis dedicado ao disco Seventeen Seconds, que está completando 45 anos e um bis com os hits mais conhecidos da banda, como “Lullaby”, “The Walk”, “Friday I’m Love”, “Close to Me” e “Boys Don’t Cry”. O Cure nunca decepciona.
Assista abaixo à ínegra do show e veja o setlist logo depois:
Luiza Villa começou uma nova fase com estilo, força e delicadeza ao apresemtar=se neste sábado dentro da programação Ágora Zumbido, realizada pelo músico Valentim Frateschi no pequeno teatro Ágora no Bixiga. Ao encher a casa para mostrar suas canções pela primeira vez sem estar sozinha no palco, a cantora e compositora convidou as instrumentistas Marcella Vasconcellos e Yasmin Monique para acompanhá-la em quase uma hora de canções que batizou de Cartas e Segredos, título de uma de suas próprias composições que escolheu para abrir a noite, que ainda teve uma mistura de “Água” do Djavan com “Ten Years Gone” do Led Zeppelin, uma canção da baixista e tecladista Marcella (que foi para o violão e deixou Luiza assumir o baixo) e uma versão deslumbrante para “Ponta de Areia”, do Milton Nascimento, quando recebeu a violoncelista Francisca Barreto para acompanhá-la no final do show, que trouxe outra composição de Luiza, esta em inglês (chamada “These Old Chords”), na hora em que o público pediu bis. A apresentação, que dirigi ao lado da própria Villa, terminou com um coro de “Parabéns a Você” cantado para Marcella, que aniversariava naquele mesmo sábado. Uma noite feliz.
Neste sábado, às 19h, Luiza Villa começa a dar um novo passo em sua carreira solo ao lado de três instrumentistas incríveis: a arrajandora e multiinstrumentista (e aniversariante do dia) Marcella Vasconcellos, a percussionista Yasmin Monique e a violoncelista Francisca Barreto. Dei meus pitacos na direção que elas conceberam e, além de músicas novas autorais da Luiza, elas ainda mostram versões lindas de canções alheias. O espetáculo Cartas e Segredos faz parte da programação Ágora Zumbido, que acontece no Ágora Teatro, na Bela Vista. Corre e garante seu ingresso neste link, que eles estão no fim.
Saldei uma dívida deste ano: não tinha visto ao vivo ainda a dupla Kim e Dramma, formada pelo vocalista Kim Cortada e pelo baterista Quico Dramma, que lançaram um bom disco de estreia (No Ombro dos Outros) e consegui resolver isso nesta sexta-feira, no Porta Maldita, quando fizeram o segundo show desde o lançamento do álbum – e que bela surpresa. Não bastasse a ferocidade vocal e presença de palco do vocalista e os tempos quebrados e pulso firme do batera, eles ainda contam com um trio de músicos conhecido da noite paulistana que ajudaram a encorpar ainda mais o som da dupla – metade d’Os Fonsecas – o baixista Valentim Frateschi e o guitarrista Caio Colasante – e o tecladista Eduardo Barco, que dão ainda mais força pro som da dupla, levando-os para outra dimensão ao vivo. Muito bom.
Em novembro o Trabalho Sujo completa 29 anos e dou início às comemorações com compadres e comadres de diferentes épocas da minha vida discotecando comigo em uma festa num endereço icônico, quando celebro a fase final deste retorno de Saturno na emblemática Casinha, novo endereço que o Mancha – da clássica casa que levava seu nome – está fazendo festas desde o ano passado. E além do próprio Mancha, ainda tocam comigo, neste sábado, gigantes que atravessaram diferentes fases da minha vida profissional: o escultor de luz Serjão Carvalho, que viu o Trabalho Sujo nascer quando ele ainda era uma página impressa em um jornal no interior de São Paulo; a eterna musa indie Kátia Mello, o icônico Luiz Pattoli que tocava nas Noites Trabalho Sujo do Alberta e da Trackers comigo, ao lado de Danilo e Babee (que convidei mas não podem vir) e minha dupla de Desaniversário Camila Yahn. A casa fica na Rua Jorge Rizzo, 63, em Pinheiros, abre a partir das 22h e a festa atravessa madrugada adentro, apareça pra me dar um abraço e se acabar de dançar, como de praxe. Os ingressos já estão à venda neste link.
Corro dali a tempo de chegar no início da segunda sessão do dia da suíte a quatro mãos que Arrigo Barnabé e seu fiel escudeiro Paulo Braga fizeram no Tavares Club, pequeno recanto na parte superior da ótima Casa Tavares, na Vila Madalena, que recebeu o mestre dodecafônico para destrinchar sua magnus opus Clara Crocodilo em dois pianos. E entre explicações sobre a música serialista e uma recitação do primeiro canto do Inferno de Dante Alighieri traduzido por Augusto de Campos, Arrigo passeou por seu grande disco em uma sessão ao mesmo tempo intimista e intensa.
Lindo o show que Gui Amabis fez nesta quinta-feira no Sesc Pompeia para mostrar, em grande estilo, o seu ótimo quinto disco, lançado no primeiro semestre deste ano, Contrapangeia. Escudado por dois velhos compadres cada um a seu um lado no palco – o violonista Regis Damasceno e o tecladista Zé Ruivo – ele foi acompanhado por um orquestra de câmara de 18 músicos e transpôs ao vivo o disco na íntegra, incluindo as participações de Manu Julian e Juçara Marçal, que encerrou a apresentação com a bela “Nesse Meio Tempo”, que também encerra o disco. Gui aproveitou a oportunidade única para reler naquela formação algumas músicas de discos anteriores (como “O Deus Que Mata Também Cura” de seu disco de estreia, Memórias Luso-Africanas, de 2011; e “Pena Mais Que Perfeita”, esta com Juçara, que a regravou em seu disco de estreia, e “Merece Quem Aceita”, do disco seguinte, Trabalhos Carnívoros, de 2012) e encerrou com um bis com uma versão deslumbrante para “Graxa e Sal”, de seu terceiro álbum, Ruivo em Sangue, de 2015, e fez todo mundo sair flutuando.
Em mais um programa dissecando as maravilhas de se assistir música ao vivo, eu e Levino desta vez chamamos o compadre Camilo Rocha, que entre lembranças de raves, apresentações de DJs e de artistas de música eletrônica, que é seu métier, voltou-se para uma lembrança afetiva indie, quando assistiu ao show do The Cure no Brasil ainda nos anos 80.
Atenção que Nina Maia acaba de lançar um dos melhores discos de 2024. Inteira resume sua pesquisa musical, entre experimentos sônicos, disciplina erudita e alma brasileira, e sua autoanálise artística, mergulhando em sentimentos, incertezas e inquietações num disco conciso e enxuto, que conversa tanto com os singles que já havia lançado quanto com um espaço musical pleno e minimalista, que faz surgir em seu álbum de estreia. E o show de lançamento acontece neste domingo no Sesc Avenida Paulista e tem tudo para estar à altura do disco.