Diferente do show de Emicida em homenagem a Cartola, a noite do projeto 74 Rotações que teve O Terno recriando o clássico Lóki? de Arnaldo Baptista foi mais reverente do que inventiva, mas tanto a banda quanto o disco requeriam aquele tipo de apreciação.
Para começar, Lóki? não é só um apanhado de canções românticas, é um disco-sentimento em que Arnaldo Baptista jorrava toda seu coração em música. É fácil imaginar que as canções que hoje consideramos clássicas são partes de um fluxo de consciência emocional contínuo, como pode ser observado a partir das jam sessions registradas no primeiro disco dos Mutantes sem Rita Lee, O A e o Z, que só foi lançado nos anos 90. O que Arnaldo Baptista cantasse enquanto tocava seus teclados – piano ou elétrico – naquela época fazia parte de uma enorme canção em sua cabeça – canção esta que se desracionalizou completamente quando sentiu o baque de perder Rita Lee e compôs/gravou Lóki? O disco é um misto de Astral Weeks com Madcap Laughs e uma pitada do mítico Smile, um disco confessional, extremamente pessoal e gravado nos limites da emoção. Por isso qualquer tentativa de recriá-lo corre o risco de soar falso ou sem sentimentos.
Daí a importância d’O Terno optar pela reverência, tocando as músicas quase literalmente como no disco, incluindo aí a ordem das faixas. A outra barreira frente ao show do sábado passado é que Lóki? é um disco composto e tocado ao piano, enquanto o trio paulistano não conta com o teclado em sua formação. Por isso quando as cortinas se abriram e o guitarrista Tim Bernardes estava sentado frente a dois teclados a responsabilidade do grupo pareceu ter aumentado a dificuldade: será que Tim era tão desenvolto no piano quanto na guitarra? E apesar da resposta negativa isso não foi propriamente um problema. Primeiro porque ele manteve-se firme na base das canções, sem tentar nenhum malabarismo instrumental que talvez não pudesse alcançar – este era espertamente dividido com o baixista Guilherme d’Almeida, que percorria linhas melódicas de tirar o fôlego (tocadas originalmente por Liminha, talvez o melhor discípulo de Arnaldo no baixo). No meio, o baterista Victor Chaves ajudava a acertar o clima das canções, por vezes como um Keith Moon (ou Dinho Leme, como seria mais apropriado) endiabrado, por outras clássico e discreto como Charlie Watts ou Ringo Starr.
Mas Tim não ficou só nos teclados nem a banda ficou só no fac-símile. Um dos momentos mais interessantes do show foi quando “Honk Tonk” (escrita e tocada originalmente apenas no piano) virou um rock pesado instrumental tocado pelo power trio ensandecido que é O Terno – emendando abruptamente na quase faixa-título (reforçando o fato de que a banda é da era do CD e atropelou a clássica virada do lado A pro lado B). Quando ia para a guitarra, Tim emulava a guitarra tropicalista Sérgio Dias e Lanny Gordin com a alavanca do instrumento e notas estridentes, numa evidente saudação aos mestres. Até na letra ele arriscou uma brincadeira, quando, em “Será Que Eu Vou Virar Bolor?”, trocou Alice Cooper por Arctic Monkeys, adaptando perfeitamente o sentimento de não-pertencimento de Arnaldo nos anos 70 para essa década de 10 (aliás, cabe um parêntese pra falar como Lóki?, como registro sentimental, ainda segue atual mesmo quando não se fala apenas em sentimento – explicitado especificamente em “Navegar de Novo” – que pensei que Tim fosse trocar “o modelo do meu carro que eu comprei só há seis meses já está fora de moda” por “o modelo do iPhone… etc.”).
O show, curtíssimo, mostrou que O Terno está pronto para viagens ainda mais loucas e encerrou com duas músicas de outros discos: “Beijo Exagerado” do último disco dos Mutantes com Rita Lee e “O Cinza” do disco que lançou esse ano. O desafio de recriar a atmosfera dentro da cabeça e do coração de um dos mestres do rock brasileiro foi cumprido à risca, com alguma (natural) tensão, mas sem deixar a bola cair. Foi quase como se o trio tivesse feito a prova do vestibular da psicodelia brasileira na frente das poucas centenas de pagantes do Sesc Santana – e visto a aprovação sair em seguida. E por mais que acertassem em diversos pontos, tiraram nota 10 no conjunto do disco, do correr da obra, na redação do show. Afinal, Psicodelia é Ciências Humanas.
Abaixo, os vídeos que fiz de todo o show, assista e deleite-se:
Um atrás do outro…
Terry Riley + John Cale – “The Protegé”
Yumi Zouma – “A Long Walk Home for Parted Lovers”
Sants + Estranho + El Mandarim- “Madruga”
Racionais MCs – “Você Me Deve”
Taylor Swift – “Blank Space”
Strokes – “Machu Picchu”
Disclosure + Eliza Doolittle – “You & Me (Flume Remix)”
André Paste + Fepaschoal – “A Calma”
Thiago Pethit – “Rock’n’Roll Sugar Darling”
Courtney Barnett – “Ode to Odetta”
O Terno – “O Cinza”
Lewis – “So Be In Love With Me”
Tops – “Change of Heart”
Alvvays – “Archie, Marry Me”
Os Gatunos – “Aquela”
Mac DeMarco – “Rock and Roll Night Club”
Spoon – “Rainy Taxi”
Alice Caymmi – “Princesa”
Céu – “Piel Canela”
Vem aqui.
Banda do Mar – “Mais Ninguém”
Ian Ramil – “Zero e Um”
O Terno – “Desaparecido”
Boogarins – “Despreocupar”
Céu – “Mil e Uma Noites de Amor”
Munk + Lizzie Paige – “Deceiver”
Flight Facilities – “Waking Bliss”
Lana Del Rey – “Brooklyn Baby (Strip Club Bootleg)”
Metronomy – “The Upsetter (Mogwai Remix)”
Teen Daze – “Reykjavik January 2015”
Chromatics – “The River”
Frank Ocean – “Memrise”
Jean-Luc Ponty – “Computer Incantations for World Peace”
Twin Shadow – “Turn Me Up”
Tourist – “Wait”
Quem vem?
Golden Boys – “Fumacê”
Bixiga 70 – “100% 13”
Orquestra Nômade – “Sonho de Tokyo”
Céu – “Visgo da Jaca”
Criolo – “Fermento pra Massa”
De La Soul + Common Sense – “The Bizness”
Strokes – “Machu Picchu”
Meghan Trainor – “All About That Bass”
Tame Impala – “Prototype”
Solange – “Losing You”
Chico Science & Nação Zumbi – “Baião Ambiental”
Marcelo Jeneci – “Sorriso Madeira”
O Terno – “Bote Ao Contrário”
Supercordas – “Sobre o Amor e Pedras”
Courtney Barnett – “Avant Gardener”
Metronomy – “I’m Aquarius”
Thurston Moore – “Forevermore”
Comecei ontem minha participação no Sim São Paulo com a palestra inaugural do evento (O Ecossistema da Música no Século 21) e sigo a tarde inteira dessa sexta-feira no Centro de Sâo Paulo, desta vez puxando outras discussões como mediador. As duas primeiras rodadas acontecem no Cine Olido: numa delas, às 14h, falo sobre jornalismo empreendedor ao lado da Bianca Freitas (do Club NME Brasil) e do Marcelo Costa (do Scream & Yell); na seguinte, às 15h30, converso sobre assessoria de imprensa e mídias sociais com Cassio Politi (da Tracto Content), Francine Ramos e Natalia Birkholz (da Inker), Larissa Marques (da Lema) e Piky Candeias (da Batucada). Depois, a partir das 17h é na Praça das Artes, quando converso sobre rádios com Patrick Torquato (Rádio Frei Caneca FM), Ricardo Rodrigues (do Festival Contato) e Roberto Maia (da 89 FM), e, finalmente, termino o dia a partir das 19h, batendo um papo com o China, a Irina Bertolucci (do Garotas Suecas), Karina Buhr, Thiago Pethit e Tim Bernardes (d’O Terno), para falar do ponto de vista do artista sobre essa história toda. Para saber mais informações sobre o Sim São Paulo, basta entrar no site do evento.
Demorei mas tô aqui.
Frank Ocean – “Memsize”
Gorillaz – “Feel Good Inc. (James Blake Remix)”
Les Sins + Nate Salman – “Why”
Warpaint – “Disco/Very”
Pipo Pegoraro – “Aiye”
Taylor Swift – “Blank Space”
Racionais MCs – “Você Me Deve”
Eminem – “Lose Yourself (Demo Version)”
Criolo – “Esquiva de Esgrima”
Flying Lotus + Captain Murphy + Snoop Dogg- “Dead Man’s Tetris”
Aphex Twin- – “PAPAT4 (pineal mix)”
Tame Impala – “Sestri Levante (Live Versions)”
O Terno – “Medo do Medo”
Ty Segall – “It’s Over”
Courtney Barnett – “Avant Gardener”
Giancarlo Ruffato – “Ele”
Thurston Moore – “Tape”
Eric Clapton – “For Jack”
Emicida tocando o primeiro disco do Cartola, O Terno tocando o Lóki? de Arnaldo Baptista na íntegra, os Sebosos Postizos mandando ver todo o Tábua de Esmeralda do Jorge Ben e Luciana Alves e o Marco Pereira Trio visitando todo o Elis & Tom. Eis o cardápio do programa 74 Rotações, terceira edição do projeto do site Radiola Urbana que começou homenageando 1972 em 2012 (com Romulo Fróes fazendo o Transa de Caetano Veloso, Felipe Cordeiro tocando o Expresso 2222 do Gil, entre outros) e no ano passado deu origem a shows que percorreram o país como Karina Buhr tocando o primeiro dos Secos & Molhados, o Cidadão Instigado tocando o Dark Side of the Moon do Pink Floyd e a Céu interpretando o Catch a Fire do Bob Marley. A terceira edição acontece entre os dias 18 e 21 de dezembro no Sesc Santana e os ingressos custam R$ 40 (inteira), R$ 20 (meia) e R$ 8 (comerciário). Bati um papo com o bróder Ramiro Zweitsch, do Radiola, sobre a edição 2014 do festejado projeto.
Como foi que vocês começaram a fazer os projetos para 1974?
Bom, começamos pensando nos discos e percebemos logo que era um ano muito forte de música brasileira: Elis & Tom, Tábua de Esmeralda, Cantar, o primeirão do Cartola, Canta, Canta Minha Gente, Gitã, Lóki? etc. Pensamos em alguns gringos, tipo Authoban e Diamond Dogs mas acabamos decidindo por focar nos brasileiros já que o projeto vem se transformando de um ano para o outro: em 2012 eram 8; em 2013 reduzimos para 4, entre gringos e brasucas; neste ano, 100% Brasil; e no ano que vem queremos muito fazer 65 e 75, vontade essa que a gente já tinha de ter aplicado em 2014 – com shows de discos de 64 -, mas simplesmente não rolou. Tivemos de descartar o Martinho da Vila por conta do show que o Otto vem fazendo desde janeiro e o do Raul Seixas também acabou gerando um outro projeto recentemente. O Cantar a gente queria fazer com a Tulipa, mas ela sabiamente declinou do convite por achar que é o tipo de show que a própria Gal poderia e pode vir a fazer. Fechamos nestes 4 que desenham um panorama interessante da diversidade da música brasileira de 40 anos atrás: a estreia fonográfica de um dos nossos maiores sambistas, o encontro entre aqueles que podem ser considerados nossa maior cantora e nosso maior compositor, um inspiradíssimo disco de rock pós-tropicália e o auge criativo de Jorge Ben — talvez o artista mais cultuado pelas últimas gerações da nossa música (90’s, 00’s, 10’s).
Como foram os convites? Alguém já tinha procurado vocês ou foram vocês que convocaram os músicos?
Fomos procurados por alguns artistas a fim de participar do projeto, mas nenhum deles propôs um disco. Eles escreviam pra gente com mensagens tipo: “pô, o projeto é demais, me convida”. São duas cartas que estão na manga para os próximos anos. Esses nomes que fechamos para 2014 foram todos convidados por nós e aceitação foi imediata da parte deles. O Emicida é um cara que a gente admira muito, que já vem experimentando uns formatos diferentes de apresentação e apostamos que ele vai arrebentar nesse esquema de cantar as melodias lindas do Cartola. A Luciana é uma cantora muito talentosa, que circula mais pelo universo da MPB e não tem nada de pop. Ela vai fazer o show com o Marco Pereira Trio, formado por grandes músicos. O Terno a gente já queria ter envolvido no ano passado, mas eles recusaram nosso convite em fazer Eu Quero Botar o Meu Bloco na Rua, do Sérgio Sampaio, por conta do foco deles em trabalhar nas próprias músicas naquele momento. Os Sebosos já fazem boa parte do repertório de A Tábua de Esmeralda e a escolha era até meio previsível. Vai ser massa porque é um disco amado por todos e foi, inclusive, eleito o melhor de todos os tempos em uma “eleição” que fizemos em 2008 na Radiola. Fora que o próprio Jorge Ben chegou a dar sinais de que poderia fazer esse show e por enquanto necas.
Como vocês se veêm como responsáveis por inspirar projetos paralelos de artistas que admiram, como a Céu, a Karina e o Cidadão – todos incorporando os shows do projeto em turnês específicas?
Ah, sentimos muito orgulho, né? É uma sensação boa de que fizemos as escolhas certas. No caso do Cidadão, a experiência foi quase transcendental, reacendeu meu amor pelo Pink Floyd inclusive. O show da Céu rendeu pacas e ficou também muito clara a afinidade dela com aquele repertório. Os shows da Karina e do Fred 04 também tiveram seus desdobramentos e a gente nunca poderia imaginar que interferiria de alguma forma nas carreiras desses dois artistas que a gente admira desde os primeiros suspiros do mangue beat.
E pra 1975, quais são os grandes discos na mira?
E aí, sugere algum pra gente? Pensamos em Fruto Proibido, Horses, Expensive Shit, Estudando o Samba… Se virar 65, temos planos malignos e infalíveis para A Love Supreme, Coisas, Highway 61 Revisted…
Pra quem não acompanha meu trabalho, há dois anos eu, o Bruno, o Pedro e o Dudu fazemos consultoria para o Prêmio Multishow de Música Brasileira. Desde o primeiro ano sabíamos que nosso trabalho precisava ser lento para ser duradouro e não podia ser brusco para manter a audiência. Então aos poucos fomos sugerindo atrações e abordagens diferentes de forma que a cada ano conseguíssemos dar pequenos passos reconhecíveis para o público do canal.
A primeira mudança deste ano é o fato do Super Júri, aquele que vota nas três principais categorias do prêmio enquanto o programa está acontecendo, ser exibido no Canal Bis e não só apenas na internet. Foi a primeira grande mudança no Prêmio, uma discussão paralela ao programa. O grupo é o mesmo dos anos anteriores, sempre criteriosos com suas abordagens e avaliações.
Outra mudança deste ano é que o prêmio Nova Canção, lançado no ano passado, em que artistas inscrevem músicas inéditas para concorrer ao prêmio na categoria, está aberto para votação popular. E os inscritos são nomes que a gente aqui já conhece: Mahmundi, Lucas Santtana, Castelo Branco, Marcelo Jeneci, Tim Bernardes (d’O Terno) e Sexy Fi. Saca só as músicas de cada um, abaixo.
Para votar, é só ir neste link. O resultado será revelado no dia do prêmio, dia 28 deste mês.
Sempre tem.
Ty Segall – “Connection Man”
Adamski + Seal – “Killer”
Lexx – “Turning Tides”
Nicolas Jaar – “Keep Me There”
Elo da Corrente – “Koan”
Pipo Pegoraro – “Aiye”
Perfume Genius – “Queen”
Max Frost – “White Lies”
Thurston Moore – “The Best Day”
Courtney Barnett – “History Eraser”
Spoon – “They Want My Soul”
Mosby Family Singers – “The Lord Is My Shepherd”
Cookies – “Chains”
Brian Eno – “St. Elmo’s Fire”
O Terno – “Eu Vou Ter Saudades”
Rita Lee – “Ando Jururu”
Dexy’s Midnight Runners – “Come On Eileen”