Trabalho Sujo Apresenta Desertshore: Nico por Paula Rebellato e convidados

E com enorme satisfação vamos repetir a versão que Paula Rebellato e seus compadres fizeram para o fabuloso Desertshore, da Nico, em mais uma edição do Trabalho Sujo Apresenta no Cine Belas Artes. A vocalista, musicista e compositora Paula Rebellato homenageia a musa do Velvet Underground, a cantora alemã Nico. Depois de uma bem sucedida temporada no Centro da Terra, a vocalista, musicista e compositora Paula Rebellato propôs uma versão na íntegra para o clássico gótico que a cantora alemã Nico lançou no início de sua carreira solo, em 1970. Desertshore foi produzido pelo ex-companheiro de banda John Cale e por Joe Boyd, produtor dos principais nomes do folk inglês daquele período, e juntos os dois abriram caminho para Nico desbravar suas canções que ao mesmo tempo são gélidas e calorosas. Paula, que fez parte do seminal grupo Rakta, toca no grupo de krautrock Madrugada e é uma das proprietárias do Porta, uma das principais novas casa de show de São Paulo, convidou três músicos a ajudarem num mergulho ainda mais hipnótico e eletrônico. João Lucas Ribeiro (do grupo Muddy Brothers, na guitarra), Mari Crestani (integrante do grupo Bloody Mary Une Queer Band e da banda Herzegovina, no sax, guitarra e baixo) e Paulo Beto (líder do grupo Anvil FX, sintetizadores e sequenciadores), levando as canções do clássico disco, como “Janitor of Lunacy”, “The Falconer” e “Mütterlein” para o território da música ambient e industrial, expandindo a experiência sonora do disco a partir de seus próprios moldes e características individuais. A apresentação acontece no dia 28 de novembro a partir das 21h e os ingressos podem ser comprados neste link.

Erma paisagem

Paula Rebellato encerrou sua temporada Ficções Compartilhadas nesta segunda-feira no Centro da Terra com uma apresentação tão maiúscula quanto sua ousadia: reler o clássico Desertshore que Nico gravou nos anos 70 quase meio século depois, com camadas eletroacústicas que transpassavam as diferentes fases musicais da soturna diva alemã. Para isso, chamou os camaradas Mari Crestani, João Lucas Ribeiro e Paulo Beto, este último agindo como maestro da banda a partir de seus sintetizadores, enquanto Mari começou primeiro no sax para depois assumir o baixo, e João Lucas ficou na guitarra, ambos segurando vocais de apoio para o canto tenso de Paula recebendo Nico. A dona da noite, com seu timbre grave e usando poucos efeitos sobre a voz, abria, a cada canção, porteiras infinitas de ruído horizontal, que espalhava-se pela plateia como um enxame invisível de abelhas. Numa apresentação tão ritualesca quanto hipnótica, os quatro integraram diferentes camadas instrumentais que passeavam do noise ao rock clássico, passando pela música eletrônica, o noise, o industrial e o ambient, todos a serviço da ampla e erma paisagem desenhada pelas imagens invocadas por Nico, seja em inglês, francês ou alemão. Foi menos que uma hora de apresentação, mas o estado de suspensão parecia ser para sempre.

Assista aqui:  

Vida Fodona #753: Ritmo normal

Começa meio rock’n’roll, mas depois…

Ouça aqui.  

Máquina do Tempo: 1° a 31 de março

darksideofthemoon
1° de março de 1973 – O Pink Floyd lança The Dark Side of the Moon

mamonas
2 de março de 1996 – Morrem os Mamonas Assassinas

likeaprayer
3 de março de 1989 –Madonna lança o polêmico clipe de “Like a Prayer”

timewarner
4 de março de 1989- TimeWarner torna-se a maior empresa de mídia do mundo

creem
5 de março de 1969 –É lançada a revista Creem

chorao
6 de março de 2013 –Morre Chorão

bluemonday
7 de março de 1983 –New Order lança “Blue Monday”

bob-dylan
8 de março de 1965 –Bob Dylan lança “Subterranean Homesick Blues”

biggie
9 de março de 1997 –Notorious B.I.G. é assassinado

sexpistols-
10 de março de 1977 –Os Sex Pistols anunciam “God Save the Queen” em frente ao palácio de Buckingham

dejavu
11 de março de 1970 –Crosby Stills Nash & Young lançam Déjà-Vu

vu-n
12 de março de 1967 –Velvet Underground lança seu primeiro disco

temptations
13 de março de 1961 –Os Temptations fazem teste para entrar na Motown

3 feet high
14 de março de 1989 –De La Soul lança o clássico 3-Feet High and Rising

tim-maia
15 de março de 1998 –Morre Tim Maia

otis-redding
16 de março de 1968 –“(Sittin’ On) The Dock of the Bay” é o primeiro hit póstumo

greatest-hits
17 de março de 1958 –É lançada a primeira coletânea chamada “Greatest Hits”

chuck-berry
18 de março de 2017 –Morre Chuck Berry

il-guarany
19 de março de 1870 –Carlos Gomes estreia a ópera O Guarani na Itália

leeperry
20 de março de 1936 –Nasce Lee “Scratch” Perry

rock_around_the_clock
21 de março de 1956 –O filme Rock Around the Clock estreia nos cinemas

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22 de março de 2018 –Morre Miranda


23 de março de 2003 –“Lose Yourself” é o primeiro rap a ganhar o Oscar de melhor canção

elvis-exercito
24 de março de 1958 –Elvis se alista no exército

john-yoko-bed-in
25 de março de 1958 –John e Yoko realizam o primeiro bed-in

dylan-bootlegseries
26 de março de 1991 –Bob Dylan começa a oficializar seus discos pirata

Renato_Russo
27 de março de 1960 –Nasce Renato Russo

blondie
28 de março de 1981 –O primeiro rap a chegar no topo das paradas é do Blondie

brian-johnson
29 de março de 1980 –Brian Johnson entra no lugar de Bon Scott no AC/DC


30 de março de 1967 –A capa de Sgt. Pepper’s é fotografada

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31 de março de 1967 –Hendrix incendeia sua guitarra pela primeira vez

Concertos de Discos

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A partir deste mês retomamos no Centro Cultural São Paulo a série Concertos de Discos, idealizada pela diretora original da discoteca pública que hoje batiza a instituição, a pesquisadora Oneyda Alvarenga, em que pesquisadores e especialistas dissecam discos clássicos em audições comentadas. Como estamos nas comemorações dos 50 anos do ano de 1967 (dentro do projeto Invenção 67), iniciamos os trabalhos com oito aulas sobre oito discos essenciais lançados naquele ano – das estréias do Pink Floyd, Doors, Velvet Underground e Jimi Hendrix, a discos cruciais nas carreiras de Tom Jobim, Roberto Carlos, Aretha Franklin e dos Beatles. O time de especialistas reunidos é da pesada e as audições acontecem na própria Discoteca Oneyda Alvarenga, no CCSP, durante as terças e quintas de junho, gratuitamente, a partir das 18h30. Veja a programação completa deste primeiro mês abaixo (mais informações aqui):

Concertos de Discos
de 6 a 29/6 – terças e quintas – 18h30
O Invenção 67 ressuscita os célebres Concertos de Discos, que a primeira diretora da Discoteca do Centro Cultural São Paulo, Oneyda Alvarenga, ministrou entre 1938 e 1958. Os Concertos de Discos voltam focados em música popular e realizados na própria Discoteca Oneyda Alvarenga, convidando o público a uma audição comentada. Programe-se: as audições são limitadas a 30 pessoas. Todos os concertos começam pontualmente às 18h30.

60min – livre – Discoteca Oneyda Alvarenga
grátis – sem necessidade de retirada de ingressos

Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band
dia 6/6 – terça – 18h30
Pai e filho, Maurício Pereira (Os Mulheres Negras) e Tim Bernardes (O Terno) falam sobre o clássico dos Beatles: Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band.

The Piper at the Gates of Dawn
dia 8/6 – quinta – 18h30
O crítico e músico Alex Antunes (Akira S, Shiva Las Vegas) trata do disco de estreia do Pink Floyd, The Piper at the Gates of Dawn.

Wave e Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim
dia 13/6 – terça – 18h30
O músico e historiador Cacá Machado analisa os álbuns Wave, de Tom Jobim, e Francis Albert Sinatra & Antonio Carlos Jobim, parceria com Sinatra e Jobim que marcou a inserção da bossa nova no contexto internacional.

The Doors
dia 15/6 – quinta – 18h30
O jornalista Jotabê Medeiros mergulha no álbum de estreia da banda The Doors, que juntou de modo dramático jazz, blues, lisergia e poesia.

I Never Loved a Man the Way I Love You
dia 20/6 – terça – 18h30
Especialista em hip hop, soul e funk, a jornalista Mayra Maldjian analisa I Never Loved a Man the Way I Love You, turning point na carreira de Aretha Franklin – e do rythmn’n’blues.

Are You Experienced?
dia 22/6 – quinta – 18h30
Músico e jornalista, Rodrigo Carneiro (Mickey Junkies) surfa em Are You Experienced?, disco em que estreou a banda Experience, de certo guitarrista canhoto chamado Jimi Hendrix.

Em Ritmo de Aventura
dia 27/6 – terça – 18h30
Guitarrista e vocalista da banda Autoramas, Gabriel Thomaz entra Em Ritmo de Aventura para falar do clássico de Roberto Carlos.

The Velvet Underground & Nico
dia 29/6 – quinta – 18h30
O jornalista e editor da revista Bravo!, Guilherme Werneck, trata de The Velvet Underground & Nico, o disco que lançou a banda de Lou Reed – e também as bases do punk.

Vida Fodona #554: Vida Fodona de resistência

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O único Vida Fodona de março de 2017.

!!! – “The One 2”
Spoon – “Whisperilllistentohearit”
Katy Perry – “Chained to the Rhythm (Hot Chip Remix)”
Bruno Mars – “24k Magic”
Dr. Dre – “Let Me Ride”
Mano Brown + Dom Pixote + Seu Jorge – “Dance Dance Dance”
Daryl Hall & John Oates – “I Can’t Go For That (No Can Do)”
Roxy Music – “Oh Yeah”
Paralamas do Sucesso – “Nebulosa do Amor”
Lorde – “Liability”
George Michael – “Careless Whisper”
Boogarins – “Olhos”
Feist – “Pleasure”
Velvet Underground + Nico – “All Tomorrow’s Parties”
Black Angels – “I’d Kill for Her”
Underworld – “Slow Slippy”
A Tribe Called Quest – “We the People”
Danny Brown – “White Lines”
Negro Léo – “O Céu dos Otários é Neutro”
Sambanzo – “Capadócia”
Sebadoh – “Vampire”
Giovani Cidreira – “Crimes da Terra”
Karina Buhr – “Esôfago”
Ney Matogrosso – “Freguês da Meia-Noite”

E aqui a versão do Spotify, com menos músicas:

50 anos do disco da banana

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Há meio século, The Velvet Underground and Nico mudava o curso da cultura ocidental – escrevi sobre o disco no meu blog no UOL.

Um disco mudou a história da cultura ocidental em 1967. Ao elevar a discussão sobre a música popular para outro patamar, ele obrigou as próximas gerações de músicos e artistas pop a terem mais consciência sobre seus gestos e propósitos, despertando um instinto artístico que ia muito além de canções radiofônicas, refrões pegajosos e riffs memoráveis. A partir deste único disco, o impacto adolescente do rock murchava inofensivo, tornado caricato quase que instantaneamente. E sua influência transcendeu para além da música, provocando impactos decisivos em áreas tão diferentes quanto o cinema, as artes plásticas, as performances e o teatro. É o momento exato em que a música pop se reconhece como obra de arte e vice-versa, quando não parece haver distinção entre o disco e a banda, o cantor e a canção. Um disco lançado no mesmo ano do igualmente influente Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band dos Beatles, um divisor de águas na carreira da banda e na música pop. Mas o lançamento de The Velvet Underground and Nico, o disco de estreia do Velvet Underground, teria uma importância ainda maior para a cultura que veríamos nas décadas seguintes. Um disco que começou com um encontro de pólos distintos, uma amizade que começou com um pacto.

Duas personalidades opostas, Lou Reed e John Cale não poderiam ter origens mais diferentes. Reed, judeu nova-iorquino, havia cantado em grupos de doo-wop na adolescência e foi submetido a eletrochoques nessa mesma época por questões psiquiátricas, trabalhava como compositor contratado da microgravadora Pickwick tentando emplacar um hit ao mesmo tempo em que estudava literatura na universidade Syracuse com o poeta Delmore Schwartz. Tinha aspirações pop e literárias simultaneamente, mas não cogitava as duas possibilidades como uma só até encontrar o galês John Cale. Erudito e moderno, Cale era um fino aluno de música contemporânea e mudou-se do Reino Unido para Nova York para aprofundar-se nesta área, trabalhando com Theatre of Eternal Music do compositor La Monte Young. Também participou da primeira execução pública da composição de “Vexations”, de Erik Satie, que durou 18 horas, ao lado de seu mestre John Cage. Os dois seguiam rumos opostos até que, a partir do sucesso monumental dos Beatles, perceberam que poderiam aprofundar-se em suas obsessões se cruzassem para o outro lado.

O encontro dos dois selou uma missão: fazer música sem fazer concessões. Um olhava para o outro como uma fronteira a ser cruzada: Reed era uma máquina de fazer hits pop mesmo que nenhum deles tenha feito sucesso, apaixonado pelo rock’n’roll e pela eletricidade musical que optava por transcender os horizontes ingênuos do pop da época. Cale havia percebido no pop um limite que poderia ser transposto pela música erudita como uma forma de atingir mais pessoas naquela cruzada artística que parecia restrita a poucas pessoas. Reed pegou uma guitarra e Cale empunhou sua viola, cujas cordas foram trocadas por cordas de aço, dando ao instrumento um timbre estridente e tenso distante de sua natureza sonora original.

Aos poucos cercaram-se de músicos ímpares. O guitarrista Sterling Morrison equilibrava-se entre a tensão monocórdica e riffs velozes, inventando uma forma de tocar seu instrumento completamente nova a partir do duelo de personalidades musicais de Reed e Cale. A baterista Maureen “Moe” Tucker usava sua falta de habilidade com o instrumento como uma virtude, transformando a percussão de seu som em um estrondo único, um bate-estaca que funcioanva como um metrônomo da destruição. Este peso fez que ela trouxesse latas de lixo para seu kit de bateria, aumentando ainda mais o impacto do som.

Juntos, os quatro embrenhavam-se por fronteiras musicais estranhas, guiados pelas letras de Lou Reed, elas mesmas explorando universos virgens na canção popular. Reed começara cantando a estranheza e o mal estar, sensações alheias à música pop dos anos 60, e a partir deste rumo embrenhava para temas ainda mais extremos, como o uso de drogas, o sexo grupal, o sadomasoquismo, o submundo. O próprio nome da banda – The Velvet Underground – havia saído de um livro barato que um amigo da banda, Tony Conrad, havia encontrado jogado na rua, que descrevia atividades sexuais consideradas tabu à época. O título do livro lembrara a banda do conceito de cinema underground ao mesmo tempo em que a palavra “veludo” funcionava como um contraponto à barra pesada.

Enquanto os Beatles mencionavam ficar “altos” no lado B de Help! e os Rolling Stones sugeriam roubar anfetaminas do armário de remédios dos pais em “Mother’s Little Helper”, o Velvet Underground descrevia uma suruba entre travestis e marinheiros em “Sister Ray”, batizavam uma música com o título do clássico do sexo masoquista “Venus in Furs”, falavam de tráfico de drogas em “Waiting for the Man” e na paranoia e ressaca moral na balada “Sunday Morning”. As aspirações literárias de Lou Reed chegavam ao extremo quando o compositor tentava descrever a sensação de estar torpe de drogas em uma canção de dois acordes batizada simplesmente de “Heroin”.

Lou Reed, John Cale, Maureen Tucker, Nico e Sterling Morrison

Lou Reed, John Cale, Maureen Tucker, Nico e Sterling Morrison

Aquele universo musical atingiu o artista Andy Warhol em cheio. Pai da chamada pop art, Warhol era um provocador que insistia que as artes plásticas estavam presos em uma encruzilhada entre a estética e o comércio. Ao insistir que a arte havia se transformado em produto, começou vendendo fotos de acidentes de trânsito como se fossem obras de arte para em seguida utilizar itens de consumo em ícones artísticos, usando latas de sopa e imagens de Elvis Presley e Marilyn Monroe como suas musas. A ironia pós-moderna de Warhol era idolatrada por uma elite artística de Nova York e aos poucos seu ateliê – chamado cinicamente de Factory (fábrica) – tornava-se referência na metrópole norte-americana – e no mundo. Quando Warhol ouviu o Velvet Underground, percebeu que ambos habitavam a mesma fronteira e dispôs-se a apadrinhar o grupo.

Trouxe o Velvet para a Factory e lá percebeu que o grupo tinha uma falha. Todos vestiam-se de preto e tocavam de óculos escuros à noite, formando o protótipo de uma gangue musical que seria a origem de todas as bandas punk que vieram a seguir. Warhol sentia falta da luz. De um contraponto claro e brilhante que ofuscaria aquela escuridão evocada pelo quarteto. E encaixou a atriz alemã Nico naquele grupo.

Nico era uma história à parte. Uma deusa germânica, loira de sotaque pesado e timbre grave, a atriz e modelo era a musa de onde quer que fosse. Apareceu no Dolce Vita de Fellini, teve um filho com o ator Alain Delon, foi inspiração para Brian Jones, dos Rolling Stones, e Bob Dylan e enfiou-se na trupe nova-iorquina de Warhol. Era exatamente a luz o que Andy achava que o Velvet precisava e, ao encantar tanto Reed quanto Cale, não encontrou dificuldade em entrosar-se com a banda, ganhando, inclusive, músicas que seriam capitais na estreia da banda, como “Femme Fatale”, “I’ll Be Your Mirror” e “All Tomorrow’s Parties”.

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Juntos, Velvet Underground e Nico eram a trilha sonora de um novo espetáculo de Andy Warhol, que ele havia começado no dia 13 de janeiro de 1966, chamado Up-Tight!, em que o grupo tocava suas músicas enquanto integrantes da trupe de Warhol – como o dançarino Gerard Malanga e a atriz Edie Sedgwick – dançavam à frente do palco, com filmes de Andy projetados sobre eles. O Up-Tight! metamorfoseou-se no show Exploding Plastic Inevitable, que tornou-se uma atração itinerante, inclusive saindo de Nova York (com Nico ao volante do ônibus da turnê). Os shows causaram burburinho na intelligentsia nova-iorquina e o lançamento de um disco era inevitável.

The Velvet Underground and Nico produced by Andy Warhol foi lançado no dia 12 de março de 1967, depois de diversas gravações feitas no ano anterior. Apesar do nome do disco explicitar a produção de Warhol, o artista plástico foi mais o provocador do disco do que seu produtor de fato, crédito que ficou, na verdade, com o mítico Tom Wilson, que entraria para a história como produtor dos discos mais clássicos de Bob Dylan, da fase áurea de Simon & Garfunkel, dos primeiros discos de Frank Zappa e por clássicos de Sun Ra. Wilson também foi visionário ao puxar o disco para sua gravadora, o selo Verve da MGM Records, depois que ele foi dispensado pela Atlantic (que não gostou das referências às drogas) e pela Elektra (que não gostou do som da viola de Cale). E além de ter tornado o disco possível, Warhol também assinou sua antológica capa, colocando a icônica banana sob um fundo branco que, em sua versão original, podia ser “descascada”, com o adesvio da casca amarela colado sobre uma pervertida versão rosa da fruta sem casca.

O clássico começa com a bucólica “Sunday Morning”, cuja doce melodia esconde uma letra sobre ressaca e paranoia, e descamba em seguida na nervosa “Waiting for the Man”, uma canção de ritmo martelado que espera a chegada do traficante de drogas. “Femme Fatale”, escrita para Nico, apresenta a vocalista em terceira pessoa, numa letra que descreve sua presença de musa implacável. A hipnótica “Venus in Furs” segue o tenso lado A com um drone sonoro barulhento, entrecortado por chibatadas elétricas da viola de Cale, numa letra inspirada no livro homônimo de Leopold Von Sacher-Masoch. “Run Run Run” aguça um clima frenético ao referir-se a anfetaminas, antes do lado A do disco terminar com a monumental “All Tomorrow’s Parties”, composta com apenas um acorde e cantada de forma sisuda por Nico – uma música que parecia retratar a vibração da Factory de Warhol, embora Reed a tenha composto antes de conhecê-la.

O lado B começa sem trégua com “Heroin”, uma das músicas mais sensacionais da história do rock, com seus sete minutos que vão do sussurro ao delírio, da calmaria ao transe, tentando retratar o barato da droga que a batiza. Ao vivo, a música chegou a ter versões que duravam mais de vinte minutos e era um dos grandes momentos do Exploding Plastic Inevitable, quando Malanga simulava injetar a droga em público. O soul “There She Goes Again” começa sampleando a introdução de “Hitch Hike”, que Marvin Gaye havia composto cinco anos antes, regravada anos depois pelos Stones, e é a faixa mais inofensiva do disco. Nico reparece pela última vez na narcisista “I’ll Be Your Mirror”, que antecipa as duas jam sessions barulhentas que encerram o álbum, “The Black Angel’s Death Song” e “European Son”, que exploravam os limites do barulho para muito além da canção.

O disco não foi um sucesso comercial e só apareceu na parada dos discos mais vendidos da Billboard no final de 1967, mas isso não impediu seu impacto artístico – pelo contrário, apenas ampliou sua longevidade estética. As onze músicas que compõem The Velvet Underground and Nico influenciaram – e influenciam até hoje – diferentes gerações de músicos e artistas. Seus primeiros filhotes foram os ingleses do glam rock – Bowie, Roxy Music e T-Rex têm grande débito para com a banda e, especificamente, este disco. Brian Eno, do Roxy Music, é autor da clássica frase que diz que “todas as 30 mil pessoas que compraram o primeiro disco do Velvet montaram uma banda”. E o aspecto faça-você-mesmo do grupo é crucial para entendermos o movimento punk global.

The Velvet Underground and Nico também é o disco cult em essência, aquele antissucesso comercial que ganhou fama e força com o passar dos anos. Mas, mais do que isso, é a obra que fez a cultura pop e a grande arte olharem uma para a outra com um estranhamento que tornou-se encanto, principalmente quando uma percebeu que pode tornar-se a outra, mudando assim o curso da cultura ocidental.

Vida Fodona #541: Primavera fria

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Vamos esquentá-la.

Vida Fodona #394: Lou Reed (1942-2013)

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Quase três horas pra nunca esquecermos da importância desse mestre.

Velvet Underground – “I’m Gonna Move Right In”
Lou Reed + John Cale – “Style It Takes”
Lou Reed – “Ecstasy”
Velvet Underground – “That’s the Story of My Life”
Lou Reed – “Dirty Blvd”
Lou Reed – “Man of Good Fortune”
Lou Reed – “The Blue Mask”
Lou Reed – “Sweet Jane”
Velvet Underground – “New Age”
Lou Reed + John Cale + Nico – “All Tomorrow’s Parties”
Velvet Underground – “Venus in Furs”
Velvet Underground – “Foggy Notion”
Lou Reed – “Andy’s Chest”
Lou Reed – “I Can’t Stand It”
Lou Reed – “NYC Man”
Lou Reed – “What’s Good”
Lou Reed – “Busload of Faith”
Lou Reed – “Berlin”
Lou Reed – “Lady Day”
Lou Reed – “Hangin’ Round”
Lou Reed – “Sally Can’t Dance”
Lou Reed + John Cale – “Faces and Names”
Lou Reed – “Satellite of Love”
Velvet Underground – “Pale Blue Eyes”
Velvet Underground – “Oh! Sweet Nuthin'”
Lou Reed – “Perfect Day”
Lou Reed – “Sad Song”
Lou Reed – “Magician”
Velvet Underground – “Some Kinda Love”
Velvet Underground – “Rock & Roll”
Lou Reed – “Vicious”
Velvet Underground – “What Goes On”
Velvet Underground – “Beggining to See the Light”
Velvet Underground – “I Heard Her Call My Name”
Velvet Underground – “Run Run Run”
Lou Reed + John Cale – “Hello It’s Me”
Lou Reed – “Magic and Loss”
Lou Reed – “Walk on the Wild Side”
Lou Reed – “I’ll Be Your Mirror”
Velvet Underground – “After Hours”
Velvet Underground – “I’m Not A Young Man Anymore”

You’re going to reap just what you sow…

On the run #127: Black & White, a Mix for Autumn

Aproveitando a seqüência Chromatics, segue mais uma mixtape outonal (depois da fantástica feita pelos Poolside) que o jovem mestre Johnny Jewel disponibilizou há pouco em seu Soundcloud.

“After looping the globe twice…We’re finally back in Montreal for one of my favorite times of year. It’s the end of Autumn, & all of the Reds, Greens, & Yellows have disintegrated into Black & White. Everything is buried by the snow…Perfect weather for locking yourself in the studio with a synthesizer & your favorite records…I put together a collage of songs that, for one reason or another…always remind me of Autumn.

Something Old.
Something New.
Something Borrowed.
Something Blue.”

O set e a lista das faixas seguem logo abaixo: