A Nação Zumbi e baixar música da internet


Foto: Info

Logo que postei a entrevista que o Zero Quatro deu à Ilustrada na semana passada, o Dafne veio me avisar que a Nação Zumbi estava se alinhando ao pensamento do líder do Mundo Livre, que declarou estar com saudades dos tempos em que as gravadoras davam as cartas no mercado de música (o que tem lhe rendido o apelido online de “Lily Allen brasileira”, devido aos recentes pitis da ex-musa do MySpace em relação à troca de arquivos na internet). No show de 15 anos do Da Lama ao Caos, que aconteceu sexta passada em São Paulo, Jorge du Peixe foi ao microfone reclamar do uso da internet para baixar gratuitamente músicas que, noutros tempos, eram pagas (e não era a primeira vez – o Bruno lembrou que o guitarrista da Nação, Lucio Maia, já tinha bradado esse discurso em outra situação). “Tem o virtual, mas precisa do real e o real está aqui”. Mas antes que venhamos tachar o mangue beat de reacionário, vale ler a entrevista que a Info fez com o Dengue, baixista da Nação, que jogou panos quentes na polêmica antes de ela descer a ladeira, afirmando que o que foi dito no show tinha muito do calor da hora:

Não se sente prejudicado por pessoas que baixaram seu último disco?
Não, de forma alguma. Nunca ligamos muito para isso. Antes baixem e divulguem do que nada. Não vão comprar mesmo (risos). É legal baixar. Estava aqui em casa agora e minha esposa disse que queria ouvir uma música do Smashing Pumpkins, ‘1979’. Fui no YouTube, vi o clipe e depois baixei o disco. Esse disco é ótimo, uma hora vou comprá-lo.

E as pessoas que só baixam e não compram?
Hoje, acho que as pessoas não baixam tantas músicas quanto um ou dois anos atrás. Teve esse boom, essa euforia do “pode tudo”, do “eu posso baixar tudo não vou pagar nada”, e depois veio a consciência, a ressaca da internet. Hoje, acho que estamos vivendo a ressaca da internet. Todo mundo baixou tanta coisa, vulgarizou tanto, que agora a galera está voltando a comprar discos. O vinil está sendo endeusado de novo. As pessoas estão comprando. É claro que tem a galera que não está nem aí para nada, acha vinil “massa”, mas não compra nenhum. A internet é uma ferramenta, não pode ser usada como um estilo de vida. Tem que ser usada para facilitar a vida. À medida que ela complica, sua consciência volta ao estado normal.

A íntegra da entrevista está aqui.

E essa entrevista com o Zero Quatro?

…e parece que o líder do Mundo Livre S/A tá com saudade das gravadoras. É isso?

“Percebo que, a despeito de toda a questão do acesso democrático e da maior visibilidade que chegaram com a internet, um fato inegável é que a web tem desestruturado quase todas as cadeias que se envolvem com a digitalização, do jornalismo à música. Hoje é moda celebrar a web, dizendo que finalmente nos livramos dos malas da indústria fonográfica. Tudo bem, a indústria até tinha um aspecto predatório, mas uma coisa é você defender a ausência da indústria, a ausência da cadeia produtiva. Se o mangue beat tivesse surgido num ambiente parecido com o que rola hoje, com gravadoras em crise, talvez o mangue beat tivesse se limitado a uma ou duas comunidades de Orkut, uma coisa de gueto. (No início dos anos 90) A Sony foi a Recife, contratou o Chico Science e bancou o primeiro clipe da banda, que rodou direto na MTV. Finalmente a indústria olhava para nós. E teve um efeito multiplicador forte. As pessoas esquecem isso. Hoje há uma situação sem indústria, sem cadeia produtiva. Está se instalando uma religião da tecnologia, um fundamentalismo tecnológico. Fala-se muito em economia sustentável, mas na cultura não existe consumo sustentável.”

Será que não? Lembre-se que estamos em fase de transição… A íntegra da entrevista tá aqui e é fechada pra assinantes do UOL.

O caixão da indústria fonográfica


Foto: Rafael Neddermeyer

Comece a reparar: primeiro Beatles, depois os Stones… Vem aí uma nova safra de caixas de CD, todas aspirando o caráter definitivo, épico, completista. É o último e longo suspiro da indústria fonográfica como a conhecemos, que exalará todo seu catálogo em diferentes formatos tácteis antes da distribuição digital, antes uma ameaça, tornar-se regra. E não é só na música, não; filmes e séries já estão nessa há até mais tempo.

Se passamos esses primeiros dez anos do século assistindo à briga entre indústria e público, a próxima década consolidará o consumo de arquivos digitais pela internet como principal forma de vender produtos, principalmente no setor de entretenimento. A discussão vai deixar de ser pirataria para cair para o preço – e se hoje já descobrimos que o download é a forma de consumo de música que menos agride o ambiente (como se precisasse de um estudo pra descobrir isso, mas enfim), já já essa discussão deixa de ser apenas de tom ecológico para recair sobre aspectos trabalhistas. Afinal, se não é preciso uma série de etapas que incluem a fabricação, o transporte e a distribuição de um pedaço de plástico fabricado em escala massiva, quando o CD sair de cena, é inevitável que essas fases deixem de existir e, pelo menos em tese, isso deveria se refletir no preço.

Fora que as lojas – sejam de conveniência ou megastores – ainda têm uma sobrevida maior, mas vão ter que se reinventar como espaço de interação social mais do que simples supermercados. E eu isso eu já falo há um tempo – em alguns anos vão aparecer lojas de amostras grátis de produtos, que podem ser tanto aplicativos para o celular e todo tipo de conteúdo digital gratuito, bocas-livres com marca em tudo (até na banda que fará o show) e uma mistura de loja de R$ 0,99 (lembra delas?) com self-service daqueles que você só paga um valor e come à vontade, só que em vez de “all you can eat”, “all you can carry” – e sem carrinho nem cesta, eis o truque. Imagino esse último tipo de loja como uma versão moderna da pesquisa de mercado. Todos clientes são betatesters e, em vez de pagar, tem de falar de seus hábitos de consumo. E isso não quer dizer ser entrevistado por um adolescente com uma prancheta, mas simplesmente preencher o cartão-fidelidade da loja que lhe dá acesso aos produtos gratuitos.

MTV, Napster e eu

Me perguntaram e eu respondi.

Michael Disco Jackson

Materinha no Link de hoje.

Era do disco morre com Michael Jackson

É impossível quantificar downloads envolvendo o rei do pop – que em vida vendeu 750 milhões de discos – após sua morte

Logo após o anúncio da morte de Michael Jackson, na última quinta-feira, o torrent com toda discografia do cantor contava com 117 usuários ativos, compartilhando um arquivo com quase dois gigas de músicas. Em menos de 24 horas, o número subiu inacreditáveis 16.184. A sexta-feira ainda viu surgir outros quatro novos arquivos com toda discografia do cantor – um deles, ‘DeLuxe Edition’ tinha quase sete gigas de MP3.

E isso diz respeito a apenas um arquivo, em um único site, o PirateBay. Fora as outras dezenas de sites de compartilhamento, milhares de links em sites de armazenamento online (do tipo Rapidshare) e milhões de MP3 trocados entre fãs conectados, que também assistiam vídeos no YouTube e compravam seus discos de forma legal.

Em menos de seis horas, seu nome apareceu no topo das buscas de agregadores de blogs de MP3 (como o Hype Machine), de redes sociais (como a Last.fm) e de lojas online (como a Amazon e iTunes). Na Amazon, o rei do pop conseguiu mais um feito espetacular, mesmo depois de morto. Nada menos do que 18 discos entre os mais vendidos da loja eram ou do cantor ou de sua banda com seus irmãos, o Jackson 5.

A notícia mexeu com a internet de forma ainda mais brusca: não bastasse ter derrubado os servidores do Twitter no breve intervalo entre o anúncio de que Michael estava sendo transportado para um hospital em uma ambulância e a confirmação de sua morte, a rede social tornou-se o principal canal para saber o que estava acontecendo com o cantor. Todos linkavam todos e logo que sua morte foi confirmada, Michael Jackson dominou nove dos 10 tópicos de discussão do dia – na décima posição, a pantera Farrah Fawcett, que também morreu no mesmo dia. Foi o suficiente para que o Twitter não suportasse a quantidade de acessos.

Não foi só o Twitter. Segundo Shawn White, diretor de operações da Keynote System, empresa que monitora o tráfego na web, “a velocidade média de download em sites de notícias dobrou de menos de quatro segundo para quase nove segundos”, disse em entrevista à BBC.

Por mais que as versões digitais ou mesmo os discos em si – sejam CDs ou vinis – possam dar uma ideia do impacto da notícia da última quinta-feira, ela é certamente infinitamente menor do que os milhões de MP3 trocados e baixados de forma ilegal.

Artista com 750 milhões de discos vendidos em seus 45 anos de carreira, Michael Jackson foi, durante pelo menos dez anos, o rei do pop. Como Elvis Presley antes dele, fez parte de um movimento que alavancou não apenas gerações de novos artistas, mas também vendas de discos. Com sua morte, muitos levantaram a inevitável dúvida que sucede a morte de qualquer astro: e quem será o próximo rei?

Ninguém. Do mesmo jeito que é impossível rastrear a quantidade downloads envolvendo o artista, não há mais cenário que propicie o nascimento de um mito desta proporção.

A música, da mesma forma que aconteceu com tudo depois da internet, saiu da mão de algumas dezenas de artistas e centenas de executivos para alimentar gratuitamente nichos infinitos. Michael Jackson é sinônimo de uma época em que o sucesso de um artista era medido em discos vendidos – uma era que metaforicamente morre junto com ele.

Números
2 vezes mais tweets por segundo. Assim que a morte de Michael Jackson foi anunciada, o número de mensagens no serviço dobrou, segundo Biz Stone, co-fundador do site
22,61% de todas as mensagens trocadas no serviço, na hora que a morte foi confirmada, eram sobre o astro
40.000 vezes a cada hora. Foi o número de vezes que foram reproduzidas, na Last.fm, músicas de Michael Jackson, na manhã da sexta, dia seguinte à morte
11% foi o aumento de acessos à internet nos EUA para saber informações sobre a morte

Link – 15 de junho de 2009

Música socialBrasil pode ter sua própria ‘lei Sarkozy’‘Pirataria’ cresce como causaProvedores de acesso também reagem contra o projeto de leiCada vez mais sozinhos ou mais conectados?Há 30 anos, walkman fazia a música andar‘O universo musical é mais rico hoje que antes da web’Há 10 anos, Napster tornava a web socialThe Sims 3: Eles precisam de você para viver, se relacionar – e até se vestirClássico dos games de boxe volta em versão de tirar o fôlego – mesmo!Twittermania!Vida Digital: Matheus Souza (Apenas o Fim)

Música social

Cada vez mais compartilhada, a música do século 21 mudou nossos hábitos e a internet; mas a lei ainda não acompanhou essas mudanças


Todos de fone de ouvido em festa silenciosa na Virada Cultural de 2008 (foto: Mônica Bento/AE – 26/04/2008)

Nunca se fez tanta música quanto hoje. As possibilidades abertas a quem não tinha recursos ou técnica para fazer música permitiram que gerações inteiras finalmente pudessem produzir sua própria trilha sonora.

Seja criando música nova, remixando hits do passado ou regravando velhas canções, pessoas de diferentes faixas etárias se descobriram artistas e puderam finalmente reconhecer-se como músicos, independentemente de profissionais ou amadores. Mais: com a internet, essa produção passou a ser ouvida por gente que não tinha outros canais senão o rádio, o show e a loja de discos para descobrir e curtir música nova.

Ao mesmo tempo, nunca se ouviu tanta música quanto atualmente. A mesma rede que permitiu que músicos finalmente tivessem acesso direto a seu público fez que cada vez mais pessoas ouvissem cada vez mais música.

Hábitos como garimpar raridades, gravar fitas cassetes (ou CD-R) com músicas escolhidas a dedo e até mesmo manter uma coleção de discos foram acelerados pela rede de tal forma que praticamente foram reinventados.

Em vez de prateleiras, falamos em gigabytes; disco raro é aquele que nunca saiu da casa – ou da cabeça – de seu autor.

Assim, aos poucos, um termo técnico que designa a forma de adquirir um arquivo digital da rede tornou-se praticamente sinônimo de música nesta década: o download. Graças à popularização do MP3, iniciada há exatos dez anos, baixar música virou uma atividade rotineira e um hábito típico de nossos tempos.

Mas esse monte de gente produzindo e ouvindo música não está isolada em seus computadores ou em seus fones de ouvido, mesmo porque isso não é novidade – o marco zero deste isolamento musical, a invenção do walkman, completa trinta anos este mês.

E o mesmo ponto de partida para a música digital como a conhecemos hoje – a criação do Napster, o primeiro software de compartilhamento de arquivos sonoros digitais – também deu origem a uma nova forma de se ouvir música.

Se o rádio, a loja de disco e a gravadora aos poucos se tornam obsoletos, a internet oferece opções que vêm sendo abraçadas por milhões de pessoas, que estão descobrindo músicas que nunca ouviram e mostrando-as umas às outras.

O download ilegal ainda é um problema no que tange os direitos autorais e várias iniciativas têm insistido em punir uma prática que já é corriqueira.

Numa época em que ouvir música torna-se uma atividade cada vez mais social, resta achar uma solução que recompense quem produz mas que não puna quem ouve.

***

Há 10 anos, Napster tornava a web social

Shawn Fenning só queria ouvir as músicas que seus amigos guardavam em seus PCs – e também permitir que eles ouvissem as suas. Entediado com a faculdade que fazia, começou a escrever um software que permitisse essa troca de arquivos em janeiro de 1999. Ele tinha acabado de completar 18 anos e, poucos meses depois, no início daquele junho, há dez anos, terminou o programa, que batizou com seu próprio apelido (“Napster” quer dizer algo como “dorminhoco”). Distribuiu para uns amigos e, como quem não quer nada, mudou a história da música – ao mesmo tempo em que resgatou um dos cernes da rede – seu aspecto social.

Voltando mais no tempo, quando o criador da World Wide Web, Tim Berners-Lee, tornou público seu projeto, o fez postando uma mensagem num fórum de notícias, no dia 6 de agosto de 1991. Nela, anunciava que “estamos muito interessados em espalhar a web para outras áreas (…). Colaboradores são bem-vindos!”

Sem querer, Shawn Fenning repercutiu a mensagem do criador da web para o planeta. E se no início dos anos 90 a rede apareceu como uma forma de facilitar a troca de dados e informações, no final da década esta troca seria acelerada graças à popularização do MP3.

Mas trocar músicas era só o começo. Logo o mundo compreendeu que a música poderia funcionar longe do disco, coisa que a indústria fonográfica não quis entender – o que a levou a processar seus próprios clientes e abrir espaço para a Apple, uma empresa sem tradição no mercado de música, tornar-se líder em comercialização de música digital.

Fenning não inventou apenas um software. Com o Napster, ele sublinhou que a rede não é compostas de máquinas que se conectam a grandes servidores – mas também de computadores que podem se conectar entre si sem precisar passar por um computador central. E que esses computadores são pilotados por seres humanos que querem conhecer não só mais músicas, mas outros seres humanos. Não é exagero: ao liberar a possibilidade das pessoas trocarem MP3 entre si, o Napster foi o embrião daquilo a que chamamos de “rede social” – que, na verdade, é uma metáfora para a própria web.

Afinal, a internet é social. E Fenning nos lembrou disso há dez anos, quando resgatou um verbo que estava um tanto em desuso e que tem sido vilanizado pelos motivos errados: compartilhar.

A volta do Muxtape

Aê, que boa notícia. E como o Miguel explica, o Muxtape é um MySpace sóbrio:

Conforme o seu fundador Justin Ouellette tinha anunciado há alguns meses, já não se trata agora de permitir que os utilizadores façam o upload indiscriminado de MP3s de modo a criarem playlists temáticas e a dá-las a conhecer ao mundo mas sim de oferecer aos artistas e bandas uma plataforma para promoverem as suas músicas, tendo ainda a possibilidade de incluírem fotos e vídeos.

Em contrapartida, os utilizadores podem agora apenas fazer streaming das faixas e agrupá-las em playlists. O resultado final não fica muito longe do MySpace, com a diferença de não termos que aturar com imagens folclóricas com cores aguerridas e gifs animados e saltitantes.

E aos poucos, vamos saindo dos tempos em que quem baixa MP3 é considerado bandido. Ainda tem tempo e chão pela frente, mas a mudança já aconteceu – a volta do Muxtape é só reflexo disso.

Leitura Aleatória 245


crazyBobcat

1) E a Capitol segue ganhando grana com o Radiohead – vai lançar versões esticadas dos três primeiros discos da banda
2) Disco novo do Sonic Youth à vista
3) Consultor jurídico da ABPD diz que P2P é a desgraça do direito autoral e que falta boa-fé ao Creative Commons
4) Samuel L. Jackson pode não ser mais Nick Fury
5) Seth Rogen vai escrever um episódio dos Simpsons
6) Manu Chao no Brasil
7) Revistas americanas sentem no bolso a diminuição de anunciantes
8) Porque Alan Moore devia deixar de frescura e assistir Watchmen
9) Fox cancela Prison Break
10) 95% dos downloads de música são ilegais, diz indústria

O xerife de Nottingham

Destacando um das notícias do Leitura Aleatória anterior, a entrevista que o Globo fez com o consultor jurídico da ABPD vem cheia de pérolas como essa:

Existe uma cultura de compartilhamento e há quem jogue arquivos na internet com o propósito de ajudar aos outros, tendo até trabalho para converter arquivos, mas com um espírito de comunidade, com a ideia de estar ajudando o próximo. Como acabar com a ideia de que se está ajudando alguém e não cometendo um crime?
É uma cultura meio Robin Hood. Você pode assaltar o meu armazém, tem uns caras querendo comer um cachorro-quente e então vamos assaltar o McDonalds. O cara que receber o cachorro-quente vai ficar feliz da vida, o dono não vai ficar nem um pouco. Não é assim que a sociedade funciona. Ou então, se é assim, vale para tudo. Atenção! Se vale para isso vale para tudo. Pô, tô sem dinheiro, você tem cartão de banco? Poxa, não tenho, então vamos quebrar um caixa-forte.

Vale ser lida na íntegra – e o Nogueira sublinha os pontos mais interessantes do papo.