Google Buzz e o Facebook

Meus dois centavos sobre o Google Buzz…

Um erra onde o outro acerta

Lembra de quando o Google apareceu? Seu visual clean mostrava que não eram necessários todos aqueles links e diretórios – característicos do Yahoo, o grande mecanismo de busca dos anos 90 – em uma página dedicada apenas a procuras feitas online. A solução do Google era um ovo de Colombo: só com um campo de busca sob um logo colorido, ele relembrava a todos que menos era mais.

Lembra de quando o Facebook apareceu? Seu visual clean mostrava que uma rede social não precisava parecer uma penteadeira de madame (o MySpace) nem uma sala de pré-escola (o Orkut). A solução do Facebook foi arquitetônica nos dois sentidos: ao oferecer um ambiente em que se deve reter o público-alvo, o site apresentava-se agradável, organizado, hierárquico, cool. Tanto sua arquitetura de informação quanto seu acabamento visual têm exatamente o mesmo peso. O site deve ser fácil de ser entendido, utilizado e percorrido, além de, por que não, agradável.

Eis os dois gigantes da internet hoje em dia. E agora, ao lançar um serviço de mensagens instantâneas muito parecido com o Twitter integrado ao seu e-mail, o Google tenta se reinventar de olho em tempos mais – para usar uma palavrinha da moda– “sociais”.

Em outras palavras, assumiu que o Facebook – a maior rede social do mundo – é seu principal rival.

Mas entre o Buzz e uma rede social envolvendo todos os serviços e produtos Google, há um longo caminho. O serviço recém-lançado, no entanto, não é o primeiro flerte do gigante rumo a uma plataforma mais social. O YouTube e o seus Maps já têm elementos de rede social, seu Reader permite compartilhamento de conteúdo. Mas foi com o Buzz que o Google assumiu que quer mudar sua natureza.

Eis o problema central: o Facebook sempre foi uma rede social. É um ambiente murado, em que todos que querem estar ali concordam em ficar apenas ali. Já o Google é o oposto disso. Começou como uma porta de entrada para a internet e está aos poucos crescendo um muro ao redor dela. E se, para usar o Google, for preciso estar dentro destas paredes, muita gente vai pular fora.

Isso fora a questão da interface, que ainda é bisonha – confusa, feia, sem hierarquia, quase aleatória. Parece um rascunho do Google Wave. Não seria o caso de o Google lembrar de como era quando começou?

O blog que leva meu nome

Avisei segunda e volto a lembrar aqui: tou com um blog novo no Link que não vai ser relinkado aqui com a mesma freqüência que as matérias que publico no caderno. Para quem ainda não passou por lá, destaco a história por trás do anúncio do Radiohead no Twitter, um Mario Bros dos tempos do Império Romano, o lançamento do iPad para você montar, uma homenagem ao Xkcd, um site que mostra o que aconteceu no ano em que você nasceu, um encontro entre Mario e Sonic e uma nova hora mágica, além dos bastidores do Link.

Lost e o futuro

Textinho que escrevi hoje no Link impresso.

O entretenimento do futuro nasce com o fim de ‘Lost’

A primeira década do século 21 assistiu a mudanças drásticas no que diz respeito à cultura – principalmente devido à dominância digital que marcou estes anos. Não houve mídia ou gênero que não fosse abalado por este impacto. E mesmo com dois formatos do século anterior vivendo dias de ouro (quadrinhos e games atingiram um patamar de excelência inédito), nenhuma obra soube lidar melhor com a cultura digital – e de forma mais ampla – do um certo seriado sobre os sobreviventes da queda de um avião em uma ilha maluca.

Num mundo cada vez mais dividido em dualidades – velho/novo, digital/analógico, online/offline -, Lost preferiu apostar nas duas alternativas ao mesmo tempo. É uma série comercial com ares de culto. Aborda mistérios científicos e espirituais, as diferenças entre destino e livre arbítrio, física e filosofia, pais e filhos, passado e futuro.

Tais oposições, na verdade, partem de um conceito descrito pelo criador da série J.J. Abrams, que ele expande para todas suas outras obras: ele quer dar classe A à “cultura B” – de nicho, quase sempre produzida com pouco orçamento e, por isso mesmo, mais ousada que a comercial.

Assim, Lost é, ao mesmo tempo, programa de sucesso e objeto de culto, novelinha emotiva e complexa saga de ficção científica, mainstream e nerd.

Esta ambivalência não fica só na tela – e aí que Lost desequilibra. Mesmo com séries de TV bem melhores que ela produzidas no mesmo período (Sopranos, The Office, Battlestar Galactica), Lost desempata ao trazer sua dualidade para fora da tela – e incluir o fã na história.

Não como nos games, em que você assume a pele do protagonista, nem como na web 2.0, em que você cria uma identidade digital a partir do que posta online. Ela apresenta a opção ao telespectador: você quer apenas assistir um programa de TV ou mergulhar num universo que expande-se online no fim de cada episódio?

Enquanto não surge um aparelho que possa romper as barreiras entre nova e velha mídia (o iPad de Steve Jobs tenta abrir este meio-termo, leia na página L7), Lost é o melhor exemplo de integração de duas culturas que ainda caminham separadas mas que tendem a virar uma só. Se é apenas um rascunho que vamos assistir daqui para frente ou já o primeiro capítulo de uma nova cultura, cabe ao futuro nos dizer.

Mas eu quero saber mesmo é o que aconteceu com os personagens depois do clarão no último episódio…

O iPod das letras

Textinho meu no site do Link de hoje.

Apple pode mudar tudo hoje – de novo

Anúncio do novo tablet que acontece em São Francisco às 15h de Brasília pode matar o Kindle e criar um iPod das letras

É verdade… Estou testando o tablet da Apple pelas últimas duas semanas e ele é impressionante“.

twitter-calacanis

O silêncio já vinha sendo quebrado desde antes do fim do ano, quando apenas rumores sobre um anúncio que seria feito pela Apple no início de 2010 fizeram as ações da empresa saltar, e à medida em que janeiro passava, surgiam ainda mais notícias e novidades relacionadas a mais um produto da empresa de Steve Jobs, cujo anúncio ocorre nesta quarta-feira, em São Francisco, nos EUA, a partir das 15h (em Brasília). Até que o blogueiro e empreendedor Jason Calacanis começou a twittar na madrugada desta quarta-feira, 27:

A melhor parte do tablet é um sintonizador de TV digital com gravador de vídeo – além de um jogo de xadrez“, “o tablet da Apple é realmente impressionante para jornais. A videoconferência é super estável, mas nada novo“, “o preço será entre US$ 599, 699 e 799 depenendo do tamanho e da memória no tablet. Ele também tem um teclado sem fio e conexão do monitor para a TV“, “sim @HappyDrew, o tablet da Apple tem um sistema operacional parecido com o do iPhone com a possibilidade de manter múltiplos aplicativos rodando simultaneamente“, “ele conta com duas câmeras: uma na frente e outra nas costas (ou pode ser apenas uma lente dupla), assim ele grava tanto você quanto o que está à sua frente“, “os games do tablet da Apple são ótimos. Do nível de inovação da Nintendo. O aplicativo para o Farmville é insano. Mark Pincus (dono da Zynga, criador do Farmville) fará uma demonstração do aplicativo amanhã“.

São muitas novidades. Ao que parece, o novo dispositivo da Apple não será meramente um “iPhonão” como previsto – não é apenas um dispositivo que permite acessar a web como conhecemos hoje de forma menos espremida do que no celular. Também não parece ser só um meio termo entre o netbook e o smartphone, um aparelho que permite conectar-se à internet de forma prática e de qualquer lugar. Pelos relatos e rumores que já surgiram, especula-se que o território que a Apple quer desbravar não é apenas o da interação e conectividade, mas também o de conteúdo e entretenimento. Especula-se que o novo dispositivo da Apple venha elevar o conceito proposto pelo Kindle – o leitor eletrônico 1.0 – a um nível sequer sonhado pelo dispositivo da Amazon – aí sim, multimídia, interativo e diferente de tudo que já foi visto antes.

O que se espera é que a Apple lance o que a Amazon parecia ter lançado: um iPod das letras. E não apenas dos livros, como o Kindle. Mas que abranja para além do mercado livreiro, o editorial como um todo, incluindo não apenas jornais e revistas, mas provedores de conteúdo online e, em última instância, até blogs. Mais do que isso: o dispositivo, se for tudo o que promete, pode integrar de vez conteúdo multimídia ao texto, provocando um terceiro salto evolutivo em uma série de tecnologias que estão mudando nossa relação com o conteúdo. Primeiro veio a web, que tornou possível livro, jornal, TV, música, telefone, rádio e cinema num mesmo ambiente, ainda que primitivo. Depois veio a web móvel, que reempacotou tudo isso em nosso bolso – e em que a Apple foi capital (primeiro com o iPod, depois com o iPhone). E é possível que estejamos às vésperas de um salto ainda maior, que torne nossa relação com a web móvel tão corriqueira e natural quanto o manusear de uma revista ou de um jornal e nos livre, de vez, do computador.

No final de uma matéria de segunda-feira no LA Times em que o jornal detalhava os acordos que algumas empresas (como a editora Conde Nasté e o jornal New York Times) vinham fazendo com a Apple em relação ao novo tablet, o analista do Instituto Gartner Allen Weiner explicava que haveria muita tentativa e erro antes que os editores tradicionais descubram o que fazer com suas edições digitais.

“Ninguém vai comprar um tablet para ler e-books. O Sony Reader mais barato custa 199 dólares e é ótimo para ler livros. Mas onde está a oportunidade? Está em criar experiências de leituras. É colocar vídeos e atualizações feitas pelo autor em um livro de culinária. É uma oportunidade porque você pode cobrar algo extra por isso”.

O que nos leva a um post de setembro do ano passado do Fake Steve Jobs, o blogueiro que posta como se fosse o fundador da Apple falando sem papas na língua (mas que na verdade é o jornalista David Lyons), quando a especulação sobre o tablet já existia. Ele começa citando outro blog, o Gizmodo:

“O Brian Lam do Gizmodo dá uma dica esta manhã, mas vale uma explicação mais profunda. Uma pequena dica: não é sobre tecnologia. Eis o trecho do artigo de Lam sobre como ele acha que nós estamos querendo reinventar jornais, livros e revistas:

‘O objetivo final é fazer com que editores criem conteúdo híbrido que tenha áudio, vídeo e gráficos interativos em livros, revistas e jornais, onde o layout no papel é estático. Com as datas de lançamento do Courier da Microsoft ainda à distância (a MS apresentou seu tablet na CES deste mês, o Slate) e o Kindle preso à tinta eletrônica relativamente estática, parece que a Apple está se movendo rumo à liderança na distribuição da próxima geração de conteúdo impresso (…)’

O itálico em ‘conteúdo híbrido’ é meu. Pois aí está o ponto central. E é isso que Brian acerta quando ele fala sobre ‘redefinir’ jornais e outros produtos feitos de árvores mortas.

Novas tecnologias abrem novas formas de contar histórias. Eis o que é verdadeiramente excitante aqui. Não é o tablet, mas o que ele significa para as notícias, para o entretenimento, para a literatura. Sacou? É isso que o Tchekov queria dizer quando falava que o meio é a mensagem. E é por isso que o tablet é tão profundo.

Não faz sentido mudar para e-readers se formos fazer só o que já fazemos em papel. É por isso que o Kindle é tão ruim. Eles só abriram a picada. E é por isso que seguramos o nosso tablet – não porque não tínhamos a tecnologia, mas porque quem lida com conteúdo é tão devagar que eles não conseguem criar algo que valha a pena ser colocado no tablet.

É impressionante como poucos grandes nomes do mercado editorial realmente entendem isso. Nós convidamos alguns deles para reuniões e enquanto estávamos conversando, nós meio que passávamos um pequeno questionário para eles resumido em uma única pergunta: para onde você acha que o mercado editorial irá? A maioria deles não conseguia pensar em outra coisa a não ser no que já vinham fazendo no passado. Para eles é só um detalhe, uma pequena mudancinha em seus negócios, como os jornais deixando de ser preto e branco para ganhar cores ou mudando de formato, por exemplo.

Mas não tem nada a ver com isso. Estamos falando de uma forma completamente nova de transmitir informação, uma que incorpore elementos dinâmicos (áudio e vídeo) com estáticos (texto e fotos) mais a habilidade para o ‘público’ se tornar criador, não apenas consumidor.

O engraçado é que os caras do mercado editorial se consideram do lado ‘criativo’ do negócio, mesmo que eles não tenham visão alguma. Para eles, nós que lidamos com tecnologia somos um bando de parasitas. E se perguntam porque, em plena era digital, somos nós quem estamos colhendo a recompensa financeira.

Minha aposta é que o conteúdo verdadeiramente revolucionário não virá dos editores de velha guarda. Virá dos novos, dos moleques que cresceram no digital. Esta noção de fundir elementos é natural para eles. E em algum lugar há um gênio esperando ser descoberto – o Orson Welles da mídia digital, alguém que irá criar uma linguagem completamente nova para contar histórias. Se você estiver lendo isso, Orson Jr., entre em contato. Temos algo que queremos mostrar para você”

Pode ser ficção, pode vir em tom de piada, pode ser ríspido em vários trechos (e eu peguei leve na tradução), mas o fato é que as considerações do Steve Jobs de mentira têm um efeito profundo à luz do que a Apple de verdade pode anunciar mais tarde.

2010 ao quadrado

Materinha de apresentação da edição do Link de hoje.

2010: de zero a cem em onze dias

Ninguém poderia prever. Mas a década mal havia começado e uma notícia pegou todos de surpresa. Um gigante online entrava com tudo num mercado tradicional pagando bilhões de dólares. Quando a America Online anunciou a compra do grupo Time Warner por US$ 164 bi no dia 10 de janeiro de 2000, há exatos dez anos e um dia, o mundo parou para discutir a importância daquilo que parecia ser apenas uma novidade da década anterior e que, ano recém-começado, dava pistas de que deixava de ser uma rede de contatos entre adolescentes, tecnófilos e acadêmicos para mexer de forma agressiva no resto do mundo.

2010 não começou com um único anúncio bilionário, mas com várias notícias de diversas áreas distintas que sacramentam a importância assumida pelo mundo digital. A começar pela maior feira de tecnologia do mundo, a Consumer Electronics Show (CES), em Las Vegas, que em todo janeiro, desde 1967, apresenta produtos e tendências que irão dominar o ano. Se em 2009, a feira foi abalada pelas notícias da crise econômica mundial, em 2010 ela já prometia a recuperação do mercado de tecnologia.

Se fossem só as novidades da CES 2010, já teríamos motivo para começar o ano com boas notícias: TVs e carros que acessam a internet, entretenimento doméstico incorporando o 3D, novas marcas se estabelecendo no mercado, computadores cada vez menores e integrando funções de outros aparelhos, tecnologia “vestível”, rivais para o Kindle. O Link esteve em Las Vegas e mostra nesta edição as principais novidades da feira que terminou no domingo.

Duas notícias paralelas à CES mexeram com a própria feira. O anúncio do Nexus One, o telefone do Google, não foi feito na terça-feira passada por acaso – ele simplesmente ofuscou quaisquer outros celulares que foram apresentados em Las Vegas, pelo simples fato de ter sido feito pelo Google.

O anúncio do novo aparelho – cujas expectativas foram aquém do esperado – pode, de cara, mudar completamente o relacionamento entre fabricantes e operadoras. E mostra uma faceta inesperada para a empresa – não bastasse ir para o mercado de celulares com seu sistema operacional, o Android, o Google agora atua no mercado de hardware.

A outra novidade que abalou a CES nem sequer é notícia, mas apenas um rumor que começou a circular no final do ano passado e causou até a subida das ações da Apple. Um suposto lançamento anunciado para o final deste mês jogou luz sobre um aparelho que estava fora do foco das novidades tecnológicas. E bastou uma especulação para que concorrentes apressassem o lançamento de seus próprios tablets. Pois é sabido que, como aconteceu com o MP3 player e o celular com muitas funções, uma vez que a empresa de Steve Jobs lança um determinado produto novo, é o suficiente para que outras marcas se animem e corram para entrar neste mercado.

A outra novidade é brasileira e veio na quarta-feira, quando a TV Globo anunciou os participantes da décima edição do Big Brother Brasil e nada menos do que cinco dos novos candidatos do reality show são personalidades que já eram conhecidas em diferentes nichos da internet.

Pode parecer bobagem, mas é uma prova de que até a principal emissora do País passa a dar atenção para a cultura digital em sua programação – o que é bem diferente de exibir URLs na tela da TV ou acessar a programação via internet. A fusão entre reality show e web 2.0 veio apenas escancarar uma suspeita – a de que, independente da plataforma em que as pessoas estejam, seja TV ou internet, é cada vez mais comum exibir-se para os outros e não se preocupar com a própria privacidade. A nova edição do Big Brother Brasil, que começa amanhã, pode acelerar essa tendência, além de desafiar a disposição das celebridades de nicho num veículo de massa.

Em entrevista recente ao Link, o futurólogo Alvin Toffler afirmou que estava cada vez mais difícil fazer previsões sobre o futuro da tecnologia. O próprio anúncio da compra da Time Warner pela America Online, que parecia criar um novo gigante online, deu com os burros n’água e foi eleito neste ano, pelo jornal inglês Telegraph, como a pior fusão de empresas da década passada.

Mas do mesmo jeito que aquela notícia antecipou a importância da internet na década passada, será que estas primeiras notícias de 2010 podem funcionar como um aperitivo dos próximos dez anos? Ou será que é melhor chutar o que pode acontecer na próxima década? Na dúvida, escolhemos as duas opções.

2009: o ano do Twitter


Foto: Aditi Jain Chaves, do WikiAves

Artigo que escrevi para a retrospectiva que fizemos de 2009 no Link, na semana do natal.

Hype ou barômetro emocional do planeta?

Twitter mudou o conceito de “agora” a partir da fusão de rede social e autopublicação online

“Rede social de microposts”. Assim o Twitter era apresentado a uma comunidade digital disposta a testar novos serviços e ferramentas online que começaram a se tornar regra a partir de metade da década que termina agora. Eram duas tendências da década que pareciam finalmente chegar a um consenso.

De um lado, a web 2.0, que permitia a autopublicação online sem que fosse preciso ter noções técnicas de programação. Do outro, as redes sociais, que tornavam possível a comunicação instantânea e online de comunidades de pessoas que se conheciam fora da internet. Os dois pilares do novo site (ou seria um serviço?) só funcionaram como ponto de partida para a criação de algo que ainda não tem nome, mas que mudou a internet em menos de um ano – justamente este, que se encerra.

Mas por que 2009? Criado em 2006, o site já vinha sendo usado por early-adopters desde o primeiro ano e já havia causado algum ruído em nichos específicos, como entre gente que trabalha com comunicação e tecnologia – a ponto até de o próprio Google ter comprado no mesmo ano um concorrente parecido, o Jaiku. Mas o fato é que, por mais barulho que o serviço (ou seria um site?) tenha feito até o início deste ano, foi só um pequeno alarido comparado com o papel central assumido pelo site desde o início do ano.

Já vínhamos falando do Twitter aqui no Link desde que ele começou a virar notícia, em 2007, mas nossa primeira capa relacionada ao tema só apareceu no início deste ano, no dia 9 de março, o que causou desconforto em alguns de nossos leitores – que acharam que havia um certo exagero na cobertura que começamos a fazer relacionada ao site. Não era um hype, como queriam parecer que fosse, e o Twitter atravessou 2009 mudando a história de muitas pessoas – e, por que não, a História propriamente dita. É um novo jeito de se portar online.

Pois o Twitter mistura os dois elementos citados no início – autopublicação e rede social –, criando um híbrido que absorve outras tendências da primeira década deste século. É uma rede social, sim, mas também é uma enorme conversa online em que pessoas, marcas e instituições conversam simultaneamente, usando linguagens formal, informal e até mesmo cifrada, criando um enorme mosaico de informação rápida que funciona como um mashup de MSN, SMS, RSS e sala de bate-papo. E, diferente das redes sociais antes dele, o Twitter permite que você siga apenas quem você quiser – e não necessariamente quem também te segue.

A grande mudança, no entanto, não diz respeito à interface, mas a uma noção nova de um jargão que ficou banalizado desde a popularização da web, nos anos 90 – o chamado “tempo real”. O Twitter não apenas se organiza por fatos e opiniões que acontecem neste exato momento. Ele também amplia o tempo do “agora” para uma escala quase pessoal – e não tão rígida quanto uma transmissão ao vivo de TV. Uma entrevista, uma notícia, uma campanha publicitária – tudo pode ser assimilado sem pressa, de acordo com a velocidade de cada usuário.

E é na força do impacto da novidade nos diferentes conceitos de “agora” que faz surgir outro superpoder do Twitter. Quando muitas pessoas começam a twittar sobre determinado assunto, ele aparece nos chamados “trending topics” (a lista dos assuntos mais discutidos na rede), que funciona como uma enorme nuvem de tags emocional de uma rede cada vez mais global. É como se o site funcionasse como um barômetro da pressão do inconsciente coletivo.

Foi essa força que tornou o Twitter o principal protagonista digital deste ano: da posse de Barack Obama na Casa Branca à morte de Michael Jackson, passando pelos protestos contra o resultado da eleição do Irã, a gripe suína e futilidades como as cantoras Lady Gaga e Susan Boyle, o serviço Google Wave e os filmes Atividade Paranormal, Avatar e Lua Nova, tudo foi registrado via Twitter. Resta saber se o site continuará desequilibrando nos próximos anos – ou se será apenas o principal “modismo” de 2009.

Assim foram os anos 00

E esse infográfico que fizemos na edição de hoje do Link, hein? Clica pra ampliar.

Tou falando: se eu fosse você, comprava o Estadão às segundas.

Clay Shirky, a cultura digital e o Brasil

Entrevistei o Clay Shirky para a edição desta semana do Link. Se liga:


Foto: Joi

A mudança sequer começou

Um dos principais pensadores da era digital acredita que a internet vai mudar ainda mais as pessoas

“O poder de organizar sem organizações”. O subtítulo da principal obra do jornalista e acadêmico Clay Shirky – Here Comes Everybody (ainda não publicado no Brasil) – anuncia não apenas seu tema como explica, em poucas palavras, o conceito de crowdsourcing. O termo junta as expressões “multidão” e “fonte” em inglês para designar a produção coletiva de conhecimento na era digital e é o mote para decifrar o que o autor considera como sendo a principal transformação que estamos vendo hoje: como a cultura humana está às vésperas de uma mudança tão – ou talvez mais – radical do que a da invenção da cultura impressa. Falando sem parar com a clareza de um bom professor, ele conversou com o Link sobre estas mudanças e o papel do Brasil neste cenário.

Como diferenciar a cultura tradicional da cultura da era digital?
Quando terminei de escrever meu livro Here Comes Everybody (Aí vem todo mundo, em inglês), tinha a impressão de que o comportamento determinava aquilo a que chamamos de cultura. Mas “comportamento” pode ser traduzido como motivação filtrada pela oportunidade. O que a cultura digital faz é pegar motivações ancestrais – “quero estar conectado a pessoas de que gosto”, “quero ter mais autoconfiança”, “quero ser autônomo”– e apresentar a elas um monte de novas oportunidades.
Tanto a ascensão da Wikipedia ou da comunidade de software livre oferecem uma oportunidade da criação coletiva. Ninguém está no comando e ninguém tem a garantia de que sua contribuição será aceita, mas em algum lugar entre esses dois polos há uma cultura de compartilhamento, de combinação e de progresso. A pergunta a ser feita é: “Qual valor conseguimos extrair destas oportunidades?” ou “como temos que mudar a cultura para ter vantagem com isso?”.

Dá para comparar as mudanças que vemos hoje com alguma outra mudança histórica?
Sim, com a invenção da cultura impressa, outro período em que o enorme acesso à informação mudou tudo. E quando ela apareceu, havia o temor de que ela centralizaria a cultura. A nova tecnologia permitiria que todos pudessem ter acesso a livros, mas sempre aos mesmos títulos, e a noção de cultura se tornaria mais massiva, ainda mais porque era controlada a pela Igreja Católica. O que aconteceu foi o contrário – e até hoje eu fico impressionado como a Elizabeth Einseinstein fala bem sobre essas mudanças sociais em seu livro A Revolução da Cultura Impressa (Ática, 1998).
Em vez de um mesmo livro ser lido por milhares de pessoas, uma pessoa podia ler milhares de livros. E o choque da diversidade – de formas de pensar e viver – virou o mundo de cabeça para baixo. A internet é uma ferramenta para acessar informação, isso é óbvio, mas é uma ferramenta muito mais importante para conectar uns aos outros. E a variedade de formas de pensar e viver está apenas começando a crescer porque, de repente, a idéia de nicho – você achava que era a única pessoa do mundo que gostava de determinada coisa ou que fazia uma atividade de um jeito diferente – pode ser expressa socialmente. Antes da consolidação da internet assistimos a diferentes movimentos – como a questão ambiental, a luta pelos direitos civis ou os direitos do consumidor – que começaram localizados e se tornaram globais.

Essa mudança poderia acontecer sem a invenção da internet?
Perceba o seguinte: embora a revolução científica não fosse possível sem a invenção da cultura impressa, ela não foi a causa da revolução científica. O que vemos com a internet é a ascensão de uma plataforma que permite o pensamento global numa época de problemas de escala global.
Esse foi o ponto da revolução científica: não foi que os cientistas descobriram que havia a mídia impressa em que eles poderiam publicar suas descobertas, mas o fato de eles perceberem que precisavam de uma cultura em que uns lessem o que os outros estavam fazendo e em que pudessem se desafiar uns aos outros. O foco agora deve ir para essas normas culturais que podem mudar a forma como usamos a internet.

Há algo semelhante à revolução científica em andamento hoje?
A mudança política vai ser a revolução científica desta geração. Precisamos pensar em um conjunto de normas culturais que nos permita lidar com questões que afetam todo o planeta. Não temos isso ainda.
Transformar o mundo inteiro em um só país com um único governo não é a forma correta de lidar com isso, pois é um retrocesso colocar o controle do mundo na mão de um grupo de líderes, mas os modelos que temos hoje também não são apropriados. Temos que pensar em formas de lidar com o engajamento político global.

Algumas das principais transformações hoje são em países em desenvolvimento. Marshall McLuhan dizia que a cultura digital é mais próxima da oral do que da escrita. Você não acha que essa mudança está redefinindo o que é sucesso?
Eu não iria tão longe. Para a maioria das pessoas, o sucesso diz respeito ao impacto que você tem em relação aos outros. Eu posso ser um integrante bem sucedido da minha comunidade a partir do momento em que fiz algo que interesse aos integrantes desta comunidade. Dentro disso, concordo que estamos vendo uma ampla mudança no que chamamos de sucesso, que permite que eu seja recompensado por ser generoso com a minha comunidade e vice-versa. E essa mudança – a habilidade de encontrar grupos ue se importam com as mesmas coisas que você, de forma que você possa ser bem sucedido – vai fazer que a amplitude de formas pelas quais podemos nos conectar uns aos outros aumente ainda mais.

Países menos alfabetizados têm mais facilidade de compreender a cultura digital?
Precisamos que as possibilidades de participação coletiva que vivenciamos principalmente online tornem-se disponíveis não de forma escrita, mas através da voz; não através de computadores, mas de telefones. O telefone é o principal dispositivo de contato para a maior parte do planeta; 4,5 bilhões de pessoas usam o telefone, enquanto outros 3 bilhões usam celulares. Vivemos num mundo em que é muito comum acessar a rede global. O que essas pessoas fazem na internet – se escrevem, leem, tiram fotos ou fazem filmes – é o de menos. A oportunidade e o desafio é como iremos fazer que a motivação social da internet esteja disponível para qualquer um que tenha um telefone – e não só para quem tem computador. E tem coisas que você pode fazer no telefone que não dá para fazer na web – e não estou falando de um iPhone, mas de aparelhos que façam apenas telefonemas e enviem SMS. Acho que é um grande desafio pensar nesses sistemas de organização social.

Você acha que o Brasil é um agente desta mudança?
Claramente. O Brasil é o primeiro país a se alinhar inteiramente a um modelo de compartilhamento como forma de progresso econômico, cultural e social. E isso aparece em diferentes níveis, desde o mais baixo – como a cultura do funk de favela, que pressupõe o compartilhamento em sua essência – até o mais alto, com o presidente Lula dizendo que prefere soluções open source para os problemas do País. Há outros países que estão se desenvolvendo desta forma, mas nenhum outro está tão à frente quanto o Brasil. E é por isso que eu acho que o Brasil é um dos países mais importantes do mundo hoje.

E o resto do mundo percebe isso?
O mundo não percebe isso como um todo, apenas como exemplos que se desenvolvem isolados uns dos outros. Não há a consciência de que essas iniciativas façam parte de um todo, mas que há, de fato, uma cultura brasileira que está sendo desenvolvida ao redor desses modelos. E isso é a coisa mais importante – não só em relação ao País, mas à forma como encaramos cultura digital no planeta.

Ninho de cobras

Atravessei a maratona de programação do Yahoo Open Hack que aconteceu em Nova York, no sábado retrasado – e a materinha saiu no Link de hoje.

Foto: Yodel Anecdotal

Os MCs da premiação, Eric Wu e Neal Sample

Hackers reúnem-se em NY para criar à vontade

Yahoo Open Hack reúne mais de duas centenas de programadores para desenvolver aplicativos a partir das ferramentas e bancos de dados disponíveis

Chris Yeh, responsável pela plataforma de desenvolvimento em rede do Yahoo, está a postos para apresentar os vencedores a nona edição do Yahoo Open Hack, que ocorreu em Nova York, no penúltimo sábado (10). Em frente a uma plateia formada pelos programadores que participaram do evento, ele explica sua falta de intimidade ao falar em público e comenta que, sob a imponência do local da apresentação (o centenário Hudson Theatre, do hotel Millennium Broadway, quase vizinho ao Times Square) e devido ao caráter técnico de seu cargo, se limitará a ler os termos de uso da plataforma de desenvolvimento do site.

Mero jogo de cena. À medida em que começa a ler as letrinhas miúdas do termo, Yeh é interrompido por outros dois executivos do site, Neal Sample, vice-presidente para plataformas sociais, e Eric Wu, gerente-sênior para integrações e aquisições. “Estamos hackeando sua apresentação”, explicam os dois, que sobem ao palco em trajes nada executivos – ambos vieram paramentados de acordo com a estética do evento, o tema “steampunk”, característico da revolução tecnológica da Inglaterra vitoriana. E antes de dar início à apresentação, exibem um vídeo que fizeram há pouco, na Times Square, em que pediam para os transeuntes explicarem o que eles entendiam por “hacker”.

O resultado, claro, foi um festival de variações de “alguém que invade seu computador com más intenções”. As gargalhadas do público – programadores e desenvolvedores, mas também hackers, todos eles – vinham de duas constatações: a de que a maioria das pessoas ainda associa o termo à má-fé e a de que, aos poucos, essa definição está sendo revista.

Vide o próprio Yahoo Open Hack, maratona de 24 horas de programação, em que desenvolvedores de Nova York foram convidados a hackear os códigos do Yahoo para criar aplicativos que possam melhorar o desempenho do site e até bolar soluções que os programadores originais sequer cogitaram originalmente. Diferentes palestras e apresentações ocorriam ao mesmo tempo em que um andar inteiro do Millenium Broadway foi tomado por programadores que, espalhando-se entre pufes, poltronas e mesas, transformaram o ambiente numa pequena zona autônoma temporária, com regras e éticas próprias.

Terminado o prazo, os hackers tiveram dois minutos cada para apresentar seus feitos, que variavam de coisas completamente inúteis até invenções realmente inovadoras. Na primeira turma, ninguém foi mais infame do que o New York Toast, criado pelo grupo MarketBot. Modificando uma impressora 3D, eles fizeram que o aparelho pudesse “imprimir” notícias e fotos em torradas, usando pasta de amendoim.

Mas estes eram minoria. Entre outros apresentados estava o Power Trends, do grupo Power Trio, que permitia, através de redes sociais, fazer que prefeituras pudessem acompanhar e, assim, economizar o consumo de energia des seus cidadãos. O AudioTexter, do grupo HellaCool, transforma mensagens de SMS em áudio e vice-versa. O programador Tom Pinckney criou o Community Bulletin Boards, que permite acrescentar fóruns de discussão em pontos de mapas online, e o grupo Yinzoo criou o TVitter, que permite que telespectadores usem o Twitter para comentar programas de TV em grupo. O campeão, apresentado por Addy Cameron-Huff, foi o InsiderTrades.org, que usa aplicativos de finanças para passar informações em tempo real para os investidores, sem a interferência humana – tudo é gerado por bancos de dados.

O evento faz parte de mais uma reinvenção do Yahoo, que sai de um ano marcado pela longa possibilidade de fusão com a Microsoft. Os dias de hacker do Yahoo já aconteceram em nove cidades do mundo – inclusive em São Paulo, no final do ano passado – e são cruciais para este novo Yahoo, que abre APIs e bancos de dados para aproximar-se destes personagens que ainda são vistos como vilões digitais. “Apostamos nisso, além do marketing tradicional”, diz Cody Simms, da plataforma YOS, ao referir-se ao enorme outdoor que o grupo acaba de inaugurar em plena Times Square.

Dan Brown, de novo

Dessa vez mexendo na história do mercado editorial:

Qual é o segredo do autor do ‘Código Da Vinci’?

Dan Brown volta às notícias com seu novo livro, ‘The Lost Symbol’: o e-book está vendendo mais do que o livro de papel

Vão falar em conspiração. Apesar do novo livro de Dan Brown, The Lost Symbol, mais uma vez abordar temas polêmicos, ele está prestes a entrar para a história por outro mérito: desde seu lançamento, na terça-feira passada, o livro ocupa, simultaneamente, as duas primeiras posições na lista dos mais vendidos em ficção na loja online Amazon. O detalhe histórico é que a versão eletrônica, o e-book, que só pode ser lida no Kindle, o e-reader lançado pela loja, está acima da versão em papel.

Aguardado desde o lançamento de O Código Da Vinci, que vendeu mais de 80 milhões de exemplares em todo mundo, o livro não criou uma expectativa de lançamento como se esperava, mesmo com o uso de ferramentas como o Twitter e o Facebook para promovê-lo. Mas sem vender um exemplar sequer, Lost Symbol já tinha conseguido seu pequeno lugar na história ao se tornar o primeiro livro a ser lançado tanto em formato eletrônico quanto em papel no mesmo dia. Até então, a cópia eletrônica sempre era lançada depois.

Mas bastou o livro chegar às lojas para conseguir suas primeiras marcas consideráveis. A primeira foi no terreno físico. Lost Symbol atingiu a marca de um milhão de cópias vendidas no primeiro dia de lançamento.

O feito invejável veio logo que a semana terminava e, embora a Amazon não confirmasse oficialmente, estava no site: o e-book, lançado há menos de uma semana, era mais vendido do que a edição de papel, posto em pré-venda há seis meses.

No Brasil, a editora Sextante, que lançará o livro em dezembro, já criou um blog (www.sextante.com.br/simboloperdido) para divulgar o lançamento. Mas não há previsão sobre uma versão eletrônica do livro.

Mas o ponto é que, mesmo que no fim das contas o e-book ainda não desbanque o livro de papel, vimos, na semana passada, o primeiro passo dado rumo à popularização do livro eletrônico, fato de que até os mais céticos duvidavam.