Do outro lado do mundo

Taí o que eu fui fazer na Nova Zelândia: visitar a Weta Digital, o estúdio que o Peter Jackson construiu em seu país para colocá-lo no mapa.

Direto do futuro
No estúdio de ‘Avatar’, dá para se ter uma ideia de como serão feitos os filmes amanhã

Na semana passada, estive no futuro. Literalmente, pois estava 15 horas à frente do fuso horário brasileiro, e metaforicamente, já que fui visitar as entranhas do estúdio Weta Digital, o complexo de efeitos especiais criado pelo diretor Peter Jackson em Wellington, capital de seu país de origem, a Nova Zelândia.

E além de conversar com parte da equipe que transformou uma ideia que James Cameron teve nos anos 90 no filme que mais faturou dinheiro no mundo (outro Blu-ray de Avatar chega às lojas em duas semanas), pude ver que, mais do que simplesmente criar épico atrás de épico, o estúdio neozelandês já faz, hoje, o cinema do futuro.

“Acho que Avatar abre uma porta para que as pessoas contem histórias que não poderiam ser contadas de outra forma”, explica o produtor do filme de James Cameron, o norte-americano Jon Landau. “Há um erro conceitual sobre o que tentamos fazer, acham que estamos querendo nos livrar dos atores. Mas é o contrário: queremos preservá-los para que eles façam coisas que não poderiam fazer antes”.

Landau, que trabalhou com o Weta apenas em Avatar e não pertence ao estúdio, obviamente puxa a sardinha para o filme que produziu, mas o que foi realizado no filme de Cameron é só mais um degrau na escalada tecnológica proposta pelo estúdio de Jackson. Desde sua criação, o Weta concentra esforços em criar ambientes virtuais que não sejam percebidos como tal pelo público. Foi assim com a Terra Média de O Senhor dos Anéis e com o início do século 20 gerado artificialmente em King Kong.

“Antes trabalhávamos com alguns personagens específicos, como os dinossauros de Jurassic Park”, conta o norte-americano Joe Letteri, supervisor dos efeitos especiais do estúdio e pioneiro em computação gráfica ao criar os répteis gigantes do filme de Spielberg. “Naquela época, apenas criávamos um ser digital e tínhamos de encaixá-lo no filme. Agora criamos o ambiente, um planeta, um universo inteiro digitalmente.”

E não se trata apenas do universo visto no filme. Enquanto entrevisto Landau, uma demonstração de como funciona a captura de movimento dos atores é realizada – e quem se interessa por efeitos especiais já deve ter visto cenas em que o ator veste uma roupa engraçada, cheia de pontos de referências cujos movimentos serão traduzidos digitalmente em uma imagem gerada por computador.

Há câmeras por todos os lados (até no teto) e um dos funcionários do estúdio usa uma “ câmera” portátil para acompanhar de perto os atores. Essa câmera vem entre aspas porque ela, na verdade, não é uma câmera de verdade: é um aparelho virtual.

Produção virtual. Hein? Explico: uma vez que os movimentos físicos são captados por todas as câmeras espalhadas pelo cômodo, James Cameron resolveu fazer o mesmo com seu próprio instrumento de trabalho. Assim, a câmera virtual não filma de verdade, mas seus movimentos (no caso, os do diretor) são registrados por todas as lentes que estão ao redor e esses movimentos são traduzidos para a tela. Monitores ao redor da sala mostram os atores já inseridos no cenário virtual, em vez da antiga tela verde que obrigava atores e diretores a imaginar cenários e personagens digitais. Esse processo foi batizado de produção virtual.

“O interessante é que, se um ator espirra durante uma tomada perfeita ou se alguém passa por trás da cena sem que o diretor perceba, ela não se perde”, conta o argentino Sebastian Sylwan, responsável por toda a área tecnológica da Weta. “Assim, direção, atuação, efeitos especiais, fotografia e outras etapas da produção de um filme deixam de depender umas das outras. As pessoas me perguntam quanto tempo que demora a pós-produção de nossos filmes. Eu respondo que demoram o mesmo tempo que a própria produção!” Letteri emenda: “Fazer filmes está virando um processo cada vez mais não-linear”.

A captura de imagens dos atores vai além do movimento corporal. Outra inovação também proposta por Cameron e executada pelo estúdio foi a criação de um capacete com uma haste que ficava logo em frente ao rosto dos atores. O que parece um microfone é, na verdade, um conjunto de câmeras para captar expressões faciais, depois traduzidas em computação gráfica graças ao trabalho da equipe do neo-zelandês Mark Sagar, coordenador de projetos especiais.

“Nos dedicamos a estudar o rosto humano e aprendemos que qualquer pequeno músculo pode mudar toda a expressão do ator”, conta Sagar. “E assim criamos uma gama de movimentos musculares que usamos como um alfabeto ou notas musicais – basta juntar determinados movimentos e criamos uma expressão completamente nova” , explica enquanto mostra, no computador, a gama de expressões dos personagens de Avatar.

“Esse mesmo tipo de tecnologia pode tornar um ator mais jovem, mais alto, mais magro e mais velho do que ele realmente é” , continua Landau. “Não acho que funcionaria colocar Will Smith para reviver o personagem Dirty Harry mais novo – mas é possível que o próprio Clint Eastwood reviva seu personagem como se ainda estivesse nos anos 70. É uma forma de preservar o trabalho do ator.”

Pé no chão
Mas nem tudo é virtual no mundo da Weta – e boa parte dos efeitos tem um pé no mundo real. Principalmente os objetos usados em cena, feitos na Weta Workshop, dirigida pelo neozelandês Richard Tayor, um dos fundadores do estúdio. O clima dentro da oficina é quase militar tamanho o sigilo. Taylor explica que a pesquisa feita para criar armas e veículos – tanto dos alienígenas aborígines quanto dos seres humanos do futuro – é extensa a ponto de incluir a criação de coisas que não serão nem vistas no filme – como toda a hierarquia tribal dos Na’Vi, o ciclo de vida das plantas de Pandora e até os cigarros -vendidos com prescrição médica – fumados pelo personagem de Sigourney Weaver.

Toda a pesquisa não foi em vão: além de servir como base para futuras continuações, ela tornou quase instantânea a criação da Pandorapedia, enciclopédia do universo de Avatar, um dos extras do novo Blu-ray. Os protótipos são criados primeiro como ilustrações e depois como objetos. Então, são escaneados para serem usados nos filmes. No enorme galpão, é possível ver um jipe usado do filme Distrito 9, o tanque em que os Na’Vi são postos em estado de suspensão, um pedaço de parede de prédio escalado por King Kong, tudo em tamanho real.

Pele boa
Além destas peças, outros detalhes vêm do mundo não-virtual, como as texturas de pele produzidas pela equipe do diretor de arte Gino Acevedo. “Escaneamos a pele de quase todo mundo que trabalha aqui” , brinca. “Se dispensávamos alguém, dizíamos para que a pessoa tomasse a dispensa como um elogio, pois a pele dela era perfeita demais para ser usada.”

Outras áreas são puramente virtuais, como toda a floresta de Pandora, concebida a partir de esboços feitos por Cameron. O supervisor de animação David Clayton fala da criação de mais de cinco mil plantas diferentes, muitas delas que não são nem vistas com detalhes no filme, mas que tiveram toda sua biologia desenvolvida virtualmente. E ele mostra as diversas camadas criadas para dar credibilidade a uma selva totalmente imaginária.

Petabytes
Para processar todos esses dados, os estúdios Weta têm um data center robusto, que processa nada menos que 15 petabytes de informação – ou 15 milhões de gigabytes. Só Avatar consumiu dois destes 15 petabytes. Parece muito (e é), mas fica pequeno se compararmos aos 24 petabytes gerenciados diariamente pelo Google.

E embora o lançamento das continuações de Avatar esteja distante (Avatar 2 e 3 devem ser lançados em 2014 e 2015, respectivamente), Landau já cogita alguns desafios que veremos a seguir. “É hora de aprendermos a colocar todo esse universo debaixo d’água. Veremos muitas cenas subaquáticas e teremos mais desafios envolvendo tecnologia e ciência para tornar toda a ação crível.” Letteri atualmente trabalha na adaptação das histórias do personagem de quadrinhos belga Tintin para o cinema ao lado de Steven Spielberg (que dirige) e Peter Jackson (que produz) e já cogita seu novo desafio: ir além dos 24 quadros por segundo, a fronteira do movimento no cinema.

Entrevista: Joe Letteri, supervisor dos efeitos especiais do Weta Digital

Em termos técnicos, como comparar o primeiro filme em que você trabalhou com efeitos especiais, Jurassic Park, com Avatar?
Os efeitos de Jurassic Park levaram mais de um ano para serem feitos, e são apenas 50 cenas. Hoje, faríamos este mesmo trabalho em menos de uma semana. Sendo ainda mais específico: acho que o meu iPhone hoje é mais avançado tecnicamente do que se juntássemos todos os computadores usados para fazer Jurassic Park.

Sendo assim, seu trabalho também é mais um desafio técnico do que artístico.
Com certeza, porque quando você tenta tornar algo crível, começa a ter de lidar com a ciência por trás daquilo – o motivo da pele ter certa aparência sob determinada luz, como os músculos se comportam. É inevitável que chegue um ponto em que tem de lidar com matemática, física e a capacidade de processamento dos computadores.

Como você sabe que a cena terminou, uma vez que dá para acrescentar camadas e mais mais camadas a ela?
Dá para saber quando terminar, mesmo porque tudo é planejado com antecedência. Mas normalmente estamos mais preocupados com o impacto emocional da cena do que com o visual. Quando atingimos o que queremos que o público sinta, é a hora de parar.

Os desafios tecnológicos tiram o seu sono?
Pelo contrário. É muito comum tentar coisas ainda mais difíceis apenas pelo prazer de fazer algo que ninguém nunca fez. Isso quase sempre quer dizer mais trabalho, mais esforço, mas eu sou continuamente estimulado por isso. Há tanto para aprender e é tão divertido ao mesmo tempo. Trabalhamos muito com paixão por aqui, por isso sempre tentamos descobrir o que é que as pessoas com quem trabalhamos gostam, de verdade. Por mais estranho que possa parecer o interesse, aquilo pode ser usado para melhorar o trabalho – e sempre melhora. E temos sorte de trabalhar com diretores como Steven (Spielberg), Peter (Jackson) e Jim (Cameron).

Uma vez que vocês criaram o ambiente de Avatar, será mais fácil fazer as continuações que Cameron tem em mente?
Sim, mas sabemos que não vamos nos contentar em simplesmente fazer uma nova história no mesmo ambiente. Então, provavelmente iremos nos lançar em novos desafios. É importante não ficarmos estagnados.

Quais são os desafios tecnológicos para o futuro? O 3D já parece ter sido assimilado…
Uma das próximas coisas que já é possível fazer é aumentar a quantidade de quadros por segundo, mas isso não é um desafio técnico e, sim, artístico. O cinema usa 24 quadros por segundo para criar a ilusão de movimento, mas tecnicamente é possível ir muito além disso. E aí entra o desafio criativo: o que fazer com esse nível de detalhe do movimento. E como é uma escolha estilística, acho que é preciso muita experimentação para se ter uma ideia do que fazer com essa nova técnica. É como o 3D, de certa forma, pois abre uma nova dimensão na forma de perceber o filme. Será que isso é melhor para cenas mais lentas ou mais rápidas? Para suspender a narrativa ou para torná-la mais ágil? Ainda estamos testando isso e não é claro como iremos usar esse novo recurso. Atualmente, nosso desafio é fazer que todas essas novidades que fizemos nos últimos anos tornem-se mais integradas umas às outras, principalmente para que os diretores e atores possam ter uma resposta mais rápida em relação àquilo que estão fazendo.

A Weta Digital desenvolve vários softwares para solucionar problemas propostos por vocês mesmos. Eles irão ao mercado?
Começamos a publicar nossos softwares agora mesmo. O primeiro deles é o Mari, ferramenta que usamos para dar cores, iluminação e textura para os nossos modelos virtuais. Ele está começando a ser vendido por uma empresa londrina chamada Foundry, mas leva a nossa marca, Weta Digital.

Como você vê a relação entre cinema e videogame?
Games e filmes são duas mídias diferentes. Uma funciona em relação a uma experiência pela qual as pessoas podem descobrir seu rumo por ela e ter sua própria história, a outra diz respeito a contar uma história. Entendo a relação entre ambas, mas prefiro fazer que o público acompanhe a história que estou contando. E ambas usam a mesma tecnologia de base, por isso eu sei do que está acontecendo nessa área. Mas não acompanho games, não tenho tempo!

Mas você não acha que as pessoas irão querer fazer seus próprios filmes, como já jogam, hoje, suas partidas de videogame?
Não. Não acho que as pessoas queiram isso. Elas querem ver histórias. Veja quantas pessoas têm caneta e quantas querem escrever um livro.

Máquina do tempo
A influência dos efeitos especiais na história do cinema

Como o cinema é uma das expressões culturais mais dependente de aparelhos e equipamentos, muitos de seus avanços artísticos quase sempre estiveram atrelados a inovações técnicas. Experimentos de linguagem (como closes, cortes de cena, zoom) e novidades tecnológicas (som, cor, câmeras digitais, 3d) ajudaram a moldar a narrativa cinematográfica como a conhecemos hoje e, em muitos casos, histórias futuristas tiveram de ser contadas para justificar inovações. A história dos efeitos especiais na sétima arte se confunde com a própria história dos filmes de ficção científica.

Avatar é apenas o filho caçula de uma linhagem que conta com representantes tão diferentes quanto o dinossauro Gertie (do animador Wilson McCay) e o Jornada nas Estrelas de J.J. Abrams – de filmes que criavam uma fantasia de futuro para executar, na prática, o futuro do cinema. A abaixo lado reúne alguns dos grandes nomes que fizeram parte dessa história.

1902
Viagem à Lua
Além de cineasta, o francês Georges Méliès era mágico. E usou truques como a superposição de imagens para criar ilusões.

1933
King Kong
Ápice da carreira do primeiro grande mestre dos efeitos especiais, Wills O’Brien, um dos inventores do stop-motion, usado até hoje.

1956
O Planeta Proibido
Primeiro filme com trilha sonora totalmente eletrônica marca a estreia de um robô no cinema

1968
2001
Primeiro a usar em grande escala a técnica da projeção frontal, em que cenários e atores eram superpostos ao mesmo tempo em que se filmava.

1977
Guerra nas Estrelas
Introduziu a fotografia de movimento controlado, técnica que mistura miniaturas a cenas reais filmadas lentamente.

Contatos Imediatos do Terceiro Grau
Douglas Trumbull, que trabalhou em Guerra nas Estrelas, deu vida a naves espaciais com o mesmo processo de fotografia, mas em espaços abertos.

1991
Exterminador do Futuro 2
James Cameron investiu pesado em efeitos especiais e, pela primeira vez, usou cenas de atores com imagens criadas por computador.

1993
Parque dos Dinossauros
Spielberg usa computação gráfica para criar os seres pré-históricos e estabelece novo padrão de efeitos especiais.

O filme do Facebook

Assisti semana passada – e é tudo isso mesmo.

Foi com ceticismo que interrompi minhas férias por três horas, na semana passada, ao entrar em uma sala de cinema nos EUA para assistir ao filme sobre o Facebook. Líder nas bilheterias daquele fim de semana, A Rede Social também recebeu aplausos e elogios de quase todas as publicações norte-americanas – citar uma lista só com os veículos que lhe deram cotação máxima em suas avaliações enumera nomes que vão de carros-chefe da indústria como Hollywood Reporter e Variety a revistas como Time, Rolling Stone e New Yorker e jornais como Washington Post, Wall Street Journal e Los Angeles Times.

Para completar, o filme reúne um time exemplar: dirigido por um dos melhores cineastas de sua geração (David Fincher, de Clube da Luta e Zodíaco), escrito pelo mesmo Aaron Sorkin que deu ao mundo West Wing (o seriado sobre a Casa Branca que spoilou a realidade ao antever a eleição de Barack Obama) e protagonizado por Jesse Eisenberg (herói dos melhores hits discretos de 2009, Zombieland e Adventureland), além do cantor Justin Timberlake e dos bons novatos Andrew Garfield e Armie Hammer. Enquanto escrevo, surgem notícias apontando o filme como forte candidato ao Oscar de 2011. Mas como o excesso de expectativa costuma ser fatal para qualquer obra, fui sem esperar nada.

E me impressionei. A Rede Social, que chega aos cinemas brasileiros no início de dezembro, é o filme mais importante de 2010. E antes que os cinéfilos venham atirar pedras, vale lembrar que “mais importante” não é sinônimo de “melhor” (este posto continua com Um Homem Sério, dos Irmãos Coen). A Rede Social é o filme mais importante do ano por fazer que Hollywood saia do casulo sem assunto em que se fechou no início do século, quando preferiu recriar universos mitológicos – seja de super-heróis ou de livros clássicos – para voltar a falar de algo que faça sentido para a vida de seu público, reassumindo um papel que já foi seu mas que, nos últimos dez anos, foi substituído pela TV.

Mas não é irônico que, para isso acontecer, o cinema norte-americano tenha de falar da criação de um site de internet?

Não. E não apenas pelo tema do filme ser um site com meio bilhão de cadastrados, mas pelo fato de o cinema finalmente reconhecer a importância do meio digital para a história contemporânea. Hackers eram tratados como seres mágicos, prontos para quebrar barreiras de segurança sempre que o herói do filme, frequentemente avesso às novas tecnologia, se via diante de um computador.

Mas se antes isso era exceção, agora não é mais: vivemos em um mundo digital e é ridículo pensar que a única obra cinematográfica feita sobre este universo seja um filme feito para a televisão (Piratas do Vale do Silício, de 1999, sobre a rusga de Bill Gates e Steve Jobs).

A Rede Social parte do princípio de que o Facebook é tão importante hoje quanto os jornais foram no tempo em que Cidadão Kane foi feito por Orson Welles – a comparação é do próprio Fincher, que chama o filme de “o Cidadão Kane da geração John Hughes” – e para entender as motivações por trás desta nova mídia, foi preciso entrar na mente de seu criador. Mas ao contrário de Welles, que pintou seu William Randolph Hearst (o Kane original) com tons amarronzados de jornalismo barato, Fincher preferiu fixar-se no paradoxo de que a ferramenta mais popular de interação em tempos de internet ter sido criada por um hacker antissocial.

Juntos, diretor, roteirista e ator criam um Zuckerberg frio, robótico, ríspido, automático; um ser humano falho, mas uma máquina de programar – e programar tudo. E, como havia feito em Zodíaco, prefere não desvendar o mistério, apenas ampliá-lo. Quando o filme termina ao som de “Baby You’re a Rich Man” dos Beatles, com Zuckerberg dando reload em uma página do Facebook, sabe-se tanto sobre o Cidadão Zuck quanto se sabia antes do início do filme.

E não pense que A Rede Social é um caso isolado. Um filme sobre o Google já está sendo produzido e não duvide que, em breve, possamos assistir à vida de Steve Jobs no cinema. Com Tom Hanks, como sugeriu minha mulher ao final da sessão, no papel do pai da Apple.

Pogue no Link

Entrevistei o David Pogue, novo colaborador do Link, para a capa desta edição.

MSN, TVs de tela plana, laptops, YouTube, smartphones, Google, MP3 players, e-readers, streaming, redes sociais, câmeras digitais, Wi-Fi, Twitter… É estranho imaginar que há dez anos nada disso existia de fato. E nesta primeira década do século 21 um jornalista viu toda essa história sendo escrita em primeira mão e de um posto privilegiado. A partir de hoje, os leitores do Link poderão acompanhá-lo perto: David Pogue, colunista de tecnologia do New York Times, estreia seu blog em nosso site no endereço http://blogs.estadao.com.br/david-pogue/.

“Muita coisa mudou nestes últimos dez anos”, diz o jornalista norte-americano, em entrevista por e-mail. “No ano 2000, nenhum dos sites da hoje onipresente web 2.0 existia: nem Facebook, nem YouTube, nem Twitter, nada. Outra mudança dos últimos dez anos foi o enorme declínio nos canais tradicionais de mídia e comunicação: jornais, revistas, telefones fixos, audiência na TV. E o tempo gasto online cresce cada vez mais.”

Formado em música na Universidade de Yale (sim, ele é maestro e apresentou-se tocando teclado num TED em 2007!), Pogue começou a escrever sobre tecnologia em 1988, na coluna Desktop Critic da revista Macworld. Em novembro de 2000 foi contratado pelo New York Times para escrever a coluna State of the Art, que mantém até hoje no caderno de negócios do jornal. Ele ainda assina a newsletter From the Desk of David Pogue e mantém o blog Pogue’s Posts, que passa a ser republicado com exclusividade no site do Link.

É natural que ele seja publicado em um caderno de tecnologia que, há seis anos, percebeu que esse assunto não é mais coisa de geeks sem vida social ou fanáticos por aparelhos. “As pessoas são tão, ou mais, importantes do que as máquinas”, diz, questionado sobre as principais mudanças da última década. “Se a tecnologia não agrada ou serve às pessoas, morre rapidamente.”

Para ele, o melhor ícone desta primeira década digital é o iPhone: “Pois ele combina muitos componentes como nenhum outro aparelho fez – entrada e saída de áudio e vídeo, GPS, sensor de movimento, de proximidade e de luz, Bluetooth… Ele criou toda uma nova categoria de produtos, que eu chamo de ‘telefone de aplicativos’. Foi-se o tempo em que o celular servia para fazer chamadas ou checar e-mails – agora rodamos aplicativos nele”. E continua, festejando a cria mais popular da Apple. “O iPhone fez mais do que isso: antes dele, as operadoras de celular controlavam o design de softwares. Steve Jobs insistiu para que a Apple tivesse todo o controle criativo – e quando as operadoras perceberam que era boa ideia permitir que fabricantes pensassem o interior do telefone, todo o ecossistema mudou”.

Ele não conhece nada sobre a cultura digital brasileira. “Mas se eles vão ler o meu blog, é óbvio que têm um gosto excelente! Quero conhecê-los, ainda que digitalmente!”. Bem-vindo, Pogue. Sinta-se em casa.

Retrospectiva Pogue:

2000

MSN
A Microsoft mudou sua estratégia para o MSN de novo, e, desta vez, pode ser que tenha acertado. O MSN Explorer empacota as melhores funções de internet em uma única e colorida janela. Ter um painel de controle unificado poupa o esforço de aprender a usar um programa para cada função.

2001

HD externo
Até um dia desses, a Iomega deu a todos os seus produtos nomes onomatopaicos: Jaz, Click, Buz. O primeiro produto batizado assim, o Zip drive, foi um sucesso. Mas o tempo passou (whooosh!): um disco Zip hoje não dá conta de coleções de MP3, arquivos de Photoshop ou vídeos digitais. Pior, alguns discos tiveram problemas graves (crash!). Usuários moveram ação coletiva contra a Iomega (crunch!). Depois que a poeira baixou, a empresa fez duas mudanças. Primeiro, abandonou as onomatopeias. Segundo, lançou um novo tipo de disco removível, o Peerles. O nome é adequado: não há nada como ele.

Windows XP
A Microsoft vem liberando versões de teste há alguns meses, e na última semana apresentou o produto final. E até a boa notícia é grande: o Windows XP é muito atraente e extremamente estável.

iPod
A Apple não costuma mandar cartões de boas festas. Então, quando a companhia enviou cartões para os repórteres na semana passada, muito cedo para o Natal, muito em cima da hora para o Halloween, dá para entender a curiosidade gerada. A mensagem alardeava a revelação de um “aparelho revolucionário”. O que poderia ser? A Apple anunciou o iPod, basicamente um tocador de música portátil. Ou melhor, o mais sofisticado tocador de música portátil jamais produzido.

2002

TV tela plana
Recentemente, Sharp, Samsung e Panasonic inauguraram uma nova categoria de telas widescreen caras, mas de tirar o fôlego: painéis planos de cristal líquido. Estes aparelhos só são acessíveis a quem espera ganhar na loteria para pagá-los, mas merecem ser vistos mais de uma vez. Se você já viu um deles, sabe o efeito que causam: o pulso acelera, os olhos não piscam e surge uma súbita vontade de vender seu carro para conseguir mais dinheiro.

2004

Gmail
Como estudantes de Stanford constroem uma empresa que fatura bilhões de dólares por ano em cinco de existência? Parte da resposta vem de uma ótima tecnologia de buscas. Mas outra parte vem do lema da empresa: “Não seja mau”. Isso explica porque a página do Google é quase vazia: anúncios e gráficos tornam a navegação mais lenta. Também explica porque os anúncios são claramente separados do resultado das buscas. Se você colocar anúncios pagos no meio da busca, como fazem Microsoft e Yahoo, você pode ser mau. Mas quando o Google disse que seu novo Gmail, que mostrava anúncios relacionados a sua correspondência, estava em teste, a reação foi de choque.

BlackBerry
Nos anais do consumo de eletrônicos, alguns aparelhos são tão presentes que criam cultos entre seus compradores. Você sabe: maníacos por Mac, malucos pela Palm. Entre a multidão engravatada, um aparelho em particular ganhou apelido próprio: Crackberry. É uma referência ao Blackberry da RIM, um palmtop altamente viciante que permite que você cheque seus e-mails em tempo real.

2006

Web 2.0
Em 2006, a grande tendência da internet foi a web 2.0 – sites que pedem a participação do público, como YouTube, MySpace, Wikipédia, Digg e Flickr, que eram abastecidos com conteúdo gerado por seus usuários. Nesses sites, a web não é só um ambiente de publicação – é um diálogo global.

2007

iPhone
Lembra da fada-madrinha de Cinderela? Ela balançava sua varinha de condão e transformava algo comum, como uma abóbora, em algo glamouroso, como uma carruagem. Ela certamente mora em algum lugar na Apple. Toda vez que Jobs vê algo desesperadamente feio, qualquer máquina complexa que chore pelo toque da Apple – como computadores ou tocadores de música –, ele a deixa sair. E na Macworld deste ano, Jobs mostrou o mais novo produto de sua fada madrinha. Ele satisfez os desejos de milhões de fãs da Apple ao transformar o celular… no iPhone.

Kindle

E-readers vêm e fracassam. O da Sony segue sendo vendido até hoje, às dúzias. Então a Amazon resolve lançar seu aparelho, chamado Kindle. Estão malucos? O Kindle é uma prancheta de plástico branco fina, que vem com uma capa de couro. Não é, er…, lindo: é tudo de plástico, tem ângulos duros e lembra uma pastiche do Commodore 64.

2008

Twitter
Por muito tempo, meus leitores me incomodaram para checar esta coisa chamada Twitter. Tentei evitar, pois parecia mais uma destes drenos de tempo online que viram moda. E-mail, blog, chat, RSS, Facebook… Quem ainda tem tempo para mais um bate-papo? Mas, para falar a verdade, não há nada como o Twitter.

2009

Netbook
O termo netbook é um eufemismo que tende a salientar as principais atividades a que ele é destinado: checar e-mail, navegar na internet, chat, Skype e processadores de texto. Talvez seja a intenção de distrair de tudo o que o netbook não faz bem: Photoshop, edição de vídeos, games etc.

Bing

Nos últimos 15 anos, o plano de negócios da Microsoft deve ter sido “espere alguém conseguir um sucesso e depois copie”. Parece maldade, mas vamos lá – a lista de cópias feita pela empresa é tão grande quanto seu braço: PalmPilot/Pocket PC, Netscape Navigator/Internet Explorer, Mac OS X/Windows Vista, iPod/Zune. E agora vemos outro esforço “eu também” da Microsoft. Chama-se Bing e é o mais novo representante na tentativa da empresa em imitar o Google.

2010

TV 3D
Há um interesse explosivo na TV 3D. Por parte das empresas, fique claro. Se as pessoas vão querer isto ou não, segue como uma grande pergunta.

iPad
Nos dez anos em que analiso produtos nunca vi algo que polarizasse tanto as opiniões quando o iPad da Apple. “Este aparelho é um absurdo risível”, disse um comentarista num blog de tecnologia. “Como eles querem que as pessoas levem a sério um computador sem mouse?”, “É uma revolução mágica”, disse outro, “eu não posso imaginar porque qualquer um queira voltar a usar mouse e teclado depois de experimentar a interface visionária da Apple”.

Legião Urbana Rock Band?

Conversei com Dado e Bonfá sobre o futuro digital da Legião Urbana para esta edição do Link.

Legado digital
O grupo brasiliense foi o último grande nome da música brasileira a abraçar a web – e agora quer redescobrir sua história com a ajuda dos fãs

Quando entrevistei Renato Russo, dois anos antes de sua morte em 1996, em dado momento da conversa, o líder da Legião Urbana falou da vontade de lançar uma caixa com todo material do grupo que circulava entre os fãs via fitas cassete e de VHS em uma caixa chamada Material.

Completamente obcecado pela própria carreira, Renato já havia organizado os registros da banda brasiliense em dois momentos específicos: em 1987, no disco Que País É Este? – 1978-1987, quando resumiu a história da banda até ali como se fechasse um capítulo; e em 1992, no disco Música P/ Acampamentos, que reunia gravações ao vivo e faixas que nunca haviam entrado em disco.

A caixa chamada Material seria o terceiro momento. Mas o projeto foi abandonado e substituído pelo lançamento da caixa de CDs Por Enquanto em 1995, que compilava todos os discos da banda.

Sou da mesma cidade em que a banda foi formada e desde os anos 80 já eram conhecidos os registros não-oficiais da banda (leia nesta página). E, como qualquer fã do grupo, aguardava o momento em que essas gravações fossem lançadas oficialmente. Parece que agora, quase 15 anos após a morte de Renato, Material começa a dar sinais de que sairá do papel.

E a organização destes registros pode partir dos próprios fãs da Legião, que agora têm ponto de encontro garantido no site oficial da banda, aberto em fase beta no início do ano e que só agora foi lançado oficialmente. O motivo é o relançamento da discografia do grupo tanto em CD quanto em vinil, que finalmente foi agendado para o próximo mês de setembro.

“O Legiãourbana.com.br funciona como um site de relacionamentos”, diz o ex-baterista da banda, Marcelo Bonfá. “Não queríamos um site com biografia, discografia e fotos porque isso todo mundo tem. Então recorremos ao que ninguém tem: os fãs”. Assim, o site se tornou um grande repositório de material reunido pelos fãs – fotos, músicas e vídeos podem ser subidos no site por qualquer um que os tenha. Vale tudo: de ingressos de shows a matérias escaneadas e até fotos autografadas.

“E o site vai crescer muito ainda, pois é um ambiente de interação. A grande força da Legião são seus fãs”, explica o ex-guitarrista Dado Villa-Lobos. “O Renato sempre falava nos shows: ‘A Legião Urbana são vocês’”, lembra Bonfá, “e, do mesmo jeito que as letras da Legião são aberta à interpretação, o site é um estímulo à troca de informações entre os fãs. Afinal, a Legião acabou mesmo e a gente não tem mais nada para apresentar”.

Arqueologia
Mas e a caixa Material? “Era um sonho do Renato, uma caixa com outtakes, programas de TV, ensaios, músicas que não entraram… Mas isso depende de um trabalho quase arqueológico”. A banda até arriscou fazer isso, mas não teve paciência.

“A gente colocou um cara lá dentro da EMI para digitalizar o material e começaram a chegar coisas tipo 35 CDs de ‘Ainda é Cedo’, 40 e tantos CDs de ‘Faroeste Caboclo’… Porra, cara, eu não vou ficar ouvindo esse negócio. Isso é pra fã maluco, você não vai pedir para o cara que gravou isso ficar ouvindo tudo… Fora que eu acho que isso é material para internet, ninguém vai comprar tudo que gravamos”, lembra Bonfá. “Em algum momento eu tomava um vinhozinho, me empolgava, descobria algo legal e falava ‘porra, vamos lançar isso!’. Mas não pode ser assim, esse tipo de trabalho tem de ser feito de forma minuciosa, com carinho.”

“Mas as coisas no Brasil andam num ritmo muito lento, esse site está sendo cogitado há dois anos”, diz o baterista. “E aqui no Rio a gente ainda tem o fator 021, que parece que deixa as coisas ainda mais lentas”, completa o guitarrista.

E já que a ideia é abraçar o meio digital, por que não um Legião Urbana Rock Band? “Pois é, cara, toda hora eu falo disso”, conta Bonfá. “É inaceitável não ter um negócio desses com a obra que a Legião tem, ia ser uma brincadeira deliciosa pra todo mundo – e era o que ia salvar a editora e a gravadora”. “Seria lindo e simples”, conclui Dado.

‘Estou indo pra Brasília…’

Aborto Elétrico
A primeira encarnação da Legião Urbana era composta por Renato Russo e pelos irmãos Fê e Flávio Lemos (que depois fariam parte do Capital Inicial). Quase todas as faixas do Aborto Elétrico foram lançadas em discos da Legião ou do Capital, mas os registros da banda no início dos anos 80 seguem inéditos oficialmente.

Sala Villa-Lobos
A apresentação da banda no erudito Teatro Nacional, em dezembro de 1986, foi um passo importante na carreira do grupo. Também segue inédito.

Mané Garrincha
O fatídico show no estádio brasiliense em 1988 terminou em confusão – e depois disso a banda nunca mais tocou em Brasília.

MP3cêntrico

Entrevistei o Anthony Volodkin, criador do Hype Machine, para esta edição do Link.

“A rádio tradicional só toca as mesmas 40 músicas”
Criador do Hype Machine, agregador de blogs de MP3, ele vem ao Brasil para falar sobre música digital

“Estava na faculdade quando percebi que não ouvia música nova”, lembra Anthony Volodkin, que chega ao Brasil esta semana para participar do evento YouPix. “Não tinha mais tempo para ficar em salas de bate-papo por causa das aulas e do trabalho. Mas descobri os blogs de música e não acreditei quando vi que tanta gente estava escrevendo sobre música só porque gostava. Depois de algumas noites em claro, escrevi um protótipo do que se tornaria o Hype Machine”.

A história se parece com a de muitos criadores de serviços digitais, com um agravante. Quando, há cinco anos, o nova-iorquino Volodkin descobriu o mundo maravilhoso dos blogs de MP3, este era formado por amadores que dispunham seu tempo livre à caça de novos artistas e bandas que ninguém tinha ouvido falar. Cinco anos depois, o Hype Machine não só se tornou a grande central dos blogs desta natureza, como ajudou-os a redefinir um papel importante na história da música digital: o de filtro.

Se as gravadoras se perderam em números de vendas que desabavam enquanto os downloads proliferavam online, os blogs de MP3 se tornaram o grande refúgio para ouvintes que não sabiam o que ouvir. A indústria do disco, perdida entre artistas gigantes que vendem cada vez menos, deixou de ser a referência para descobrir novos nomes. Assim, coube a blogueiros apaixonados por música assumir esse papel.
E são as gravadoras maiores quem mais sofrem com esta nova realidade digital. “Elas não conseguem responder rapidamente a vazamentos de álbuns, por exemplo”.

A reação do mercado ao site foi gradual. “Somos uma forma independente pela qual a indústria pode monitorar o que as pessoas estão fazendo nesta nova mídia”, ele explica, e diz que as gravadoras pequenas e blogs de MP3 responderam positivamente – e logo – à existência do site. “Foi um processo orgânico”, lembra.

Em seus cinco anos de existência, o Hype Machine acompanhou as drásticas mudanças na indústria. “As gravadoras passaram a ousar mais ao vender música online. Já estão contando o fã como um agente importante, em vez de deixá-lo de lado, como no passado”, explica o dono do site, que também comenta as mudanças nos hábitos de consumo. “As pessoas estão comprando mais música digital do que nunca – além de ouvir cada vez mais música na web e nos seus celulares.”

“Mudou também a forma como as pessoas gastam seu dinheiro”, continua. “Isso não quer dizer que a música deixou de ser importante para as pessoas. Mas o mais interessante é perceber como as pessoas interagem e criam neste novo ambiente.”

Às vésperas de lançar uma nova versão do seu site, além de um aplicativo para celular, Volodkin nem pestaneja ao ser perguntado se a internet assumiu o papel do rádio. “Sem dúvida. A rádio tradicional só existe para tocar as mesmas 40 músicas, sempre, sem parar, como se fosse um iPod de baixa capacidade de armazenamento”.

Serviço
YOUPIX.COM.BR – MELHORES DA WEBSFERA 2010.
De 8 a 11 de junho, das 15h às 23h. Museu da Imagem e do Som. Av. europa, 158. Jardim Europa. Volodkin será sabatinado na quinta-feira, às 21h. confira toda a programação no site do evento

O que aconteceu, aconteceu

Materinha de abertura da edição do Link de hoje.

O começo do fim
Falta uma semana para o fim de Lost. Mas o impacto da série de J.J. Abrams, que mudou a forma como a cultura é produzida e consumida, continuará a ser sentido ao longo do século 21

Em menos de uma semana, tudo terá terminado. A história que fez que a série Lost se tornasse uma das marcas mais fortes da cultura do século 21 chega ao fim no próximo domingo, quando irá ao ar o último episódio da série, chamado apenas de “The End”.

Mas o fim da série só reforça sua importância, que vai muito além da TV. Lost criou uma mitologia própria e obrigou o espectador a especular para além da trama original, buscando links em livros clássicos e na história da religião, da ciência e da filosofia para tentar desvendar seu enigma.

Some isso ao fato de que a série acompanhou a forma como a internet mexeu com a velha mídia e desdobrou-se online, usando a rede como plataforma para divulgar mais especulações. Lost não só contava uma história – chamava seu público para participar dela, como em um jogo.

Fora dos Estados Unidos, Lost foi ainda mais importante, pois pela primeira vez na história um produto ficcional teve audiência planetária em tempo real, mérito que antes era apenas de transmissões jornalísticas e eventos esportivos. O interesse pela série fez que telespectadores de todo o planeta não esperassem a exibição dos episódios em seus países e buscassem meios – online – para acompanhar a saga simultaneamente ao público de seu país de origem.

Lost também inaugura um novo tipo de narrativa, que explora as possibilidades da era digital como nenhum filme, livro ou disco conseguiu fazer até hoje. É o produto que melhor representa como será a cultura do futuro, em que o público pode escolher entre simplesmente acompanhar uma única história ou se entregar a um universo de ramificações infinitas.

A série faz que seus espectadores sejam ativos e busquem aumentar a história a partir de sua própria participação – mesmo que isso signifique apenas especular sobre o que pode acontecer. Parece pouco, mas não é.

“O mistério representa possibilidades infinitas”, disse seu criador J.J. Abrams em uma palestra no evento TED (sobre tecnologia, entretenimento e design) em 2007. “Representa esperança, representa potencial… O mistério é um catalizador da imaginação”.

O grande plano de J.J. Abrams

Eu assinei o Personal Nerd desta edição do Link.

De volta ao vinil

Materinha que fiz pro C2 Música, a edição semanal do Caderno 2 do Estadão dedicada ao tema, sobre a visita que fiz há menos de um mês à Polysom, a tão falada única fábrica de vinis da América Latina, que finalmente lançou seus primeiros discos. Ela conversa com o Personal Nerd que fiz pro Link há duas semanas.


Sulcos do acetato, primeira etapa na fabricação do vinil, vistos no microscópio da sala de corte

Fotos: Tasso Marcelo/AE

Fazendo disco: o pó de PVC é posto na extrusora…


…que depois sai pelo cilindro à direita, como uma massa mole…


…as matrizes do disco são postas na prensa, que é calibrada a cada prensagem…


…a massa de vinil é posta entre os dois rótulos do futuro LP e depois posta na prensa…


…que, uma vez fechada, é aberta para revelar o disco idêntico ao que você vai pegar na loja, ainda quente…


…Tcharã!

O que ele está fazendo aí?
Passar um dia na Polysom, única indústria de vinil da América Latina, é como viver nos tempos em que CDs e música digital não eram mais do que ficção

Uma massa mole e preta sai quente de uma máquina chamada extrusora. Moldada numa pequena bola que cabe na palma da mão, ela é disposta sobre um dos rótulos de papel do futuro disco ? o outro é aplicado por cima, formando uma espécie de sanduíche de massa de pó de PVC e papel, que é colocado em uma enorme prensa hidráulica. A máquina faz seu trabalho em poucos segundos: espreme o bolinho engraçado entre duas chapas horizontais que, ao se afastarem uma da outra, revelam um disco de vinil recém-prensado.

Esta operação simples e quase artesanal é a etapa final de um processo que chega ao fim após quase um ano. “A gente achava que em um mês dava para colocar isso para funcionar e já estamos há oito meses, sempre fazendo testes para ficar direito”, explica João Augusto, dono da gravadora Deckdisc e agora proprietário da Polysom, a única fábrica de discos de vinil da América Latina.

A fábrica fica em Belford Roxo, região metropolitana do Rio, e a ida do Aeroporto Santos Dumont ao portão da Polysom dura quase o mesmo tempo que o do voo Rio-São Paulo. Ao volante, Rafael Ramos, filho de João Augusto e diretor artístico da gravadora ? um dos principais entusiastas da reativação da Polysom -, recorda o feito, com o sorriso largo. “Nem parece que até outro dia isso era só uma provocação que eu fazia com o meu pai”, revela enquanto atravessamos a Linha Vermelha saindo do Rio.

É importante entender o papel de Rafael nesse processo, uma vez que ele faz parte de uma geração que viu os vinis nas coleções dos pais, assistiu à ascensão e posterior queda do CD, viveu os primeiros dias da música digital, sem suporte e sem disco, e redescobriu o velho disco preto quase no fim da primeira década do século.


“As pessoas compram pelo fetiche”, diz João Augusto, um dos donos da Polysom

E Rafael está longe de ser o único. Só nos EUA, no ano passado, foram vendidos 2 milhões e meio de vinis, um número a que João Augusto acrescenta um dado interessante: “47% desses compradores sequer tem toca-discos”, enfatiza citando uma pesquisa feita pelo instituto Nielsen Soundscan. “As pessoas compram pelo fetiche.”

As megastores brasileiras não demoraram a perceber isso, tanto que algumas já exibem prateleiras com vinis recém-fabricados – todos importados. “Mas a maioria das lojas não tem nem espaço para receber os discos”, conta João. E ele traduz esse novo interesse pelo vinil ao contar como foi que a cantora Pitty reagiu ao ver seu disco na versão vinil: “Agora, sim, somos uma banda de rock.”

Pitty faz parte da primeira safra de discos saída da gravadora, todos da Deckdisc. Além do relançamento de Chiaroscuro, a primeira leva ainda inclui outros discos da gravadora carioca: o solo da vocalista do Pato Fu Fernanda Takai e os discos mais recentes dos grupos Cachorro Grande e Nação Zumbi. Mas João é enfático ao dizer que a Polysom não é a fábrica da Deckdisc. “É dos sócios da Deckdisc, cobramos da Deck o mesmo que cobramos de qualquer um.”

Ele acredita que a primeira etapa do processo está terminando agora, com a fabricação dos primeiros discos. “Só agora é que as pessoas vão ver que é verdade”, festeja. E não está falando apenas dos consumidores, mas também das gravadoras e dos artistas. “Acredito que os artistas vão motivar muito este movimento”, diz João, contando que alguns deles – Jorge Ben Jor e Lenine – já abraçaram a ideia.

Resta saber como o mercado brasileiro reagirá aos lançamentos. A gravadora EMI é uma das que estão em conversações com a Polysom para o relançamento da discografia do grupo Legião Urbana. Se ainda é cedo para saber se o velho LP volta para valer às lojas, ao menos podemos comemorar que a única fábrica de vinil da América Latina fica no Brasil ? e já está funcionando.

Na linha de produção


Pré-análise do áudio. O operador mede a qualidade do som usando instrumentos específicos e sua experiência técnica, antes do áudio começar a se transformar num vinil.


Cabeça de corte. Esta máquina funciona como um toca-discos. A diferença é que, em vez de reproduzir o som, ela grava os sulcos no acetato.



Galvanoplastia. É a fase química do processo, em que o acetato original é colocado em tanques com nitrato de níquel. As partículas de níquel “grudam” no acetato, formando uma “capa”, que é retirada e funciona como um vinil em negativo.

Prensagem. A capa de níquel é colocada nas prensas, que depois recebem uma massa mole feita a partir de pó de PVC que, prensada, vira um disco.

Garantia de quatro anos

Texto que escrevi pra matéria de capa sobre televisão que publicamos esta segunda no Link.

Ano de Copa do Mundo, ano de TV nova

Como sempre, o mercado aproveita o torneio para lançar novas tecnologias; convergência, transmissão digital e TV 3D são as de 2010

A Copa do Mundo não é o evento esportivo mais popular do planeta só pelo fato do futebol ser o esporte mais popular do mundo – mas também por ter a TV como sua principal aliada. Televisionado desde a edição de 1954, na Suíça, o evento ganhou ainda mais popularidade graças a avanços tecnológicos que foram introduzidos tanto nos aparelhos quanto na transmissão do torneio.

Não vai ser diferente em 2010, com um agravante: esta será a primeira Copa em que a internet surge como principal ameaça real à audiência da TV. Além disso, a legislação brasileira exige que qualquer aparelho de TV com 32 polegadas ou mais venha com decodificador de TV digital embutido até julho.
Junte essas novidades à corrida tecnológica que vem acontecendo na última década e temos o encerramento de um ciclo: TVs de tela fina deixaram de ser artigo de luxo para entrar na rotina das pessoas.

Isso sem contar uma série de recursos e tecnologias que vêm invadindo o vocabulário. A antiga divisão entre LCD e plasma de alguns anos já rendeu novas terminologias, como LED, HDMI, Full HD e TV 3D.
Com os novos modelos que se conectam à rede e ao PC, a TV ressurge não como um eletrodoméstico que estimula a passividade, mas como central de entretenimento doméstico que conecta internet, computador, game, celular, players portáteis e pendrives – tudo num mesmo aparelho que, aos poucos retoma o papel central que já teve na casa das pessoas e que ficou para trás com a ascensão da dupla computador e internet.

Este ciclo de renascimento não vai fechar em 2010. Mas durante este ano já veremos o que é promessa há alguns anos chegar ao mercado de fato.

Por outro lado, a popularização da tela fina ainda não foi o suficiente para determinar o fim da velha TV de tubo, que ainda é o modelo que mais vende no Brasil – embora não seja o tipo de aparelho mais popular no mundo. Além de emperrar a onda de conectividade total dos modelos mais novos, o tubo de raios catódicos, quando descartado, agride muito mais o meio ambiente do que as TVs finas.

Nesta edição, tentamos entender o que irá acontecer com um dos aparelhos mais populares que existem em um ano que pode definir de vez seu papel nos lares do mundo.

“I just wanna tell you how I’m feeling…”

Que espetáculo esse Rick Astley em página inteira, hein. Tem coisas que só o Link impresso faz pra você.