Vou tentar exercitar meus poderes telepáticos, de origem místico-científica, e arriscar um palpite: essa não é a primeira resenha, crítica ou análise do Series Finale de LOST que você, leitor, está lendo. E digo mais, provavelmente a maioria das análises que você já leu discorriam não apenas sobre o enredo de Lost, mas também sobre a experiência pessoal do autor com a série, certo?
A métrica mais infalível para discernir uma obra de um fenômeno cultural é avaliar o quanto da própria vida as pessoas associam à vida da obra. Não tenho vergonha de admitir que Lost está para sempre misturada à história dos meus vinte-e-muitos anos. Muito mais do que uma série televisiva em 114 capítulos, Lost era, no início, uma obssessão de tempo integral, que permeava hábitos de leitura, pesquisas na Wikipedia, horas e horas surtando em sites enigmáticos cuja relação com a série era vaga, na melhor das hipóteses. Era uma das melhores desculpas para fazer amizades de toda a década de 00, e grande parte do meu círculo social atual nasceu nas madrugadas desesperadas atrás de links para baixar os episódios, que eram assistidos sem legenda, conforme iam chegando, para serem então discutidos até quando o sono permitisse. Qualquer coisa levemente parecida com uma pista perdida num canto de um frame que só era visto na transmissão em HD era motivo para mil teorias. Os erros de continuidade e de produção não eram perdoados. A mitologia da série se misturava à “mitologia” do próprio grupo de amigos que se conheceu através dela. Como entre os personagens da série, também houveram muitos romances, muitos rompimentos, brigas, polarizações, alguns bebês, e – felizmente – nem de longe tantas mortes, mas certamente um ou dois sumiços dramáticos e inexplicáveis. Como eu disse na análise de “What They Died For,” a linha entre os protagonistas e os espectadores de Lost é tênue, e portanto não tem como analisar a jornada completa de Lost sem passar pela contribuição pessoal.
Durante essa minha jornada particular, eu vivenciei bem cedo a revolta que muitos agora direcionam para o Series Finale. Apesar de ter sido rotulado de “massa de manobra de seita messiânica” por causa do meu review positivo de “Across the Sea,” a verdade é que eu desencantei da vertente pseudo-científica de Lost muito antes da maioria das pessoas, no final da segunda temporada, quando “eletromagnetismo” era um eufemismo para “energia que faz o que os roteiristas quiserem que faça.” Meu lado sci-fi geek é MUITO geek. Não precisou chegar nem perto de viagem no tempo, que dirá de luz mágica dentro de caverna, para que eu me afastasse de Lost, esfriasse a cabeça, e depois me reaproximasse já encarando a série como um drama sobre pessoas onde a mitologia é um veículo, não um destino.
Sob essa abordagem, a de que nem toda mão de treinador de cavalo em cena é uma pista, e de que os mistérios servem para testar a fé dos personagens, não para premiar telespectadores-detetives que venham a desvendar “o final” com antecedência com algum troféu imaginário – nesse aspecto, “The End” é um finale absolutamente digno para uma série que, dentro de seus acertos e (não poucas) falhas, fez história como um verdadeiro marco cultural e pairou acima da maioria das obras televisivas desse início de século.
Antes de qualquer coisa, vamos tirar da frente algo que me incomoda profundamente em qualquer conversa sobre Lost: é evidente que os produtores foram escrevendo a história ao longo da série. Isso não é detrimento NENHUM ao roteiro. Toda história foi escrita em algum momento. Lost começou como uma cena imaginada na cabça de J.J. Abrams durante um vôo. Naquele momento, não existia final, nem mistério, nem nada, era apenas uma queda de um avião. Li em algum lugar que, quando fez o pitch da série para a ABC, Abrams só tinha planejado até o momento da descoberta da escotilha. Ainda não existia final. Os bad numbers, que viraram ícone da série, foram criados por David Fury quando ele ainda trabalhava na série, antes de deixá-la por 24 Horas sem ter escrito qualquer explicação lógica para eles – a explicação ficou por conta de Javier Grillo-Marxuach (que por sinal foi o criador da Iniciativa Dharma) num ARG que ele comandou depois de ter saído, ele mesmo, da série, ao final da segunda temporada, e que foi criado justamente para tentar fechar algumas das questões que não eram centrais à trama, mas que tinham sido introduzidas pelos roteiristas na época em que Lost ainda era uma série sem data para acabar (e consequentemente carente de enredos que a mantivessem por tempo indefinido).
Encaremos a realidade dos fatos. Até o final da segunda temporada, Lost era uma série muito rentável que a ABC pretendia estender por quanto tempo pudesse. Durante dois anos, o importante era sustentar a narrativa, e não dosar meticulosamente pistas para um final que já estava garantido. Foi só durante a crise do mid-season da terceira temporada que Damon Lindelof e Carlton Cuse resolveram ter uma conversa séria com a ABC e exigir que a galinha dos ovos de ouro deles ganhasse uma data de fim, e temporadas mais curtas que não tentassem competir com 24 Horas no número de episódios. Era isso, ou sacrificar ainda mais os índices de audiência, porque o público não ia mais comprar jogo de espelhos e fumaças por muito tempo, e a série precisava de um rumo. A partir daí, sim, as temporadas passaram a ter coesão narrativa e uma espinha dorsal que unia as pontas.
Assim como a maioria das pessoas, eu também passei por uma fase na infância e adolescência em que escrevia contos. Eram uns contos bem sem-vergonhas, mas a maioria deles germinava de uma cena que brotava na cabeça, e daí crescia para sua explicação. O importante era a ambientação e o impacto da cena. Essa filosofia também era aplicada nas mesas de RPG que eu mestrava. Muitas aventuras de mistério e terror que meus players lembram até hoje (sempre fui fã ardoroso de Ravenloft, nem imagino o porquê) nasciam de cenas soltas que eu imaginava serem assombrosas para os jogadores, e dali em diante, conforme o desenrolar das aventuras, a explicação dos mistérios ia surgindo como consequência das pistas, e não o contrário. Me desculpem se estou decepcionando alguém, mas as duas primeiras temporadas de Lost foram certamente escritas da mesma forma. Com muito mais técnica e competência envolvidas, claro, mas ainda assim, Lost é um mistério escrito de fora pra dentro. Isso significa que os produtores trapacearam? Claro que não. Vocês ficariam surpresos com a quantidade de histórias com reviravoltas e enigmas que são escritas desse jeito, e para desbancar de vez a tese de que elementos inseridos depois do primeiro capítulo são irrelevantes e/ou encheção de linguiça, só menciono dois personagens que surgiram como participações especiais e foram ampliados por causa da resposta do público: Desmond David Hume e Benjamin Linus. O quão irrelevantes eles soam para vocês?
Pronto, agora que isso saiu do meu peito, posso falar sobre “The End” em paz. Não vou repetir o que muita gente mais entendida que eu já falou sobre como Lost reinventou sua própria estrutura estilística ao longo das temporadas, e como isso é genial e tudo o mais. Quem me conhece sabe que um dos momentos mais chocantes da minha vida enquanto telespectador de teleséries foi o último capítulo da terceira temporada, em que todos assistimos por mais de uma hora a cenas do futuro sem saber do que se tratavam, e tomamos na cara aquela aparição de Kate e aquele “We have to go back!” Nenhum outro momento de “te peguei” na séire desde então teve um impacto tão forte quanto aquele. Nem mesmo a última reviravolta de “The End,” aquela que explica finalmente a “realidade paralela” que vínhamos acompanhando desde o início dessa temporada, mas rapaz – chegou bem perto. Ao ponto de eu por um momento não entender o que estava vendo, e subitamente, como um raio, tudo ficar claro, e meus olhos se encherem de lágrimas. Não me importo que tenha sido a reviravolta mais descaradamente espiritual da série até a data – nunca me incomodei com espiritualidade em obras de ficção científica, inclusive porque é um recurso manjadíssimo pra quem não estreou no universo nerd com Lost – aquela cena me deixou moído, com cara de paisagem, me sentindo mais uma vez ludibriado, da forma boa, pelos produtores (eles sempre disseram que *a Ilha* não era o purgatório… boa, Darlton, muito boa). Injetou significado retroativamente em todos os episódios da temporada, e todas as estranhezas e as coincidências das vidas que os Losties levavam nela se encaixaram de forma cristalina. Eles precisavam uns dos outros. Precisavam se reencontrar, mesmo que além do plano mortal, para seguir em frente. E que metáfora filha da puta para nós, espectadores-protagonistas, que também tivemos que deixar a Ilha, e que também precisamos seguir em frente depois de termos sido parte de Lost por seis anos. A sexta e última temporada de Lost tem na resolução de seu enredo um motivo apenas secundário. O principal, o essencial, era a despedida. O fim da jornada que foi assistir – e produzir – Lost. Um tema que fala forte àqueles que realmente se envolveram com a série, não aos que assistiam aos pedaços, sem atenção, procurando cenas ou diálogos patronizadores que preenhcessem listinhas frias de “perguntas sem respostas.” E por se envolver, quero dizer se envolver com a história, não necessariamente ficar obcecado por cada minúcia, por cada campanha de marketing, por cada spoiler vazado, etc. Quero dizer se importar mais com o bem estar de Jack, Kate, Sawyer, Hurley e tantos outros, do que com a ilha que uniu nossas vidas às deles.
E, diga-se de passagem, para quem tinha se decepcionado com a “Luz dentro da caverna” de Across the Sea, o series finale de Lost deixa bem claro que não sabemos nada de nada. Não havia uma bola flutuante de luz dourada dentro de uma caverna de pedra, e sim um ambiente com sinais claros de intervenção inteligente, com mecanismos, com mais enigmas separando mesmo os candidatos empossados da verdadeira natureza do poder da ilha. Os órfãos da pseudociência podem se esbaldar em teorias pelo resto da vida aqui, desde civilização Atlante até Exogênese, porque essa é a parte que os produtores deixaram de legado para os fãs (e para a Disney, que certamente vai continuar ordenhando essa mitologia por algum tempo). Eles foram bem específicos quando disseram que a história que eles iriam terminar de contar era a dos passageiros do vôo 815 e dos amigos e inimigos que cruzaram seu caminho. O que realmente é a luz, o que realmente é o monstro, o que realmente é a Ilha… para isso existem gazilhões de teorias na internet muito mais elaboradas do que eles jamais se prestariam a criar. A falta de respostas não é uma trapaça, é uma concessão. Lost é dos fãs, também, e já que eles se apropriaram tão ferrenhamente da mitologia, para quê estragar a explicação pessoal de 99,9% deles para fazer 0,1% felizes por uns poucos dias, enquanto ainda tiverem fôlego para dizer “eu avisei”? Não faz sentido.
O episódio final de Lost foi arrebatador porque me deu exatamente aquilo que eu queria ver, e em quase todas as ocasiões, com atuações memoráveis de todo o elenco. Retiro o que disse semana passada, que preferia que a missão de Desmond no flashpurgatório tivesse começado mais cedo na temporada, porque não poderia ter sido diferente. Não ia ter o mesmo impacto ver o “despertar” de cada um dos Losties se não fosse tudo de uma vez, com a trilha sonora do Giacchino debulhando, e culminando na cena da igreja ecumênica. Quase todos os reencontros me levaram às lágrimas, alguns (o ultra-som de Sun, o parto de Claire, e a monstruosa cena de Sawyer e Juliet), confesso, ao choro compulsivo. Só o final de Sayid é que destoou horrendamente do resto, acho que de propósito – já que o Naveen Andrews, apesar de competente em cena, sempre desdenhou da série na mídia para quem quisesse ver. Unindo isso à atuação claramente para-cumprir-contrato da Maggie Grace e tivemos a cena mais dispensável do finale.
Mas essa foi a única cena realmente ruim. Algumas outras ficaram meio dispensáveis, como aquele pulo do Jack na última cena antes do intervalo de seu confronto final com FLocke, que beirou o pastelão. Mas não chegou a estragar a porrada, que foi épica (E um parêntese aqui para quem disse não ter entendido o papel de Desmond na derrocada do Homem de Preto, é bastante óbvio – Desmond tirou a Ilha da tomada e o deixou mortal por tempo suficiente para Kate, numa participação digna da Kate das primeiras temporadas, enfiar uma bala no infeliz e acabar de vez com a ameaça do fumacento. Jacob pensa em tudo!). E eu esperava um tiquinho mais do Jorge Garcia na cena em que – outra reviravolta maravilhosa que me marejou a vista – Jack repassa a ele o bastão de protetor da Ilha antes de dar sua vida pela causa que levou seis temporadas para aceitar. Aliás, que cena fenomenal aquela em que ele diz ao Flockezilla que este desrespeita a memória de John ao usar seu rosto. Jack foi escrito para esse momento, e se seus episódios ao longo da série eram sempre fillers chatos, nesse último ano ele mereceu realmente o posto de protagonista central que estava há tanto tempo guardado para ele. Quanto ao Jorge, ele compensou o deslize nessa cena com duas outras cenas tocantes com Michael Emerson.
Aliás, falando em Emerson, ele e Terry O’Quinn fecharam seus personagens magistralmente. Cada cena com Ben e Locke (e FLocke) nesse episódio é uma aula. O diálogo entre os dois na porta da igreja é possivelmente a melhor cena que eles dividiram na história da série, talvez empatando com a cena final de “The Life And Death of Jeremy Bentham,” sem o impacto violento desta, mas com dois diálogos paralelos acontecendo, um verbal e um só de olhares. Dois gênios em cena. E como negar que Josh Holloway segura a cena com Liz Mitchell em pé de igualdade naquela que foi a mais aguardada e emocionante cena de despertar? Diabos, até a Evangeline Lilly segurou uma cena como “gente grande,” quando tem aquela conversa com Jack no fim do show beneficente. Em seis anos de série, ela nunca tinha me convencido como me convenceu com aquele “I missed you so much.” E o que dizer das expressões de Daniel Dae-Kim e Yunjin Kim quando, já cientes de quem são, conversam com um ainda confuso James Ford no hospital? Poderia rever aquela cena mil vezes.
No geral, The End é um episódio para ser sentido. Tem, sim, sua dose de ação – muito bem dosada e dirigida, diga-se -, de idas e vindas, com o trio Lapidus, Miles e Alpert consertando o avião e parando em cima da hora para Sawyer, Claire e Kate embarcarem, com o confronto final entre Jack-ob e Flocke, e toda aquela autoreferência certeira comparando a caverna com a escotilha da Estação Cisne, mas a essência do episódio está nas atuações, nas resoluções pessoais de cada um dos Losties, nas cenas que os produtores deram para cada um dos membros do elenco, e que a maioria aproveitou muito bem (Até o Dominic Monaghan e a Elizabeth Mitchell, que nem eram mais do elenco fixo, representaram de corpo e alma suas cenas, o que só aumenta minha vergonha alheia pela Maggie Grace e pelo Naveen Andrews). É um episódio sobre a própria série, sobre como nós vivemos intensamente essa Ilha por seis anos, vendo muitos de nossos companheiros se revoltarem e abandonarem a série, vendo a própria série se reinventar para se tornar um projeto fechado, sobre como os episódios bons nos tocaram e os episódios ruins nos revoltaram, e sobre o que fazer agora que as cortinas cairam. Seguir em frente, dizem Carlton Cuse e Damon Lindelof. Aprender com a experiência, guardar dentro de nós mesmos o que ficou de bom, e partir para a próxima. Como temos mais sorte do que os Losties, não precisamos esperar até o próximo passo no ciclo da existência para recuperar os laços perdidos. Estamos todos aqui, bem ou mal. E só esperando a próxima aventura que virá nos tirar o sono e nos fazer viver um pouco da fantasia compartilhada que deixou sua marca em tantas vidas de tantos grupos de amigos.
Como diriam os guardinhas da cena final de O Show de Truman… vamos ver o que mais está passando? 😉
* Rafael publicou este texto em seu blog.
Acabou.
Comecei esse texto cerca de 5 minutos depois dos créditos do episódio final de Lost, e ainda tenho muita coisa pra assimilar. E mesmo já tenho muita coisa a dizer, a especular, a divagar, é muito difícil escolher como começar.
Uma certeza eu tenho: muita gente vai xingar demais esse final. E provavelmente por não entenderem.
Lost foi um fenômeno midiático desse começo de século, construindo sua popularidade não só na TV, mas na internet e em diversas ações. Só que a base desse sucesso é a mesma de qualquer outro sucesso das telas, de qualquer época: os fãs.
E esse final foi um tributo para os fãs.
Não só o final, como praticamente a metade da temporada, através dos flash-sideways. Recurso cuja explicação em princípio pode parecer horrorosa e se encaixar entre os piores temores dos fãs. Como assim “estão todos mortos”? Não, não estão todos mortos! Pelo menos não nas 5 primeiras temporadas, e nem durante as cenas na Ilha na 6ª.
É o desenrolar na Ilha que marca o final, com o sacrifício de Jack, a derrota do Fumação, Hurley assumindo como novo Jacob tendo em Ben o seu braço direito e com Kate, Sawyer, Claire, Miles, Richard e Lapidus escapando. ISSO é o final de Lost.
Mas claro, esse é um final melancólico. Para falar a verdade, quase desesperador. Afinal, acabar assim significaria que a vida de John Locke foi uma grande tragédia sem sentido. Que Sun e Jin deixaram uma filha órfã por nada. E mesmo com a vitória final do “bem”, esse seria um final triste pra cacete.
Nada contra finais tristes. Mas vamos lembrar de novo dos fãs, e do que sustentou eles acompanhando a série até o momento. Foram os mistérios? Uma ova! Pelo excesso dos mistérios eu só conheci gente querendo largar a série. O que fazia a gente se importar em Lost eram os personagens. E os flash-sideways serviram para que pudéssemos nos despedir de todos eles juntos de forma digna e significativa. Quase como um prêmio de consolação.
A chave para isso está no episódio do Desmond, “Happily Ever After”. Felizes para sempre. Infelizmente isso não foi possível pra quase ninguém em suas vidas. Mas o presente de Damon Lindelof e Carlton Cuse pra nós fãs foi mostrar que ainda havia chance de felicidade para eles, mesmo que apenas do outro lado da vida. E foi extremamente tocante cada reencontro.
É claro, um fim sobrenatural, quase espiritual. Mas pra quem acompanhou uma série com uma ilha que se move, um monstro de fumaça e pessoas que não envelhecem, esse tipo de coisa não deveria incomodar, certo?
Só acho uma pena que provavelmente as pessoas acabem falando mais desse final “prêmio de consolação” do que do real, que foi igualmente emocionante e espetacular. Desmond “desligando” a luz foi épico, e Jack se sacrificando para acendê-la novamente também. Mas os dois grandes momentos sem dúvida foram a grande luta de Jack e Flocke e a morte de Jack. Ele caminhando no bambuzal até cair no mesmo lugar onde a série começou foi perfeito. E se tudo teve início com um close do olho dele abrindo, só poderia acabar com o mesmo close, só que com o olho fechando, não sem antes ver o avião com seus amigos saindo em segurança.
Um final emocional e repleto dos elementos que nesses 6 anos foram parte tão presente na vida de quem acompanhou a série. Lost marcou época na TV e na cultura pop mundial.
E seu final fez justiça a essa importância.
Épico.
* Alexandre Esposito escreveu este texto em seu blog.
Texto de fã não é e nunca será imparcial. Dito isso, afirmo: fui e sou fã de Lost. Então serei exagerado na medida que me é possível, como fã, e na proporção que é esperada de alguém assim.
Lembro quando meu irmão chegou um dia e disse “Gá, você precisa ver esse seriado, sério. Muito bom!” Comecei a assistir do 3º episódio da 1ª temporada. Foi assim que conheci a AXN. A hora de Lost era sagrada em casa. Ninguém atendia telefone e se meu pai, coitado, chegasse em casa no meio do episódio, só ia receber um abraço quando aparecesse o robozinho vermelho do JJ Abrams.
No Twitter, comparei Lost ao Show de Truman, não o filme, mas o programa mesmo, dentro do filme. Velhinhas e suas almofadas estampadas com o rosto do Truman, o gordinho na banheira e as pessoas chorando e torcendo pelo Truman como se fosse um conhecido, um grande amigo. Minha comparação foi mais ingênua, dizendo que ao fim de Lost, viraríamos uns para os outros e diríamos: “Hum… o que mais está passando na TV?”
Ledo engano. Lost acabou de terminar pra mim e não quero ver, nunca mais, TV. Claro, é um exagero, mas eu disse que ele viria. A sensação, no momento, é de desamparo, como se eu fosse um órfão. E somos, eu e você, que era e é doente por Lost. É o fim de uma era. Quando comecei a assistir o seriado, morava com meus pais e cursava a faculdade. Hoje estou formado, saí de casa, casei e ontem estava tão ansioso para assistir ao último episódio como se tivesse começado a assistir à série na semana passada. Lost fez parte da minha vida.
A música tema, quase clássica, dessa temporada ainda está na cabeça e preciso me segurar para não chorar. Exagero? Dane-se. Decidi assistir sozinho ao The End, diferente do que foi o seriado inteiro, porque ninguém mais entenderia. Se eu choro com reportagem do Globo Esporte sobre a despedida do Juninho Paulista, que dirá no último episódio do meu seriado favorito.
É uma tristeza que tenha acabado, mas sei que não daria pra ser eterno e prolongar demais seria perigoso. Mas eu sou fã e não quero nem saber. Quero episódios especiais, extras, filme e o que mais for possível fazer. Aí eu lembro do final e os caras colocaram um ponto final. “Era isso que a gente tinha pra contar”.
Sei que nunca lerão isso, mas obrigado JJ Abrams, Damon Lindelof e Carlton Cuse, por terem feito uma das melhores coisas do início desse século. Toda a ‘indústria’ Lost foi algo nunca visto antes, com os ARGs, pistas espalhadas e tal. O que o seriado movimentou foi incrível, reconheço. Mas é o menos importante, para mim. Não escrevo como jornalista cultural, analisando um fenômeno.
O ‘universo’ Lost criado, os personagens e as histórias contadas são o que de mais rico ficam. Tiram sarro de mim pois choro em tudo, mas dessa vez foi diferente. No final, era como se eu estivesse vivendo aquilo com eles, sofrendo junto, rindo junto e, principalmente, chorando junto.
Lost e seu último episódio foram meu Show de Truman e eu sofri como o gordinho da banheira, entregue a um produto cultural televisionado para milhões de pessoas, mas achando que aquela história estava sendo contada só pra mim, sentados um de frente pro outro.
No final das contas, vocês nos fizeram acreditar que somos, cada um, John Locke, especial em si, sem motivo aparente, mas que só é assim porque também acredita ser assim. E, por isso, são uns desgraçados geniais, já que isso é só um seriado e a gente não consegue, nem pode, admitir isso.
***
Depois de ter escrito meu texto de fã, acima, no momento da emoção, vai mais um. Continua sendo de um fã, por isso é também uma explicação do porque considerar Lost tão bom e uma das melhores séries já feitas.
O entrevistador Jimmy Kimmel diz acreditar que a história de Lost não é sobre a ilha, é sobre as pessoas. Mais especificamente sobre Jack Shephard. “Eles não responderam todas as perguntas”, algumas pessoas dizem. 1) Se você considerar que o tema da série eram os personagens e não a ilha, eles responderam todas as perguntas. 2) É clichê, mas o que é mais importante: conhecer novas perguntas ou saber todas as respostas?
“Cada pergunta respondida leva a outra”, diz a mãe de Jacob e do irmão. Se assim fosse, o seriado seria eterno, do tamanho de uma vida. Porque a vida é assim. Quantas perguntas suas já foram respondidas, desde “Posso ir jogar bola lá fora?” pra sua mãe, até hoje? E quantas você ainda tem? A nossa vida vai acabar e ainda não teremos todas as respostas. Se com a gente é assim, porque em Lost não seria?
Sim, eles não responderam por que Jacob e o irmão eram daquele jeito. É verdade, não responderam uma porrada de coisa. Mas a ideia não era essa. “Lost” não é porque estavam perdidos e precisavam de uma bússola. É porque estavam perdidos em si e precisavam de novas perguntas, as perguntas certas. Lost foi “Queremos contar uma história. Conheçam essas pessoas, da onde partiram e onde chegaram.”
Contaram uma história que todos sonhamos, de sermos especiais, de termos um propósito nessa vida. Uma história que nos conduza a isso. Porém, as circunstâncias nos perguntam, como a ilha fez com Jack, Sawyer, Kate, e Locke, e cabe a nós darmos as respostas. Nem todos são especiais, mas todos escolhem não apenas desempenhar, mas escrever seus próprios papéis.
Se JJ Abrams, Damon Lindelof e Carlton Cuse conseguiram passar coisas assim por um seriado de TV norte-americano, não tem como dizer que devido a um último episódio sem todas as respostas o seriado perdeu valor. Pelo contrário. O último episódio foi que comprovou todo o valor que Lost teve ao longo desses anos. “Quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?” Cabe a você fazer as perguntas. Se elas serão respondidas, é outra história.
Namaste.
* Gabriel Louback escreveu estes textos em seu blog.
Eu vi Friends. Mas vi, antes, MacGyver, Magnum, Voyager, A Gata e o Rato, Caverna do Dragão (ok, era desenho e eu coloquei aqui só para sacanear). Vi Super Vicky, Punky – A Levada da Breca (o que diabos quer dizer “breca”?!), Alf – o Eteimoso, Esquadrão Classe A, Blossom, vi até Capitão Marvel e A Ilha da Fantasia (embora essa última nem seja bem da minha época). Vi Mundo da Lua e Anos Incríveis e, provavelmente, foram duas das coisas mais belas que vi na tevê. Vi Married With Children, Fresh Prince of Bel-Air (me recuso a escrever os títulos em português), Todo Mundo Odeia o Chris, Seinfeld e, mais recentemente, vi Angel, Battlestar Galáctica, Roma, Pushing Dasies, The Big Bang Theory, 24horas, Glee, Heroes (forget it), e Arquivo X. Vi muitas séries. Vi séries que nem listei aqui. O texto já está demasiado longo.
Eu não vi Lost. Não vi uma série de tevê, como vi as outras. Durante seis anos acompanhei uma história cativante, uma trilha sonora mágica do mestre Michael Giacchino, roteiros deliciosa e meticulosamente cíclicos, mas, principalmente, vivi os dramas dos muito bem construídos e interpretados personagens. Chorei com Charlie e sua luta mortal para se libertar (não estou falando das drogas). Torci por Michael e Walt, histórias de pai e filho sempre me comovem. Quis acreditar na Sun ao mesmo tempo em que desconfiava com Jin, tudo porque o amor deles era mais forte que qualquer coisa. Cri na bondade do torturador iraquiano, Sayid disfarçava-a como um bom espião. Confiei na sabedoria do olhar contornado de Richard e, mais tarde, na calmaria do de Jacob. Quis ser amigo-irmão de Desmond e amei odiar o Ben. Sawyer trapaceou e tomou a cena durante algum tempo, e foi muito divertido. Kate foi necessária, até a última cena. Locke era quase que a própria ilha e a ilha foi protagonista e antagonista. Hurley era a minha voz, meu medo e minhas lágrimas lá dentro e como dói saber que semana que vem estarei calado. E Jack. Jack era nosso olho.
Eu chorei. Não sei dizer nesse momento se por conta da história de cada personagem, que formou a série toda, ou se por estar órfão dela. Não importa. Whatever, como diriam dois amigos nossos. Algo que gerou tanta comoção, tanta diversão, tanta entrega, tanta discussão, tantos amigos (se você chegou aqui há uma grande probabilidade de ser um meu), não pode ser catalogado, resolvido, totalmente explicado. Não foi. Nunca será. Os clássicos são assim.
Se você esperava um desfecho arquitetado que amarrasse totalmente a trama, sinto muito. Você viu Lost. E esperou por algo que outras séries tentaram entregar. Algumas até conseguiram. Mas se você esperava realmente só isso, sinto muito. Você não teve a mesma sorte que eu. Se fosse do seu jeito, esse texto acabaria na lista do primeiro parágrafo e nós, no final do último episódio. Talvez eu tenha sido um homem de fé e você, de razão. Para a nossa sorte (sim, espero que no futuro seja a sua também), Lost não era sobre causa e consequência realistas. Era sobre o humano. Eu tive a melhor experiência cultural que poderia compreender e ela se expandiu e foi uma experiência humana. A parte física dela acabou, mas uma que ainda não consigo explicar ficou. Está aqui, comigo, agora. Como os grandes momentos da minha vida que, mesmo passados, me acompanham e me tornam o que sou. Eu não vi Lost.
Vi muitas séries e algumas muito boas. Mas não vi Lost. Eu vivi Lost.
E espero vivê-la novamente em outra vida, brotha!
* Marcelo escreveu este texto em seu blog.
Lost foi legal pra caralho.
Deve ter um monte de série melhor por aí, mas acompanhar Lost na época em que foi transmitido pela primeira vez foi, como dissemos, legal pra caralho.
Baixar episódio e ficar esperando a filha dormir para poder assistir sem distrações, ficar discutindo teorias com amigos do trabalho, com a Pri (minha mulher e principal companheira de Lost), até com desavisados em bares e restaurantes não era legal? Orra se era! Descobrir detalhes “importantes”, logos Dharma escondidos, números disfarçados, respostas camufladas: muito bom. Essa parte “social”, do esforço coletivo para entender a série, com certeza foi exclusivo de Lost, e eu curti bastante. O ponto alto desse aspecto coletivo foi a heróica rede de amigos gravando a segunda temporada na TV paga para mim, que não tinha cabo, não queria esperar a Globo e ainda não sabia dos torrents. Aê, amigos, valeu! Mas sei que fizeram isso por interesse próprio: se eu não assistisse Lost, eles iriam ter que falar de outra coisa na hora do almoço.
Teve mais coisa legal: a incrível cena inicial nos destroços do avião, a luz da escotilha acendendo pro Locke, o mr. Eko, o “botão”, “NOT PENNY’S BOAT”, o Michael traidor, a volta do Michael na 4a. temporada, the constant, Daniel Faraday, a bomba de hidrogênio, “we have to go back!”, Locke no caixão (duas vezes!), a morte da Alex, Benjamim Linus!, Desmond, o começo da segunda temporada, o cara de tênis vermelho morrendo esmagado, Locke na cadeira de rodas e depois mexendo o pé na praia, “Dude…”, o começo da terceira temporada na vila Dharma, Oceanic 6, deserto da Tunísia, Jacob tocando os personagens, Jacob tecendo uma tapeçaria, o reencontro de Sawyer e Juliet, o monstro de fumaça no templo, o pai do Jack falando “To remember… and to let go”, porra, sei lá, um monte de cenas e seqüências fabulosas.
O último episódio também foi espetacular. Não tem essa de mistérios não-resolvidos. Essa choradeira que o finale não esclareceu nada é ridícula. O finale não era prá explicar nada, era prá servir de despedida. Prá mim, o episódio mais esclarecedor (e o melhor da série), foi o final da 5a. temporada. O que o Jacob fazia ali era a explicação para o que é Lost. Ele pegava o fio da história de cada um daqueles personagens e trançava todas essas histórias entre si numa grande tapeçaria. Aquele tapete que ele aparecia tecendo era a série, era Lost! As “regras”, as imortalidades estranhas, as listas, tudo isso era arbitrário, assim era porque Jacob assim queria, era o desenho que ele queria no tapete.
Aqui nesse ponto entra a minha teoria mirabolante pro fim da série. Jacob teceu a tapeçaria até ser morto, e passou a tarefa pro Jack, que por sua vez passou pro Hurley. E o Hurley, o cara mais gente-boa ever, fez outra tapeçaria, outro desenho no tapete com as mesmas linhas. Na tapeçaria do Hurley, o Jack tinha um filho, Sun e Jin não morriam, Sawyer era decente, Ben era inofensivo, Locke era confiante, todos eram felizes, não tinham problemas com os pais nem com os filhos e ninguém nunca ia para a Ilha. Ora vejam se não era isso mesmo: Hurley se fez o cara mais rico e poderoso e gente boa e sortudo dos flash-sideways, e não é à toa que ele foi o primeiro a ser “despertado” pelo Desmond, não é à toa que o Ben lhe diz que agora ele deve “cuidar das pessoas” e lhe dá a dica que as coisas só eram cheias de regras porque o Jacob queria, não é à toa que ele e Ben se congratulam pelo trabalho bem feito no jardim da Igreja e certamente não será à toa que o epílogo inédito a ser incluído na caixa com o Lost completo vai ser sobre Hurley e Ben na Ilha – como o Michael Emerson já falou numa entrevista. O flash-sideway não era um purgatório, era o final que o Hurley queria para a série, já que aquele fim com Jack e mais um monte de gente mortos, Ji-yeon órfã, Ilha semi-destruída e tudo mais era muito triste. Olha só, o Hurley já tinha dito que não queria a função de Jacob, ele só mudou de ideia porque viu que era a chance dele de reverter tudo!
Não sei se é isso mesmo, mas que ia ser legal pra caralho se fosse, ah ia.
* Daniel Araújo escreveu este texto pra cá.
Estou de volta e quero, preciso, escrever um pouco mais sobre Lost e seu épico Finale. Sim, épico. Lost encerrou a jornada de seus personagens nos mostrando exatamente tudo aquilo que era relevante e fazia parte da história da Ilha. E digo a jornada de seus personagens porque seria impossível contar a estória se não tivesse ninguém na Ilha, certo!?
Nos últimos três dias li vários artigos, de vários sites, sobre o Final. Todos excelentes e com análises bem parecidas com a minha sobre o que vimos no dia 23 de Maio de 2010 e também sobre o que vivemos desde 22 de Setembro de 2004. Percebi que não estava sozinho na forma como percebi o Final. Assim como os nossos losties, alguns fãs se uniram para finalmente “seguir em frente”, enquanto outros ainda precisam de um tempo para “encontrar suas próprias respostas” antes de continuar.
Mas preste atenção, a questão aqui não é ter “entendido” o Final, apenas uma observação minha sobre essa relação que percebi entre os eventos do Sideway com a divisão entre os fãs.
Essa divisão surgiu do tal “final aberto”, da resposta para o Sideway e das pontas soltas que ficaram para trás. Primeiro que, honestamente, não achei assim tão aberto o Final, já que a grande maioria dos fãs (gostando ou não do Finale) entenderam da mesma forma. Segundo, é preciso encarar a resposta para o Sideway como uma resposta da temporada e não o encerramento da série. O Finale aconteceu na Ilha! E terceiro, é preciso pensar em quais questões deixadas para trás são relevantes e poderiam alterar o rumo da série até a sua conclusão.
A parte mais importante da vida de cada personagem foi a estória que nos foi mostrada. Nela vimos os losties envolvidos em algo muito além deles e que não tinham qualquer responsabilidade, mas era preciso sobreviver. Era necessário saber como eles conseguiriam passar por esse momento e seguir com suas vidas. Pelo caminho, vários morreram. Quem ficou, continuou buscando a fuga. Mas fugir não significava exatamente sair da Ilha. Precisavam encerrar o ciclo no qual foram envolvidos e para isso cada um teria sua função e, em conjunto, estariam livres.
Hurley, que sempre foi de certa forma uma “representação” dos fãs entre os losties, agora assumia a posição de “Novo Jacob”, herdando de Jack que se sacrificou para ficar e deixar todos livre. Se Hurley representava os fãs, podemos considerar que todos nós, fãs de Lost, assumimos a posição de defender a Ilha pelo tempo que for possível.
Se o Sideway não teve a resposta que muitos esperavam, e aqui me coloco na lista, fez sentido com o que vimos na temporada e com aquilo que os losties buscavam: a Paz!
Paz que todos nós buscamos e também enfrentamos um caminho cheio de desafios, escolhas, vitórias e derrotas, para alcançar o objetivo. Para mim, a Paz não é como Lost nos mostrou, mas essa é minha visão.
Para mim, Lost é eterno e nos mostrou que, durante a vida, coincidências acontecem e que sempre acreditaremos ter certeza sobre uma resposta, mas as perguntas sempre existirão para nos ajudar a “seguir em frente”…
* Leco escreveu este texto em seu blog.
Há seis anos um canal de TV norte-americano estreou mais uma série. As primeiras cenas mostravam os primeiros instantes após a queda de um avião em uma ilha aparentemente deserta. Há poucos dias, as cenas finais deste mesmo seriado apresentaram seus personagens principais se reencontrando amigavelmente, longe da ilha. Um final feliz, não há dúvidas. Mas o quanto os fins justificaram os meios neste caso?
Entre 22 de setembro de 2004 e 23 de maio de 2010, a indústria de entretenimento foi tomada de assalto por um dos universos ficcionais mais audaciosos de todos os tempos. Dentro e fora da ilha, J. J. Abrams, Damon Lindelof e Carlton Cuse não tiveram a menor timidez em entupir o programa com mistérios, dúvidas, detalhes e referências das mais diversas naturezas, além de misturar gêneros e montar-desmontar-remontar enredos e estruturas narrativas. Se a pretensão foi muita e o sucesso também, seria evidente que as expectativas seriam imensas e as frustrações idem.
Este texto não pretende se alongar nessa “fase 2″ da discussão, que teve início assim que a tela preta com o logo “L O S T” surgiu pela última vez na ABC. Os significados e interpretações trazidos pelos fãs após o final merecem um cuidado próprio. Por enquanto, vamos nos ater às impressões mais imediatas deixadas pelo episódio duplo em questão.
Mistérios, dúvidas e expectativas à parte, todos os espectadores entraram na viagem de 104 minutos do desfecho querendo saber como o vilão-mor, o Homem de Preto, seria derrotado. A série teve início com o abrir e encerrou com o fechar dos olhos de Jack Shephard. E no penúltimo episódio, foi ele quem – pela enésima e última vez – chamou a responsabilidade, assumindo o cargo de Jacob. Portanto, nada mais natural que o “doc” fosse o artilheiro do gol decisivo, embora como Romário, não teria conseguido sem o passe irretocável do seu Bebeto, o bom escocês Desmond.
Daí em uma sucessão de cenas pouco claras – é “Lost”, lembre-se – Jack não se importou de ver o MIB-Locke executar seu plano de usar Desmond para “tirar o ralo” da ilha, façanha que só ele supostamente seria capaz por ser imune às grandes doses de eletromagnetismo emanadas daquele lugar. Jack sabia/sentia que isso faria a ilha começar a ruir, como o MIB planejara, mas também “desligaria” a mesma energia que transformou aquele homem em uma entidade sobrenatural o tempo suficiente para ele retornar à mortalidade. Era a última e única chance.
Vamos combinar: o quebra-pau entre Jack e o MIB foi arrepiante. Direção, montagem e atuações de primeira. E a conclusão com o tiro de Kate e o chute final de Jack à beira do precipício foi impecável. Um dos grandes momentos da série. A morte do monstro não poderia ter ocorrido melhor.
Uma das justificativas que mais ali a favor do polêmico episódio final é que, “no fim de tudo, a série era sobre aqueles personagens”. Não concordo inteiramente com essa afirmação, que pode ser interpretada como desculpa para negar sua própria insatisfação sobre o que não “deu certo” no programa, mas admito que os personagens foram um dos grandes ativos de “Lost”.
Dito isso, o final acertou em fazer o que a série sempre fez muito bem: dar atenção a quase todos os personagens minimamente cativantes. O “ex-flashsideway” teve seus pontos altos no despertar de memória de todos que ainda não se lembravam da ilha, com destaque para os cinco casais: Jack e Kate; Sun e Jin; Sawyer e Juliet; Charlie e Claire; e Sayid e Shannon. O amor foi fundamental. Nesse processo, os poucos personagens que ainda se sentiam na pior, como Sayid, Locke e o casal coreano, perceberam que o insight não era apenas um retorno de memórias: era em si a chave para sua própria redenção.
Novelesco? Não tenha dúvida. Vai de cada um acatar. Como a direção e as atuações estavam muito boas, pelo menos a mim conseguiram comover.
O complicado, porém, é que esse desfecho, culminando no reencontro na igreja, era falho diante das circunstâncias de produção. Afinal, por que alguns personagens mereciam estar naquele “lugar”, naquele “momento” e tantos outras pessoas que também “caminharam juntas” ficaram de fora? O papo do “eles ainda não estavam prontos” porque tinham “coisas a resolver” é aceitável até certo ponto, pois serve para o cheio de pecados Ben ou para o traíra Michael, mas por que não para Mr. Eko, por exemplo? Apesar da marra e de ter sido um assassino antes da ilha, ele sempre ajudou a todos por lá. Sem teorias aqui, meus caros: Eko “não estava pronto” simplesmente porque o ator Adewale Akinnuoye-Agbaje não aceitou voltar à série. Isso sem falar de Miles, que conviveu com Juliet e Sawyer por anos…
Apesar de triste, achei adequado Jack morrer na ilha. Ele foi o herói trágico do início ao fim. Foi o cara que se sacrificou por todos, mesmo por quem questionava e desprezava sua liderança em todos esses anos. E a companhia de Vincent naquele último instante não foi menos que poética. O doutor descansou em paz porque seu lema – viver junto para não morrer sozinho – foi recompensado.
Não gostei, porém, de Hurley, Desmond e Ben ficarem por lá. Ben até entendo, pois a ilha sempre foi o seu lar mesmo. Mas no penúltimo episódio, Hugo falou claramente que estava aliviado de não ter sido ele o guardião. Daí porque Jack decidiu ficar, ele não só ficou também, como virou o novo Jacob? Não me convenceu. O diálogo dele com Ben ainda deu a entender que eles conseguiriam/conseguiram tirar Desmond da ilha, mas como e em quanto tempo, vai saber…
Aqui é terreno delicado e caro a muita gente. Até porque a própria definição de mistério é muito sutil em uma série como “Lost”, onde o mistério não era um gênero em si, mas uma ferramenta importante e usada à exaustão na série toda.
Todos divergem entre o que foi totalmente, parcialmente ou não explicado, sobre as possíveis interpretações das “respostas” ou mesmo o quão importante tais resoluções eram para curtir o programa. Por enquanto, vou me ater ao que considerei mais crucial na condição de fã.
Acredito, portanto, que os “mistérios” mais importantes foram “resolvidos” – as aspas existem porque, como falei acima, tudo é questão de interpretação e ponto de vista. No “Lostverso”, o planeta Terra concentra uma forte energia eletromagnética com benefícios e malefícios inúmeros. A ilha é o ponto de maior concentração desta energia, que precisa ser guardada por alguém que aceite a responsabilidade e o esforço de protegê-la da cobiça da Humanidade. Um mito moderno, enfim.
Talvez o eletromagnetismo seja o maior motivo da ilha ser tão difícil de ser encontrada. Como o físico Daniel Farady comprovou, essa energia, liberada sob certas condições, permite viagens no tempo. Mas apesar de difícil, não é impossível encontrar a ilha, e diversas gerações de visitantes passaram por lá. A mãe adotiva de Jacob e MIB, depois a mãe natural deles, o Black Rock, a Dharma, o barco Elizabeth, o voo Oceanic e o voo Ajira conseguiram, pois cada um teve a “sorte” de cruzar com as condições certas. Sim, o termo “Triângulo das Bermudas” acende em neon neste momento.
A explicação maior para os números foi mesmo o grau do ângulo de cada nome de candidato no observatório de Jacob. Além disso, no ARG de “Lost” falava-se que os números eram variáveis de uma equação matématica sobre o fim do mundo. Não explica inteiramente todas as coincidências envolvendo tais números, claro. Atribuo isso a traquinagem dos produtores mesmo.
Agora quem era a mãe adotiva de Jacob, por que a fonte emanava aquela luz, como a mesma fonte transformou MIB em um monstro, como Desmond não fritou o juízo com tanto eletromagnetismo, porque Walt tinha poderes, porque Richard pôde envelhecer de novo, que diabo era aquele cavalo de Kate, bla bla bla… enfim, tudo isso vai ficar em aberto mesmo. Se isso resulta na grande farsa dos produtores incompetentes ou em uma obra propositadamente aberta para que os espectadores a preeencham com suas versões, você decide. Mas voltarei a esse ponto crucial do debate em outro texto, como falei acima.
Para resumir muito bem resumido: gostei bastante do episódio final, mas não o considerei um desfecho satisfatório para a série como um todo. Não apenas por todos os pontos negativos já citados aqui, mas também porque não comprei muito terem transformado o flashsideway em um – na falta de um nome melhor – “purgatório”. Nem se trata da sensação de ser “enganado”. Mas acredito que, mais que resolver ou não mistérios, a grande falha de “Lost” foi se afogar nas águas navegadas por suas pretensões.
É, os produtores juraram por anos que a tese do purgatório era infundada. Só aí já dá pano pra muita manga. Mas a minha decepção vai por outro viés. Será que usar um recurso relativamente batido – “Ghost”, “O Sexto Sentido” e “Os Outros” só de relance – é mesmo digno para uma trama tão ambiciosa? E será que foi certo Lindelof e Cuse chegarem no começo da sexta temporada e mudarem o discurso de “as respostas virão no final” para “nem tudo será respondido“?
Apesar de meio “lei da compensação”, há tempos aprecio a ideia que muita gente também vem seguindo: de que o grande barato de “Lost” foi a viagem, não o destino. Não era importante para mim que a série acabasse com todos juntos felizes de volta à civilização – e antecipar esse momento no flashforward foi uma jogada de gênio. Também não era um maníaco por respostas de mistérios. Daí vejo que, assim como “Arquivo X” nos anos 90, “Lost” foi uma série que definitivamente marcou seu lugar no panteão dos grandes conceitos pop por diversos méritos, por mais falhas que tenham apresentado no processo.
Já falei um pouco os motivos disso aqui, mas falando especificamente da história, acho que o programa criou personagens incríveis e de fácil identificação, apesar de complexos nos detalhes. A sensação de estar sempre “perdido” a todo início de episódio, mesmo acompanhando toda semana, era semelhante a pular de 100 metros de altura no bungee-jump: por mais que se repetisse, era sempre um prazer inédito. A estrutura narrativa mutante desafiava positivamente nosso interesse pela trama.
E os detalhes? As frases impagáveis de Hurley, os apelidos de Sawyer, a fé insistente de John Locke, o heroísmo de Jack, a coragem de Kate, o medo de cada aparição do monstro, o (des)agradável cinismo de Ben, os dramas particulares, os romances, as cenas engraçadas… será que todas essas coisas boas não compensaram desastres como “Across the Sea”, os flashbacks chatos de Kate, a dupla Paulo e Nikki, o desfecho meia boca e todas as outras coisas ruins?
Não sei você, mas para mim compensou. No fechar de olhos de Jack Shepherd, é hora de manter os meus abertos. Que venha outro “Lost” em nossas vidas.
* Marcio escreveu este texto em seu blog.
Não é que eu esteja em meio a uma crise existencial sobre o fim de Lost e não consegui escrever nada – simplesmente resolvi tirar a semana depois de um finde tenso (você acompanhou) para dar uma descansada e diminuir o ritmo de postagem. E se você não assina o RSS, entrou aqui todo dia e não viu nada além do post Lost: The End, dê uma sacada nos posts anteriores – e no próprio post, que foi crescendo à medida que o povo foi discutindo o fim da série na área de comentários. E apesar de ter batizado essa semana de “perdida” (hein? hein?), ela não foi em vão – deu para recapitular bem a série, descansar dos tweets de hora em hora e dos posts em ritmo industrial.
A partir de segunda que vem o ritmo segue nessa lentidão relax, meu Twitter ativo de vez em quando ainda pra pegar o jeito, Vida Fodona em novo dia, novas mudanças na programação. E não é só um reajuste – vem aí uma grande mudança nOEsquema que, além de bonitaça, vai pegar um monte de gente de surpresa.
Antes disso, temos mais um fim de semana sobre Lost, desta vez colhendo opiniões e comentários postados em blogs e sites espalhados por aí. Se alguém quiser indicar um post que curtiu ou que fez em seu próprio site, traduzir um trecho de um blog gringo que teorizou legal ou linkar algo que viu que tenha a ver com o final da série, faça o favor. Credito e tudo.
E, na segunda-feira, temos o último Comentando Lost e as minhas considerações em texto sobre o fim da série.
E depois, move on.
Chore.
E olha os itens que vem nessa caixinha:
Lost: Season Six
* Every Sixth Season Episode
* Bloopers and Deleted Scenes
* Audio Commentaries accompany four episodes (LA X, Dr. Linus, Ab Aeterno and Across The Sea)
* The End: Crafting A Final Season – Join the LOST team along with other producers of some of television’s longest running shows as they examine the challenges of ending a landmark series.
* A Hero’s Journey – What makes a hero? Which survivors of Oceanic 815 are true heroes? These questions and more are explored.
* See You In Another Life, Brotha – Unlocks the mysteries of this season’s intriguing flash sideways.
* ‘LOST on Location’ – Behind-the-scenes featurette showcasing stories from the set, including all-new interviews with actors and crew.
* PLUS: A LOST Blu-ray & DVD exclusive – Go deeper into the world of LOST with a much-anticipated new chapter of the island’s story from Executive Producers Damon Lindelof and Carlton Cuse.Lost: The Complete Collection
* Every Episode in the Series (Seasons 1 through 6)
* Over 30hrs of Season 1-6 Bonus materials (previously released materials from Season 1-5 and the all-new Season 6 bonus material)
* A unique series of featurettes that takes viewers on very personal tours of Oahu where the series was created, with key cast and crew as they reflect.
* Exploring the global phenomenon that is Lost, bonus showcases events ranging from the series cast and crew at San Diego’s famed Comic-Con convention to international voice recordings, local events and even fan parties, all of which helped make the show into a worldwide favorite.
* A closer look at some of the props with cast, writers and producers, exploring their significance, stories and emotional ties to the characters.
* Humorous yet emotional look at every character who died on the series
* 16 hilarious Lost “Slapdowns” featurettes showcasing celebrity Lost fans who confront Executive Producers Damon Lindelof and Carlton Cuse to ask press questions about the final season, including the Muppets and cast members Nestor Carbonell, Michael Emerson, Rebecca Mader and more.
* The exciting collectible packaging also includes:
o Special Edition collectible ‘Senet’ Game as seen in Season Six
o Custom LOST island replica
o Exclusive episode guide
o Collectible Ankh
o Black light penlight
Demais, hein.
E o Gideon’s Life terminou sua série assim.