F#m G
Lucifer Sam, siam cat.
B
Always sitting by your side
E
Always by your side.
C G D
That cat’s something I can’t explain.
F#m G
Jennifer Gentle, you’re a witch.
B
You’re the left side
He’s the right side.
E
Oh, no!
C G D
That cat’s something I can’t explain.
F#m G
Lucifer go to sea.
B
Be a hip cat, be a ship’s cat.
E
Somewhere, anywhere.
C G D
That cat’s something I can’t explain.
F#m G
At night prowling sifting sand.
B
Hiding around on the ground.
E
He’ll be found when you’re around.
C G D
That cat’s something I can’t explain.
Stooges, protopunk e cena paulistana de roque, pra capa de uma Rockpress das antigas.
***
Stooges contra tudo
Algo aconteceu no final dos anos 60. Uns culpam conjunções astrais, outros a era de ouro do capitalismo – o certo é que os hormônios da sociedade ocidental estavam em plena ebulição, uma menopausa às avessas que o planeta parece sofrer de cinqüenta em cinqüenta anos. A guerra do Vietnã servia de pretexto para uma geração inteira abandonar as regras impostas por seus pais e professores e descobrir formas próprias de cair fora do sistema. Os movimentos feministas e pró-direitos civis ganhavam força em nível mundial, ao mesmo tempo em que a América Latina sucumbia a seu período de ditaduras militares. A África vivia o ápice do processo de descolonização enquanto alunos matavam pais e professores com respaldo de Mao, na China. Tempos difíceis e interessantes, o mundo caía em uma dicotomia que abriu uma vala entre duas ideologias políticas e dois modos de vida, tendências cujas seqüelas ainda sofremos até hoje.
Mas os Stooges não se importavam. Para eles, era pouco. Como se as mudanças que o mundo atravessava fossem mais uma pequena amostra do poder de transformação do que uma mutação definitiva. As coisas ainda estavam inteiras, a raiva ainda estava contida, o máximo que víamos eram duelos entre estudantes e polícia, pouquíssimos contra-atacaram com a mesma violência do sistema. Faltava destruição. Com o mundo dividido em dois, quase toda intelectualidade migrou para o lado não-capitalista da disputa – mas poucos pegaram em armas. Muito foi dito e escrito sobre os anos 60, mas foram poucos que foram lá e deram o próprio sangue.
James Osterberg não havia dado sangue até a metade de 1966. Até então, apesar de considerado um dos melhores bateristas entre a turma de adolescentes da minúscula Ann Arbor, subúrbio de Detroit, no estado americano do Michigan, ele ainda era um moleque comportado, que estudava para as provas, vestia-se bem para paquerar as garotas e morava com seus pais num trailer. Foi a música quem o obrigou a entrar em contato com os irmãos Asheton (Ron e Scott) e seu amigo Dave Alexander. Estes três tocavam em diferentes bandas da cidade e eram conhecidos na vizinhança por sua fama de arruaceiros – quando ser roqueiro significava andar fora da linha. Em 1965, Scott e Dave venderam suas motocicletas e foram para a Inglaterra, “ver os Beatles em Liverpool”. Não deu certo, mas assistiram a shows memoráveis, como o único show do Who no Cavern Club. Vendo a excitação dos ingleses e a facilidade que eles tinham para fazer músicas e shows, os dois voltaram para o meio-oeste americano prontos para montar sua própria banda.
O mesmo havia acontecido com James, que saiu de Ann Arbor em 66 por recomendação do guitarrista Mike Bloomfield, que o baterista tinha ido adular após um show da Paul Butterfield Band em Detroit. Conhecido por Iggy por ter mantido o apelido de sua antiga banda (The Iguanas), ele foi para Chicago encontrar o verdadeiro blues. Passou a percorrer a periferia barra-pesada daquela cidade, onde era o único branco a freqüentar os shows. Mas logo havia percebido o melhor daquela música – deixar que ela saísse naturalmente, como a extensão natural de seus sentimentos.
Foi um baseado fumado às margens de uma estação de tratamento de esgoto que fez com que Iggy visualizasse seu futuro. “O lance é tocar meu próprio blues simples”, pensou enquanto experimentava maconha pela primeira vez, sozinho. Maquinava aquelas idéias quando foi ao primeiro show dos Doors em Detroit. Na platéia, a multidão só queria ouvir a banda que havia gravado “Light My Fire”. No palco, Jim Morrison cantou o show inteiro em falsete, provocando a platéia. Iggy não se aguentava, Jim fazia o que ele achava que devia ser feito, confrontava o público ao mesmo que o seduzia. “Se esse cara pode fazer isso, eu também posso”, pensava enquanto sorria vendo o grupo à sua frente, “E tenho de fazer agora, não posso esperar!”
Quando Iggy encontrou os irmãos Asheton, a explosão foi imediata. Tudo que eles queriam fazer era liberar aquela energia adolescente confrontando o público, despejar o triplo de vibração que sentiam com mais agressividade e violência. “Vamos por Dave Alexander pra tocar baixo, eu pego a guitarra e meu irmão toca bateria em qualquer coisa que dermos pra ele”, disse Ron Asheton, que logo perguntou o que Iggy faria. “Não se preocupem: farei algo”.
Quando encontraram Iggy, ele estava com as sobrancelhas raspadas, papel alumínio na cabeça e vestido num enorme macacão branco. Os irmãos Asheton começaram a rir quando o viram e lembraram de um vizinho chamado Jim Pop, um débil mental que raspava os pelos do rosto. Entre risadas, começaram a chamá-lo de Iggy Pop. Pegou.
Horas depois, estavam no palco do Grand Ballroom, em Detroit. Um ruído insuportável saía das caixas de som antes mesmo da banda subir no palco – era um liquidificador plugado na mesa de som. Logo depois, deram início a uma rotina de destruição cênica e sonora que se tornaria clássica com o tempo. Ron Asheton tocava sua guitarra ao lado de um aspirador de pó, que grudava no microfone sempre que largava seu instrumento. Iggy sapateava sobre uma tábua de lavar roupa devidamente microfonada, enquanto Scott martelava (literalmente) dois enormes galões de óleo. A grande maioria do público odiou aquilo e Iggy vomitava sua raiva incontida sobre aqueles que ficaram para vaiar. Entre os poucos felizes com aquilo estava o líder hippie John Sinclair, que mais estava cooptando outra banda de Detroit (o MC5) para clamar sua revolução à americana:
“Era uma porra tão real que era simplesmente inacreditável. Iggy não se parecia com nada já visto. Não era como uma banda, não era o MC5, nem Jeff Beck, como não era coisa nenhuma. Iggy criou um número hipnótico psicodélico como pano de fundo para suas palhaçadas na linha de frente. Os outros caras eram literalmente escadas (stooges) para suas palhaçadas. Eles apenas deixavam aquele tremendo zumbido rolar, como compassos dementes. Estavam tão perto da música do norte de África quanto do rock. E lá estava Iggy, dançando como se Esperando Godot tivesse virado um balé. Ele não era Roger Daltrey, se você entende o que eu digo”.
Danny Fields, o maluco que a gravadora Elektra contratou para descobrir novos talentos, também ficou impressionado com o primeiro show que viu do grupo: “Era 22 de setembro de 1968. Não posso minimizar o que vi no palco. Nunca tinha visto ninguém dançar ou mover-se como Iggy no palco. Nunca tinha visto tanta energia atômica vindo da mesma pessoa. Ele dançava movido pela música, como são os grandes dançarinos. Era a música que eu havia esperado minha vida toda para ouvir”.
Fields conseguiu um contrato para o grupo após Iggy Pop mandá-lo pastar quando foi procurá-lo atrás do palco. Não que Pop rejeitasse a idéia de um contrato – simplesmente não acreditou que aquele sujeito fosse de uma gravadora. Quando o dono da Elektra, Jac Holzmann, os chamou em sua sala e perguntou se eles tinham material para compor um álbum, a resposta foi positiva. Mas era mentira – tinham apenas três músicas próprias e compuseram o resto do primeiro álbum no final daquele dia.
Stooges, o primeiro disco do grupo, foi gravado por John Cale por indicação de Danny Fields. Cale havia acabado de sair do Velvet Underground e Fields deu-lhe a oportunidade de fazer algo ligado ao rock, já que este parecia disposto a voltar à música de vanguarda. Quando o grupo começou a tocar no estúdio, com amplificadores no último volume, Cale acabou com a alegria do grupo. Não dava pra gravar daquele jeito e os Stooges ficaram putos com ele. Apesar da negação, Cale queria que o grupo soasse alto e sabia que este recurso se consegue com uma boa produção – tocar ao vivo no estúdio não funcionava, fazia o som soar capenga. A contragosto, eles gravaram baixo. E o entusiasmo do grupo seguiu o volume. Por isso o primeiro disco do grupo não tem a energia que eternizada por sua reputação. Mas lá estão os clássicos: “I Wanna Be Your Dog” é o antiblues, pedindo pelo sofrimento; as monumentais “1969” (“outro ano pra você e eu/ Outro ano sem nada pra fazer”) e “No Fun” são hinos à apatia de uma adolescência sem transformações; “We Will Fall” e “Ann” cambaleiam como gigantescas rochas que prenunciam uma avalanche e esta vem com “Little Doll”, “Not Right”, “Real Cool Time”…
Mas o impacto do disco de estréia não seria sentido no vinil. Em sua primeira turnê, o grupo definiu o limite que o grupo tinha frente ao excesso: nenhum. Ao ir para Nova York, tudo estava perdido. Uma platéia de intelectuais e foras-da-lei foi seguidas vezes aos quatro shows que o grupo deu em sua estada na metrópole. Lá, tinham tudo à disposição: mulheres, drogas, bebidas, moral e dinheiro.
A colisão do pequeno grupo caipira com o bas-fond nova-iorquino foi fulminante. Na primeira apresentação, Iggy entrou no palco e vomitou na platéia. Na segunda, jogou-se sobre o público e caiu sobre Johnny Winter, que estava ao lado de Miles Davis. Este riu à beça da performance do grupo e convidou-o para cheirar uma montanha de cocaína em seu apartamento, para depois sair por Nova York elogiando o trabalho do grupo. Iggy atirava coisas na platéia, que atirava de volta. Ácidos, baseados e picos davam lugar às refeições. Era o caos.
Mas a recepção era boa – coisa que não aconteceu quando o grupo continuou sua turnê. Na maior parte dos lugares em que tocaram, o público em geral reagiu mal e quase sempre os shows acabavam em confusão – vários em briga, a banda no braço com o resto da platéia. Ao mesmo tempo, iam se envolvendo com heroína. Mas era Iggy quem fazia a diferença – lambuzava-se de pasta de amendoim e jogava-se sobre o público, cobria-se de tinta, vomitava, rolava sobre cacos de vidro, comia hamburgueres de boca aberta, deixando pedaços de carne mastigada rolar pelo peito nu. E ameaçava o público. Xingava, provocava, puxava para a briga, entrava na platéia socando, misto de mosh com pogo antes dos dois terem sido inventados.
Para o segundo disco, Funhouse (batizado em homenagem à casa em que moravam), não havia outra forma de gravação – o grupo estava tão destroçado que só conseguia tocar como se fosse um show. Convocaram o saxofonista Steve McKay para tapar os buracos de algumas canções e gravaram tudo ao vivo. Para a produção, foi chamado o mesmo Don Gallucci que assistiu os Troggs gravarem “Louie Louie”. O disco abria com a brutal “Down on the Street”, que não esperava nem um minuto inteiro para explodir o som rumo ao espaço. Tudo caía aos pedaços, como escombros após uma explosão – mas com a firmeza e pulso característicos do rock’n’roll. “Loose”, “T.V. Eye”, “Dirt”, “1970”, “Fun House”, até a apocalíptica “L.A. Blues”, que destroçava o resto de música que existia no disco ao elevar o sax de McKay aos limites ignóbeis do free jazz.
Depois disso, o grupo acabou. Foi dispensado pela gravadora (mesmo com o próximo disco – Raw Power – composto), caçado pelo imposto de renda, pela polícia e por um grupo de traficantes com que Scott havia se metido. Após um acidente com um caminhão que destruiu uma casa, uma ponte, o caminhão e todo equipamento alugado pela banda, entraram numa paranóia sem limites e transformaram a antiga funhouse num bunker antimotoqueiros. Com o dinheiro da venda de drogas, compraram armas pesadas e ficaram à espera de inimigos que não vinham. Com aquela quantidade de armas e nada pra alvejar, destruíram a própria casa com tiros de grosso calibre.
Com o fim, o grupo tornava-se uma lenda. Mas não havia mais para onde ir. O dia seguinte da primeira vinda dos Stooges não deixou pedra sobre pedra e o grupo não teve outra opção senão voltar para suas próprias casas. Na formação, um racha: Dave Alexander havia sido demitido por Pop depois de uma balada baixo astral. E um elemento alheio havia se infiltrado na cúpula do grupo – James Williamson é descrito como “uma nuvem negra baixando nos Stooges” pela irmã dos Asheton, Kathy. O que, em se tratando do grupo, só tinha um sentido.
Mas a sorte continuava sorrindo para eles quando David Bowie os descobriu do outro lado do Atlântico. Começa a ser um nome de sucesso, devido às suas entrevistas francas e hits comportados, mas ele queria mais. Através dos discos dos Stooges e do Velvet Underground, Bowie descobriu uma América do contra, um submundo de perversão e corrupção que parecia ser o único lugar que permitiria (como mais tarde permitiu) a melhor música daquela época existir, num país careta daqueles. E o imaginário de sexo, drogas e destruição que tanto Iggy Pop quanto Lou Reed descreviam em suas canções era perfeito para uns bons meses de farra.
E assim aconteceu: Bowie foi para os Estados Unidos, catou Iggy e Lou, e resolveu se esbaldar. No meio da baladaça, perguntou se Iggy queria reformar os Stooges e James Williamson deu seu jeito de entrar na história, armando um disco gravado na Inglaterra. Todos estavam tão chapados de todas as formas que Iggy esqueceu de avisar aos Asheton, que vinham acompanhando toda a zona desde o começo. A chegada de Bowie à América causou um tipo de comoção às avessas, uma vez que a parte suja dos Estados Unidos que queria deslumbrar o astro inglês com aquilo que ele vinha procurar – fartura de realidade e reputação junto à rua.
Iggy e James voaram para a Inglaterra, onde, depois de tentar várias músicos, chamaram os irmãos Asheton para o baixo e a bateria. Assim, gravaram Raw Power, que teve seu som “amaciado” por David Bowie na mixagem (uma versão recente, com o dedo de Iggy Pop, corrigiu esse erro). A sonoridade dada por Bowie tirou todo poder de ataque do grupo ao vivo, que voltava a se equilibrar perto do fim. Uma turnê em Los Angeles fez com que o grupo instalasse morada na capital do excesso, uma combinação ingrata. Ninguém mais suportava os Stooges e seus shows iam ficando cada vez mais sem limites. Agora era a platéia quem encarnava a violência de Iggy, com resultados catastróficos.
O último show do grupo aconteceu em Detroit, em 1974. Uma gangue local os havia jurado de morte e o show começou com uma chuva interminável de pedras e garrafas. Iggy sequer se intimidava, gostava do clima pesado: “Alguém tem mais cubos de gelo, ovos ou granadas que queiram tacar no palco? Vocês pagaram, agora agüentem. Vamos ouvir o cantor. Eu sou o melhor… Obrigado pelos ovos. O que eu ganho se juntar uma dúzia de ovos? Ouçam, eu jogo ovos melhor que vocês. É hora das garotas do tumulto? TUMULTO. Me dá uma toalha pra eu tirar essa gema. Eu não quero que me vejam com gema na cara. Oooh baby. C’mon mama… Lâmpadas também? Copos? É, estamos ficando violentos… Tem dois subindo no palco. Temos que sair. Vejo vocês depois”. Quando um sujeito começa a esmurrar Iggy no palco. O cara sai, Iggy pega o microfone, todo fudido, e diz que, depois dessa, o público merece uma versão de 55 minutos de “Louie Louie”. E isso está tudo em disco, no pirata Metallic K.O.
E assim o grupo acabou. Mas seu legado apenas começara. Em Nova York, seguidores fiéis compactavam seu som e misturavam com rock bubblegum dos anos 50 – eram os Ramones. Em Londres, eram citados por ninguém menos que os mestres da revolução, quando os Sex Pistols cantavam “No Fun”. Iggy Pop era tratado como uma lenda viva do punk, mas foi para Berlim no auge do movimento gravar discos solos com David Bowie. Iggy conseguiu se equilibrar entre o showbusiness e a sarjeta, limpou-se de vez no começo dos anos 90 e hoje continua firme. Os Asheton montaram um New Order antes do homônimo grupo inglês que não vingou e mais tarde Ron assumiria as guitarras do Destroy All Monsters. De vez em quando aparecem em discos dos outros, como convidados, mas vivem uma vida mais normal que a sua. A última aparição de um deles foi quando Ron gravou “T.V. Eye” para a trilha de Velvet Goldmine, ao lado de Mike Watt, Thurston Moore, Don Fleming e Mark Arm, todos discípulos fiéis dos Stooges.
***
PROTO-O QUÊ?
Clash, Ramones, Buzzcocks, Joy Division, Sex Pistols, X, Jam, Television, Fall, Cars, U2, Black Flag, Wire, Hüsker Dü, UK Subs, Suicide, Blondie, Dead Kennedys, Smiths, Echo & the Bunnymen, Richard Hell & the Voivods, Talking Heads, B-52’s… Toda a geração de bandas que pode ser englobada no chamado período punk da história do rock (que agrupou diferentes tendências como punk, hardcore, new wave e pós-punk) não teria existido sem dez anos de barulho curtido no underground americano. Toda a cena faça-você-mesmo que explodiu com o punk e criou a “segunda via” do mercado de rock no planeta não aconteceria da mesma forma não fosse um punhado de bandas ilustres e diversas bandas anônimas de uma elite comportamental chamada de protopunk.
Quem mandou o automóvel ser a moeda corrente da primeira fase do capitalismo do século 20. Afinal, foi o primeiro supérfluo (transporte público serve pra quê?) a ser vendido como indispensável pelo mercado e, como tal, logo virou sinônimo de status. Aos poucos, a garagem se tornava cômodo indispensável em qualquer residência a partir dos anos 40. Mas com o declínio da economia americana nos anos 60, o carro logo foi o primeiro indispensável a ser descartado pela classe média americana, deixando milhares de garagens livres pela América. Logo, toda casa tinha uma sala de ensaio perfeita pra qualquer tipo de banda, recurso que até hoje é seguido, como um sacramento.
Seu uso efetivo começou com a invasão britânica. Depois que os Beatles oficializaram o rock como gênero inglês, dando oportunidade para vários jovens conterrâneos arqueólogos do blues americano entrar no mercado fazendo seu próprio som, o próximo passo desta ascensão seria entrar nos Estados Unidos. Quem vencesse na América, vencia no mundo e foram os Beatles quem deram o primeiro passo. Deram sorte: os Estados Unidos ainda não haviam se recuperado do assassinato de seu querido presidente JFK quando os cabeludos ingleses desceram por lá. Com a Beatlemania, todas as bandas de rhythm’n’blues inglesas migraram para os EUA, na vã tentativa do sucesso. Todas elas emplacaram ao menos um hit e constituiriam, mais tarde, a primeira geração da era de ouro do rock.
Como reza a terceira lei de Newton, a chegada dos ingleses provocou um verdadeiro chamado às guitarras na terra do Tio Sam. Foi quando adolescentes por todo país montaram suas bandinhas e foram em direção às paradas. A grande maioria trombou no mínimo sucesso e uma parte deste grupo emplacou dois ou três hits no resto do país. Tocando guitarras sem muita técnica e com muito barulho, bandas como Sonics, Troggs, Kingsmen, Seeds, Music Machine e outras semidesconhecidas cruzaram os Estados Unidos sobre um único hit, transformando suas apresentações em festas explosivas de energia juvenil. Mais que as apresentações inglesas, os grupos americanos tinham uma identidade imediata com o público e cada vez mais gente se empolgava a pegar uma guitarra. Para estes, uma geração bastarda da cruza da surf music com o rock inglês, “Louie, Louie” era o hino.
Foi exatamente no meio dos anos 60 que várias diferentes correntes do mercado musical se encontravam: a Beatlemania se esgotava e os próprios Beatles procuravam outros artifícios sonoros, a música folk saía imediatamente de moda – primeiro pela debandada de Bob Dylan para o rock, depois pelo surgimento do então novíssimo folk rock -, a técnica passaria a ser quesito indispensável em qualquer músico, a psicodelia transformava a cabeça de jovens londrinos. A quantidade de grupos que nasceram neste período é incomensurável e os nomes (Chocolate Watch Band, Jefferson Airplane, Captain Beefheart & His Magic Band, Grateful Dead, Doors, Frank Zappa & the Mothers of Invention, 13th Floor Elevators) ajudavam todas a confundir-se entre si.
Três bandas distinguiam-se radicalmente das outras. A primeira delas, o Velvet Underground, era fruto do encontro de Lou Reed com John Cale, dois jovens estudantes de vanguarda dispostos a quebrar convenções impensáveis de seus meios. Reed vinha da literatura, cantava a marginália de forma suntuosa e fazia bicos em gravadoras, compondo músicas bobas de amor para grupos de doo-wop. O galês Cale vinha da música contemporânea, músico prodígio desde menino, foi para Nova York estudar com os grandes mestres da nova música, como John Cage, LaMonte Young e Cornelius Cardew e queria flertar com o lado feio da música pop. O casamento dos dois gênios era explosivo e completado pela microfonia indomável de Sterling Morrison e pelo metrônomo unissex chamado Moe Tucker dava origem a um turbilhão sonoro sem precedentes até então. Barulho, melodia e vanguarda são dispostos lado a lado e tratados da mesma forma. Apadrinhados por Andy Warhol, tiveram que gravar um álbum com a cantora húngara Nico, que nunca realmente pertenceu ao grupo. The Velvet Underground and Nico, de 1967 (o disco da banana), é obra fundamental em qualquer estante de amantes de música popular moderna. O disco seguinte, White Light/ White Heat, trazia um turbilhão de ruído nunca ouvido antes em disco, um amálgama de ritmo e barulho que destruía o chão a cada pisada. Os dezoito minutos de dois acordes que arrastavam-se por Sister Ray, populados por uma orgia de travestis e marinheiros entupidos de heroína, falam por todo disco.
A saída de Cale levou o barulho para longe do Velvet. Com Cale, o lado erudito contemporâneo de destruição da música era posto de lado em favor do artesanato pop praticado por Lou Reed, que assegurou o repertório do grupo por outros dois discos e anos. John Cale saiu do Velvet a contragosto e resolveu despejar aquela raiva em sua carreira solo – o que incluía seu trabalho como produtor. Foi ele quem comandou as primeiras sessões em estúdio do segundo grupo desta leva de desajustados. Os Stooges de Iggy Pop aceitaram ser produzidos por um músico metido da cidade grande, que logo os impôs às limitações do estúdio – onde uma grande banda de palco pode soar meia-boca. As gravações soam cansadas, mas qualquer pirata do grupo naquele 1969 (“Outro ano sem nada pra fazer”, resmungava Pop) traduzia o dínamo autodestrutivo que era o grupo.
No palco, ninguém pegava os Stooges. Suas apresentações levavam o conceito de caos aos limites do possível, com o grupo colidindo de frente com a platéia, através do som e da fúria. Cuspindo as vísceras artísticas pra fora, os Stooges eram um atentado aos bons modos que o rock de sua época acabava parecendo, seja a piromania de Jimi Hendrix ou o quebra-quebra do The Who. Ao lado dos Stooges, na mesma cidade, um terceiro grupo completava a linha de frente do proto-punk. Erguendo a bandeira da desordem como nova religião, o MC5 (o quinteto da Motor City) era o lado mau dos Rolling Stones, o que Jagger e cia. diziam ser. Citando referências tão diferentes quanto Nat King Cole e Sun Ra, o grupo encabeçava o movimento Panteras Brancas, do ativista político de araque John Sinclair, um hippie que preferia disfarçar suas verdadeiras intenções numa bandeira política. Mas para o MC5 não havia disfarce: ele explicava com todas as letras seu intuito – sexo, drogas, rock’n’roll e nenhum outro motivo, o prazer e a diversão ficavam em segundo plano em relação ao excesso. “Irmãos e irmãs!”, berrava o cabeludo Rob Tyner como pastor de uma nova religião. Wayne Kramer e Fred “Sonic” Smith (que mais tarde casou com Patti Smith) grunhiam em resposta, ao mesmo tempo que Dennis Thompson e Michael Davis empurravam o ritmo com bateria e baixo. Um disco gravado ao vivo – Kick Out the Jams – é o melhor registro da truculência do ROCK (com maiúsculas) do grupo.
Com os anos 70, todos pasteurizaram seu som – o MC5 lembrava um grupo hippie tocando clássicos do rockabilly em Back to the USA, os Stooges pareciam escondidos embaixo dos escombros graças à mixagem de David Bowie em Raw Power e o Velvet Underground gravou uma coleção de hits radiofônicos batizada de Loaded. Os três grupos logo acabariam, mas seus estilhaços podem ser sentidos em duas outras bandas – os New York Dolls e os Modern Lovers.
As duas eram opostas como dia e noite. Os Dolls vinham de diversas bandas de Nova York que só queriam farra. Vestidos de mulher, David Johansen, os guitarristas Johnny Thunders e Syl Sylvian, o lendário baixista Arthur Kane e o baterista Billy Murcia, tomaram o subúrbio da capital do mundo de assalto, com uma resposta suja e grotesca ao glam rock inglês. “Tanto em tão pouco tempo” era um dos lemas do grupo, que batizou o primeiro disco. A sonoridade era mais rock’n’roll do que propriamente punk rock – o groove da banda saía do mesmo lugar do dos Rolling Stones -, mas a altura do som e a presença de palco do grupo antecipavam o gênero que começava a borbulhar. E o picareta inglês Malcolm McLaren assistia de perto – tanto que pegou os Dolls como empresário e os tentou transformar numa banda comunista (?), toda de vermelho, com uma bandeira da União Soviética ao fundo.
Ficando com a metade tímida dos primórdios do punk, os Modern Lovers de Johnathan Richman eram o extremo oposto dos Dolls. Com sua Stratocaster e sua insegurança ao encarar o palco, Richman só podia cantar canções como aquelas – “I’m Straight” (“Eu Sou Careta”), “Pablo Picasso” (“Pablo Picasso nunca foi chamado de cuzão, como você”) e “Hospital” (narrando a espera da namorada num pós-operatório). Com Jerry Harrison (futuro Talking Heads) e Chris (futuro Cars) na primeira e clássica formação de seu grupo, Richman transformava canções sem graça em hinos de rebeldia adolescente, culminando com o maior de todos, o clássico estradeiro “Roadrunner” (e seu refrão “Radio on!”). As primeiras demos, produzidas por John Cale, só apareceram como disco quase um ano de terem sido gravadas.
Logo depois, o sonar da música pop cairia em Nova York. Depois que o glam rock esvaziou-se em Londres e os hippies da Califórnia estagnaram nos montes de dinheiro dados por gravadoras, foi a vez de um grupo de moleques descobrir um velho bar de motoqueiros que funcionaria como bunker de toda uma geração. O CBGB’s funcionou de base para bandas como diferentes como o Television, os Ramones, o grupo de Patti Smith e embriões de bandas que mais tarde seriam o Blondie, o B-52’s, o Talking Heads, os Cars, os Heartbreakers, os Voivods. Aquele impulso garagesco tomou conta de uma cena que passou a despertar interesse primeiro da imprensa, depois das gravadoras. Com seus discos debaixo do braço, eles levaram seus shows para o outro lado do Atlântico e para a costa oposta dos Estados Unidos, fazendo as cenas londrina e angelena brotarem. O punk havia nascido.
***
Protopunk à paulistana
Nos subterrâneos do rock paulistano, uma cena caminha no limite entre o ritmo, o barulho e a psicodelia. Qualquer semelhança com Nova York no começo dos anos 70 não é mera coincidência…
Tá certo que São Paulo teve sua cena protopunk nos anos 60, mas ela era, no máximo, uma versão mais vigorosa da Jovem Guarda. A violência e a fúria que descambaram no punk no final dos anos 70 teve de ser importada do exterior para nascer no concreto paulistano. Mas se, na época, o protopunk não teve a brutalidade suficiente, uma geração amadurecida durante os anos 90 equilibra as mesmas doses de psicodelia, barulho e rhythm’n’blues que seus antecessores americanos.
No centro do furacão, um trio de veteranos com histórias para contar. Marquinho veio dos Pin Ups, onde tocou bateria em toda chamada “fase de ouro” do grupo paulistano, sobrevivendo ao caos de grito e desespero que foram os bastidores deste conjunto em seu auge. Adriano “µ” Cintra calvagou outro caos, o inferno ambulante chamado I Love Miami, cuja existência bizarra vale uma biografia à parte. Sandro Garcia pode ser considerado o pioneiro de toda essa geração. Convicto em ser mod, fundou os Charts e dentro deste foi descobrindo todas as diferentes vertentes desta geração. Todos abandonaram suas bandas na mesma época (1995, o ano da seca de bandas no país) e começaram a construir nova carreira no mesmo ambiente.
É quando começa a gravadora Ordinary, comandada por Marco e sua esposa Deborah Cassano, a Debbie, e assessorada por Adriano. Juntos, Marco e Adriano respondem por duas das bandas mais importantes da cena. De mesma formação (os dois nas guitarras e o baterista Rodrigo), as duas bandas diferem-se pela abordagem musical. Enquanto o Butchers’ encarna a mesma versão suja dos Rolling Stones que o Pussy Galore imaginou em seu Exile on Main Street, de 85; o Red Meat é o que os Afghan Whigs seriam se Greg Dulli trocasse estilo por culhões, explodindo soul e rock’n’roll em alta combustão. Adriano ainda responde pela one-man-rock-band Ultrasom, que ultrapassa referências pessoais para abraçar o papel de guitarreiro solitário, uma espécie de trovador rock’n’roll (no bom sentido).
Gravando em seu próprio estúdio (Ordinary Studios, claro, na garagem do casal ordinário), o núcleo lança discos com uma velocidade muito difícil de acompanhar, dando faixas e fazendo remixes de suas músicas para lançamentos semioficiais. Sandro acompanhou o crescimento da Ordinary de seu estúdio particular, o conhecido Quadrophenia. Logo, Ordinary e Quadrophenia criaram uma cena ao redor daqueles caras que falavam de bandas antigas obscuras e de novas semidesconhecidas – e que tocavam aquela sonzeira.
Sandro suspendeu as atividades dos Charts e passou a dedicar-se a dois projetos. O primeiro, ao lado do mitológico Plato Dvorák (uma mistura de Otto com um Syd Barrett gaúcho, fanático por bandas de garagem dos anos 60 e lenda-viva em Porto Alegre), chamava-se Momento 68 e funcionava muito bem enquanto cada um deles ficava em sua cidade. À primeira apresentação ao vivo, o temperamento profissional de Garcia e a inconseqüência psicodélica de Plato bateram-se de frente e logo depois a dupla estava desfeita. Sem banda para correr, Sandro apegou-se ao Momento 68 e montou uma banda com Gregor Izidro – dos Espectros – e Carlos Rodrigues, gravando de cara uma fita com suas referências: Troggs, Who, Pink Floyd do começo, Yardbirds, Otis Redding e Love. No outro projeto, ajudou Fábio Golfetti a ressuscitar o Violeta de Outono, facilitando o desenho da árvore genealógica para aqueles que não haviam entendido, assumindo o baixo (e Izidro, a bateria) da lendária banda psicodélica.
Fazendo o circuito Alternative (“Alternative NÃO!”, reclama toda a freguesia em uníssono, antes de ver que não há outra opção por perto)/Borracharia – duas casas de show em Pinheiros -, logo novas bandas começaram a agregar-se ao epicentro da cena “churly” – rótulo usado de forma irônica pelos integrantes do grupo, numa forma de ridicularizar qualquer tentativa de rótulo. A primeira delas, o Sala Especial, teria uma história à parte.
Uma das primeiras bandas brasileiras a assumir o espírito easy-listening, logo as raízes roqueiras do grupo vieram à tona, devido à influência da cena que se formava. Aos poucos, o Sala deixava de ser uma simples banda engraçada e instrumental para se tornar uma ótima banda de rock instrumental. Logo passaram a incluir soul e rock garageiro em seu cardápio de música francesa, Jovem Guarda e discos de teste de estéreo, e suas duas fitas – Aventuras Estereofônicas Volumes 1 e 2 – venderam mais de mil exemplares, sendo copiadas outras mil vezes Brasil afora. Um verdadeiro sucesso underground, amados igualmente por paulistas e cariocas (o que não é fácil). Com o terceiro volume de suas Aventuras já engatilhado (quem ouviu, prevê outro sucesso), o grupo encontra-se na encruzilhada que outros grupos instrumentais brasileiros já cruzaram: como fazer sucesso de verdade num país viciado em letras.
Margeando a cena, ainda temos uma cena psicodélica na Móoca, formada pelos Effervescing Elephant (que troca um guitarrista por um tecladista para tornar-se o Flaming Salt) e pelo Cedar Lunen; os já citados Espectros, fazendo a linha garageira mesmo, a la Troggs; e a banda oficial da comunidade psicodélica de Cidade Ademar, os Jerssons, um combo de música aleatória que ganha fama fazendo shows memoráveis em faculdades de filosofia e cidades do interior, convidando todos os músicos presentes a subir no palco.
Enfim, uma cena. Coberta por publicações (eletrônicas ou em papel) diferentes como Magazine (das organizações Ordinary), o recheado Lo-Fi, a revista Velotrol, o venenoso Buxixo (o filhote paulistano do Tupanzine) entre outros, ela faz com que o Brasil finalmente tenha uma geração protopunk de respeito – mesmo que mais de trinta após a geração original.
Essa é a versão integral, antes da edição final, que saiu aqui, na Folha:
Pop: Chambaril faz o elogio da colagem
“Ween”, responde Cláudio N. “Pink Floyd”, diz Pi-R. A pergunta queria saber que shows eles gostariam de abrir. Entre o quarto esfumaçado dos irmãos Dean e Gene ao topo do mainstream trip rock, a lacuna entre as duas opções parece apenas exibir enciclopedismo musical, mas cataloga a banda de ambos, o Chambaril, num gênero ainda não canonizado – a lisergia impressionista nerd branca, disposta a transpor barreiras entre rótulos musicais através de montagens e superposições sonoras.
Entre outros exemplares desta espécie estão as colagens subversivas da primeira era de ouro ao ataque ao copyright (final dos 80, de nomes como Negativland, Double Dee & Starsky e KLF), os Mutantes, o hip hop instrumental de DJ Shadow e RJD2, o Primal Scream, os Beastie Boys de “Paul’s Boutique”, Bomb the Bass, Solex, Avalanches, e, claro, Ween e Pink Floyd. É desse habitat sonoro que sai o recifense Chambaril.
Que, apesar do nome estranho, não é um remédio. “Só se for pra fome”, ironiza Cláudio, o colador original, que largou a guitarra rock dos Astronautas para se dedicar à arte do cut and paste num gravador de quatro canais, “Chambaril na verdade é um prato regional, carregado de proteínas, que consiste em ossobuco, pirão, arroz e salada”.
Descritos, parecem uma reedição do conceito de “mistureba” que assolava o pop brasileiro no começo dos 90. O primeiro disco, batizado com o nome da banda e distribuído pela Peligro, abre com beats de hip hop velha guarda, cordas chorosas que parecem terem sido abduzidas do “Álbum Branco” dos Beatles, levada sintética de flash-house, baixão à Prince, piano apocalíptico, gemido de gaita de blues. Mas a indigestão é meramente textual – em disco tudo flui macio e sutil.
Começando como projeto pessoal de Cláudio em 2001, logo teve agregado à formação os amigos Vinícius também nas colagens, Pi-R nos teclados e Carlos Cabeça, dividindo as guitarras com Cláudio – todos descritos por ele como “músicos de confiança e amigos das tardes enfumaçadas e bucólicas da UFPE”. No ano passado, compuseram a trilha para o filme “Sertão de Acrílico Azul Piscina”, de Marcelo Gomes (“Cinema, Aspirina e Urubus”) e Karim Aïnouz (“Madame Satã”). “Após essa gravação, resolvi passar pro PC algumas partes interessantes de minha coleção de vinil, dando predileção aos discos de 1 real, e as utilizei em forma de loops na construção de uma porrada de músicas”, explica Cláudio.
Entre grooves de disco music, álbuns falados, levadas Jovem Guarda e violões de fossa, não é possível reconhecer quase nada, fora um Costinha contando piadas aqui e a orquestração de Rogério Duprat para “Deus Lhe Pague” do Chico Buarque acolá. “Não temos preconceito”, resume Cláudio, “não achamos que nossa música deva se prender a algum estilo”.
Chambaril
Bazuka Discos
R$ 12,00
www.peligro.com.br
Largado (MP3)
(De Leve)
É o terror da família quando cê cola com a filha
só porque cê é… LARGADO!!!
o pai olha não gosta até comenta pelas costa
o quanto cê é… LARGADO!!
cê anda de chinelo toda hora, sua namorada quase chora
porque não queria que cê fosse tão… LARGADO!!
cê fica até sem graça, mas não muda porque não é de graça
que se deixa de ficar… LARGADO!!!
essa é pros malucos que andam de havaiana
contra toda pessoa que abana
pra longe a cultura sul-americana
e são malvistos nos lugares que entram,
nos restaurantes que vão
quando barram a entrada social,
a solução é entrar pelo vão
aos que deixam de ir em festas
porque não tem uma calça limpa
no brechó e nenhum tênis calça o quanto mais cê garimpa
seu macacão cê mente que a nova moda é alça ímpar
no restaurante finge dieta e come salsa com azeite
pra não gastar dinheiro com ônibus anda de skate
seu sogro acha que cê é atleta
porque não sente frio e não toma leite
essa é dedicada a cada maluco que já foi confundido
com ladrão, e ficou preso na porta giratória de tão mal vestido
pra todos aqueles que só mudam de camisa
mas niguém percebe porque o pacote são de 3 iguais GG e lisa
praqueles que foram parados na porta das americanas
acusado de roubo de suco Del Valle só tendo no bolso um vale
pros que perderam emprego por causa da “aparência”
2 meses depois a empresa do cara que avaliou declara falência
porque cê foi contratado por outra agência
concorrente que deu preferência não à ropa,
mas à inteligência…
É o terror da vizinhança porque desde criança
cê não deixa de ser… LARGADO!!!
a vizinha nova te achô bunito, não deu mole porque é esquisito,
cê é velho e continua… LARGADO!!
cê muda de cidade, troca de idade, e ninguém entende a verdade
e o porque de ser tão… LARGADO!!
sua namorada te deu um sapato,
teimoso trocou por um par de chinelos baratos
pra continuar… LARGADO!!!
essa é a melô dos malucos
que almoçam no restaurante do governo
por 1 real, pagando com vale refeição e pedindo o troco,
que pro seu governo é obrigatório, repete-se o prato
e quando dá pra dá calote
não pagamo e vazamo mais rápido que corrida de rato
mas nego é do gato, o fato é que onibus só de balão
ou por debaixo da roleta quando vamu pro Maraca de bondão
e os mais ratão pulam o muro
do Mário Filho com o filho no colo
eu bolo porque ainda levam
o milho robado quando tava ainda no solo
do vendedor que tava den’da panela
olhou pro lado perdeu mais 3
e vagabundo rala com sebo nas canela
a melo dos irmão que só estreiam ropa nova no aniversário
que ganhou da namorada
que custou ficar o resto do mês sem salário
e só comem em restaurante chique convidado,
na mesa não para o tique que parece que pede
“fique mais retardado”
(ah) síndrome de pobre, largado estilo nobre,
o que cobre o pelo além dos cabelo
é calça da C&A de 10 conto quando descobre
e 1 boné imprestado do amigo
que como si fosse castigo
nunca mais vai ver a cor do mesmo, nem pintado
esse é o hino dos meninos que si identicaram com a letra
e dos MC’s que entram na papelaria pra roubá uma caneta…
Na festa a fantasia cê aproveitou a mania
e se vestiu de… LARGADO!!!
ganhou o prêmio no final de fantasia mais original
profissional em ser… LARGADO!!
dia seguinte, outro capítulo, quiseram te tirar o título
porque fora da festa cê também era… LARGADO!!
tem gente que muda
mas si depois de 25 anos ainda sai de casa de bermuda
cê vai morrer… LARGADO!!!
Falei do filme sohre o Watchmen outro dia em cima de uma notícia velha, mas o negócio tá mais adiantado do que parece. O diretor deve ser o mesmo David Hayter que escreveu o roteiro em cima do original de Alan Moore. Pra quem não ligou o nome à pessoa: Hayter é o cara que escreveu os roteiros dos dois X-Men e do Hulk – ou seja, parece boa pessoa. O legal é o papo do cara do Ain’t it Cool News, que elogia pacas o roteiro de Hayter, que ele leu no ano passado:
I had my answer within the first ten pages of the script. Hayter has done the unthinkable. He’s written the first comic book screenplay to treat its source material as literature, and he’s crafted this with all the care and complexity of end-of-the-year Oscar bait. This is an epic story about responsibility and mankind’s worst nature and hope, and in the shadow of September 11th, it feels more important than it ever has before. There are very few scripts that I read each year that I feel must be made, but this is a case where the genre is literally incomplete unless this film is brought to the screen as soon as possible. This isn’t just great film writing; it’s the very model for how to adapt something and preserve it intact while still making the hard choices that anyone faces when translating something from one media to another.
E, pelo jeito, 1) nada dos textos extensos nos finais dos episódios e 2) nada do Cthuluh em Nova York
Qual é a melhor banda da história do rock brasileiro? Fácil: os Mutantes. Olhando à distância, o rock nacional nunca teve grandes bandas, daquelas cujo estrago pode ser medido tanto pelas influências na geração seguinte quanto pelo apelo pop, esta qualidade enigmática que faz com que diferentes canções consiga tocar o ouvinte mais fundo que a distância entre o tímpano e o cérebro, mesmo que por pura diversão. De um lado temos bandas grandes (Legião, Paralamas, Titãs, Sepultura, Engenheiros, Secos & Molhados, RPM) cujo impacto de sua música em alguns momentos de suas carreiras balançaram o alicerce central da cultura brasileira. Do outro temos os injustiçados esquecidos pelo mercado (Tomzé, DeFalla, Walter Franco, Cascavellettes, Fellini, Arrigo, Joelho de Porco, Black Future, Picassos Falsos, Gang 90, Erasmo, Tim Maia, Premê) que ainda terão sua herança nacional reconhecidas com o tempo, finalmente premiando sua ousadia fora de época que lhes custaram as próprias carreiras. Os Mutantes equilibravam tanto experimentalismo quanto popularidade, embalando hits como Panis et Circensis e Ando Meio Desligado com álbuns que fundiam a transgressão sônica e lírica proposta pelo rock mundial da época, o desbocado humor brasileiro e uma energia que só adolescentes são capazes de liberar. E acabaram funcionando para o Brasil como o referencial mais próximo dos Beatles que nós temos.
Mas o que se sabe sobre os Mutantes? Todos conhecem a história, as histórias e os maiores sucessos do grupo (na voz deles mesmos ou em algum dos diversas canções-tributo ao trio/quinteto paulistano), mas sua música ainda é uma incógnita. E por apenas duas vezes na história tivemos a possibilidade de redescobrir o grupo através de reedições. A primeira e mais clássica delas aconteceu durante os anos 80, quando a gravadora independente Baratos Afins se dispôs a lançá-los de volta ao mercado. Ainda conseguiu relançar jóias perdidas relacionadaos ao grupo, como o primeiro disco solo do tecladista Arnaldo Baptista, o clássico Lóki?. Nesta mesma época, o jornalista e músico Thomas Pappon (então no Fellini) se dispôs a registrar pela primeira vez a história do conjunto, entrevistando os principais envolvidos e escrevendo um marco na história da história do rock brasileiro, publicado em duas edições da extinta revista Bizz. O advento do CD trouxe novo interesse pelo trabalho do grupo no começo dos anos 90, quando a gravadora PolyGram trouxe os Mutantes para o disquinho prateado. Além das “todas as letras revisadas por Arnaldo Baptista”, a remessa trouxe toda discografia do grupo, Lóki?, os dois primeiros discos solo de Rita Lee (o primeiro – Build Up – com a participação de todos os Mutantes em diferentes faixas, o segundo – Hoje é o Primeiro Dia do Resto da Sua Vida – com os Mutantes como banda de apoio da cantora, considerado por muitos o melhor disco do grupo) e o disco engavetado do conjunto, O A e o Z. Sem Rita, este álbum entregava os pontos que o quinto disco da banda (Mutantes e Seus Cometas no País dos Bauretz) e descambava para o rock progressivo do calibre do Yes. Se você tem discos brasileiros dos Mutantes em casa ou são vinis lançados na época ou nos anos 80 ou são CDs do começo dos anos 90. Nenhum disco do grupo saiu de outras senão destas três safras.
Até que o jornalista Carlos Calado resolveu estrear sua bibliografia biografando o grupo paulista. Com o óbvio título de A Divina Comédia dos Mutantes, o livro de 1996 não trazia grandes surpresas no enredo da história já contada por Thomas quase dez anos antes. Mas entre as surpresas descobertas pelo escritor, estava um disco inédito do grupo, formado apenas por faixas conhecidas, quase todas cantadas em inglês. O álbum foi gravado em Paris quando o grupo passou em uma temporada de shows no final de 1970. Escoltados pelo produtor inglês Carl Holmes (que insistia na sonoridade brasileira do grupo), os Mutantes entraram no Studios Des Dames em Paris em novembro daquele ano e registraram Tecnicolor, o disco que lançaria a banda na Inglaterra e na França. Mas por algum motivo, a Polydor inglesa não se interessou pelo álbum, como sua sucursal brasileira, a Phillips. A fita foi arquivada num estúdio londrino e desenterrada por Calado, embora trechos do disco fossem conhecidos pela rede de pirateiros especializados no grupo. O autor ensaiou um relançamento do disco à época que o livro saiu, mas problemas burocráticos empacaram o processo. Mas uma recente onda de música brasileira no exterior fez com que o interesse pelo grupo crescesse tanto ao ponto da gravadora de David Byrne lançar uma coletânea do grupo (Everything is Possible) e o selo indie Tal reeditar os três primeiros álbuns dos Mutantes. Tal mania pela música do grupo fez com que os realizadores deste projeto conseguissem agilizar o lançamento do álbum inédito com a PolyGram (que, pra complicar ainda mais as coisas, foi vendida para a Universal – a empresa, não a igreja). O resultado chega às lojas esta semana.
Historicamente, Tecnicolor se situa entre as duas fases do grupo: a careta (dos três primeiros discos, quando a ingenuidade e espontaneidade do grupo eram a força-motriz de sua criatividade) e a chapada (dos três últimos, quando a técnica passa a ser fator primordial no método de composição, até o grupo tornar-se um monstrengo progressivo). Ao gravar um disco fora do país depois de alguns anos habituados com o estúdio, os Mutantes tiveram a oportunidade de reescrever sua história a partir do zero, pescando os melhores títulos e adaptando-os para o inglês e para sua sonoridade de então. Transbordando criatividade, o disco é o ponto de mutação do grupo, o momento em que as duas fases se convergem para o mesmo lugar. Este lugar é o disco em questão e se você não consegue decidir-se qual dos dois estágios do grupo você prefere, Tecnicolor é o melhor disco dos Mutantes.
“É hora de entrar em contato com as coisas que nos importamos”, sussurra, em inglês, Rita Lee na faixa que batiza o álbum. É uma boa desculpa para adentrarmos no universo do grupo. Sabemos da importância dos Mutantes, mas poucos se dispõem a mergulhar em sua biosfera de psicodelia apaixonada e jogos de calçada. Com Tecnicolor, é impossível resistir ao convite musical que a banda nos propõe, acompanhado dos mais belos vocais já cantados pelo trio principal: Arnaldo, Rita e o guitarrista Sérgio Dias. A química entre os cinco músicos (Liminha no baixo e Dinho na bateria) é perfeita e é possível detectar claramente o que foi improvisado no estúdio e o que nasceu de observações à parte.
Tecnicolor é, antes de tudo, um registro preciso do amadurecimento técnico do instrumental dos Mutantes. Aqui eles policiam seus excessos e prolongam as faixas ao instante em que elas parecem nos fazer querer mais, reduzindo o volume até a jam continuar apenas em pensamento. Os vocais são sussurrados e sob controle (Rita geme em Batmacumba, seduz em Baby, assombra em Le Premier Bonheur du Jour; Arnaldo lamenta-se em I’m Sorry Baby e o trio hipnotiza com Tecnicolor, na reprise de Panis et Circensis e Adeus Maria Fulô) e os poucos arranjos são inéditos, emboras muitos (Virgínia, El Justiciero, Baby, Saravá) fossem aproveitados quase integralmente no álbum seguinte à gravação do disco francês, Jardim Elétrico. As mudanças mais drásticas acontecem em I Feel A Little Spaced Out (Ando Meio Desligado) com o improviso comendo solto entre o baixo condutor e o teclado e a jam session de hard blues na parte final da canção e em Adeus Minha Fulô, onde a levada caribenha ganha ares de caixinha de música acompanhada com cuíca e marimba. Fora estas, poucos detalhes ajudam a envernizar o glamour das faixas do grupo, como o pesado teclado futurista em Virgínia, a bela guitarra de Le Premier…, o final que mescla Ob-La-Di Ob-La-Da com Rain (as duas dos Beatles) em She’s My Shoo-Shoo (divertida versão para A Minha Menina, de Jorge Ben), a versão crua de Saravah, o solinho de piano jazzy ao final de Baby… A brasilidade come solta por Batmacumba (onde parte da percussão é feita por guitarra e contrabaixo) e She’s My Shoo-Shoo (com agogô e cuíca), enfatizando a intenção do produtor Holmes em lançar o grupo no mercado europeu aproveitando a nova febre de música brasileira no mercado. Duas faixas (She’s My Shoo-Shoo e Baby) citam nominalmente “samba” e “bossa nova” em suas adaptações para o inglês, embora não contem com os termos nas versões originais. A delicadeza e respeito que o grupo tem para sua musicalidade faz com que, mais uma vez durante o disco, lembremos de Plastic Soda, o disco recente de Jupiter Apple.
O disco só peca por seu acabamento. O limpeza de som proposta por Carlos Freitas é menos digital que a média, mas perde-se parte dos graves que as válvulas dos amplificadores do grupo faziam rugir (poderia ser pior se caísse nas mãos do Liminha). O design de Paulo Pelá Rosado e Gê Alves Pinto lembra os últimos discos do Legião Urbana, feitos sem cuidado e com um duvidoso senso de estética. A capa só precisava de uma faixa prateada por cima para ser assinada pelo Hans Donner. A gravura de Sean Lennon (fã de última hora do grupo) na contracapa é ineficaz: não tem nem o primitivismo rústico dos desenhos do pai John, nem a esquizofrenia trêmula do traço de Arnaldo Baptista. Dessem este serviço a Arnaldo (que atualmente mais desenha do que toca) ou ao inglês Alan Voss (que ilustrou a capa de Jardim Elétrico e No País dos Baurets), o resultado conseguiria capturar o astral dos dias de glória do grupo. Mas mesmo com toda a produção executiva de Marcelo Fróes remando contra, o conteúdo passa incólume, indiferente a tratamentos plásticos que possam arruinar sua embalagem. Nunca os Mutantes estiveram tão em forma quanto nesta gravação que, mesmo sem o brilho pueril dos primeiros álbuns, é item obrigatório no panteão da banda. Perfeito.
1. Panis et circencis
2. Batmacumba
3. Virginia
4. She’s my shoo shoo (A minha menina)
5. I feel a little spaced out (Ando meio desligado)
6. Baby
7. Tecnicolor
8. El justiciero
9. I’m sorry baby (Desculpe, babe)
10. Adeus, Maria Fulô
11. Le premier Banheur du Jour
12. Saravah
13. Panis et circensis
É oficial: Alex Antunes traduziu o Neuromancer para a Editora Aleph (além de ter escrito o prefácio). Depois que eu ler, comento aqui, mas se der certo, os caras retomam a linha sci-fi. Cruzem os dedos!
Quem me conhece que me compre: a capa da revista da MTV deste mês e parte da tradução do recém-lançado Zap Comix levam a mesma assinatura deste sítio. Satisfação garantida ou satisfação garantida.
Esse inferno é o dos outros
Você liga o rádio e só toca merda. Você liga a TV e nada interessa. Você lê o jornal e todo dia ele é cada vez mais igual. O mesmo acontece nas lojas de disco, nos cinemas, nos portais de internet, na vitrine da megastore, na prateleira do supermercado, nas bancas de jornais, nas livrarias, no cardápio do restaurante. Mas ao mesmo tempo, você sabe que a música brasileira está passando por um período de renovação incrível, que o DV deu um gás fenomenal na produção cinematográfica no mundo inteiro, que estamos passando por um boom mundial de nova literatura, que o mundo anda cada vez mais difícil de ser explicado e pedindo analistas pra, se não explicar, ao menos ajudar a compreender o enigma do futuro.
Mas os meios de comunicação não captam isso. O comércio não percebe isso. Os “formadores de opinião” não estão interessados. As notícias em tempo real só repercutem pesquisas de universidades que se contradizem mais do que a Bíblia. As revistas só querem ouvir a opinião de gente sem opinião. A TV e o rádio se superam na capacidade de repetir fórmulas mais gastas do que a lei de Murphy.
Há, portanto, uma lacuna bem definida.
Mas é fácil entender.
Quando o muro de Berlim caiu, foi propagada a idéia de que o capitalismo havia vencido a Guerra Fria – e, portanto, era o novo Dono do Mundo. Uns afobados disseram até que a história havia terminado, num prenúncio hoje óbvio do que mais tarde chamaríamos de Pensamento Único. Esse conceito foi se infiltrando nas cabeças das pessoas à medida em que a economia foi sendo utilizada como régua para o sucesso de outrem. Parecia lógico, né – se o capitalismo venceu e os Estados Unidos são o maior país capitalista do mundo, nada mais natural que usar seus parâmetros para atingir sucesso semelhante.
Essa história você já conhece: do receituário neo-liberal que arruinou as economias na América Latina, na Ásia e na África, ao ridículo artifício de desqualificar a pessoa em vez de se discutir suas idéias, passando pelo boom nos fundos de investimento, as bolsas de valores se tornando o termômetro do mundo e megafusões de megaempresas que você nunca ouviu falar, porque tomam conta das partes do mundo que você conhece. Foi o que deu origem ao consumismo desenfreado da década de 90, responsável por coisas tão diferentes (e próximas, de alguma forma) como a multiplicação dos shopping centers e das faculdades privadas, o encarecimento dos planos de saúde e a Bolha da Internet, as fraudes de contabilidade nos EUA e o fenômeno das megastores no Brasil.
É aí que as coisas degringolam. O consumismo passou a medir oficialmente as pessoas por dinheiro, o que fez com que todo o conteúdo fosse deixado de lado em prol da forma. Isso explica desde o fato de Clinton ter saído ileso do escândalo Monica Lewinsky até o fato do Festival de Cannes ter virado uma versão européia do Festival de Sundance. Daí os modelos de carro exuberantes, o boom de academias de ginástica e de produtos cosméticos, a inflacionada indústria da moda, os blockbusters hollywoodianos cheios de efeitos especiais, livros de auto-ajuda, Paulo Coelho e “Querida Mamãe” entre os mais vendidos, a ditadura da beleza física, o sensacionalismo, a volta do dramalhão, credibilidade confundida com carisma, discos cheios de participações especiais, a popularização do conceito de que “as pessoas não querem ler muito” (que atravessa o mercado editorial – fotos grandes -, a internet – textos curtos – e a publicidade – imagem é tudo) e Schwarzenegger governador da Califórnia. Exemplos não faltam, faça sua própria lista.
Pois se era a forma que contava, o conteúdo não importa. Por isso um site com animação em flash e acabamento visual sofisticado conta mais do que um sistema de publicação eficiente. Por isso tanto faz qualquer tipo de análise crítica em relação a qualquer tipo de obra de arte – que, talvez justamente por isso, vem se tornando mero objeto de consumo. Isso explica textos estéreis, comerciais sem graça, fotos posadas, press-release pra qualquer bobagem, entrevistas vazias, cotidiano fútil. Esqueça a síntese da idéia, apresente-a com páginas e páginas de um papel chique e com uma fonte classuda e ela parece melhor do que se apenas apresentada diretamente. É a ascensão da mediocridade: ser bom não é necessário, basta apenas ser OK.
As várias bolhas de dinheiro ilusório que estouraram nos últimos cinco anos (um crash da bolsa em câmera lentíssima, quase bullet-time) garantiram contra-cheques cheios de zero e gordos abonos a toda essa choldra medíocre que hoje nos diz o que devemos consumir. Mas à medida em que a falsidade foi tornando-se evidente, o mercado veio cobrar a dívida, defenestrando os salariões. Quem ficou, teve de acumular função, trabalhar mais tempo, perdeu regalias. Sem motivação pra trabalhar, a mediocridade parou de se esforçar. Vem fazendo as coisas de qualquer jeito, sem se preocupar com o resultado.
O mainstream virou isso: a decadência da mediocridade. “Coxal”, pra falarmos em português bem claro. Patrões na espera de números altíssimos para devolver algumas das condições exigidas por empregados medíocres que não se esforçam para fazer nada. Por isso que você lê revistas, vê filmes, ouve músicas e tudo parece dizer a mesma coisa: nada. Esse é o som da criatividade mediana em marcha lenta.
Avisem aos patrões que eles podem esquecer. As vendas altas não vão voltar. Ninguém vai vender mais dez milhões de discos ou ter tiragem de um milhão de cópias no domingo. Vivemos uma nova realidade que, por motivos óbvios, não voltará a ser o que era há poucos anos.
É só raciocinar. Infelizmente, não há números precisos para aferir esse tipo de coisa, mas é fato que a quantidade de discos gravados hoje em dia é infinitamente maior do que a de dez anos atrás. Mesmo porque hoje muita gente grava discos pra família, pros amigos, pra um grupo pequeno de admiradores. Produzir um disco não é mais nenhum bicho de sete cabeças e fazer música tem se tornado um hobby cada vez mais popular. Culpe o computador, a internet ou a saudade que as pessoas já sentem de música tocada ao vivo. O fato é que a produção musical parece estar, lentamente, ultrapassando a mera audição.
Afinal, não precisa pensar muito para entender que o tempo que uma pessoa passa produzindo um disco faz com que ela não dedique tanto tempo ao consumo de discos como fazia antes. E cada novo disco lançado anula não sei quantos discos que poderiam estar sendo vendidos. (Falei de música, mas poderia estar falando de cinema, literatura, internet, esportes…)
Com isso, cai o popstar. Aquela figura imbatível, que olhava a todos do alto, onipotente, faliu. Virou um enorme elefante branco que não cabe na nova realidade – seja de mercado ou de cultura – do século 21.
E tudo isso não tem nada a ver com crise econômica. Estamos passando por uma crise de criatividade do mercadão, que não sabe mais o que fazer para as pessoas comprarem milhões de unidades como compravam antes.
Já era. Basta pegar a coleção de livros de qualquer um, as pastas de MP3 em qualquer computador, acompanhar as saídas noturnas de diferentes pessoas. Ninguém quer mais consumir só a banda da moda, o livro da vez, o filme cult. Todo mundo quer viver tudo ao mesmo. Não estamos mais falando em mero consumo passivo – as pessoas querem decidir elas mesmas o que ler, ver, ouvir e falar. E cada nova decisão pare um novo DJ, uma nova escritora, um novo cineasta, uma nova produtora de eventos…
Todos prontos pra chutar a bunda da mediocridade em baixa. Todos fora do mercado. Todos sabendo quanto vale cada gota do seu suor. Prontos para tomar conta da situação – quando a hora chegar.
Quando é isso? Não sei, só sei que é perto.
Se você já tomou ácido alguma vez na vida, ou teve ou vai ter um flashback. Quando você menos espera (normalmente nas situações mais impróprias), as luzes no trânsito começam a se entrecruzar, sua professora passa a emitir uma estranha vibração colorida ou o computador no seu trabalho começa a mexer-se sutilmente, como se quisesse dizer algo pra você. Ao detectar a janela da percepção aberta pelo vento, não entre em pânico. Primeiro certifique-se que só você está vendo aquilo e tente manter a calma.
O flashback acontece de acordo com a quantidade de micropontos você colocou debaixo da língua durante a sua vida. Quanto mais viagens pessoais você se propôs, mais chances tem de voltar àquele universo que o ácido deslacra sem querer. O Brasil pode não ser o maior consumidor de LSD da história, mas um flashback pesado bateu numa hora improvável, num lugar inesperado. De Maceió, nas Alagoas, o Mopho desencadeia uma série de memórias e lembranças musicais que o cérebro havia se encarregado de trancar num velho baú empoeirado.
Em seu primeiro disco, batizado apenas com o nome da banda (e o primeiro lançamento em muitos anos da gravadora Baratos Afins), o grupo embarca numa viagem de marcha-ré pelo mesmo trem-fantasma que levou os Mutantes, os Beatles e o Pink Floyd ao país das maravilhas. Mas ao contrário de neopsicodélicos como o Olivia Tremor Control, os Boo Radleys e o Gorky’s Zygotic Mynci, o Mopho não fica apenas nos anos dourados do LSD (entre 1967 e 1969), entrando pelo começo dos anos 70 e abraçando referências de hard rock. O que faz com que o grupo possa soar tão pesado quanto o Cream e tão viajandão quanto os Byrds, às vezes na mesma faixa.
Nada Vai Mudar abre o CD com a assinatura sonora da banda: baixo e bateria firmes e entrosados com as grandes bandas da invasão britânica dos anos 60, um órgão pré-histórico, guitarra tornando-se líquida graças à distorções diversas e um vocal idealista e, por isso mesmo, distante, cheio de ecos. “Nada vai mudar, as coisas são assim”, conforma-se o guitarrista João Paulo, “além de mim, a velha vitrola e aquele disco dos Mutantes (provavelmente o primeiro, devido ao sampler de Panis et Circensis ao final da faixa)”.
A Geladeira entra na Magical Mystery Tour dos Beatles, com teclados de vaudeville e surrealismo no dia-a-dia: “Na minha geladeiras, as coisas acontecem/ Enquanto tudo congela”. Não Mande Flores continua no mesmo álbum do quarteto de Liverpool e é a resposta brasileira para You Were Wrong, do Built to Spill. “Eles disseram/ Você não notou/ Eu sei fingir também/ Não quis, não fiz, eu não, não eu”, canta o guitarrista entre backing vocals hipnóticos e um solo de guitarra de fazer Noel Gallagher morder as sobrancelhas de inveja, “Na sua cabeça pipocam/ Milhares de cores/ Um pouco de sexo, drogas e rock’n’roll”. O Mopho saúda os anos 60 como uma religião não compreendida, uma série de códigos e diretrizes que foram mal interpretadas, usadas como motivo para curtir a vida no limite. O borbulhar sonoro que Não Mande Flores provoca ao seu final explica, à moda Love, que ninguém reparou nas nuances das milhares de cores.
A escapista Ela Me Deu um Beijo mostra a veia hard rock da banda, administrada com tanta maestria quanto a face psicodélica. Aqui as referências claras são Cream, Made in Brazil e até mesmo Kiss, mas a guitarra wah-wah firma o pé na porção trippy e reverencia o mestre Hendrix, enquanto o tecladista Leonardo lembra Arnaldo Baptista. Tudo Vai Mudar celebra Beatles (“Beatles estão no ar”) e Arnaldo Baptista (“Onde está meu rock’n’roll?”), enquanto dão a fórmula para mudar a regra da primeira faixa do disco: “Volte no tempo/ Ouça com atenção/ Você vai encontrar/ Onde está o meu rock’n’roll/ Veja as cores no ar/ (…) Eu já sei o que fazer/ Não vou mais esperar”, canta João Paulo enquanto violino, violão e teclado montam uma base ensolarada.
Tão Longe faz a conexão com o folk rock, catando discos dos Byrds, Dylan, Raul Seixas, Turtles e o Rubber Soul dos Beatles para cantar uma canção de amor aditivada, citando referências nacionais e internacionais ao tentar descrever a sua incessante procura: “Um ponto distante/ Meu porto seguro/ A dose perfeita/ O último trem”. Uma Leitura Mineral Incrível começa a ver alucinações e a ter estranhas sensações: “Ratos são cristais nessa prateleira/ Da secura da boca um diamante/ De repente você…/ Peixes hidráulicos e som”. Um tour-de-force clássico, que descamba num solo de teclado à Rick Wright que pode se tornar uma trip Violeta de Outono nos shows.
Eu Quero Tudo volta ao rock’n’roll. “Eu quero tudo que meu olho cego de cachorro raivoso fareja/ Escancarar os dentes/ Quero cabeças na bandeja!”, berra Leonardo enquanto a bateria de Hélio Pisca e o baixo de Júnior Bocão se entrosam como Roger Glover e Ian Paice. O romantismo triste e realista de A Carta é descendente de Roberto Carlos (“Nada faz sentido/ Hoje eu sei/ Todo aquele tempo / Quanto ilusão/ Foi tudo o que eu quis/ E pensar/ Me faz querer um pouco mais/ Compreender/ O que não tem explicação/ Escreva uma carta/ Nela me diga que você/ Não esqueceu de mim/ Que sente a minha falta e quer/ Me beijar”) e sua psicodelia traça parentesco com A Sétima Efervescência de Júpiter Maçã, num dos momentos mais tocantes do rock nacional.
Já Não é Mais casa Zombies com Byrds sobre as guitarras de George Harrison, piano e violão, num casamento que poderia constar em qualquer disco dos Beatles pós-67. Mosca Sobre a Cabeça faz óbvias referências a Raul Seixas e aos Secos e Molhados, mas seu teclado metálico vem da black music, enquanto as guitarras saem do Abbey Road, dos Beatles. Tutti-Frutti, alguém? A doce Um Dia de Cada Vez canta sobre efeito de fortes alucinógenos, mas o que conta é o prazer indescritível que faz uma música que cante “Vou sair no carnaval” soe tão lisérgica. Vamos Curtir um Barato Juntos encerra o disco com teclados Doors e andamento Mutantes (escondida no fundo do baú, uma delicada versão semiacústica para Uma Leitura Mineral Incrível).
Mopho é para todos que viveram intensamente os anos 60 e 70, seja na própria época ou através de discos fantásticos. Usando as referências corretas com cérebro e disposição, o quarteto alagoano já entrou no panteão da psicodelia, sentando ao lado de seus grandes mestres. O flashback é forte porque o ácido é bom. Um disco irrepreensível, obrigatório para saudosistas que não se contentam com a nostalgia. Para comprar o seu disco, peça para o grupo através do correio (Rua Pedro Américo, 1119. Poço. Maceió-AL. CEP 57030-580) ou pela Baratos Afins por email baratosafins@baratosafins.com.br ou por telefone (011-223-3629).
Resuma a história da banda do início ao contato com a Baratos Afins.
João Paulo – A banda tem basicamente três anos. Antes de eu e o (Hélio) Pisca, o baterista, montarmos a banda, nós já tocávamos em várias bandas de Maceió, basicamente conjuntos de covers. Até que montamos uma banda chamada Água Mineral, que tinha influências sessentistas, mas era mais voltado para o hard rock, mesmo porque era um power trio, não tinha o teclado que acabou dando esse toque mais anos 60. Esse grupo durou uns dois anos e fizemos uma demo em 95 e a partir de 96 começamos a trabalhar o material. Nessa época começamos a tocar com o Leonardo, que é o tecladista, só que como músico convidado. Daí o Alessandro, que era o baixista original, saiu e entrou o (Junior) Bocão, na época de lançamento desta demo. Desde 97 a formação está estabilizada. Mudamos o nome da banda por causa daquela música da Timbalada, Água Mineral, que fez com que muitas pessoas achassem que tocávamos essa música. Além disso, como tocávamos alguns blues no repertório, as pessoas passaram a pensar que era uma banda de blues. Todo mundo estava confundindo tudo, então resolvemos mudar o nome.
E o Mopho saiu de onde?
Veio de alguma forma que as pessoas nos satirizavam aqui. Estava em plena época da efervescência do mangue beat, com aquelas coisas de ritmos regionais ao lado de rock e funk. Logo definiram que a gente era datado e aquilo era moderno. Então a gente ouviu um comentário maldoso, dizendo que a nossa banda ia acabar mofando e resolvemos adaptar isso…
Engraçado, é a mesma história do Led Zeppelin, que o baterista do The Who, Keith Moon, disse que o novo grupo do Jimmy Page ia subir como um zepelim de chumbo e o Page ficou sabendo e adotou o nome como uma forma de assumir o desafio.
Pois é, é bem isso. Aí naquele disco do U2, Pop, havia uma música que se chamava Mopho, com PH, e achei a grafia muito interessante e passei a pensar no nome da banda. “Mofo”. Não há como falar “mofo” de outro jeito, em todo Brasil é dito do mesmo jeito. Optamos pelo PH para fazer uma conexão com o Pholhas (antigo grupo sessentista brasileiro) também (risos)…
Além do fato de “mofo” ser fungo e aí tem o duplo sentido, porque fungo é uma espécie de cogumelo. Como é a relação de vocês como as drogas? Dá pra sentir a influência nas letras…
A gente fuma um. Sempre. É uma coisa que já faz parte do nosso dia-a-dia, fumar um pra ajudar a pensar, a relaxar… O respeitável juiz chega em casa e toma uma dose dupla de uísque, o pai de família toma sua pinguinha antes do almoço e nós fumamos maconha pelo mesmo motivo: descansar, ajudar a pensar… Eu gosto muito, eu e o Bocão viemos de Arapiraca, no interior, que é terra do fumo real, tanto tabaco quanto o outro. Fumei aí em São Paulo, mas era um fumo prensado, industrializado, ruim. Aqui é muito melhor… Mas não faço propaganda de fumo. Não é um negócio como Planet Hemp. A gente usa e pronto, não precisa ficar levantando bandeira. É claro que influencia o som, mas influencia a vida, que influencia o som. A gente também toma chá de cogumelo, mas em uma determinada época, entre julho e agosto, que é quando chove aqui e o pasto do interior dá uns belos cogumelos. Mas o principal é o fumo – ajudo muito, desde a timbragem de amplificadores, até a pensar nas letras, na música… Leonardo não usa, dá uns tapinhas, mas é o mais careta da gente.
E o contato com a Baratos Afins?
Foi uma coisa natural, porque desde os anos 70 eu conheço a Baratos… Hoje é muito bonito você chegar na mídia e dizer que gosta de Mutantes, mas houve um tempo que não tinha nada dos caras… E a Baratos relançou. Não só Mutantes, como os solos do Arnaldo Baptista e uma série de outros grupos. Então foi natural mandar a fita pra Baratos. Mas quando mandamos o CD demo Um Dia de Cada Vez começaram a acontecer umas coisas legais. O Frank Jorge, da Graforréia Xilarmônica e dos Cowboys Espirituais, mostrou o disco para o Carlos Eduardo Miranda, que mostrou para o Fernando Rosa, de Brasília, que tem uma revista virtual bem legal, chamada Senhor F, só sobre rock dos anos 60 e 70 e influências… Isso criou um certo buxixo, as pessoas começaram a querer conhecer a gente. Até que o Ricardo Alexandre, do Estado de S. Paulo, entrevistou o Arnaldo Baptista, dos Mutantes, e mostrou várias músicas novas, entre elas Não Mande Flores da gente, pra ele comentar. Ele falou muito bem da gente e o Calanca, da Baratos, ficou interessado na gente. Aí a gente tava gravando o primeiro CD aí em São Paulo quando faltou grana pra mixagem. Ficamos muito chateados, estávamos gravando com uma grana que a gente não tinha numa cidade que a gente não conhecia. Fomos na Baratos, eu ia comprar aquele disco do Arnaldo, Disco Voador. Aí conhecemos o Calanca e ficamos conversando com ele. Até que falamos que éramos de Maceió e o cara pega um papel, amassa e fala pra gente “Amassei, ó!”, cheio de risada. Achávamos que ele tava sacaneando a gente. Então eu disse que eu era do Mopho e o cara arregalou o olho: “O QUÊ!! Você tá brincando!!”, tirou foto com a gente. Formou uma amizade, a gente saiu pra tomar umas geladas quando a gente disse que o disco faltava ser mixado e távamos procurando alguém para lançar o disco. Ele se declarou um grande admirador do nosso trabalho, o que nos deixou extremamente lisonjeados, não só pela figura humana que ele é, mas pelos serviços prestados ao rock nacional. Ter um disco lançado pela Baratos era como um sonho.
O disco ficou do jeito que vocês queriam?
Do jeitinho exato não. Mas é o primeiro disco, você sabe… Se fôssemos sair por uma gravadora maior, talvez pudessem descaracterizar mais o som. A mixagem também foi rápida, fizemos em 15 horas, nem pudemos colocar efeitos de estéreo, que é uma coisa que eu sempre gosto de ouvir, como arranjar o nível e o timbre de cada instrumento. A concepção da capa também é interessante, mas aquele reloginho não tem nada a ver, parece um relógio Cosmos (risos)… Se fosse uma ampulheta… A textura do papel também não é a ideal… Mas é assim, né cara, você não fica satisfeito nunca. A foto do encarte do CD foi outra confusão. Tiramos altas fotos com um conhecido nosso de São Paulo que é fotógrafo e se ofereceu pra fazer o trabalho, o Richard (Schoezel). Tudo no Ibirapuera, com aqueles monumentos… Aí o cara chega outro dia em casa, todo cabisbaixo… Alguém entrou no estúdio dele quando ele tava revelando e velou o filme… É dose, porque é o nosso dinheiro sendo jogado fora. Eu nunca ganhei NADA com o Mopho… NADA…
Vocês escutam alguma coisa de música atual ou ficam só nos clássicos?
Eu ouço de tudo, tenho a cabeça aberta pra tudo, gosto de Beck, de Ben Harper, Lenny Kravitz – não gostei desse último disco -, Cardigans, Garbage, Manic Street Preachers… Tento me atualizar, mas tem muita banda que o povo fala que não é legal. Ganhei um presente do Fernando Rosa que é fantástico, cinco CD-Rs com coisas obscuras do rock nacional. Bandas que sequer tiveram um breve reconhecimento público e que são maravilhosos, que batem bem forte na psicodelia.
Dá pra fazer uma lista dos 10 discos mais importantes pro Mopho?
Dez é pouco, mas posso tentar… Revolver, dos Beatles, é o primeiro. A Divina Comédia dos Mutantes é outro. Pet Sounds dos Beach Boys. Houses of the Holy, eu adoro Led Zeppelin. O Electric Ladyland – Jimi Hendrix Experience. Uma coletânea dos Byrds tirada de uma caixa de 4 CDs chamada 20 Essential Tracks. O Há Dez Mil Anos Atrás do Raul Seixas. O último disco do Casa das Máquinas, Casa de Rock. Aí começa o lado hard rock, ponha também o Stormbringer do Deep Purple. E o Talking Book, do Stevie Wonder, que é um disco fantástico. Tudo do Cream, tudo, tudo… Se for pra escolher, fico com o Wheels of Fire, que é duplo. O Who’s Next, do The Who. O Hot Rats, de Frank Zappa, que sem dúvida é uma grande influência. Sabbath Bloody Sabbath, do Black Sabbath… E Sticky Fingers, dos Rollling Stones, que não é um disco psicodélico, mas é o melhor disco deles. Pô, tem Brown Sugar e Sister Morphine, não precisa de muito mais que isso, mas tem muito mais ali. Eu sou um consumidor compulsivo de discos, eu só parei porque tô sem grana. Tenho muitos vinis, que é uma coisa que eu compro até hoje… Tenho uns mil vinis, uns cem CDs e vários cassetes, coisas que eu não consigo comprar, gravo muitas fitas cassete… Big Star, o primeiro do McCartney é um disco lindo, o primeiro dos Wings, Wild Life, foi um disco que nos ajudou muito a passar da fase dos covers pra compor músicas próprias. Eu acabo sendo injusto com muita gente… A primeira fase do David Bowie. Até Kiss, o Kiss Alive I é um melhor disco ao vivo da história do rock, um disco que tem uma qualidade técnica sofrível. Tudo nacional dos anos 60 e 70 eu ouço, eu gosto… Roberto Carlos, pô, é a maior injustiça não reconhecerem o valor desse cara. Muita gente tira uma na gente porque a gente gosta de Roberto, mas pô, é muito bom, aquela fase soul, o disco O Inimitável, o disco de 1972… Uma música como A Carta só podia ter saído do Roberto Carlos, eu brinco que é o Saucerful of Secrets do Roberto Carlos (risos)…
Faltou Pink Floyd.
Com certeza! Desde o Dark Side of the Moon, que é um disco que nos inspirou bastante até o primeiro, que é psicodelia pura aos solos do Syd Barrett… Eu ouço o Atom Heart Mother até hoje. 60% da nossa sonoridade vem desses discos… Gosto de blues, Howlin’ Wolf, Robert Johnson…
Love?
Eu gosto de Love, mas não assimilei muita coisa ainda pra dizer que é influência. Música negra em geral, soul e funk são fundamentais… Booker T & the MGs, Wilson Pickett, Otis Redding é um dos meus cantores favoritos, Try a Little Tenderness é a segunda melhor música de todos os tempos?
E qual é a primeira?
Eu só não disse a primeira, porque eu não sei.
God Only Knows ou Tomorrow Never Knows?
É mesmo (risos). Páreo duro. Só Deus sabe.
Amanhã nunca se sabe…
É isso aí (risos)!