Loki

É sério.

G
It’s no good trying to place your hand
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G
and you’re rocking me backwards
A#
and you’re rocking towards the
C D
red and yellow mane of a stallion horse.

E

G
It’s no good trying to hold your love
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G A#
the caterpillar hood won’t cover the head of
C D
you know you should be home in bed.

E

G
It’s no good holding your sequin fan
D
where I can’t see because I understand
A
that you’re different from me

yes I can tell
D
that you can’t be what you pretend
G A#
yes you’re spinning around and around in a car
C D
with electric lights flashing very fast…

E

Gary Lachman era integrante do Blondie no final dos anos 70 (até escreveu um livro sobre a época, New York Rocker: My Life in the Blank Generation with Blondie, Iggy Pop and Others, 1974-­1981, assinando com seu pseudônimo, Gary Valentine), mas sua carreira como escritor voltou-se para um lado pouco ortodoxo entre escritores pop, falando sobre a natureza da consciência (A Secret History of Consciousness), uma biografia sobre o mago Gurdjieff (In Search of P.D. Ouspensky: The Genius in the Shadow of Gurdjieff) e um compêndio sobre a história do ocultismo (The Dedalus Book of the Occult: A Dark Muse). Traçando uma conexão entre estes dois universos – o pop e o oculto -, Lachman escreveu Turn Off Your Mind: The Mystic Sixties and the Dark Side of the Age of Aquarius, em que ele diz que a psicodelia dos anos 60 era uma espécie de continuação do revival do desconhecido que rolou no mundo no final do século 19. Publiquei essa entrevista e essa resenha sobre o assunto, mas a íntegra do papo segue abaixo.

Ex-baixista do Blondie revê anos de paz e amor

Os Beatles na Índia, Mick Jagger com o peito tatuado no programa “Rock’n’Roll Circus”, Timothy Leary usando o “Livro Tibetano dos Mortos” como base de seu “A Experiência Psicodélica”, Jim Morrison escolhendo o nome de seu grupo a partir do livro “As Portas da Percepção” de Aldous Huxley, hippies celebrando a natureza coletivamente. Meros flashbacks dos anos 60? Não é isso que vê Gary Lachman.

Ex-baixista do grupo Blondie (quando era conhecido como Gary Valentine), Lachman revê os anos de paz e amor com olhos pouco deslumbrados no livro “Turn Off Your Mind – The Mystic Sixties and the Dark Side of the Age of Aquarius” (Desligue Sua Mente – Os Místicos Anos 60 e o Lado Obscuro da Era de Aquário). E remonta a psicodelia dos anos 60 não como o caleidoscópio tecnicolor que entrou para a história do pop, mas como um lento e avassalador resgate do ocultismo, relacionando os hippies com a nova geração vislumbrada por Madame Blavatsky no fim do século 19, os Merry Pranksters de Ken Kesey com a “Viagem ao Oriente” de Herman Hesse e o ácido lisérgico com o cogumelo Amanita muscaria, que seria a religião mais antiga do planeta. Em entrevista por e-mail, Lachman falou sobre o assunto de seu livro.

Como você percebeu esta conexão entre a psicodelia e este resgate do ocultismo nos anos 60?
Se você observar a cultura pop dos anos 60, verá que, claramente, por volta de 1966 e 1967 que alguns elementos daquilo que chamamos de “ocultismo” estavam renascendo. Como eu digo no livro, esta tendência começou em Paris, em 1960, com a publicação do livro “Le Matin des Magiciens” (“A Manhã dos Mágicos”, de Louis Pauwels e Jacques Bergier). Mas logo ela passou a se espalhar pela Inglaterra e pelos EUA. Como uma criança nos anos 60, podia perceber isto em coisas como nos quadrinhos da Marvel, graças a personagens como o Doutor Estranho. Os próprios X-Men, que não eram “ocultistas”, funcionavam como precursores dos hippies, no sentido em que eles eram adolescentes mutantes.

Como você entrou em contato, ainda nos anos 60, com o ocultismo da época e como este contato influenciou a pesquisa para seu livro?
Eu nasci em 55, por isso tinha 9 ou 10 anos quando essas coisas estavam começando. Eu comecei a ver isto em filmes, programas de TV, quadrinhos e em livros de literatura fantástica da época. Os livros do Conan começaram a ser republicados em 1966; alguns anos depois houve a redescoberta de H.P. Lovecraft. Entre 1967 e 68, as pessoas estavam falando em Tarô, terceiro olho, viagens astrais e coisas do tipo. Comecei a me interessar mais seriamente em 1972, quando um amigo meu me deu uma cópia do “Sidarta”, do Herman Hesse.

De todos as principais redescobertas mágicas dos anos 60 – como Crowley, Hesse e Tolkien -, quem você considera a mais bem-sucedida de todas?
Hesse e Tolkien eram os mais populares na época, pelo menos em termos de escritores. Os livros de Tolkien começaram a ser republicados nos anos 50, mas não tiveram um grande impacto até que uma edição pirata do “Senhor dos Anéis” saiu nos EUA. Hesse foi imensamente popular – na época em que comecei a lê-lo, praticamente todo mundo que eu conhecia tinha pelo menos um de seus livros. Crowley era conhecido nos anos 60, mas ele não teve um grande impacto até a década seguinte, e hoje é muito mais conhecido do que era quando estava vivo. Mas o trabalho de Tolkien é claramente o mais popular de todos, ainda mais com os filmes e afins.

Falando em nomes, qual popstar dos anos 60 esteve mais envolvido com o Desconhecido? Será que até aí os Beatles são o nome mais influente?
Bem, os Beatles eram as pessoas mais famosas do mundo na época, mas eles não estavam tão interessados em ocultismo como estavam em misticismo oriental. Os Rolling Stones estavam muito mais envolvidos com o lado escuro. Como outras bandas, como o Doors. Os Beach Boys se envolveram com o Charles Manson. Mais tarde, o Led Zeppelin se associou a Crowley e Tolkien.

Você descreve o movimento New Age como sendo uma evolução natural do interesse dos anos 60 com o Oculto. Como você relaciona isto com o atual interesse no assunto – que envolve desde franquias bem-sucedidas como “Senhor dos Anéis” e “Harry Potter”, quadrinhos de Alan Moore e Neil Gaiman e seriados como “Buffy – A Caça-Vampiros” e “Charmed”?
As pessoas sempre se interessaram em “magia” e é muito provável que continue a se interessar nisto. A diferença é que hoje o ocultismo é apenas um dos muitos estilos de vida alternativos, enquanto nos anos 60 era um dos poucos que haviam. Acho que há uma parte da psicologia humana que sempre será atraída pelo misterioso. Eu nunca assisti “Buffy”, por isso não posso falar nada, mas acho que o interesse nos livros de Harry Potter, por mais comercial que seja, é geralmente um bom sinal.

Como o espaço sideral, robótica e engenharia genética se tornaram uma espécie de ocultismo científico? No livro, você relaciona ufologia e extraterrestres ao ocultismo e há uma enorme lista de escritores de ficção científica (L. Ron Hubbard e Philip K. Dick sendo os mais óbvios) que de alguma forma lidam com o tema do seu livro.
Historicamente, em tempos de transição ou crise, a cultura responde de duas formas: revertendo-se a um estágio passado ou olhando em direção ao “futuro”. O que era fascinante nos anos 60 era como isso era evidente. Os hippies estavam advogando uma filosofia de “volta à natureza”, ainda que estivessem relacionados a substâncias químicas modernas, como o LSD. Viagens espaciais eram associadas à sabedoria ancestral, na época: deuses do espaço retornariam e dariam início a uma nova era de ouro. A idéia geral é que se algo está “errado” com o presente, é necessário procurar soluções em outras “épocas”.

Você termina o livro mostrando que filmes como “Matrix” são apenas novos disfarces para o ocultismo voltar ao imaginário comum. Gostaria que você falasse um pouco sobre as formas que o Oculto é vendido atualmente, usando disfarces que à primeira vista não parecem dizer o que eles são na verdade – sendo mídia tecnocêntrica sendo a máscara mais evidente…
“Matrix” lida com idéias gnósticas padrão sobre a natureza da realidade. Os antigos gnósticos acreditavam que vivemos em um mundo “falso” e o objetivo de práticas ocultistas e espirituais é escapar deste para um mundo “real”. Este é o tema central não apenas de “Matrix”, mas de filmes sci-fi dos anos 90 menos conhecidos, como “Cidade das Trevas” e “O Cubo”. Todo o jargão cyber de computador é basicamente uma fantasia de vitrine, para tornar a história contemporânea. Mas o roteiro básico é eterno. O objetivo da magia é escapar da grande ilusão.

Ao final do livro, você acena que a Era de Aquário não lida apenas com a luz do sol e euforia tecnicolor e que também pode ser sombria e doentia.
Os elementos sombrios dos anos 60 estão presentes na filosofia “faça o que quiseres” retirada de Crowley e na cessão àquilo que me refiro como “forças estranhas”, que foi alertado por pessoas como Hesse. Isso não quer dizer que o Oculto é sombrio e deve ser evitado, mas que a ética liberalista pode facilmente se tornar em uma espécie de agressividade fascista. Isto pode ser encontrado, acredito, em boa parte das políticas radicais da época. “Faça o que quiseres” pode se tornar facilmente “faço o que eu gosto” e dar origem à falta de consideração com as outras pessoas. Não é que algum tipo de conservadorismo seja preferível, mas que muitas pessoas que se envolveram com isso tinha um entendimento superficial das idéias com que estavam se envolvendo.

Fora alguns dos nomes que foram resgatados nos anos 60, seu livro é focado entre a Inglaterra e os EUA, os principais centros de produção psicodélica da época. Mas à medida que a psicodelia tornou-se uma tendência mundial, gostaria de saber se você teve contato com artistas ou resgates psicodélicos em outros países estrangeiros e se este interesse no ocultismo ocorreu em um âmbito mundial.
Centrei-me nos EUA e na Grã-Bretanha porque era a cultura pop que eu mais conhecia. Hoje, claro que o ocultismo é uma subcultura mundial. Mas fazia mais sentido centrar o foco naquilo que eu conhecia melhor. O livro poderia ter se tornado uma espécie de enciclopédia, em vez de uma narrativa histórica, mas acho que isso o tornaria menos interessante.

Livro de Lachman destaca fascínio pelo desconhecido

Apesar de repassar a história dos anos 60 com minúcia e abrangência, “Turn Off Your Mind” não é um livro sobre a psicodelia daquela década. Numa prosa deliciosa e enciclopédica, Lachman pega o gancho dos sixties para escrever um pequeno tratado da história da magia.

Por isso, Timothy Leary, Allen Ginsberg e Pink Floyd são motivos para descobrir nomes da pesada (Gurdjieff, Eliphas Levi, Dr. Dee), picaretas (L. Ron Hubbard, Charles Manson, Anton LaVey) e ocultistas do primeiro escalão (Aleister Crowley, Kenneth Anger).

Os popstars dos anos 60 acabam vindo à tona como pontas de um iceberg que se esconde por toda a década –e além. No fim, esse é o grande mérito do livro de Lachman: mostrar que, por mais tecnófilos, científicos ou céticos que possamos fingir ser, o fascínio pelo desconhecido é característica humana. E não há razão que consiga contê-lo –daí ele voltar através do rock’n’roll.

Faz o quatro

Que cêis vão fazer nessa quarta, dia 14?

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LITERATURA: AUTORES DISCUTEM “DROGAS E CRIAÇÃO” NO STUDIO SP
Os escritores Clarah Averbuck, Alex Antunes e Xico Sá, colunista da Folha, realizam hoje, a partir das 22h, no Studio SP (r. Inácio Pereira da Rocha, 170, Vila Madalena, SP, tel. 0/xx/11/3817-5425), mais uma edição da leitura de textos “Trilogia Suja de Sampa”, com o tema “Drogas e Criação”. O convidado é Alexandre Matias. Após a leitura, haverá apresentação do DJ Alessandro Psycho. A entrada custa R$ 10.

Boa coisa daí não pode sair…

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Como o vinho Chicleteiro.

O Tchuna colou aqui em casa e no meio do papo-furado ele me mostrou esse clipe genial para “O Homem da Gravata Florida” do Jorge Ben (a “Lucy in the Sky with Diamonds” dos trópicos). E num papo com o Mini pelo MSN hoje de tarde, ele me mostrou o clipe novo dos Walverdes (essa música – “Seja Mais Certo” – é foda!), que o sujeito fez usando uma máquina fotográfica digital e animou na unha. Enjoy…

Olhe no espelho, o que você vê? Certamente não o mesmo que as outras pessoas vêem em você. O máximo de tempo que você possa dedicar ao simples fato de se observar vai sempre lhe dar a certeza que nunca ninguém te observou daquele jeito. Cada pequena dobra de pele, cada fio de cabelo que sai de sua cara, cada colorido que você possa encontrar: todo detalhe que você vê em seu próprio rosto está envolvido por sentimentos pessoais que vêm à sua memória a cada centímetro observado. O espelho não é um mero reflexo da realidade – é uma distorção plana que nos leva aprofundar-se em nossas personalidades, o único lugar em que conseguimos observar nosso próprio olhar e analisá-lo friamente na tentativa de descobrir o que as outras pessoas podem ver. Mesmo assim, não é preciso, afinal os lados estão trocados: a esquerda é a direita e vice-versa e temos que reorganizar o que vemos no cérebro para tentarmos chegar perto da realidade.

Na frente dele, todos somos iguais. Mesmo se o encaramos ou fugimos dele, temos sempre a mesma reação que é uma ansiedade em vermos nós mesmos. Todo ser humano tem esta curiosidade ou repúdio, sentimento que varia de acordo com o nível de amor próprio que cada um tem. Um mundo estranhamente natural, que nos leva a pensar se é mesmo um portal para uma dimensão paralela, como o escritor inglês Lewis Carroll uma vez imaginou. Confessionário, juiz, vitrine, terapia, passarela: o espelho pode ser o que você quiser, basta você querer. Você transfere para ele aquilo que você quer ser.

A psicodelia foi o espelho que o rock mirou-se no meio dos anos 60. Ao atingir a adolescência, ele viu que não precisava se esconder na barra da calça de gêneros mais velhos para sobreviver. Ele queria se afirmar e bastava apenas se olhar num espelho para ter certeza do que estava fazendo. Mas a psicodelia não é inventada, não surge de uma hora para outra. Bastaram os Beatles disseminar a facilidade e felicidade que era ter e tocar em uma banda de rock para que todo planeta os ajudasse neste processo de amadurecimento.

Nos Estados Unidos, moleques de todo país se enfurnavam nas garagens de seus pais à procura de um som que, por mais rudimentar que fosse, era pessoal, próprio, individual. Das garagens para as ruas, os jovens passaram a morar juntos, em comunidade, numa forma desesperada de deixar a realidade quadrada de seus pais e criar seu próprio modelo de sociedade. O leque de referências ia se ampliando e aqueles jovens iam enfiando tudo que achassem que pudessem ser apenas seu em sua normalidade anormal: drogas, free jazz, xamãnismo, arte de vanguarda, poesia beat, distorção e microfonia, surrealismo, teatro, flores, revolta, modernismo, literatura do começo do século, poesia romântica, efeitos sonoros, gravações alteradas… Como uma menina se maquiando pela primeira vez, o rock americano pegava todas as referências que pudesse encontrar e esfregava-as em sua própria cara, criando sua noção de realidade, um novo mundo.

Na Inglaterra, uma revolução semelhante acontecia, mas ditada pelo estilo. Enquanto os Estados Unidos abraçavam o rock visceral como ponto de partida, no velho continente este saía do ponto de equilíbrio entre mods e rockers. Como a menina americana que se maquiava pela primeira vez, a menina inglesa preocupava-se em não borrar-se (borraria-se uma década depois, com o punk), abraçando um espectro igualmente amplo de informações. Só que o academicismo europeu acabaria fazendo com que a psicodelia inglesa englobasse elementos que sua versão americana nem pensaria em incluir.

O melhor exemplo, claro, é o marco da virada dos Beatles – a tríade Rubber Soul, Revolver e Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band -, que marca a passagem da juventude mundial de um retrato em preto e branco para uma paisagem tridimensional multicolorida, colocando-os no olho do furacão ao mesmo tempo que ajudava-o a continuar evolvendo. Entre os discos de 1965, 1966 e 1967, respectivamente, os Beatles saíam de seu universo pop (mais vasto que a maioria das bandas de sua época, englobando country, soul, pop, folk, skiffle, rockabilly e blues) e criavam um universo tão amplo quanto o que habitamos hoje. Não é exagero dizer que toda cultura pop – que é a cultura popular em tempos de capitalismo – deva os olhos da cara ao que os Beatles fizeram naqueles três anos.

Tibet, circo, música hindu, religião, Bach, mensagens subliminares, amor, técnicas de gravação, medicina e farmacêutica, fitas invertidas, Dylan, música infantil, cravos, Inglaterra vitoriana, Alleister Crowlley, vaudeville, vocais superpostos, televisão, Gandhi, Motown, jazz, Elvis, orquestras, dinheiro, cordas, música erudita, Stockenhausen, nostalgia: a paisagem total criada pelos Beatles regeria não apenas a psicodelia do final dos anos 60 como todo o mundo depois deles.

Um elemento era fundamental para a psicodelia em ambos lados do Atlântico (e para o resto do mundo): o LSD. Sintetizado por Albert Hoffman no final dos anos 50, o ácido lisérgico 25 foi a chave para toda geração flower power perceber a nova dimensão que o mundo tomava, o formato das coisas que estavam para acontecer. Era um portal para uma nova consciência que revelava nuances da realidade imperceptíveis quando careta. Mais do que uma droga hedonista, que apenas faz com que o usuário se sinta bem, o LSD tinha um caráter de revelação, de iniciação mística e espiritual, que fez com que toda uma geração (gente que hoje anda pela casa dos 50 anos e recrimina seus filhos por usar coisas bem mais leves) entrasse na mesma sintonia e se observasse, ao mesmo tempo, no mesmo espelho.

Mas se os Beatles tinham a responsabilidade de serem os líderes desta geração (disfarçando suas mensagens em títulos que soavam como piadas internas, sendo Lucy in the Sky with Diamonds (atente para as iniciais) o caso mais clássico), outros grupos não estavam nem um pouco preocupados em ser sutis. O mais evidente de todos era o Pink Floyd, cujas apresentações ao vivo eram perfeitas para se viajar de ácido. Tomados pelo espírito inventivo e experimentalista que o ácido proporcionava, eles levitavam o rock para uma realidade desconhecida, andando no lado escuro do sonho que os Beatles desenhavam.

O grupo foi criado em 1965 no curso de arquitetura da Escola Politécnica da Regent Street, em Londres. Eram apenas quatro malucos (o guitarrista Syd Barrett, o baixista Roger Waters, o tecladista Rick Wright e o baterista Nick Mason) que começaram como outra banda qualquer, mas que, por influência do ácido, começaram a experimentar o som. À frente do grupo, a figura de Syd Barrett era responsável pelos limites explorados pelo grupo. Barrett era uma versão rock de um misto de Salvador Dali com Buda, liderando o grupo e seus primeiros fãs com a placidez de um líder religioso, mas com o espírito inventivo e de inovação que move a arte desde o começo dos tempos. Introspectivo fora do palco, ele se entregava por inteiro quando imergia-se na música.

O grupo passou por várias encarnações, como Meggadeaths, Sigma 6, Abdabs (que contava com a futura esposa de Wright, Juliette Gale, na formação e se apresentava de forma convencional – como Architectural Abdabs – e não-convencional – como Screaming Abdabs -, às vezes na mesma noite), Leonard’s Lodgers e T-Set, em cada uma delas lapidando o som que mais tarde comporia o som do Pink Floyd. Este nome inclusive, mostra o nível de liderança que Barrett exercia sobre seus outros companheiros, pois foi tirado de uma visão que o guitarrista teve durante uma viagem de ácido. O nome mais tarde seria revelado uma fusão dos primeiros nomes dos bluesmen favoritos de Syd, Pink Anderson e Floyd Council – mas na época ninguém contestou o batismo premonitório.

E como Pink Floyd o grupo saiu do circuito universitário, freqüentando casas noturnas que em pouco tempo se tornariam referenciais da cultura londrina. Vivendo em plena era Swinging London, Londres assistia ao nascimento de sua psicodelia à medida que as cores apareciam e o volume dos sons aumentava, como se a própria cidade tivesse tomado LSD. Os mods tornavam-se cada vez mais coloridos e os rockers cada vez mais barulhentos e essa combinação de estilo com ruído caía como uma luva nas apresentações do Pink Floyd. Em casas de shows como o Marquee, a Roundhouse e o UFO, eles tocavam rocks primitivos (como Louie Louie) em versões caóticas, além de apresentar as canções do vocalista e guitarrista – jóias pop distorcidas em clássicos lisérgicos. Ocasionalmente se comportavam como uma banda tradicional, experimentando em estúdio e no palco os limites que poderiam ser encontrados entre refrões, introduções, solos. Outras vezes deixavam simplesmente o instinto tomar conta em jam sessions intermináveis, onde barulho e silêncio se encontravam com instrumentos tocados de forma não-convencional, efeitos de som e de luz, projeção de slides, seqüências de notas heterodoxas e a repetição abusada ao extremo.

Gravaram seu primeiro single de forma independente, com o futuro George Martin do folk inglês atrás dos controles (Joe Boyd mais tarde seria responsável pelos melhores discos da Incredible String Band, do Fairpoirt Convention, Sandy Denny, Richard Thompson e Nick Drake – além dos primeiros discos do R.E.M.). Arnold Layne/Candy and a Current Bun já mostrava a disposição para ir contra a corrente. No lado A, Syd Barrett cantava sobre o personagem-título, um sujeito cujo hobby era roubar lingerie dos varais da vizinhança. O lado B teve que ter seu título mudado pois o original, Let’s Roll Another One (Vamos Enrolar Mais Um), daria problemas com a polícia. Nos dois, o experimentalismo sônico já estava em voga, com efeitos sonoros, cadências estranhas, o estranho cruzamento do som da guitarra Danelectro de Syd (tocada aos pedaços) e dos teclados de Rick sobre a cozinha anfetamínica de Waters e Mason. Os vocais de Syd – chapados e concentrados ao mesmo tempo – contrapunham-se com as melodias, quase infantis, das duas canções. O single teve ótimo desempenho nas paradas, atingindo o 20º posto na Inglaterra. O próximo (See Emily Play – parente inglesa dos Doors -/Scarecrow) seguia o rumo do primeiro, mas a regência já não era de Boyd, mas de Norman Smith, engenheiro de som da EMI que havia trabalhado em pelo menos quatro discos dos Beatles. Eles foram levados para a mesma gravadora do grupo de Liverpool após seu primeiro contato com o empresário Peter Jenner, que passeava por Londres procurando uma banda que pudesse mudar sua vida. Encontrou o Floyd num show no Marquee Club e resolveu transformá-los em seus Beatles. Logo o grupo estava tocando no concerto de lançamento do diário da revolução sonora londrina – o International Times, também conhecido com It -, em dezembro de 1966.

Logo o nome do grupo começava a crescer e eles fariam sua primeira turnê pela Europa no inverno de 1967. Voltaram da Holanda no dia 27 de abril daquele ano, no Alexandra Palace, ainda a tempo para apresentar-se como principal atração do minifestival 14 Hour Technicolor Dream, ao lado de artistas como Yoko Ono, os Pretty Things, Binder Edwards & Vaughn, Utterly Incredible Too Long Ago To Remember Sometimes Shouting at People, Ron Geesin, Alexander Trocchi, Graham Bond, Michael Horovitz & The 26 Kingly Street Group, Alexis Korner, o pianista Champion Jack Dupree, Barry Fantoni, Ginger Johnson, Savoy Brown, Christopher Logue, 117, os Flies, The Purple Gang, o Crazy World Of Arthur Brown (cujo vocalista ateou fogo no próprio corpo durante seu único hit – Fire) e o Soft Machine. Era claro que o grupo era o principal nome da nova cena londrina, afinal 20 mil malucos de ácido não poderiam estar errados. A consagração aconteceu no mês seguinte, no show Games For May (cujo título havia sido tirado de See Emily Play), no Queen Elizabeth Hall. O evento multimídia colocava o Floyd no centro das atenções, entre música eletrônica, shows de luzes, projeções de imagens, incenso e a estréia do Azimuth Co-Ordinator, o impressionante sistema de som e efeitos sonoros do grupo. Estava na hora de entrar no estúdio para gravar seu primeiro álbum.

Assim nascia The Piper at the Gates of Dawn, cujo título havia sido tirado do livro infantil The Wind in the Willows. Gravado no estúdio 1 do complexo da EMI (que mais tarde viria a ser conhecido como Abbey Road), Piper foi concebido enquanto os Beatles terminavam seu megaprojeto Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band no estúdio ao lado, o 2. A vibração psicodélica estava no ar e muitos cogitam a possibilidade de um disco ter influído no outro, devido aos encontro esporádicos entre Barrett e John Lennon nos corredores da gravadora, saindo dos estúdios para fumar um cigarro ou tomar uma xícara de chá. Capitaneado pelo mesmo Norman Smith de See Emily Play (que depois levaria seus conhecimentos sonoros lisérgicos adquiridos com o Floyd para as gravações do melhor disco dos Pretty Things, S.F. Sorrow), The Piper at the Gates of Dawn é o disco mais pop e mais psicodélico simultaneamente que a história do rock já viu.

Ele abre com a tensa Astronomy Domine, que começa com o empresário Peter Jenner fingindo-se de torre de comando do controle espacial enquanto lê, monocordicamente, um livro de astronomia aberto numa página qualquer. Sobre o vocal robótico, a guitarra seca de Barrett começa a marcar o tempo e é seguida pelo baixo de Waters, formando um compasso mecânico acrescido de um código morse inventado por Rick Wright ao teclado e pela bateria esparsa de Mason. A guitarra abre a canção com acordes soltos e improvisados, seguidos pelos vocais superpostos de Barrett e Waters: “Flutuando abaixo, o som soa sob as águas congeladas no subterrâneo/ Júpiter e Saturno/ Oberon, Miranda e Titânia/ Netuno, Titã/ Estrelas podem assustar”. A guitarra vai para um lado, o baixo vai para o outro e ambos desenham uma ladeira vertiginosa que mostra a amplitude sonora que as referências astronômicas parecem descrever. O vocal sobre este improviso é um falsete assustador que logo é interrompido com o barulho do vento e a entrada do solo. Por trás, Mason viaja sobre a cadência criada no começo da música, virando-a para dar a dimensão espacial do som. Entramos num universo sonoro novo, onde ouvimos cores e vemos sons.

Lucifer Sam abre com uma levada groovy do baixo de Waters surpreendida pelos teclados flutuantes de Wright. “Lucífer Sam/ Gato siamês/ Sempre sentado a seu lado/ Sempre a seu lado/ Este gato é algo que não consigo explicar” – o imaginário de Barrett apenas atira pedaços de referências, deixando o ouvinte sem o rumo que a canção pode ter. Sua guitarra alterna golpes secos com microfonia e assobios feitos com o wah-wah. “Você é o lado esquerdo/ Ele é o lado direito/ Oh não” – não há sentido nenhum nas letras a não ser a mesma expansão de consciência que o grupo propõe com som. Ele quer que o ouvinte torne-se uma criança que não conhece o mundo, ingênua da realidade que o cerca, esperando novidades trazidas de outra região da mente. E assim é Matilda Mother, cujo andamento hipnótico revela ouvintes ávidos pelo desconhecido: “Oh mãe/ Conte-me mais/ Por que você me deixa aqui/ Com meu ar infantil/ Esperando?/ Você só tem que ler as linhas/ Escritas em negro e tudo se iluminará”. No meio da canção, Syd – com os vocais – repete a bateria dos Beatles em Tomorrow Never Knows e deixa teclado e guitarras fazerem o que quiser.

Flaming começa sombria, mas logo se mostra um dos momentos mais coloridos do disco. “Só sob as nuvens azuis/ Deitado num edredon/ Você não pode me ver/ Mas eu te vejo” – aqui a atmosfera é de sonho e o narrador nos guia por um folk ácido, cheio de referências surreais e efeitos sonoros, interrompidos por um solo de teclado inspirado, acompanhado de perto dos ruídos do Azimuth Co-Ordinator e da guitarra melancólica de Syd. A instrumental Pow R. Toc H. nos leva para uma floresta úmida e misteriosa, onde cada um dos integrantes imita um animal fantástico, numa espécie de Caravan (de Duke Ellington) abastecida com ácido. No centro da canção, outro solo de teclado, mais jazzy, dá melodia ao batuque primitivo que é a espinha dorsal do disco. A percussiva Take Thy Stethoscope and Walk é a única composição de Waters do disco e é construída em volta de um vocal repetitivo que trafega o verso “Doctor! Doctor!” de uma caixa para outra. Mas logo à frente, o grupo volta às jam sessions que fazem durante todo disco, para Barrett concluir o primeiro lado do álbum: “Música parece ajudar a dor/ Parece cultivar o cérebro/ Doutor gentilmente conta à sua esposa que/ Estou vivo!/ Flores nascem!/ Perceba!/ Perceba!/ Perceba!”.

O lado B começa com um dos momentos mais memoráveis da carreira do Pink Floyd em disco. Interstellar Overdrive é apenas um riff repetido várias vezes até o grupo ceder ao improviso e se arrastar por quase dez minutos que ao vivo chegavam a quarenta, em alguns casos. Durante o percurso, o mais próximo que a psicodelia chegaria ao free jazz sem perder suas características rocker, o grupo acelera, pára, aumenta o som, diminui, os teclados emitem sons estranhos, a guitarra cria sensações anormais, o baixo desfere golpes e assobia doces melodias e a bateria voa para muito além do ritmo – sempre voltando, ocasionalmente, à frase inicial, que retorna, lenta e com pirações em estéreo, no final da canção, interrompida abruptamente por The Gnome, antes do fim. Esta canção, uma bucólica e infantil descrição da vida de Grimple Grumblo em sua aldeia de gnomos. “Olhar pro céu/ Olhar pro rio/ Não é tão bom?”, sussurra Barrett, celebrando o ócio que sua geração abraçara.

“Um movimento é completo em seis estágios/ E o sétimo traz a volta”, canta, contemplativo, Barrett em Chapter 24, “o sete é o número da luz jovem/ Forma-se quando a escuridão é acrescida de um/ Mudança volta sucesso/ Indo e vindo sem erros/ Ação traz boa sorte/ Pôr-do-sol”. A faixa é lírica e um dos momentos mais lisérgicos do disco e foi tirada em sua íntegra do capítulo 24 (Fu) do I-Ching. Ao ocaso da canção, o teclado de Wright desenha uma bela paisagem em que os vocais de Barrett e Waters se circulam como numa canção oriental.

A percussão de Scarecrow é construída à medida que a canção começa e é acompanhado por um teclado infantil. A faixa tem o mesmo ar pueril de The Gnome, mas em vez de falar sobre sua própria geração, prefere discorrer sobre a de seus pais, falando da estática não-criativa que a sociedade os impôs na figura de um espantalho. O clima infantil continua em Bike, em que os principais elementos do Floyd original – pop, efeitos sonoros, letras surreais, solos, vocais intercalados e superpostos – se encontram pela última vez. “Eu conheço um quarto de sons musicais/ Uns rimam, outros tocam/ A maioria deles é mecânica/ Vamos lá fazê-los funcionar”, Barrett encerra o disco cantando sobre o próprio, à medida que saímos do quarto que ele acabou de descrever. Mas sem antes deixar-nos intrigados com uma seqüência de sons inventados no estúdio.

Lançado no dia 5 de agosto de 1967, The Piper at the Gates of Dawn foi, junto com seus contemporâneos (como o primeiro disco dos Doors, o primeiro de Frank Zappa, o primeiro do Velvet Underground, Smiley Smile, dos Beach Boys) ofuscado pelo lançamento de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, que é inevitavelmente o disco mais importante deste período. Mas o disco de estréia do Floyd explora o limite entre o pop e a lisergia de uma forma que os Beatles sequer consideravam. Depois do lançamento do disco, Barrett começou a dar sinais que a quantidade de ácido que tomava não estava fazendo bem à sua cabeça e ele teve de ser afastado do grupo, sendo substituído por David Gilmour já no segundo álbum, A Saucerful of Secrets. Mesmo com alguma participação em Saucerful… (como a íntegra de Jugband Blues e participações em Remember a Day, See-saw e Set the Controls for the Heart of the Sun) e outros singles que hoje só encontramos em piratas (Vegetable Man e Apples and Oranges, além do até hoje inédito Scream Thy Last Scream – todos dignos de nota), o legado de Syd Barrett está totalmente concentrado no primeiro disco do Pink Floyd, que depois tornou-se a principal banda do rock progressivo, levando o conceito dos Beatles em Abbey Road (de 1969) às últimas conseqüências. Mesmo em sua errática carreira solo (em que preferia esmurrar o próprio violão a explorar novos horizontes sônicos), Barrett não conseguiu atingir o mesmo vigor e brilho do auge da psicodelia londrina. Nem ele, nem ninguém.

Sealab 2021

Adult Swim é mesmo absurdo, mas o laboratório submarino transcende os limites do nerdismo nonsense da TV atual. É, simplesmente, lindo.

Se você tá com frio, problema seu – porque hoje tem Clash of Titans (Branco Mello vs. Paulo Miklos) no Vegas. Ringue de gel auditivo – de um lado, o poptópico Lucio Ribeiro com novidades rock’n’roll e electrêra dumau, do outro, eu esculhambando tudo como se o Renato Aragão e o Fatboy Slim tivessem nascido em sete cinco, em Brasília e numa mesma pessoa. O esquema é chegar em casa, dar um bode master e sair pra naite uma meia-noite, meia-noite e pouco… Assumimos a pista britanicamente à uma – e eu tou levando meus óculos escuros, por isso, te prepara. Só as gatas sobreviverão – acredite.

Get Crazy

O Piangers me deu a letra num comments aí e eu fui atrás da “Hey Ya” da segunda metade da década no YouTube. Começa com a aeroversão slow-pitch que eles fizeram no Top of the Pops (aqui, bem boa pra esse meu maio), mas ainda tem o primeiro rascunho do vídeo, a primeira vez que a música foi tocada ao vivo, o show deles no Coachella e um sync massa com o anime Samurai Shampoo. Aliás, tem muito vídeo com essa música, buscaê.