Encerramos, nesta terça-feira a programação de apresentações musicais de fevereiro no Centro da Terra com o violão solo de Daniel Murray, que mostra pela primeira vez no palco seu ciclo autoral Vista da Montanha, composto por 24 miniaturas compostas para seu instrumento como um contraponto às obras do artista plástico Gabor Geszti e propondo uma escuta da diversidade, através de melodias que nascem de uma leitura livre do perfil das montanhas, se atendo a sonoridades e texturas que reaparecem variadas a cada peça. O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos estão à venda no site do Centro da Terra.
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Que noite maravilhosa que foi este encerramento da temporada Adupé que Lenna Bahule nos proporcionou nesta última segunda de fevereiro no Centro da Terra – um encontro de duplas transcendentais que respiravam como um mesmo organismo. Os irmãos Kiko e Ed Woiski misturando harmonia e ritmo no encontro de seus instrumentos elétricos – a guitarra e o baixo -, os percussionistas Ari Colares e Kabé Pinheiro deitando a mão no couro para dar o equilíbrio e a tensão rítmica da noite, as vozes – e percussões – de Lenna e Juçara Marçal se encontrando em picos e vales emocionais, que horas exprimiam força, outras transpiravam delicadeza, nos levando para dimensões extracorporais e fazendo todo mundo se segurar nas poltronas no limite para sair dançando junto, como foi o caso das três intervenções corpóreas puxadas pelas danças de Kabé, uma delas com chocalhos nos tornozelos, outra com sapatos de sapateador e a última ao lado da dona da noite, que lavou a alma de todos os presentes que lotaram o teatro com sua liderança, encanto, leveza e rigidez, tudo encarnado numa mesma pessoa maravilhosa. Uma noite que todos guardarão na memória.
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Grupo de jazz funk idealizado pelo baixista Juninho Sangiorgio e pelo baterista Rodrigo Saldanha, o sexteto Bufo Borealis está prestes sa lançar seu terceiro álbum, batizado de Natureza, que consideram seu disco mais livre – e dão uma amostra do que vem por aí ao antecipar o segundo single, “Urca”, que será lançado nesta terça-feira, em primeira mão aqui no Trabalho Sujo. “É o nosso disco mais plural, com composições de todos os integrantes e referências que vão do On The Corner de Miles Davis ao Check Your Head dos Beastie Boys, passando por Curtis Mayfield e Lou Donaldson”, explicam os dois fundadores do grupo, que ainda conta com Anderson Quevedo (sax), Paulo Kishimoto (percussão e sintetizadores), Tadeu Dias (guitarra) e Vicente Tassara (piano). “Este trabalho mostra um claro amadurecimento e intensa conexão musical entre nós, que nos últimos anos fizemos inúmeras apresentações totalmente diferentes umas das outras, deixando a música cada vez mais aberta ao improviso e mais livre de estereótipos”. O disco sai no dia 6 de março e conta com participações da vibrafonista Nath Calan, do trompetista Daniel Gralha e do baterista Clayton Martin. “Urca”, com seus diferentes climas e atmosferas, é um bom exemplo do que os dois falam, e tem seu clipe dirigido pela videoartista Julia Ro, que também faz as projeções nos shows do Bufo, que o montou a partir de imagens filmadas pelos integrantes da banda.
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Uma das vozes mais deslumbrantes da música estadunidense encantou-se nesta segunda-feira, quando Roberta Flack despediu-se deste plano aos 88 anos. Filha de pais pianistas, ela começou sua carreira no final dos anos 60 e aos poucos foi conseguindo, pelas brechas, espaço em shows e no mercado fonográfico. Mas sua entrada definitiva no mercado veio a Clint Eastwood, que escolheu a regravação que Flack havia feito para “The First Time Ever I Saw Your Face” em 1970 como música-tema de seu primeiro filme como diretor, Perversa Paixão, de 1971. A escolha transformou a música na canção mais tocada nos Estados Unidos em 1972 e lhe rendeu um Grammy de melhor gravação naquele mesmo ano. No ano seguinte iniciou a parceria com o amigo cantor, compositor e pianista Donny Hathaway, com quem emplacou hits em diferentes momentos de suas carreiras, incluindo dois discos em dupla, até a morte do amigo em 1979. Antes disso emplacou mais um hit solo, música tornou-se sua assinatura musical, “Killing Me Softly with His Song”, que lhe rendeu dois Grammys em 1974 e tornou o disco Killing Me Softly seu disco mais vendido da vida. Voz macia e potente ao mesmo tempo, ela levava a soul music para um lado épico e dramático característico do braço “quiet storm” do gênero, que criou uma escola de artistas que domina o atual R&B. De Lauryn Hill a Michael Jackson, passando por Anita Baker, Jill Scott, Erykah Badu, D’Angelo, Ariana Grande, Mary J. Blige, Maxwell, Whitney Houston, Mariah Carey, Sade, John Legend, Janet Jackson, Rihanna e Beyoncé – artistas que formam o panteão da música negra moderna norte-americana são infuenciados diretamente por sua importância – ela cujo nome do meio (“Cleopatra”) deixa clara sua própria majestade. Morreu cercada pela família e a causa de sua morte não foi revelada.
Domingaço no Cine Joia, quando a Associação Cecília reuniu a nata do underground brasileiro atual para um evento histórico. O festival Cecilia Viva foi criado para arrecadar fundos para o renascimento da casa que fechou suas portas no ano passado por motivos de força maior e era um dos principais focos de resistência e criação da cena alternativa de São Paulo. E foi bonito ver o Cine Joia ir enchendo lentamente até praticamente lotar sua parte inferior para ouvir artistas que abraçam o risco e o experimento como matéria-prima de suas apresentações. O festival começou ainda de dia, com o show dos cariocas do Crizin da Z.O., que infelizmente não consegui chegar a tempo, mas consegui pegar o Test – que nunca tem erro. A dinâmica entre a guitarra e o vocal de João Kombi e a bateria de Barata é um casamento único que deixa o público com os nervos à flor da pele, de tanta tensão. Como a maioria das apresentações da noite, o Test fez um show curto e direto, sem espaço para descanso, deixando claro que esse clima – essencialmente paulistano – era a tônica do evento.
Depois do Test foi a vez de Kiko Dinucci subir ao palco do Cine Joia para defender seu primeiro disco solo, Cortes Curtos, sozinho na guitarra. Houve quem se frustrasse ao perceber que o compositor de Guarulhos tocaria seu disco de 2017 sem banda, mas… Sinceramente? Nem precisava. Só o reencontro de Kiko com seu instrumento-base já seria motivo para comemoração (quanto tempo que ele não toca guitarra num show? Nem lembro mais…), mas o sambista-punk foi além e segurou boa parte das músicas de seu disco no clima tenso que instaurou-se no palco durante o festival: emendando uma música atrás da outra, sem conversa nem tempo pra respirar. E como é bom ver o Kiko na guitarra, principalmente quando ele liga o modo noise, invocando o espírito Glenn Branca para o contexto da vanguarda de São Paulo, misturando suas referências-chave (Lira Paulistana, punk rock e samba paulistano). Volta pro noise, Kiko!
No meio da noite, a referência rock ficou em segundo plano quando o DJ Nuts apresentou um set autoral, misturando bases de diferentes pontos da sua vasta coleção de música brasileira com vocais sampleados de rappers brasileiros, criando um clima pesado e tenso com o daquela noite de domingo. E ao trajar uma camiseta do clássico disco primeiro disco solo do ultramagnetic MC Kool Keith como Dr. Octagon (projeto criado ao lado do produtor Dan the Automator), Nuts deixou clara as intenções daquele set, que era menos para dançar e mais para entrar em nossas mentes enquanto mexia no inconsciente com samples levemente reconhecíveis e timbres vocais que todos conhecemos, numa apresentação que mostrou que, mesmo a Associação Cecília tenha nascido num contexto punk, sempre estava aberta a outras formas de experimentação musical.
Os Boogarins vieram quase no final do festival, puxando mais uma de suas sessões de cura e libertação, improviso extremo em que Fefel, Dinho, Benke e Ynaiã passeiam por diferentes recônditos de sua psicodelia brasileira como se estivessem compondo músicas na hora – e enfatizando, como Dinho sempre diz, o poder de cura da música. Os goianos abriram uma exceção para aquela sessão específica e até tocaram músicas num formato mais tradicional, mas sempre abrindo pontes instrumentais em que poderiam voar para onde quisessem. Sempre lavam a alma.
Mas a noite era delas. O reencontro de Paula Rebelatto e Carla Boregas no palco do Cine Joia não foi a primeira atração a ser anunciada do festival à toa – era o primeiro show das Rakta em cinco anos (!!!) e, acompanhadas pela bateria absurda de Maurício Takara, integrante da formação mais recente do grupo, as duas mostraram que não tinha pra ninguém. O surto elétrico de noise e pós-punk das duas acabou por sintetizar a expectativa da noite, reunir o maior público e eletrizar corações e mentes com seu ritual mágico único, que faz uma falta danada pra noite de São Paulo e pra cena underground brasileira. O final perfeito para uma noite histórica para o underground paulistano. Quem foi sabe.
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É uma pena que o melhor filme desta temporada não esteja recebendo a devida atenção. Mais do que Anora, Conclave, Brutalista, Babygirl, Nosferatu, Substância, A Verdadeira Dor, Nosferatu e até Ainda Estou Aqui, o inacreditável Trilha Sonora para um Golpe de Estado, com suas duas horas e meia de duração, é sessão obrigatória para quem gosta de cinema, música e política – e para quem quer entender o estado das coisas do mundo atual. Escrito e dirigido pelo multiartista, curador e diretor belga Johan Grimonprez, é uma aula de história política internacional, que mira no coração da África no auge da Guerra Fria (especificamente a partir da independência do Congo) para falar sobre como a política cultural dos EUA ajudou a aumentar as tensões políticas do país depois que este livrou-se da Bélgica para, como diz seu título, dar um golpe de estado (como é de praxe na política estadunidense). O que transforma este documentário numa aula eletrizante é a forma como Grimonprez usa o elemento cultural da vez – a outra parte do título, a trilha sonora – para dar uma dinâmica de tirar o fôlego para sua história, usando o melhor jazz norte-americano, personificado em ícones como Louis Armstrong, Dizzy Gillespie, Nina Simone, Miriam Makeba, John Coltrane, Duke Ellington, Charles Mingus, Ornette Coleman, entre inúmeros outros, para dar um ritmo à edição de cenas, que em sua enorme maioria, são imagens de arquivo – e reunindo alguns dos principais nomes da política internacional do período, de Fidel Castro a Malcolm X. Poucas imagens foram captado para a realização do documentário, a enorme parte das imagens são cenas e falas que já existiam, ordenadas de uma forma magistral, intercalando trechos com imagens e textos (além de dois flashes curtos, quase comerciais sobre o século 21 que parece ter começado a partir daquela exploração colonial) e começando e terminando o filme com a cantora Abbey Lincoln e o baterista Max Roach liderando uma invasão no Conselho de Segurança da ONU para protestar contra o assassinado do primeiro ministro Patrice Lumumba. É muito foda.
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Morreu neste sábado a cantora carioca Lilian Knapp, que tornou-se conhecida como a Lilian da dupla Leno e Lilian que compôs com o potiguar Gileno Azevedo durante o auge da Jovem Guarda, nos anos 60. Ela foi a primeira a gravar sucessos como “Devolva-me”, “Pobre Menina” (versão em português para “Hang on Sloopy”, do grupo The McCoys), “Coisinha estúpida” (versão da dupla para “Something Stupid”, eternizada por Frank e Nancy Sinatra), “Sou Rebelde” (versão para o hit de 1971 da cantora espanhol Jeanette) e “Eu Não Sabia Que Você Existia” ,que depois seriam regravados por nomes tão diferentes quanto Adriana Calcanhotto, Chico César, Paquitas, Alice Caymmi e pelas bandas Virgulóides e Vexame, esta última liderada pela atriz Marisa Orth. Também foi a primeira mulher a compor um rock no Brasil, quando assinou “O Picapau”, gravada por Erasmo Carlos em seu disco de 1965 (“com meu bem fui ao cinema…”). Lilian estava internada em estado grave nos últimos meses, mas ainda estava em atividade até há pouco tempo – seu último show aconteceu no fim do ano passado, na clássica churrascaria Ed Carnes (clássica justamente por ser de propriedade de outro ícones da Jovem Guarda, Ed Carlos), e sua apresentação ao lado de seu eterno dupla Leno (que morreu em 2022) aconteceu há mais tempo, na Virada Cultural de 2015, há dez anos.
Chegou a hora de afastar os móveis da sala e se acabar de dançar – neste sábado tem mais uma Desaniversário, quando eu, Clarice, Camila e Claudinho transformamos o Bubu na nossa pista de dança favorita, resgatando pérolas que você nem lembrava que gostava e enfileirando-as com hits atuais que você vai adorar. A festa sempre começa cedo justamente pra acabar cedo, por isso esperamos vocês neste sábado a partir das 19h para terminar a farra lá pela meia-noite – e o Bubu, você sabe, fica ali na marquise do Estádio do Pacaembu (Praça Charles Miller, s/nª). Vem dançar com a gente!
Guilherme Cobelo e Tagore fizeram uma noite quentíssima na edição desta sexta-feira no Inferninho Trabalho Sujo no Picles, quando trouxeram versões de uma psicodelia brasileira influenciada pela cultura do sertão, cada um à sua maneira. Cobelo trouxe seu Caubói Astral pela primeira vez para São Paulo, acompanhado do guitarrista Jota Dale, do baterista Dinho Lacerda e do baixista André de Sousa, e ainda cantou músicas inéditas, como minhas favoritas “Asa Soul” e “Conversando como Sábado”, esta última dividindo os vocais com sua irmã de Joe Silhueta, Gaivota Naves, que subiu no palco para abrilhantar ainda mais a noite.
Depois foi a vez de Tagore passear por seus discos e invocar a psicodelia nordestina, puxando Alceu Valença e Ave Sangria entre seus vários ídolos musicais em meio às músicas de seus discos clássicos como Movido a Vapor, Maya e o mais recente Barra de Jangada. Ele veio com uma banda azeitadíssima, que contava com seu fiel comparsa João Cavalcanti no baixo, o ás Arthur Dossa na guitarra, o baterista Arquétipo Rafa e o tecladista Gustavo Garoto, e ainda convocou o capixaba André Prando para a celebração de uma noite quente! Showzaço!
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O fim de semana começou com mais um show dos Pelados, desta vez no palco do Museu da Imagem e do Som, lentamente encerrando o ciclo de seu disco de 2023, o ótimo Foi Mal, que chegou à sua versão em vinil justamente nesta apresentação. Talvez por isso a banda tenha abandonado de vez as músicas do disco anterior, focando apenas em músicas do disco mais recente (à exceção de “Medo de Ficar Pelado”, que o público até tentou puxar, e “Ser Solteiro é Legal”, que o guitarrista Vicente Tassara prometeu para um show próximo) e algumas do próximo disco, que já está gravado, entre elas uma que canta que “as cores da Enel desbotam no papel” no refrão e a já conhecida “Modrić”. E entre as músicas aquele clima de turma que sempre baixa nos shows, com as piadas infames da Manu Julian e do Lauiz (comemorando “aniversário”) e fazendo o público, que assistia ao show sentado, levantar-se das cadeiras para vê-los de pé. E se eu não vejo a hora de ver esse disco novo na rua, imagino a banda…
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