Jornalismo

Um estranho e interessante alinhamento cósmico aconteceu na sexta passada na Porta Maldita, quando reuni três artistas de diferentes pontas do espectro musical para um Inferninho Trabalho Sujo memorável. A noite começou com os novatos da Orfeu Menino mostrando que eles não têm tempo ruim quando o assunto é jazz brasileiro. Liderados pelo carisma encarnado de Luíza Villa, o grupo fez seu show quase todo autoral à exceção de três músicas, que pautam bem o terreno habitado pela banda: “Chega Mais” da Rita Lee, emendada com “Cara Cara” do Gil e “Tudo Joia” do Orlandivo. Passeando suas composições pelo samba jazz pós-bossa nova, estrearam três músicas novas e estão absorvendo bem a entrada do novo guitarrista, o carioca João Vaz. Fiquem de olho neles…

Depois foi a vez de outro poço de entretenimento que é o show de Ottopapi, codinome que Otto Dardenne assumiu para sua carreira solo. Acompanhado de uma banda fulminante (Vítor Wutzki e Thales Castanheiras nas guitarras, Gael Sorkin na bateria, Bianca Godói no baixo e Danileira nos synths, efeitos e coreografias), ele é um dos melhores shows de São Paulo atualmente, com aquela energia de rock de garagem que ecoa tanto os momentos menos artsy do Velvet Underground quando a época que os Strokes eram uma banda semidesconhecida, em composições tão descartáveis quanto grudentas, hits pop disfarçados de pulsões elétricas que não deixam ninguém parado. E ele já anunciou que o disco tá vindo…

E a noite encerrou com o Casual Art Ensemble, projeto de improviso noise surgido do encontro de três quartos dos heróis indies cariocas do Oruã (os cariocas Lê Almeida, João Casaes e Bigú Medine) com a dupla paulistana Retrato (Ana Zumpano e Beeau Gomez), que pode reunir ainda mais gente, que foi o que aconteceu na sexta-feira, com as presenças de Guilherme Pacola (bateria, percussão e efeitos), Clóvis Cosmo (sopros e percussão) e Gabriel Gadelha (do Naimaculada, no sax), conduzindo o público a três diferentes transes hipnóticos em que seus integrantes trocavam de instrumentos a cada nova viagem. Coisa linda.

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E nem terminou um e já temos outro: sexta que vem temos mais uma edição do Inferninho Trabalho Sujo na magnífica Porta Maldita – e essa noite é estelar, começando pelos novatos Orfeu Menino, banda liderada pela vocalista Luíza Villa, mostrando seu novíssimo repertório autoral, seguido da incrível banda de Ottopapi em mais uma catarse indo direto ao centro nervoso da crueza e urgência do rock e finalizando com o improviso do Casual Art Ensemble, grupo formado pela dupla Retrato e por 3/4 do grupo Oruã, liderado por Lê Almeida. Como sempre discoteco antes, entre e depois dos shows, sempre reforçando o clima quente dessa noite. Os ingressos podem ser comprados antecipadamente aqui.

Não sou propriamente fã do Eddie Vedder, mas não há como negar que ficou linda a versão que ele fez para “Needle and The Damage Done”, do mestre Neil Young, que estará presente na coletânea Heart Of Gold: The Songs Of Neil Young, que ainda terá a participação de Fiona Apple, Sharon Van Etten, Doobie Brothers com Allison Russell, Steve Earle, Mumford & Sons e Courtney Barnett (que inclusive já mostrou sua versão para “Lotta Love”, no mês passado). Vedder, além de dividir o palco com o velho Neil algumas vezes (inclusive um disco inteiro de sua banda Pearl Jam com o bardo canadense, o fabuloso Mirrorball), já havia mostrado ao vivo a música outras tantas, mas finalmente ela ganha uma versão em estúdio. O disco, que já está em pré-venda, será lançado no mês que vem.

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Fiona Apple é a primeira convidada do próximo disco do grupo escocês Waterboys a mostrar sua colaboração. A faixa “Letter From An Unknown Girlfriend” faz parte do décimo-sexto disco da banda, Life, Death And Dennis Hopper, que, como o prega o título, conta a história de um dos maiores ícones da cultura pop do século passado. “O arco de sua vida é a história de nossa época”, explicou o líder, fundador e único remanescente da formação original da banda, Mike Scott. “Ele estava no big bang da cultura jovem no filme Juventude Transviada com James Dean, no início da pop art com o jovem Andy Warhol, e faz parte da contracultura, da cultura hippie, do movimento pelos direitos humanos e da cena psicodélica dos anos 60. Nos anos 70 e 80 ele passou por uma década selvagem, quase morreu, voltou, se endireitou e tornou-se um ator que fazia cinco filmes por ano sem perder o brilho em seus olhos ou o senso de perigo e de imprevisibilidade que sempre esteve ao seu redor.” O disco tem 25 faixas e passa por sua infância até a manhã seguinte à sua morte e “não é só sobre Dennis, mas sobre toda a estranha aventura de ser uma alma humana no planeta Terra”, conclui Scott. O disco, que será lançado em abril, ainda conta com participações de Bruce Springsteen, Steve Earle, Anana Kaye, Barny Fletcher, da banda country norueguesa Sugarfoot, Kathy Valentine das Go-Go’s, entre outros. Ouça o single abaixo: Continue

Björk no cinema

Mais música no cinema! Desta vez é a cantora islandesa Björk que anuncia o lançamento do filme de seu show Cornucopia em mais de 500 cinemas em todo o mundo, na primeira vez que o registro do espetáculo é exibido na íntegra. Conduzido em parceria com a diretora argentina Lucrezia Martel e com a diretora musical Isold Uggadottir, a apresentação aconteceu no dia 1º de setembro de 2023 na Altice Arena, que fica na capital portuguesa de Lisboa, e mistura músicas dos discos Utopia (2017) e Fossora (2023), além de efeitos de realidade virtual e a exibição de três curtas escolhidos pela artista. Cornucopia será lançado em todo o mundo no dia 7 de maio, inclusive no Brasil, e para saber mais informações sobre as sessões, cadastre-se no site da artista.

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O novo programa de entrevistas da Netflix, Everybody’s Live, apresentado pelo ator e comediante John Mulaney, conseguiu um feito e tanto em seu segundo episódio não apenas ao reunir no mesmo programa duas das maiores mestras do rock independente – Kim Gordon e Kim Deal, vocalistas, baixistas, musas e faróis do mundo indie, a partir de suas respectivas bandas, Pixies e Sonic Youth, que lançaram ótimos discos solo no ano passado – como conseguiu colocá-las juntas no mesmo palco para cantar ao vivo pela primeira vez a música que gravaram há 30 anos no subestimado disco Washing Machine que o Sonic Youth lançou em 1995. O canto fantasmagórico das duas em uma balada soul não apenas ecoa pilares da música pop como os girl groups dos anos 60 (algo que o mesmo Sonic Youth havia feito no ano anterior, ao regravar o hino “Superstar”, canção da dupla Delaney & Bonnie imortalizada pelos irmãos Carpenters) como faz ponte com artistas contemporâneas tão diferentes quanto Amy Winehouse, Lana Del Rey e Weyes Blood – e é tão bom vê-las cantando essa música em 2025 como se estivessem em 1995 ou 1965!

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Ops, ela fez de novo: “Toda noite, em toda cidade, cantaremos uma música de um artista local”, disse Dua Lipa em sua segunda noite em Melbourne, na Austrália, logo depois de fazer um show em que cantou “Highway to Hell”. A australiana homenageada desta quarta-feira foi Natalie Imbruglia, com seu irresistível hit “Torn”. E, como fez na musica do AC/DC, a senhorita Lipa fez bonito e mostrou que não está no lugar que está à toa. Resta saber se essa tática pode reverter o jogo de ter lançado um disco fodíssimo no ano da pandemia e em seguida lançado um disco sem graça que agora começa a circular ao vivo. Parece uma boa tática, mas vamos ver…

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Ainda deu pra correr e ver um pouco do primeiro show do trio Mocofaia em São Paulo, que aconteceu no Bona. E embora o encontro de Luizinho do Jêje, Marcelo Galter e Sylvio Fraga tenha sido bonito, havia algo de diferente no som da casa – que não é característico de lá – que deixava as partes graves (especificamente o synthbass tocado por Galter) muito acima dos outros instrumentos e das vozes, o que eclipsou o brilho da apresentação, que mesmo assim foi bonita, principalmente quando o convidado da noite, o pernambucano Zé Manoel, juntou-se ao trio. E é sempre bom ver Luizinho tocar – que mago!

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E para encerrar o curso Bibliografia da Música Brasileira que estamos dando no Sesc Pinheiros nesta quarta-feira, eu e Pérola falamos de movimentações extramusicais que mexeram não apenas na produção musical brasileira da virada do século como impactaram nas publicações deste mesmo período. Voltamos para o início dos anos 80 para mostrar como São Paulo começou a protagonizar uma mudança na produção quando casas de shows como o Lira Paulistana e lojas de discos como a Baratos Afins começaram a lançar artistas rejeitados pelas gravadoras multinacionais – que trabalhavam cada vez mais em bloco, forçando sucessos comerciais na marra -, criando, sem perceber, o mercado independente. Este foi ágil em perceber o potencial da internet e abraçou a rede desde o primeiro momento, bem como as novas tecnologias digitais, que permitiam que mais artistas tivessem como gravar seus discos e distribuí-los. Essas transformações também mexeram no mercado editorial e sua abordagem em relação à música no período, com a consolidação de novas editoras independentes, o surgimento de autores que começaram a publicar textos e livros online e a facilitação do acesso aos livros seja em PDFs piratas ou em livros digitais gratuitos. É sempre bom ministrar esse curso, pois além de um mergulho na história da nossa música, também mostra como os livros que contam essa história apenas refletem as características – políticas, estéticas e estruturais – de diferentes períodos dessa trajetória. Já estamos com vontade de dar mais aulas! (📷: @sescpinheiros)

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E se Jim Morrison ainda estiver vivo? As mortes dos grandes nomes da fase clássica do rock não apenas funcionaram como pregos no caixão de uma época e, por terem acontecido subitamente e matado esses ídolos ainda na tenra idade, criaram uma aura de encantamento e mistério que tornaram-se material da própria história do gênero. E por mais que as mortes de Brian Jones, Jimi Hendrix e Janis Joplin hoje já não sejam tão envoltas em lendas, a de Jim Morrison ainda segue vaga quanto em seu tempo, no final de 1971. O líder dos Doors mudou-se para Paris naquele ano e morreu sem deixar vestígios, teoricamente vítima de um ataque cardíaco na banheira de seu apartamento em Paris. Ninguém sabe quem é o médico que o examinou após a morte, não houve autópsia e sua namorada Pamela Courson, a única pessoa que o conhecia a vê-lo morto, morreu três anos depois. Agora uma série vem jogar luz nessa possibilidade anunciando inclusive a possibilidade de ter encontrado o próprio cantor, que viveria em Nova York e trabalharia disfarçado como um zelador. Não são as únicas pistas: Finn descobriu que o número de Seguro Social de Jim ainda está ativo e mostra outras pistas para pessoas que conheceram o vocalista dos Doors em diferentes momentos de sua curta vida. Criada e dirigida pelo fã Jeff Finn, Before the End é dividida em três episódios, já estreou na Apple TV nos EUA e vem acompanhada de um livro, escrito por Finn, chamado 127 Fascination: Jim Morrison Decoded, que ainda será lançado, sobre o mesmo tema. Veja o trailer abaixo: Continue