Jornalismo

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Em outra reedição caprichada da Rhino, o disco que consolidou a importância do Sepultura na cena mundial, Beneath the Remains, ganha uma nova versão em vinil com direito ao disco de 1989 remasterizado a partir das fitas originais, além de um segundo disco com faixas gravadas no Rio de Janeiro, algumas em versão instrumental, antes do grupo registrar as versões definitivas na Flórida, e músicas tiradas do show que o grupo mineiro fez no clube Zeppelinhalle, na cidade alemã de Kaufbeuren, no dia 22 de setembro do ano de lançamento do disco, com direito a versões para “Symptom Of the Universe” do Black Sabbath e “Holiday In Cambodia” dos Dead Kennedys:

São apenas 1500 cópias do disco, que já está à venda.

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Que maravilha essa transformação a que Kieran Hebdan submeteu em uma das faixas do disco mais recente de Kevin Parker. O remix que o senhor Four Tet fez para “Is it True?” tira a faixa mais besta do disco novo do Tame Impala, The Slow Rush, dos anos 80 para elevá-la espiritualmente rumo a uma dimensão fluida entre beats da virada do século e acordes ambient que parecem sempre terem existido, aprofundando a canção para além de seu ar pop vespertino original.

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Jay-Z e Pharrell, dois monstros do pop deste século, se uniram no single “Entrepreneur”, que celebra iniciativas negras espalhadas pelo planeta, em uma ação em parceria com a revista Time, que dedica a capa de sua edição semanal à “nova revolução norte-americana”, um levantamento feito por Pharrell em como seu país está mudando a partir da presença de negros no mercado como patrões – ou “empreendedores”, como reforça o título da canção. Mas o clipe forte e mensagem importante da música não se refletem na faixa em si, que é apenas passável.

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Um Sonic Youth aqui, um Belchior ali, um Plato Dvorak com Frank Jorge acolá, um Alceu Valença mais adiante… A disparidade de autores reunidos no primeiro disco de versões lançado por Pedro Bonifrate nesta quinta-feira dissipa-se quando enfileirados na ótima surpresa que é este Diversionismo: versões & fantasias (2004-2020). “Volta e meia pensava em juntar essas versões que fiz por aí e que achei que ficaram legais, inventivas em relação às gravações originais, num álbum só pra elas”, me explica por email, falando de um disco que inevitavelmente soa folk e psicodélico, derretido e solar como a maioria de seus trabalhos, seja em carreira solo, seja à frente do falecido grupo Supercordas.

“Engraçado é que a maioria dessas versões foram encomendadas pra tributos de artistas que certamente não seriam meus primeiros escolhidos se eu fosse pensar em que versões fazer por mim mesmo”, continua quando pergunto sobre as músicas escolhidas para o disco. “Por exemplo, eu acho que se ouvi um disco inteiro do The Fall foi uma ou duas vezes no máximo”, Bonifrate lembra da versão que fez para o tributo ao grupo inglês de Mark E. Smith, proposto pelo dono do selo Midsummer Madness, Rodrigo Lariú. “Ele me passou algumas sugestões e “Psykick Dancehall” me chamou atenção pela letra que achei muito bonita, então foi quase como musicar uma poesia”. Bonifrate também lembra desta maravilhosa versão, que soa como um encontro de Neil Young com George Harrison, como marco para definir o rumo deste disco. “Eu realmente gostei muito de como ficou, o Lariú também, mas ainda ficaria pequeno pra ter um álbum cheio”, relembra.

Diversionismo só começou a ganhar uma cara a partir da quarentena de 2020. “Durante o isolamento tive vontade de fazer com ‘Home of the Brave’, do Spiritualized, o que eu já tinha feito ao vivo uma vez ou outra e isso já inteiraria uns 30 minutos e achei que estava de bom tamanho. Já estava organizando o material pro disco quando o Pedro Montenegro pediu um cover de qualquer música brasileira pro programa dele na Soho Radio de Londres, o BarKino. Então fiz ‘Íris’ do Alceu pra ele e a coisa ficou ainda mais redonda”.

E entre um Sonic Youth quase indígena (“100%” como se fosse “My Wild Love” dos Doors), um Belchior renascido no Magical Mystery Tour (com uma lisérgica “Hora do Almoço”, gravada no disco-tributo organizado pelo Scream & Yell) e uma “Happiness is a Warm Gun” tocada num saloon, ainda há espaço para um afrossamba! “O tributo aos Afro-Sambas d’A Escotilha me pegou totalmente de surpresa, eu podia escolher quase qualquer faixa e não me via fazendo nenhuma, é tão tipo não-a-minha-onda que não visualizei”, lembra Pedro. “Mas no final ouvi o ‘Lamento de Exu’ e pensei ‘ah isso é bem abstrato, consigo fazer algo com isso’. Depois ouvi a versão de 1990 do Baden Powell sozinho e ela sim me encheu de ideias, e acabei fazendo uma das gravações minhas de que mais gosto.”

“Acho que essa aleatoriedade dos convites ditou a onda dessa compilação, as leituras me parecem improváveis em tantos aspectos, e acho isso ótimo”, prossegue. “Só a do Spiritualized, a do Alceu Valença e a dos Beatles partiram de uma vontade própria de fazer aquelas canções especificamente.” Quando pergunto se alguma ficou de fora, ele força a memória. “Se ficou, foi outra do Spiritualized que foi a primeira coisa que eu fiz quando tive um gravador de fita de 4 pistas na minha frente lá pra 1998, mas não consegui encontrar no meio de tantas fitas, e acho que hoje deve soar bastante tosca, até pros meus padrões”, confessa.

Ainda mais isolado devido à quarentena, ele segue no meio do mato em sua cidade-musa Paraty. “Olha, não posso dizer que estamos na pior. Moramos perto da natureza, temos duas crianças na casa que dão muito trabalho mas muita alegria também, e por enquanto temos esse ‘privilégio’ do isolamento social – que nada mais é do que um direito que só é garantido a poucos no Brasil. É doido como dá trabalho ficar em casa, tanta coisa pra fazer, pra limpar, pra secar, pra esfregar, pra martelar, pra rastelar e eu já me pergunto como é que eu conseguia existir trabalhando de 8h-17h antes disso”, confessa.

Quando fala na primeira pessoa do plural, refere-se a ele e à esposa, Thalita Silva, que cada vez mais participa do trabalho de Pedro, cantando desta vez em três canções, além de aparecer na capa do disco. “Na real ela já estava na capa do Museu de Arte Moderna (2013) e gravou uns vocais pra última faixa, ‘Canção de Pelúcia’. Volta e meia ela grava umas vozes, teve ‘Rock da Paçoca’ do Toca do Cosmos EP (2014), ‘Rã’ do Lady Remédios (2017), e na ‘Parte VI’ do Mundo Encoberto (2019) ela não só canta solo como toca caixa, meio que de um jeito como se toca a Caixa do Divino, do Maranhão, porque ela toca num grupo de caixa daqui de Paraty há alguns anos. Ela tem uma musicalidade muito intuitiva e uma voz muito bonita e aerada, que sempre cai bem.”

Mas nem só de versões vive o velho supercorda em 2020 e já anuncia mais um disco solo, o primeiro desde que seu antigo grupo acabou. “Um novo álbum como Bonifrate já está quase pronto, com canções próprias e inéditas”, revela. “O Diogo Valentino está terminando de mixar aí em São Paulo e deve sair nos próximos meses. Fora isso, vamos tentando ficar vivos e sãos pra encarar esse mundo esquisito que vem logo depois da curva.”

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A cada passo em direção a seu novo disco, Billie Eilish reforça a mudança que tem atravessado como artista, sublinhando que não quer mais ser vista essa caricatura de enfant terrible com it-girl da geração Z que lhe transformaram e vem aproveitando este estranho 2020 como plataforma para esta mudança. Começou ainda em 2019, quando, com a contemplativa “Everything I Wanted” mudou o tom de sua abordagem, sublinhando a presença do irmão Finneas em seu processo criativo e entrou no novo ano, quando ela mostrou “No Time to Die”, música que compôs para o próximo filme de James Bond antes de entrarmos em quarentena. Agora ela surge como coadjuvante de luxo da eleição para presidente dos EUA, mostrando a recém-lançada “My Future” pela primeira vez ao vivo na convenção do partido democrata dos EUA que oficializou o nome de Joe Biden como . Não sem antes passar seu sabão no momento político atual de seu país.

“Você não precisa que eu diga que as coisas estão uma bagunça – Donald Trump está destruindo nosso país e tudo que nos importa. Precisamos de líderes que resolvam problemas como mudança climática e o covid – não os neguem. Líderes que lutarão contra o racismo sistêmico e a desigualdade. Começa votando contra Donald Trump e por Joe Biden. O silêncio não é uma opção e não podemos ficar de fora. Todos nós temos que votar como se nossas vidas e o mundo dependessem disso – porque eles dependem. A única maneira de ter certeza de nosso futuro é fazê-lo nós mesmos. Por favor registre; por favor vote.”

Mais uma vez acompanhada do irmão e de um baterista, ela dominou completamente a cena, cantando seu novo single com leveza e desenvoltura, ciente de todo o simbolismo da situação: o fato de votar pela primeira vez por ter apenas 18 anos, o fato de representar os nascidos no século 21 que, como ela, pode votar pela primeira vez para presidente em 2020 e estar cantando uma música chamada “My Future” em um evento que poderá decidir o futuro dela, de seu país e de todo mundo.

Ela vai longe…

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“As Curvas da Estrada de Santos” é uma das canções mais emblemáticas de Roberto Carlos, especificamente no ponto de vista musical, quando ele começa a flertar com a soul music, o gospel e o blues, usando a música para extravasar as emoções – tanto que no ano seguinte de seu lançamento, em 1970, Elis Regina a regravou em seu clássico Em Pleno Verão justamente sublinhando as cores rasgadas da canção original. Três anos depois, o grupo instrumental Azymuth regravava o hit numa versão ainda mais pesada, que infelizmente foi engavetada. Só que ao arrumar suas coisas depois de ajudar a coletânea Azymuth – Demos (1973-75) Volumes 1 & 2, lançada no ano passado pelo mesmo selo inglês Far Out, o baterista do grupo, o mítico Ivan Conti, o Mamão, desenterrou essa pérola que agora vai ser finalmente lançada pelo mesmo selo, em um compacto. Na gravação, alem de Conti, o grupo ainda conta com o falecido José Roberto Bertrami nos teclados elétricos, Alex Malheiros tocando contrabaixo acústico e o guitarrista João Américo.

O disco já está à venda no site da Far Out. No lado B do compacto, um improviso entre o tecladista e o guitarrista, cujo apelido era Paraná, batizando a faixa de “Zé e Paraná”. Estas duas faixas, como a coletânea do ano passado, foram gravadas entre 1973 e 1975, na casa de Bertrami, no bairro das Laranjeiras, no Rio de Janeiro.

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Você até pode não lembrar do nome de Herb Alpert, mas basta ouvir algumas de suas músicas à frente de seu grupo Tijuana Brass para ter a certeza de já ter ouvido seu inconfundível trompete (e talvez a bela balada “This Guy’s Love with You”, quando cantou pela primeira vez). Sua história, tanto nos palcos quanto nos bastidores, finalmente vai ser contada no documentário Herb Alpert Is…, dirigido pelo mesmo John Scheinfeld que dirigiu os ótimos Chasing Trane e Who Is Harry Nilsson?, que será lançado no início de outubro.

Fenômeno musical nos Estados Unidos desde o início dos anos 60, Alpert também é um marco na indústria fonográfica por ter sido um dos primeiros músicos a ter sua própria gravadora e dar-lhes condições de fazer discos como queriam. A A&M Records, fundada ao lado de Jerry Moss em 1962, foi lar de artistas tão diferentes quanto Procol Harum, Carpenters, Quincy Jones, Joe Cocker, Sergio Mendes, Supertramp, Bryan Adams, Burt Bacharach, Carole King, Joan Baez, Peter Frampton, Human League, Police, entre muitos outros, todos satisfeitos com o tratamento que o selo lhes deu antes de serem vendidos para a PolyGram, no fim dos anos 80. E como se não bastasse isso, ele ainda tornou-se pintor e escultor abstrato reconhecido no mundo das galerias de arte.

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Junto com o filme também será lançada uma caixa que reúne 63 canções com o mesmo nome do documentário, que repassa todo o histórico da carreira do músico. A caixa – que em CD terá três discos e em LP cinco vinis – também trará um livro com 180 páginas contando a história do músico e produtor.

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Crua e delicada

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Angel Olsen mostra mais uma música do disco-cara-metade do melhor disco do ano passado, o exuberante All Mirrors. E depois de mostrar a faixa-título deste novo trabalho, Whole New Mess, ela vem com outra inédita, a celestial “Waving, Smiling”.

Ela aproveitou para liberar uma versão ao vivo da mesma música, gravada no Masonic Temple na cidade de Asheville, nos EUA, em uma de suas lives pagas que tem feito sob o título de Cosmic Streams.

O curioso é que ela ainda não mostrou nenhuma versão de nenhuma faixa já conhecida por All Mirrors. Whole New Mess é a segunda versão para um mesmo repertório que a cantora norte-americana composto desde o fantástico My Woman, de 2016. Ela até cogitou lançar um disco duplo, mostrando as duas faces que pensava para este conjunto de músicas, um mais suntuoso e chique, outro mais cru e delicado. Ela optou por lançar a versão opulenta no ano passado, cravando o álbum no topo da minha lista pessoal de melhores discos de 2019 e agora revisita o mesmo repertório em outro ambiente, gravado em uma igreja, só com ela tocando guitarra e violão. Mas como ela não mostrou nenhuma música que já conhecíamos, apenas determinou o parâmetro musical do novo disco, mostrando que trará toda uma nova profundidade a uma obra irrepreensível. O disco sai na semana que vem e já está em pré-venda.

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Que internet você quer? Esse questionamento já acompanha minha querida amiga Dani Arrais há alguns anos e tornou-se um dos motes de seu trabalho – e da sua vida. Blogueira desde os tempos em que isso não era pejorativo, ela transformou seu Don’t Touch My Moleskine em mola-mestra de seu trabalho e aos poucos descobriu outra forma de se conectar às pessoas. Convidada desta semana do meu programa semanal Bom Saber, puxo a questão online para discutir outros temas, amplificados pela quarentena: nossa relação com o trabalho, com o dinheiro, com as pessoas mais próximas e com as celebridades, com o jornalismo, com a arte e com o mercado. Um papo que, se deixasse, ficava até amanhã.

O Bom Saber é meu programa semanal de entrevistas que chega primeiro para quem colabora com meu trabalho, como uma das recompensas do **Clube Trabalho Sujo**. Além da Dani, já conversei com Bruno Torturra, Negro Leo, Janara Lopes, Tatá Aeroplano, João Paulo Cuenca, Eduf, Pena Schidmt, Roberta Martinelli, Dodô Azevedo, Larissa Conforto, Ian Black, Fernando Catatau, Mancha, André Czarnobai e Alessandra Leão – todas as entrevistas podem ser assistidas aqui no Trabalho Sujo – ou no meu canal no YouTube, assina lá.

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Sofia Coppola convocou Bill Murray para fazer outro filme, mas desta vez compor dupla – e não par – com Rashida Jones. On the Rocks, seu sétimo longa, também conta com mais uma música nova da banda do marido, o vocalista do Phoenix, Thomas Mars, com quem a diretora é casada desde 2011 e com quem tem duas filhas. Tanto o trailer do filme quanto o novo single parecem capturar os dois artistas em lugares confortáveis e cômodos – e por isso talvez pareçam meio genéricos de si mesmos (mal que já vem acometendo a banda francesa há pelo menos um disco).

“Identical” também é o primeiro single do novo disco da banda que, aparentemente, será a trilha sonora do novo filme de Sofia.

É a sexta vez que ele participa da trilha de filmes dela, num relacionamento que começou antes do namoro dos dois: em seu segundo filme, Virgens Suicidas, Mars gravou os vocais da música-tema “Playground Love” usando o pseudônimo de Gordon Tracks, e no filme seguinte, Encontros e Desencontros, ela usou “Too Young”, da banda do marido francês. Mas a colaboração dos dois se tornou mais intensa após o casamento, com Mars e o guitarrista da banda, Laurent ‘Branco’ Brancowitz, participando mais ativamente do processo criativo da cineasta. Desde então, o Phoenix já emplacou música em Um Lugar Qualquer (“Love Like A Sunset Part I”), Bling Ring (“Bankrupt!”) e O Estranho Que Nós Amamos (“Ti Amo”).