É oficial: a Disney comprou os direitos de distribuição do documentário Get Back, em que diretor Peter Jackson debruça-se sobre o material que outro diretor, Michael Lindsay-Hogg, fez no último mês em que Beatles tentaram manter-se como uma banda, em janeiro de 1969. O projeto Get Back foi originalmente uma tentativa que Paul McCartney fez com o grupo para que eles voltassem a funcionar coletivamente, depois de uma série de brigas em 1968 que culminou com a saída do baterista Ringo Starr do grupo, por uma semana.
Paul sugeriu que os quatro voltassem ao estúdio para tocar clássicos do rock como nos velhos tempos, batizou a iniciativa de Get Back, a partir de uma canção sua, e convenceu os Beatles a deixar uma equipe de filmagem acompanhou o processo. A presença das câmeras – e forçadas luzes coloridas – deixou o clima entre os Beatles, que já estava ruim, pior, e aquele mês assistiu à desintegração do grupo como uma banda. Emblemático que culminasse com a última apresentação ao vivo do grupo, o show de 40 minutos que parou Londres quando o grupo tocou sem anúncio no topo do prédio onde funcionava seu escritório, a gravadora Apple.
Get Back foi arquivado e o grupo passou a trabalhar no que mais tarde se tornaria o disco Abbey Road, mas nunca mais os quatro integrantes da banda estiveram juntos no estúdio, sendo este último disco gravado com no máximo três beatles por vez na sala. Alguns deles mal falavam um com o outro, Paul tretado com John, George tretado com Paul, Ringo de saco cheio dos três. Em 1970, depois do anúncio oficial do grupo, Get Back foi relançado num novo formato – pós-produzido por Phil Spector, que descaracterizou as gravações cruas da época com cordas e coros, o disco transformou-se em Let it Be, nome também do último filme do grupo, extraído das filmagens de Linsday-Hogg.
O documentário que aproximou o diretor de Senhor dos Anéis ao grupo inglês é a versão definitiva deste momento. Trabalhando em cima de todo o material deixado pelo diretor original, Peter Jackson mergulhou no projeto, que finalmente ganhou sua data de estreia no cinema, com o anúncio da entrada da Disney no projeto. Se o coronavírus não atrasar ainda mais, o lançamento está previsto para o dia 4 de setembro. E trará a íntegra do show no terraço da Apple, quando o grupo tocou três vezes “Get Back”, duas vezes “Don’t Let Me Down” e “I’ve Got a Feeling”, além de “Dig a Pony” e “One After 909”, acompanhados do tecladista Billy Preston.
O cineasta inglês Arthur Cauty fez um minidocumentário sobre o único estabelecimento que ainda aluga filmes (e até em VHS!), a inglesa 20th Century Flicks, que foi fundada nos anos 80 e sobrevive a todos os modismos – contando inclusive com duas salas de exibição, a Videodrome, para 18 pessoas, e a Kino, para 11. Que maravilha!
Os últimos anos foram puxados para os dois Beastie Boys sobreviventes. Depois de lançar sua autobiografia em 2018 e transformá-la em um espetáculo dirigido por Spike Jonze, Mike D e Ad-Rock levam sua Beastie Boys Story para um outro nível e anunciam o lançamento da versão em vídeo de sua história. O “documentário ao vivo”, seja lá o que isso signifique, que será exibido primeiro no SXSW, em março, para depois ir para os cinemas (por enquanto apenas nos EUA) e no serviço de streaming da Apple no final de abril. Sente o trailer:
Spike Jonze, que trabalhou com o trio desde o memorável clipe de “Sabotage”, também anunciou há pouco que iria lançar um livro de fotos que fez com o grupo quando trabalharam juntos. O livro já está em pré-venda e tem essa capa maravilhosa abaixo:
Quando o diretor Stanley Nelson começou a escrever o documentário que queria fazer sobre Miles Davis, ele tinha como meta tirar a personalidade junkie e problemática que paira sobre o Picasso da música até hoje para mostrá-lo como um artista completo. E o resultado ele traz neste Miles Davis: Birth of the Cool, que chega aos cinemas norte-americanos neste semestre.
https://www.youtube.com/watch?v=34r017yYNa0
O grupo Nação Zumbi reencontra-se com seu primeiro disco sem Chico Science, Rádio S.Amb.A., lançado no ano 2000 pois o disco está sendo lançado pela primeira vez em vinil ao mesmo tempo em que é assunto de um documentário que estreia nesta quinta, com show em que a banda toca todo o disco na íntegra, no Cine Joia, dentro da programação do festival In-Edit (mais informações aqui). Conversei com os produtores do documentário e com o guitarrista Lucio Maia em matéria que escrevi para a Trip – saca só.
O segundo documentário de Martin Scorsese sobre Bob Dylan, Rolling Thunder Revue, cujo foco é em sua lendária turnê em 1975, já tem data de lançamento: dia 12 de junho chega à grade da Netflix, segundo o próprio serviço de vídeos sob demanda. Não há muitas informações sobre o filme, exceto que há participações de Joan Baez e Allen Ginsberg e depoimentos de nomes como Patti Smith, Joni Mitchell, Sam Shepard e Sharon Stone – e que é menor do que o documentário anterior de Scorsese sobre Dylan, No Direction Home, que tinha seis horas – este tem apenas duas horas e meia.
Como parte do evento Invenção 67, Roberta Martinelli e Ricardo Alexandre discutem o mítico festival da Record em 1967 (aquele que revelou Caetano Veloso e Gilberto Gil, além de consolidar as carreiras de Edu Lobo e Chico Buarque) este sábado, no CCSP. O debate acontece às 17h, logo após a exibição do filme Uma Noite em 67, de Ricardo Calil e Renato Terra (que foram convidados para participar do evento mas não tinham disponibilidade de agenda). Tanto a exibição do filme quanto o debate são gratuitos – e a lotação está sujeita à capacidade da Sala Paulo Emílio. Os ingressos estão disponíveis uma hora antes do evento – mais informações aqui.
Financiado através de crowdfunding, o documentário David Lynch: The Art Life estreou no início do mês no festival de Veneza e é resultado de uma série de entrevistas do diretor Jon Nguyen com o mestre do cinema surreal que busca descobrir a criação de seu personalidade artística a partir de sua infância e adolescência, mostrando como este período se reflete em todos seus filmes.
A clássica revista Creem, cujo auge aconteceu nos anos 70, ganha documentário bancado via financiamento coletivo – escrevi sobre isso no meu blog no UOL.
Houve um tempo em que ter uma banda e viver de música eram atividades quase marginais, quando conhecer música era uma atividade para iniciados pois discos eram difíceis de serem encontrados e escolhas estéticas criavam conjuntos musicais que não estavam interessadas em fazer sucesso comercial. Esse é o espectro do documentário Guitar Days – An Unlikely Story Of Brazilian Music, que começa a se materializar a partir dessa semana, com os três shows de volta do Killing Chainsaw em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte. A volta do mítico grupo piracicabano, pedra fundamental para um mercado independente que hoje movimenta milhares de pessoas em todo o país, está diretamente ligada ao filme idealizado por Caio Augusto, que passou a entrevistar dezenas de bandas, produtores, donos de selo e jornalistas, para contar a história de uma cena que começou no início dos anos 90 e colhe frutos até hoje. Fui um dos entrevistados do filme, que ainda não tem data de lançamento, e também chamado para discotecar no show do Killing Chainsaw desta quarta, no Z Carniceria, que terá abertura dos Twinpine(s) (tocando com o Zé dos Pin Ups) e dos Mickey Junkies (mais informações aqui). O Killing também toca sábado em BH ao lado do Secod Come, do Valv, do Câmera e do Lava Divers (mais informações aqui) e no Rio dia 30 ao lado dos Cigarrettes e do Second Come (mais infos aqui). Conversei com o Caio por email sobre o documentário e a cena que ele se dispôs a conhecer melhor.
Como surgiu a ideia de documentar este recorte da produção musical brasileira?
A ideia original era fazer um curta sobre a ocupação do espaço público pelo músico independente. Em algum momento em março do ano passado, um grupo de amigos divulgou um show de rua que seria realizado na Praça Roosevelt. A tarefa não parecia nada fácil, naquela semana eles trocaram de lugar uma porção de vezes. Problemas com autorizações e a polícia militar. Na noite anterior ao evento, conseguiram a autorização. O show não aconteceu porque choveu. Aquilo me chamou a atenção e os procurei pra saber quais eram as dificuldades de se tocar hoje em dia.
Digo hoje em dia porque também tive banda, que se chamava Kaddish, mas nem chegou a gravar nada e sabia, por experiência própria, que a vida nos anos 90 não era nada fácil, achei que ali tinha uma boa história e esse paralelo temporal poderia ser feito.
Durante as pré-entrevistas, onde os próprios entrevistados sugeriam os próximos a ser entrevistados, percebi que as histórias não eram tão somente sobre a conjuntura do cenário alternativo-independente, contava-se uma história longa, desde o início dos anos 90, como se houvesse a necessidade de cobrir um espaço nessa linha de tempo que eu, como entrevistador, talvez precisaria ser informado por não ser um tema óbvio.
A partir deste momento, entendi que um pedaço incrivelmente relevante da história da música brasileira me chamava para ser registrado, a história das bandas alternativas-independentes que cantavam em inglês e utilizavam a voz como mais um elemento musical, e não como protagonista da canção. Eram as guitar bands.
Como você chegou ao denominador comum em relação a cantar em inglês no Brasil?
Dissonância, vocais embutidos e letras em inglês foram denominadores comuns para estas bandas que, a partir do início dos anos 90, decidiram romper com rock dos anos 80 e assumir suas influências que vinham de fora. Mas isso tinha um preço.
Quando se fala em “artista”, sobretudo no mundo da música, comumente pensa-se em badalação, fama, grana e afins. Inclusive, não é nenhum exagero dizer que o jovem que procura a vida artística, hoje em dia, ambiciona essa vida de celebridade que lhe é vendida, em vez da divulgação e promoção da sua produção artística. Os envolvidos neste cenário alternativo-independente abandonam qualquer possibilidade de se tornar um “artista” da maneira como lhes tem sido apresentado, pela simples escolha do idioma inglês como canal de expressão. Pelo menos, é o que tem se provado até então.
Por que se tornar um artista sem exigir o “pacote de benefícios” que a função costumava lhe conferir? Nunca houve, realmente, nenhuma pretensão? As respostas para estas perguntas têm ligação direta com aquilo que o documentário também pretende apresentar: o rock pode ter sofrido com sua autoestima, mas nunca perdeu a atitude. Quem acha que perdeu, está olhando para o lugar errado. O fato do mercado não se interessar por rock – em 2015 não houve um música de rock sequer nas top 100 das rádios brasileiras -, não extirpa da personalidade do rock a sua característica essencial. Enquanto as câmeras apontam para um lugar, atrás delas o bicho tá pegando.
Se sua banda canta em português, não importa qual sua intenção no show business, você tem chance.
É óbvio que para toda regra há uma exceção. E essa exceção, até agora, foi o Cansei de Ser Sexy. Agora, se você perguntar “por que eles estouraram?”, nem mesmo Carlos Eduardo Miranda, o primeiro a assinar com a banda através da Trama, sabe te responder. Adriano Cintra, compositor e multi-instrumentista do Cansei, tem uma boa resposta pra isso, “não foi meritocracia nenhuma, foi como ganhar na mega-sena”.
Qual a sua relação com estas bandas? Como conheceu esta cena?
No início dos anos 90, também tive uma banda que compunha em inglês. Não era uma guitar band, era uma banda de pós-punk com influências de Cure, Siouxsie, Joy Division e afins. Em São Paulo, o costume era oferecer noites de pós-punk/gótico às sextas, guitar aos sábados, e punk/hardcore aos domingos. Raramente me encontrava com essa galera, apesar de ter assistido aos shows de Pin Ups, Killing Chainsaw, Mickey Junkies e Garage Fuzz nessa época.
Havia um misto de curiosidade e admiração por estas bandas. Lembro quando vi pela primeira vez o disco homônimo do Killing, o da capa do Akira – feito pelo jornalista Alex Antunes -, e pensei: “Cara, as portas se abriram. Vai rolar gravar um disco!” Mas assim como o Sol Segabinaze do Stellar lamenta no teaser do doc, é difícil rolar.
A minha relação com eles foi como a de muitos, de quem estava por perto naquele momento, mas não eram meu círculo de amizade e nem curtíamos o rolê juntos. Ao contrário dos meus amigos que me acompanham na produção do documentário. O Magoo Felix sempre esteve nos mesmos lugares dessa galera toda, da mesma forma que o Maurício Palhano esteve com a galera de Belo Horizonte. Acredito que esse distanciamento me habilitou a tratar do assunto com imparcialidade necessária para um documentário, tanto na captação das experiências dos entrevistados, quanto na descrição dos fatos.
Foi um documentário dificil de ser realizado?
Tem sido. O primeiro desafio a ser compreendido e equacionado é a obtenção e alocação de recursos para um projeto que não tem apelo comercial. É um trabalho sobre um cenário musical que, apesar de prolífico e de alcance nacional, ainda se trata como nicho, comercialmente. Ainda assim, pudemos observar durante a realização do documentário, que existe uma intenção objetiva de seus envolvidos – casas, mídia especializada e músicos – em assumir sua importância dentro do rock brasileiro e se profissionalizar. Por conta disso, nossa primeira tentativa de captação de recursos foi através de crowdfunding. Avaliamos que esta forma coletiva de financiamento seria uma possibilidade real para escoar nossas recompensas através desta ampla network em construção, auxiliaria no processo de divulgação inicial, com a possibilidade de entregar ao fã de música recompensas relevantes relacionadas ao tema. Preparamos uma coletânea de músicas inéditas em parceria com a Midsummer Madness, exibições de corte-não finalizado, DVD com extras e shows especiais em SP, BH e RJ, mesclando bandas noventistas com a nova safra e promovendo o retorno do Killing Chainsaw. Paralelamente, lançamos uma campanha chamada “Pacoteira Guitar Days”, onde dezenas de artistas, selos e bandas independentes de diversos estilos colaboraram com camisetas, CDs, vinis e uma série de outros itens bacanas para estimular a venda dos apoios. Ainda assim, o crowdfunding não trouxe o retorno esperado e preferimos interromper o processo em tempo para que os shows pudessem ocorrer sem problemas para os fãs interessados. A Pacoteira será sorteada entra aqueles que comprarem os ingressos para estes shows.
Ainda sobre problemas, um dos maiores ao realizar esse documentário foi decidir quando parar de buscar os personagens a serem entrevistados. O Guitar Days não tem a pretensão de indicar quem são as bandas mais relevantes do país, sobretudo se falarmos sobre a cena atual. Mas é inegável que Pin Ups, Second Come, Killing Chainsaw, Mickey Junkies, Garage Fuzz, Low Dream, brincando de deus, PELVs e The Cigarettes, foram sim os pioneiros da música indie nacional. Foram os primeiros a gravar discos e CDs, os primeiros a desenvolver uma linha rudimentar de distribuição de fitas demo, os primeiros a lançar uma plataforma online – brincando de deus tinha site na web em, pasme, 1993! – e os primeiros a criar uma rede de colaboração e cooperação entre bandas. A partir daí, o guarda-chuva se abriu. Querer definir a relevância das bandas independentes a partir deste ponto seria, no mínimo, irresponsável. Com bandas do mainstream isso é simples e óbvio, há uma lista ali de quem vendeu mais discos. Mas e para quem vende discos para um público ultra-segmentado? Por isso, a partir dali, a escolha das bandas para o registro do documentário obedeceu um critério objetivo. Dentre os temas abordados na narrativa, buscamos bandas que têm experiência para falar sobre tais assuntos e foram, também, mencionadas nas pré-entrevistas.
Um exemplo. Em Belo Horizonte, tínhamos na lista os excelentes Valv e Vellocet de BH, e Soap Blisters de Contagem. Três guitar bands de expressão na região, sendo que uma delas foi uma das primeiras bandas nacionais a participar do South By Southwest, o Valv. E eles contaram como foi essa experiência nos EUA.
Recebo mensagens cobrando a participação de bandas de todas as partes do Brasil, como se tivesse havido uma eleição ou seleção de bandas para o documentário. O doc não trata de quem é o mais importante, trata de assuntos importantes relacionados ao cenário alternativo-independente cantado em inglês e a forma como bandas experienciaram aquilo.
Mas como trabalho pouco é bobagem, pra quê simplificar se a gente pode complicar, não é? Hoje, temos um longa-metragem para finalizar, um CD para prensar e três shows para produzir. Se não é a participação dos parceiros Rodrigo Lariú – do selo Midsummer Madness – fazendo o meio-de-campo na produção da coletânea; o Rodrigo Carneiro – dos Mickey Junkies – ajudando enormemente em tecer alguns contatos fundamentais para as entrevistas; o Maurício Mauk – do Second Come – fazendo a ponte com a galera no Rio de Janeiro; nosso anjo da guarda mineiro, a Fernanda Azevedo – que era da produtora Motor Music – na linha de frente do show em BH; a Mariângela Cavalho – do Supernova – dando total suporte na nossa divulgação, posso lhe assegurar que nós aqui já tínhamos arrancado todos os nossos cabelos, unhas e etc.
Como você vai financiar o resto do filme? Há uma previsão de lançamento?
Ainda estamos avaliando alternativas para o financiamento do filme. A intenção é esgotar as possibilidades de finalizar o documentário de forma autossustentável, e os shows são uma das ferramentas de apoio para o financiamento. Veja bem, não sou contra a utilização de leis de incentivo. Acredito que o governo tem a obrigação de fomentar a produção cultural no país. Ainda assim, é uma busca pessoal tentar alternativas ao financiamento público. O Guitar Days é sobre isso, também. Sobre ser independente. Criar caminhos para que o audiovisual autoral possa se retroalimentar é, além de uma luta pela sobrevivência, uma declaração de independência. Sobretudo com a iminência de tempos difíceis por aqui. Sobre o lançamento, ainda não há previsão. Além do financiamento, durante este processo de levantamento de recursos percebemos que ainda havia algo que precisava ser contado. Por conta disso ainda faremos algumas captações pontuais, mas muito importantes para o refinamento da história.
Fale sobre a relação do documentário com o último show dos Pin Ups e a volta do Killing Chainsaw?
Quando fiz a pré-entrevista com o Zé Antonio, ainda em maio de 2015, ele já havia me dito que estavam conversando com o Sesc para fechar o último show da banda em São Paulo. Não teve dedo nosso ali, ao contrário do Killing Chainsaw.
Ao entrevistar o Rodrigo Guedes em Londrina, e Gozo, Pedrinho e Gérson em Piracicaba, percebemos que havia ali uma vontade latente em tocar juntos mais uma vez. E não era “voltar a tocar”, Guedes nunca deixou de tocar. Apesar do tempo lhe atribuir mais responsabilidades, ele é o “singer-songwriter” do Grenade. O pessoal de Pira se reúne eventualmente para tocar, com menos frequência, uma vez que o baterista Pedro Rosas mora hoje em São José dos Campos.
Eu, como fã de música e de performances ao vivo, sempre quis ver o Killing tocar mais uma vez. E acredito que eles também. Antes das entrevistas contei para eles tudo aquilo que tinha ouvido nas entrevistas anteriores. Como as bandas e jornalistas viam o Killing Chainsaw e como essa admiração não mudou de tamanho dos anos 90 para cá. Admito que fui à entrevista de Piracicaba já com segundas intenções, mas não aumentei uma palavra sequer daquilo que tinha ouvido. O Killing Chainsaw tinha uma vigorosidade nos palcos, que os entrevistados lembravam com brilho nos olhos. A semente havia sido plantada. Colheremos agora nesta quarta, no Z Carniceira em São Paulo, no sábado na Autêntica em BH, e dia 30 no Saloon 79, no Rio de Janeiro.
Quem você vê como os principais herdeiros daquela época?
A internet te oferece um universo de músicas e bandas, hoje, de forma totalmente horizontal e democrática. O oposto dos anos 90, quando você tinha que sair de casa, ir aos shows, copiar demos, vasculhar zines para ouvir coisa nova. Também não há o elemento da ruptura, que caracterizou aquela época, nos dias de hoje; mas sem dúvida alguma podemos ver bandas que foram influenciadas ou que transitam pelos caminhos criados por aquelas bandas. Pessoalmente, gosto de bandas mais soturnas, como os piracicabanos – tem coisa naquela água lá! – do Travelling Wave, mas não acho que eles seriam herdeiros por causa de uma sonoridade contemporaneamente distópica. Na minha opinião, os mineiros do Lava Divers e os gaúchos do Loomer, agregam as especificidades da época: guitarra distorcida, vocal embutido, volume alto, 4 pessoas que vivem a banda, correria, networking e muita disposição. Tenho convicção de que, se a música que o Lava Divers gravou para o Guitar Days, “Hash and Weed”, for lançada na gringa, vira hit. Aliás, essa coletânea do Guitar Days tá uma coisa linda!
O que mais lhe impressionou ao produzir o documentário?
Os artistas, sem dúvida alguma. O que conheci foi um número de talentosos artistas brasileiros que são tão artistas quanto My Bloody Valentine ou Sonic Youth. A diferença aí, é que estes artistas independentes não podem se dedicar a sua arte em seu tempo integral, porque precisam se dedicar a outras atividades para custear a sua atividade artística que, como sabemos, não é autossustentável. Não há dúvidas ao afirmar que essa foi a melhor parte ao realizar este documentário. A sensação ao sair das entrevistas era de perplexidade por estes artistas não terem recebido o devido reconhecimento por aquilo que produziram até então. Foi um privilégio ouvir as histórias dessas pessoas. Não por acaso, foram mais de 70 horas de conversas registradas.
Como foi seu contato com o Mauricio Palhano e o Magoo Félix, que estão ajudando no documentário?
O Magoo Felix é amigo de bairro. Nos conhecemos desde os 16 anos quando ele só ouvia Anjos dos Becos. A bateria que ele usou nos primeiros 6 anos de Twinpine(s) era a minha. Magoo era um dos entrevistados para o curta-metragem sobre a ocupação do espaço público. Foi ele quem me costurou os contatos do Zé Antonio do Pin Ups e Rodrigo Carneiro dos Mickey Junkies. E foi logo após estas entrevistas que decidi ampliar o escopo de atuação. Eu o chamei, dizendo que seria uma produção de guerrilha e não poderia pagar um real sequer, ele aceitou na hora. Magoo é um trabalhador incansável! O Maurício Palhano foi meu parceiro de Academia de Cinema. Ele não gosta muito de tocar no assunto, mas é baterista da banda shoegaze mineira Multisofá. Através dele, desenrolamos as entrevistas de Minas e Rio de Janeiro e algumas outras em São Paulo. Além dos contatos com os entrevistados, Magoo e Maurício seguiram atuando em diversas frentes da produção, como obtenção de locais para gravação, busca de material de cobertura, artes gráficas, e também durante as gravações, auxiliando na captação de áudio e também participando das entrevistas. Isso sem falar na correria da produção dos shows, que é todo um trabalho à parte.