
Dua Lipa começou a perna latino-americana de sua turnê mundial com duas datas no estádio do River Plate, em Buenos Aires, e, como tem feito, pinçou duas canções portenhas para celebrar o público argentino, cantando cada uma em uma de suas apresentações. Ela começou nessa sexta-feira, quando arrebatou a todos com o gigantesco hit do Soda Stereo, “De Música Ligera” (que foi hit até no Brasil, graças às versões feitas pelos Paralamas e pelo Capital Inicial). E no dia seguinte, preferiu uma canção mais fofinha, quando escolheu “Tu Misterioso Alguién”, do grupo Miranda!, igualmente cantada em uníssono pelo público. Só lamento que ela não convidou nenhum artista local para subir ao palco com ela – tomara que não seja uma regra para essa parte da turnê…

Vocês estão acompanhando a ascensão do Geese? A banda nova-iorquina existe há quase dez anos, mas só após o lançamento do primeiro disco solo de seu vocalista Cameron Winter, Heavy Metal, no fim do ano passado, começou a chamar atenção da mídia alternativa nos EUA, que começou a perceber que a banda vinha conquistando um público cada vez maior com músicas longas e difíceis, um vocalista de timbre estranho, um baterista animal e apresentações fulminantes. Seu quarto e recém-lançado disco, Get Killed, está dividindo opiniões entre as pessoas que não acham que eles sejam tudo isso, gente que tem certeza que eles são os próximos Strokes e outros que acham que a banda é uma armação. O fato é que eles são a primeira banda da geração Z a ganhar destaque nos Estados Unidos e isso conversa com um movimento que está acontecendo no mundo todo – novos adolescentes que, um pouco antes ou durante a pandemia, descobriram o prazer de tocar juntos sem que isso fosse pensado como uma carreira formal ou uma forma de ganhar dinheiro – e a energia desse encontro atrai cada vez mais gente da mesma faixa etária encantada com esse superpoder que é ter uma banda de rock que parece ter caído no esquecimento do mercado e da mídia. É o mesmo movimento que tenho registrado aqui no Brasil no Inferninho Trabalho Sujo, uma das inúmeras iniciativas – entre selos, casas noturnas, festas, sites e fanzines – que tentam acompanhar essa novidade que a mídia convencional literalmente ignora. O disco novo não me bateu tanto quanto o solo de Cameron, mas o caso do Geese não é só questão de gosto: eles estão cada vez mais populares e o hype tem gerado notícias constantes sobre o grupo, que acaba de gravar uma improvável versão para o único hit dos New Radicals, “You Get What You Give”, na rádio BBC. Dá uma sacada…

O grupo Florence + The Machine acabou de lançar um novo disco (Everybody Screams) e para divulgá-lo gravou uma sessão acústica de músicas do novo álbum na rádio Siriusxm – mas não só. E para fugir do roteiro apontando para o clima de dia das bruxas, eles voltaram para sua “Which Witch?” que já tem dez anos de idade e a emendaram com duas “Abracadabra” – a primeira, claro, uma versão para o primeiro single do disco que Lady Gaga lançou esse ano, mas também acenando para o clássico hino soft rock da Stevie Miller Band. Ficou jóia.

Além de Lana Del Rey (que saudou o anfitrião com uma versão arrebatadora para “The Needle and the Damage Done”), quem também participou do concerto beneficente organizado por Neil Young – que agora chama-se Harvest Moon – foi o bom e velho Beck, que fez um set ensolarado com seus estandartes folk (“The Golden Age”, “Tropicalia”, “Dead Melodies”, “Lost Cause” e sua já clássica versão para “Everybody’s Got to Learn Sometimes”), ainda passeou por versões acústica para seus hits dance (“Where It’s At” e “Loser”) e encerrou sua apresentação reverenciando Daniel Johnston, com sua versão de uma das músicas mais bonitas do mundo, “True Love Will Find You in the End”.

Lana Del Rey foi uma das participantes do concerto beneficente anual estadunidense Harvest Moon, organizado por Neil Young para arrecadar fundos para instituições de apoio a crianças com dificuldades ou doenças raras, e aproveitou a oportunidade para cantar uma versão de chorar para a eterna “The Needle and the Damage Done”, do mestre canadense. Além dela, também tocaram, neste sábado num camping no Lago Hughes, na Califórnia, artistas como Beck, Tyler Ramsey, Muireann Bradley, Masanga Marimba e a nova banda do próprio Young, Chrome Hearts. E agora eu não consigo pensar em algo que possa me acalmar tanto a alma quanto um disco da Lana cantando o repertório do velho Neil. Olha esses vocalises no fim da música…

Nem sou chegado em Empire of the Sun, mas é inegável a importância de “Walking on a Dream” como cápsula de um tempo em que dance music, indie rock e música pop se misturavam numa mesma cena híbrida, que incluía nomes tão distintos quanto Tame Impala, Phoenix, MGMT e LCD Soundsystem, entre inúmeras outras bandas que eram descobertas nos saudosos blogs de MP3. E é inevitável perceber a influência dessa cena na atual geração indie, momento retratado com perfeição quando o Wet Leg visita justamente o hit do Empire of the Sun em sua passagem pelos estúdios da BBC, em Londres. Olha que pérola.

Enquanto rola esse boato que talvez a Demi Lovato toque no Brasil esse ano (fora esse outro da Adele, mas isso é outra história – em outra cidade), ela lança um vídeo no Live Lounge da BBC cantando um medley com duas pérolas do disco mais recente de Lady Gaga, que, vamos combinar, é um dos discos desse ano. E Demi faz bonito ao emendar “Disease” com “Perfect Celebrity”, diz aí…

Encerrando a etapa californiana de sua turnê pelos Estados Unidos, Dua Lipa celebrou dois ícones pop de São Francisco nos dois show que fez na cidade nesse fim de semana. Ela começou os trabalhos no sábado, quando visitou o blues imortal de “Piece of My Heart” de Janis Joplin, numa versão light que ficou aquém de seu potencial vocal (vai ver ela não estava inspirada no dia). E no domingo ela recebeu o próprio vocalista do Green Day, Billie Joe Armstrong, para marcar de vez a mudança de estação com sua balada “Wake Me Up When September Ends”. Sua próxima parada é em Seattle. Será que ela vai de Jimi Hendrix, Heart ou Nirvana?

Robbie Williams adiou o lançamento de seu próximo disco, batizado de Britpop, para o ano que vem, pois não queria correr o risco de ser destronado por Taylor Swift. “É bem egoísta, eu quero meu décimo sexto disco no topo da parada”, disse ao jornal Guardian, explicando a nova data de um disco cujos singles que já foram mostrados contam com participações especiais de Tony Iommi, do Black Sabbath, e da dupla mexicana Jesse & Joy. E para não perder o espaço nos holofotes, pinçou o primeiro hit da banda “Wet Leg” para tocar em uma apresentação que fez no programa Radio 1 Anthems Live Lounge da BBC londrina. Além de misturar o hit “Chaise Longue” com sua própria “Candy” e com o grito de guerra dos Ramones, ele ainda mudou o início da música, falando de sua própria carreira, ao cantar que “eu entrei no Take That e ganhei diploma de pop star”. Ficou massa.

Se Dua Lipa já tinha subido bem o sarrafo ao puxar uma música do Mamas & The Papas e outra do Fleetwood Mac como suas primeiras celebrações californianas, durante sua turnê pelos EUA, nas duas outras noites que tocou em Los Angeles, ela trouxe talvez duas de suas melhores participações locais dessa turnê. Na primeira noite, na terça-feira, ela trouxe para o palco ninguém menos que o senhor Lionel Richie, irretocável, para celebrar sua essencial “All Night Long”. No dia seguinte, ela foi ainda mais fundo e trouxe a própria Gwen Stefani para dividir os vocais do maior hit de seu grupo No Doubt, a baladaça “Don’t Speak”. É tão bom vê-la não apenas mapeando os hits da cidade em que passa, mas colocando-os em uma genealogia própria, que parece seguir a cronologia do rock clássico, mas que também apóia-se em grandes hits pop (e não importa se é um rap, uma música latina ou um rock farofa) e baladaças arrasa-quarteirão, mostrando de onde ela veio. A próxima parada ainda é na Califórnia, mas dessa vez em São Francisco.