Abertura dionisíaca

“A palavra é pra ser esquecida, a sensação é que fica”. Maravilhosa a estreia da temporada Prémistura que Chicão Montorfano promoveu nesta segunda-feira no Centro da Terra, ao dar mais detalhes de seu primeiro disco (Mistura, que terá seu primeiro terço lançado ainda este ano, e que foi gravado há inacreditáveis quinze anos), mostrando suas canções inéditas ao lado da cantora e percussionista Marcela Sgavioli, além de conectar-se com sua verve teatral ao invocar o mestre Zé Celso Martinez Corrêa exatos quatro meses após sua passagem ao relembrar das Bacantes que fez a direção musical ao lado da cantora Letícia Coura. Foi a primeira vez que mostrou suas belíssimas canções em público, em dueto com sua companheira Marcela – e que voz maravilhosa que ela tem! Também foi a primeira vez que tocou violão num teatro, quando puxou uma sequência de composições nascidas durante a pandemia que rotulou de “bossas novas bad”. A apresentação expandiu sua natureza musical e passou a ganhar contornos teatrais com a entrada de Coura, empunhando seu cavaquinho e sua voz igualmente maravilhosa, e colocando coroas de louros no palco – e no público. Logo estávamos em terreno dionisíaco de uma peça escrita 700 anos antes de Cristo e mexendo com nossas sensações como faz há milênios – incluindo no fantástico final abrupto que esfregou em nossa cara o papel da arte. Uma noite ímpar.

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Chicão: Prémistura

O maestro Chicão Montorfano começa sua temporada no Centro da Terra nesta segunda-feira (6), quando começa a mostrar as canções de seu primeiro disco solo, gravado há anos e que finalmente verá, em breve, a luz do dia. O disco chama-se Mistura e justamente por isso a temporada foi batizada de Prémistura, quando o músico, compositor e arranjador mostra diferentes versões de seu trabalho, apontando tanto para o passado recente quanto para o futuro próxima. Na primeira apresentação, ele começa a noite com sua companheira Marcela Sgavioli nos vocais e percussão apresentando-se como a dupla Mar & Chicão. A segunda parte da noite vem com a cantora e cavaquinhista Letícia Coura que acompanha o tecladista pelas canções da peça Bacantes, do Teatro Oficina, do qual Chicão também foi diretor musical. Na segunda que vem (13), ele acompanha dois amigos e ídolos – Alzira E. e Yantó – somente ao piano. Na segunda dia 20 não terá temporada, pois é feriado, e ela continua no dia 27, quando Chicão abre a Prógui Náiti ao lado dos músicos Gabriel Falcão (guitarra) e voz, André Bordinhon (guitarra), Fernando Junqueira (bateria), Filipe Wesley (baixo) e mais uma vez Marcela Sgavioli (voz e percussão), visitando tanto músicas de seu primeiro disco solo quanto clássicos do rock progressivo. A última segunda-feira da temporada é a primeira de dezembro (4), quando recebe os músicos Barulhista, Bernardo Pacheco e Wanessa Dourado para um concerto de improvisação livre. Os espetáculos começam sempre às 20h e os ingressos podem ser comprados através deste link.

Centro da Terra: Novembro de 2023

O ano aos poucos chega ao fim e com ele a temporada de música do Centro da Terra. Como temos menos datas que os meses recorrentes em dezembro, este é o último mês cheio de apresentações no nosso querido teatro do Sumaré. E quem toma conta das segundas-feiras deste mês é o maestro Chicão Montorfano, mestre das teclas do Quartabê que também já tocou com Gal Costa, Ava Rocha, Silvia Machete, André Abujamra, Negro Léo, entre outros, e aos poucos prepara o lançamento de sua carreira solo, com um disco que gravou há tempos, chamado Mistura, e finalmente prepara-se para lançar. Por isso batizou sua temporada de Prémistura, justamente para antecipar este seu primeiro álbum. Em quatro segundas, ele atravessa diferentes formações para mostrar o futuro trabalho e rever o próprio passado musical com a presença de pessoas queridas com quem trabalhou nestes anos. Na primeira segunda (6), ele mostra suas novas canções ao lado da companheira cantora e percussionista Marcela Sgavioli na formação Mar & Chicão, além de convidar a cantora e cavaquinhista Letícia Coura para passear pelas canções da peça Bacantes, do Teatro Oficina, do qual o compositor também foi diretor musical. Na outra segunda (13), ele chama dois ídolos e amigos – Alzira E. e Yantó – para acompanhá-los ao piano. Na segunda (27), ele promove a Prógui Náiti mostrando as músicas de seu novo disco ao lado de uma banda composta por Gabriel Falcão (guitarra) e voz, André Bordinhon (guitarra), Fernando Junqueira (bateria), Filipe Wesley (baixo) e mais uma vez Marcela Sgavioli (voz e percussão), que visita também clássicos do rock progressivo mundial. A temporada encerra na primeira segunda de dezembro (4), quando ele se reúne com os músicos Barulhista, Bernardo Pacheco e Wanessa Dourado para um concerto de improvisação livre. E a programação segue intensa às terças. A primeira delas (7) marca estreia do supeergrupo nordestino Ondas de Calor, formado pelos cearenses Davi Serrano (voz, guitarra, baixo e teclas), Xavier (voz, bateria, baixo e guitarra) e Igor Caracas (voz, bateria e guitarra) e o sergipano Allen Alencar (voz, guitarra, baixo e teclas), músicos que se conheceram ao acompanhar a cantora Soledad e que perceberam que juntos poderiam dar mais luz às canções que compunham como artistas solo. Neste primeiro show, são acompanhados das cantoras Anais Sylla e Julia Valiengo. Na terça seguinte (14), Juçara Marçal e Cadu Tenório se encontram mais uma vez para dar continuidade ao seu projeto Anganga, em que revisitam vissungos (cantos de trabalho) recolhidos pelo linguista Aires da Mata Machado Filho há cem anos em São João da Chapada, município de Diamantina (MG), em 65 partituras no livro O Negro e o Garimpo em Minas Gerais, que foram regravados por Clementina de Jesus, Geraldo Filme e tia Doca da Portela no álbum O Canto dos Escravos, em 1982. Na outra terça (21) é a vez do paraibano Vieira mostrar como está preparando seu próximo trabalho, continuação de Crise dos 20, disco que produziu ao lado de Benke Ferraz, dos Boogarins, em 2021. O mês fecha na última terça do mês (28), quando Bruno Berle mostra uma versão completa de seu álbum No Reino dos Afetos com a participação de boa parte dos artistas que estiveram no disco, incluindo canções que nunca tocou ao vivo. Os espetáculos começam sempre às 20h e os ingressos já podem ser comprados neste link.

Sessão de terapia musical

Ao vivo, o formato Micro, que Maurício Pereira adotou em seu disco mais recente ao lado do compadre Tonho Penhasco, necessariamente torna sua apresentação uma sessão de terapia musical em que o mestre aponta suas músicas para nós, colocando-nos no meio de suas autorreflexões. Nesta terça-feira, no Centro da Terra, ele aprofundou-se ainda mais ao fugir do roteiro de sempre puxando canções – próprias e alheias – que só toca quando ensaia esse show com Tonho com o título autoexplicativo Micro Desmontado – A Gaveta Secreta do Ensaio. Por isso tome Roberto Carlos, Gilberto Gil, Beatles “Mamãe Coragem” e Marília Mendonça, “Satisfection”, Rafael Castro, composições inéditas com Tonho, duas versões para “Tranquilo” entre discussões sobre “lugar de falha”, luz e gelo seco, autopromoção de seu recém-lançado livro e lembrança da São Paulo dos anos 60, sem esquecer clássicos como “Mulheres de Bengala”, “Um Dia Útil”, “Pan e Leche” e “Trovoa”. Sempre aquela maravilha.

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Maurício Pereira: Micro Desmontado – A Gaveta Secreta do Ensaio

Encerrando a temporada de outubro no Centro da Terra, temos o imenso prazer de receber o mestre Maurício Pereira, que resolveu dissecar seu disco mais recente, o portátil Micro, abrindo seu próprio caderno de rascunhos. No espetáculo Micro Desmontado – A Gaveta Secreta do Ensaio, ele e o fiel comparsa Tonho Penhasco passeiam pelo próprio repertório mas abrindo margem para improvisos que só fazem quando se encontram sozinhos para passar o repertório que levam nos palcos. Entre músicas autorais e alheias, Pereira sempre adocica as canções com suas histórias, deixando tudo bem à vontade. O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos podem ser comprados neste link.

Erma paisagem

Paula Rebellato encerrou sua temporada Ficções Compartilhadas nesta segunda-feira no Centro da Terra com uma apresentação tão maiúscula quanto sua ousadia: reler o clássico Desertshore que Nico gravou nos anos 70 quase meio século depois, com camadas eletroacústicas que transpassavam as diferentes fases musicais da soturna diva alemã. Para isso, chamou os camaradas Mari Crestani, João Lucas Ribeiro e Paulo Beto, este último agindo como maestro da banda a partir de seus sintetizadores, enquanto Mari começou primeiro no sax para depois assumir o baixo, e João Lucas ficou na guitarra, ambos segurando vocais de apoio para o canto tenso de Paula recebendo Nico. A dona da noite, com seu timbre grave e usando poucos efeitos sobre a voz, abria, a cada canção, porteiras infinitas de ruído horizontal, que espalhava-se pela plateia como um enxame invisível de abelhas. Numa apresentação tão ritualesca quanto hipnótica, os quatro integraram diferentes camadas instrumentais que passeavam do noise ao rock clássico, passando pela música eletrônica, o noise, o industrial e o ambient, todos a serviço da ampla e erma paisagem desenhada pelas imagens invocadas por Nico, seja em inglês, francês ou alemão. Foi menos que uma hora de apresentação, mas o estado de suspensão parecia ser para sempre.

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Sentimental e foda

Foi tão bonito quando Manuela Julian abriu seu primeiro show solo nesta terça-feira no Centro da Terra com a versão que fez para “Conto do Pescador”, funk do MC Menor da VG. Primeiro porque mostrou que basta sua voz – sem nenhum acompanhamento instrumental, ela subiu o tom do funk da pista de dança a um espectro quase etéreo, sobrenatural. Depois porque foi quando a vi cantando sozinha essa mesma música num stories no semestre passado que comecei a pilhá-la para fazer esse show. Depois de algumas conversas, ela falou que faria acompanhada pelo Thales Castanheira ao violão e qual foi a minha surpresa quando vi o palco montado com guitarras, teclados e computador. Mas longe de encher as canções, ela optou por roupas mais minimalistas para seu repertório sentimental (título da apresentação), que além das belas músicas inéditas ainda incluiu versões para as músicas que fez com suas bandas (“Consolação”, da Fernê, e “Música de Término”, “Mesmasmesmasmesmas” e “Mexe Comigo”) e de outros autores, como Ava Rocha (“Você Não Vai Passar”, escrita pelo Negro Leo e com um solo foda do Thales), do Dônica (“Como Eu Queria Voltar”) e da banda argentina El Príncipe Idiota (“Novedades”). Um começo foda para uma carreira promissora.

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Manuela Julian: Sentimental

Maior satisfação receber o primeiro show solo da Manuela Julian no Centro da Terra nesta terça-feira. Vocalista das bandas Pelados, Fernê e Pequeno Cidadão, ela já vinha mostrando umas músicas novas em suas redes sociais quando perguntei se não tinha um show dela ali. Ela pediu tempo pra pensar e logo depois retornou topando e chamou o compadre Thales Castanheira para acompanhá-la ao violão e apresenta o espetáculo Sentimental, em que mistura suas referências artísticas, composições próprias e alheias aos poucos moldando esta sua nova faceta musical. A apresentação começa pontualmente às 20h e os ingressos estão à venda neste link.

Hipnose densa e tensa

Mais uma segunda-feira com Paula Rebellato no Centro da Terra e desta vez a noite de suas Ficções Compartilhadas foi ao lado de sua nova banda, Madrugada, tocando pela primeira vez num teatro. O fato do transe krautrock das apresentações do grupo partir do ritmo fez com que a performance ganhasse nova conotação naquele palco, colocando o grupo em uma hipnose central tensa e densa à medida em que o groove ia ganhando corpo. A cozinha formada pelos irmãos Dardenne (capos do selo Selóki) e pelo percussionista Thalin determinava diferentes rumos para o grupo, que fazia com que o noise do teclado de Paula e da guitarra de Raphael Carapia se desprendessem soltos criando camadas de interjeições elétricas que às vezes eram temperados pela fala em loop do baixista ou pelos devaneios solo dos vocais de Paula. Uma noite memorável.

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Natureza rocker

Depois de uma apresentação sensível e flertando com o silêncio, a percussionista Nath Calan foi para o outro extremo de sua versão no palco. A sutileza do concerto Música Cênica do Princípio ao Fim ficou na semana passada, abrindo espaço para a força de sua bateria e de sua presença de palco ao lado dos compadres Carlos Gadelha (guitarra) e Eristhal (contrabaixo). No espetáculo As Canções Que Toquei Por Aí ela assumiu sua natureza rocker para cantar músicas de Itamar Assumpção, Porcas Borboletas, Stela do Patrocínio, Maurício Pereira, Danislau TB, Malu Maria e Peri Pane, estes três presentes em participações surpresas, entre elas o próprio filho de Nath, o pequeno Benício, que cantou em uma música e dançou em outra. Pura energia!

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