E a mesma “Friday” é assunto da minha coluna deste domingo no Caderno 2 do Estadão (que entrevista a ministra da cultura Ana de Hollanda em sua capa, vale ler).
“Fun, fun, fun, fun…“
“Friday” e o futuro do pop
Você já ouviu “Friday”, hit sem graça da adolescente Rebecca Black? Se não, prepare-se para ouvir. Em pouco mais de duas semanas, a norte-americana de 13 anos transformou um clipe idiota para uma música ainda mais estúpida em um dos grandes fenômenos da história do YouTube. Às vésperas de completar 50 milhões de views até o fechamento desta coluna, na sexta-feira, o vídeo de Rebecca conseguiu, em poucos dias, o dobro do que Lady Gaga teve com seu vídeo mais recente, “Born This Way”, lançado há mais de um mês.
Mas quem é ela e por que uma menina tão sem graça, num clipe tão besta, cantando uma música tão boba é motivo de tanto barulho? Vale rebobinar a fita (que termo arcaico!) para entender o que está acontecendo.
O clipe foi lançado pelo escritório Ark Music Factory que, em vez de tentar convencer marcas a usar a internet para que elas se tornem conhecidas, deixou empresas de lado e voltou-se para as pessoas. Mais especificamente pais que acham que seu filho tem talento para se tornar o próximo Justin Bieber.
Pois os pais de Rebecca acharam que a filha tem talento (não tem), funciona em vídeo (não funciona) e é bonita (não é) o suficiente para justificar o investimento. O clipe foi lançado no fim de fevereiro, mas só no dia 11 de março se tornou viral. Primeiro pelo próprio ridículo do clipe (seu vídeo já é o décimo mais comentado na história do YouTube). Depois, com a insistente repetição online, virou motivo de piada: remixes, mashups, colagens e recombinações de toda ordem fizeram a menina se tornar o sucesso que é – dando entrevistas e até fazendo shows! O nível de insanidade é tal que ela não saiu dos trending topics do Twitter desde que entrou pela primeira vez.
Mas o que isso quer dizer? Que a internet aceita qualquer coisa? Que a cultura do século 21 é o sonho do pós-modernista mais ferrenho, em que o conteúdo pouco importa e sim a forma como ela se espalha? Que, tanto faz marca, modismo ou arte, o público só quer consumir e pronto? Aguardem cenas do próximo capítulo: essa história está longe de terminar… Até lá, decore o refrão: “Fun, fun, fun, fun…”
E minha coluna do Caderno 2 de hoje volta ao Charlie Sheen, mas pelos olhos do Brett Easton Ellis.
A queda do império
Charlie Sheen e a era digital
A essa altura do campeonato, você deve estar farto de ouvir falar em Charlie Sheen. O ator aprontou e desaprontou junto à produção do seriado Two and a Half Men, em que interpreta um personagem playboy mal-educado que vive uma vida de lazer e decadência, até que foi demitido. Antes de sua demissão, passou a provocar seus chefes com entrevistas em que jogava toda sua arrogância no ventilador, atirando contra tudo e todos que condenam seu estilo de vida com frases de efeito como “‘Não posso’ é o câncer do ‘acontecer’”, “morrer é para tolos”, além de um bordão que repetia quase como um mantra para suas bravatas: “Winning!”.
Demitido da emissora em que trabalhava, foi comemorar o feito no topo de um prédio, bradando contra todos enquanto agitava um facão e tomava uma bebida de uma garrafa escrita “sangue de tigre”.
Mas isso foi há duas semanas. Na semana passada, o escritor Brett Easton Ellis foi contra a massa que chiava do comportamento de Sheen e comemorou as ações do ator ao dizer que ele, na verdade, é uma “celebridade pós-império”, que dá às pessoas o que eles realmente querem ouvir. E o comparava a Lady Gaga, aos reality shows, ao Facebook e à apresentação de Ricky Gervais no Globo de Ouro deste ano. Mas Ellis não estava falando do império americano, não faz esse tipo de analogia barata.
O “império” em queda seria, no caso, toda a indústria de entretenimento que desmorona, principalmente, graças à internet. É ela que humaniza os ícones, destrói barreiras, conecta pessoas sem que elas precisem de um guia como antes. Em outras palavras, Charlie Sheen também é um ícone da era digital.
Telefone sem fio
Japão, CNN, Twiiter e o Godzilla
No dia da maior tragédia no Japão desde o fim da Segunda Guerra Mundial, um dos trending topics do Twitter era Godzilla. Mas olha como o monstrengo foi parar lá. Como é típico das emissoras de notícias em situações dessa proporção, a programação da rede CNN dedicou-se a comentar o acontecimento com todos os tipos de entrevistados. E um deles comparou a destruição do terremoto e do tsunami ao cenário de um filme de monstro. O telefone sem fio começou quando alguém ouviu a frase sendo dita na TV e perguntou no Twitter se a CNN havia feito alguma piada envolvendo o Godzilla.
Foi o suficiente para que milhares de seguidores da rede começassem a reclamar da falta de tato da apresentadora que estava no ar no momento, Rosemary Church. E, em poucas horas, ficou parecendo que o canal de notícias estava ironizando a tragédia. Prontamente, os responsáveis pela área digital da emissora anunciaram via Twitter que estavam checando para ver se aquilo havia sido dito mesmo e, logo depois, avisaram que era só um grande mal-entendido. Mas deve ter gente até hoje achando que a CNN pegou pesado demais…
Minha coluna no 2 foi sobre o veículo de lançamento do novo single do Camelo.
A nova do Camelo
O YouTube é o novo rádio?
Como você ficava sabendo de uma música nova há uns dez anos? Muito provavelmente, pela rádio. Ou, se a música em questão não fosse tão popular, você esperaria o lançamento do disco e o compraria na loja. Mas em dez anos, graças à internet, muita coisa mudou. Rádios e lojas de discos continuam por aí, mas não são mais a forma exclusiva – ou pelo menos, não mais a primeira alternativa – para quem quer conhecer algum artista novo. Veja o que aconteceu nesta semana.
Marcelo Camelo, ex-vocalista do grupo carioca Los Hermanos, lançou seu primeiro disco solo em 2008 – um disco hermético e pouco pop, como se o compositor quisesse fugir da aura popular que sempre pairou sobre sua banda. Rodrigo Amarante, o outro vocalista do grupo, saiu pela tangente e montou o Little Joy com integrantes de outras bandas, incluindo o baterista dos Strokes, o brasileiro Fabrício Moretti. Sem a necessidade de fugir do clima pop dos Hermanos, o Little Joy parecia comemorar os prazeres da vida sem se preocupar com o que os ouvintes iriam dizer.
E isso criou uma expectativa: será que o próximo disco de Marcelo Camelo teria alguma influência de Little Joy? Será que Marcelo teria percebido que não precisava se preocupar tanto com o que as pessoas iriam pensar do seu trabalho e voltar a fazer música fácil?
Outro fator que influenciava essa nova fase de Camelo era o fato de ele estar namorando a pequena Mallu Magalhães, cantora revelada na internet com atributos pop que eram inevitavelmente influenciados pela banda do atual namorado, embora não diretamente. Será que a convivência com Mallu fez Camelo soar mais leve?
A partir da simples Ô ô (é, o nome da música é só isso), tudo indica que sim. A novidade, no entanto, não está apenas no fato de a música corresponder às expectativas do ouvinte que esperava algo mais pop e tranquilo. Mas sim o fato de Camelo ter escolhido a internet para lançar sua canção. Mais do que a internet, o YouTube. E em vez de simplesmente lançá-la, optou por apresentá-la aos poucos, com pequenos vídeos com poucos segundos da faixa, que começaram a ser postados na segunda-feira passada.
Dez segundos em um dia, 10 em outro, mais 10 na quarta-feira e na quinta-feira Ô ô era revelada integralmente. Os fãs, claro, amaram. Mas, mais do que agradar aos fãs, Camelo fez que sua nova música atingisse um público que, de outra forma, levaria mais tempo para ouvir a nova canção.
Sinal dos tempos. O YouTube é um dos principais veículos de comunicação de nossa época e muitos o utilizam como continuação da televisão (não deu para assistir ao Jô ou ao jogo no dia anterior? Alguém já subiu no YouTube, no dia seguinte), e mais gente ainda, como rádio. Sim, há muita gente que escuta música no YouTube. E Camelo sabe disso.
Minha coluna no 2 de hoje pega o gancho do Oscar para falar de TV e internet.
Televisão social
Hoje todos veremos o Oscar juntos
A TV já foi o centro do lar e agregadora de atenções. Sua ascensão, após a Segunda Guerra Mundial, fez com que o momento de união da família, antes à mesa ou na missa, mudasse para a sala de estar, ao redor da luz branca dos raios catódicos. Mas, como já disse aqui em outras oportunidades, a TV deixou de ser o centro das atenções à medida que o computador foi ganhando espaço dentro da casa. Primeiro veio um, que era de uso da família. Depois ele começou a aparecer no trabalho e logo foi para outros cômodos, tornou-se portátil e, se não chegou a deixar a TV em segundo plano, conseguiu tirá-la do foco central doméstico.
E isso fez muitos se perguntarem se o computador estaria matando o aspecto social da TV, em que famílias e amigos se reúnem em frente do aparelho para discutir a novela, o jogo ou o programa da vez. O Oscar, cuja cerimônia de premiação será exibida hoje para todo o mundo, era um desses eventos.
Era? Em tempos de redes sociais, pode até ser que as pessoas não façam mais festas para assistir ao programa num mesmo cômodo. Mas não há nenhuma dúvida de que a audiência global do programa estará com um olho na TV e o outro no monitor ou na telinha do smartphone. As pessoas podem não estar mais virando para o lado e comentando o vestido da tal atriz, a piada sem graça do apresentador tal ou a bobagem que o dublador traduziu errado. Mas estão falando isso para todo mundo, no Twitter, no Facebook, em blogs, comentários de sites ou de trechos de vídeo que vão parar no YouTube antes mesmo de o programa terminar.
Foi assim com o enterro do Michael Jackson e no Grammy, é assim em qualquer grande jogo de futebol ou no Big Brother. E vai continuar sendo assim… até o dia em que a televisão se misturar com a internet de vez.
E aí temos uma boa resposta para uma das questões que mais afligem produtores de conteúdo e veículos de comunicação. Os blogs serão mais importantes do que os jornais? O YouTube já é mais importante do que a TV? A mídia tradicional será suplantada pela social?
Tudo indica que não. Que ambas plataformas se misturarão num ambiente em que a grande mídia pauta uma conversa que se desdobra num diálogo que segue na audiência. E daqui a pouco teremos telinhas de chat no canto da TV, tweets aparecendo embaixo da imagem principal e links pra Wikipedia para descobrirmos quem é aquele tal ator. E a TV vai ser mais social do que jamais foi.
A minha coluna no 2 de ontem foi sobre o The King of Limbs, e mesmo tendo sido fechada antes do lançamento do disco, na sexta, não invalida o que foi publicado ontem.
Sem medo de ousar
Radiohead e o artista do século 21
Aconteceu de novo, na semana passada. Depois de mais de três anos do lançamento de seu disco mais recente, In Rainbows, o grupo inglês Radiohead pegou todo mundo de surpresa ao anunciar, na segunda-feira, que seu novo disco estava pronto e seria apresentado ao mundo em menos de uma semana. Foi exatamente como aconteceu em 2007. Na época, o Radiohead começou a postar notícias cifradas em seu site para, em menos de uma semana, anunciar que tinha disco novo pronto e que ele seria lançado online em menos de uma semana. Não bastasse isso, o grupo liderado por Thom Yorke ainda ousou ao propor que o próprio público dissesse quanto gostaria de pagar pelos MP3 – mesmo se não quisesse pagar nada.
Corta para 2011 e o anúncio de The King of Limbs foi feito igualmente no susto. A grande diferença, no caso, foi que desta vez a banda não perguntou quanto valia a obra. E propôs preço para o disco ainda inexistente: US$ 9. Além da versão digital, a banda também avisou que lançaria uma edição “física” do álbum, que incluiria, além do CD, dois discos de vinil, cartões e “625 pequenas obras de arte”, seja lá o que isso queira dizer. Também anunciou que o disco talvez fosse o primeiro “álbum-jornal” do mundo, também sem explicar nada sobre o que seria isso. Quem comprar a versão não digital teria de desembolsar US$ 48, preço de envio incluso, e esperar para recebê-lo a partir do dia 9 de maio.
Até o fechamento desta coluna, o álbum ainda era um mistério, mas é bem provável que hoje, pleno domingo, você já tenha lido as primeiras impressões sobre ele e talvez já o tenha até ouvido. Mas mesmo que você nem saiba o que é Radiohead (na minha nada modesta opinião, a melhor banda do mundo hoje, ponto final), saiba que eles são os pioneiros e talvez o maior nome entre os grandes do entretenimento mundial na forma de lidar com o mercado digital.
Basicamente porque eles não têm medo de experimentar. E não só musicalmente. Há uma reclamação constante de que para o Radiohead é muito fácil fazer isso, uma vez que a banda surgiu e cresceu nos tempos em que as grandes gravadoras mandavam no que deveríamos ouvir. Mas eles poderiam simplesmente continuar vendendo seus discos sem nenhuma novidade. Ao contrário, eles não apenas abraçam a novidade como não têm medo de ousar.
E sabem que, para o artista do século 21, arte e mercado têm de ser vistos como se fossem a mesma coisa.
Minha coluna no Caderno 2 ontem foi sobre o Twitter em 2011…
O último ano do Twitter?
O passarinho azul subiu no telhado – e parece que vem outra bolha por aí…
Tweets, trending topics, retweets, seguidores, hashtags, unfollow, #FF, @username… Toda essa terminologia já era conhecida de um punhado de usuários do Twitter antes da explosão da rede social, em 2009. Em 2010, o mundo inteiro abraçou o site – até mesmo o Brasil, tradicionalmente acostumado a uma vida digital paralela à do planeta, entrou na rede em grande estilo, emplacando vários termos e hits nacionais para o resto do mundo. Mas se em 2010, o Twitter indicava ter embalado num crescimento que parecia não ter volta, 2011, no entanto, dá sinais que pode ser o último ano da rede social do passarinho azul. Ou pelo menos como a conhecemos.
O Twitter já vinha dando sinais de desgaste no fim do ano passado, quando o tráfego de dados na rede caiu drasticamente em outubro, segundo o site Alexa. Especula-se que a queda só não foi maior pois a rede social foi traduzida para novos idiomas e começou a agregar usuários em países em que ainda não estava presente. A queda de audiência poderia estar ligada à nova interface do site, que estreou no segundo semestre do ano passado e desagradou muitos de seus cadastrados.
A crise política no Egito também ajudou o Twitter a ganhar uma sobrevida e pareceu repetir o feito de 2009, quando o site foi crucial nas eleições presidenciais do Irã. Como disse o comediante norte-americano John Stewart à época: “Não foi o Twitter que salvou o Irã. Foi o Irã quem salvou o Twitter”. Não é exagero dizer o mesmo do Egito em relação ao site. Só que o momento é exatamente oposto: em 2009, a rede social ainda não tinha vivido seu grande momento popular.
O principal aviso de que, provavelmente, o passarinho do Twitter pode estar com seus dias contados veio na quinta-feira da semana passada, quando o jornal Wall Street Journal publicou que os executivos da rede social estariam conversando tanto com o Google quanto com o Facebook para tentar vender o site – e teriam ouvido ofertas que pagariam entre US$ 8 e 10 bilhões pelo serviço.
Uma vez comprado – seja por quem for –, uma coisa é certa: o Twitter vai mudar. E, pelo histórico dos dois possíveis compradores, pode até acabar. Mas isso ainda é terreno de especulação.
Mas um número citado pelo jornal chama atenção – o de que a rede, hoje com mais de 150 milhões de usuários, teria sido avaliada em US$ 4,5 bilhões em dezembro. Em menos de dois meses seu preço dobrou? E se lembrarmos que, nesta mesma semana, o blog Huffington Post foi vendido à America Online por mais de US$ 300 milhões, não duvide que estamos às vésperas de uma nova bolha digital, como a de 1999.
Minha coluna no Caderno 2 de ontem foi sobre o jornal do iPad…
Um jornal para o iPad
E o futuro (fechado) da Apple
Na quarta-feira da semana passada, depois de muita especulação, finalmente foi lançado o jornal sem papel imaginado pelo magnata das telecomunicações Rupert Murdoch. The Daily é um jornal que só pode ser lido no iPad. Funciona como uma revista eletrônica diária, cuja diagramação se adapta à forma como se segura o tablet, além de conter conteúdo multimídia, como vídeos, áudio e infográficos em movimento. Cada edição custa US$ 0,14 (a assinatura anual custa US$ 39,99), mas, nos dois primeiros meses, o aplicativo é gratuito para os clientes da operadora norte-americana Verizon.
Mas mais do que uma tentativa de ver como funciona um veículo feito para ser consumido em apenas um tipo de aparelho, a aparição do Daily acontece junto de uma mudança drástica na política comercial da Apple. A empresa agora só permite que se baixe aplicativos gratuitos para seu tablet se isso ocorrer em sua própria loja, a App Store. De graça, agora, só se for via Apple.
É um momento interessante e, talvez, crucial para a sobrevivência do modelo de negócios ao redor do hypado tablet. Não custa lembrar que o iPod, o MP3 player que fez a Apple voltar ao cenário digital no início do século, só foi um sucesso de vendas porque permitia a inclusão de músicas que pudessem ser adquiridas em outro lugar além da loja da Apple. Será que se o iPod só tocasse músicas compradas na iTunes ele seria o sucesso que foi? Acho que não.
Outra nuvem que paira sobre o novo negócio da Apple é a própria presença de Rupert Murdoch, cuja empresa, News Corp., comprou o MySpace por meio bilhão de dólares em 2005. Foi o suficiente para a rede social, então a maior do mundo, começar a desandar. O futuro do MySpace, hoje, é mais do que incerto. Mau agouro?
E quem pode desafiar o poder da Apple e de Murdoch são os próprios usuários, como o norte-americano Andy Bayo, que pegou o conteúdo do Daily e o transformou em um tumblr (http://thedailyindexed.tumblr.com), aberto para quem quiser ler. Sem pagar.
Cara Microsoft
“Queria continuar no Hotmail, mas…”
O rapper Dan Bull ficou conhecido no fim de 2009 quando fez uma carta aberta em forma de vídeo à cantora Lily Allen reclamando do fato de ela ter sido descoberta na internet e na época se voltar contra os downloads ilegais. O alvo da nova missiva musical do norte-americano agora é a Microsoft. Num longo e-mail cantado, ele reclama que a empresa só dá passos errados hoje em dia.
Minha coluna de ontem no 2 ainda seguiu falando da vinda do Wozniak ao Brasil.
Amigos digitais
O pai do PC e o futuro de sua invenção
Há uma semana, terminava a quarta edição da Campus Party, maior evento de cultura digital do País, e sua principal atração, mesmo com as presenças do ex-vice-presidente norte-americano Al Gore e do inglês Tim Berners-Lee, conhecido como o “pai da web”, não dá para dizer que nenhum deles chamou tanta atenção quanto o bonachão Steve Wozniak. Ele foi o criador do computador pessoal como o conhecemos (do formato monitor-teclado-mouse-gabinete) e foi cofundador da Apple – o grande trunfo de Steve Jobs foi perceber que poderia vender a invenção de Wozniak para o público em geral.
Sua palestra foi a mais disputada de todo o evento – e não era para menos, afinal os participantes da Campus Party se espelhavam em sua trajetória: um nerd sem vida social que, enfurnado em seu quarto e com uma ideia na cabeça, conseguiu mudar o mundo como o conhecemos e virar uma lenda viva. Grande parte de sua apresentação consistiu nisso: uma grande palestra de autoajuda em que Wozniak elegeu valores não convencionais no mundo dos negócios como o motivo para seu sucesso. Falou em trabalhar apaixonadamente, em alçar metas que os outros consideram impossíveis e no papel que o bom humor, a transgressão e a brincadeira têm na vida de pessoas que são consideradas geniais. Foi ouvido em silêncio quase solene, interrompido por risadas cúmplices e suspiros de admiração. Estava em casa, afinal.
Pouco antes de sua apresentação e da coletiva oferecida para o resto da imprensa, pude entrevistá-lo e, em vez de jogar a conversa para seu passado, preferi conduzir a conversa para o futuro de sua invenção.
Comecei o papo com a mesma argumentação que defendo aqui há duas semanas – de que aparelhos como o iPad e o Kinect estão mais próximos de degraus rumo ao futuro do computador pessoal do que de aparelhos que estarão em nossa rotina num futuro próximo. Ele concordou e disse que o que ambos aparelhos trazem de novidade diz respeito justamente à interação entre homem e máquina, mais do que novos tipos de produtos. E falou que, no futuro, eles lidarão com computadores como se fossem outras pessoas. “Se tornará bem difícil saber se você está lidando com um computador ou com uma pessoa de verdade”, profetizou.
Exagero? Pode parecer, mas quem diz isso não é um futurólogo ou um provocador, mas o sujeito que, nos anos 70, imaginou que os computadores, geringonças que ocupavam quartos inteiros nas décadas anteriores, seriam utilizados por qualquer pessoa, em casa. E se lembrarmos que boa parte da internet já funciona a partir de uma inteligência artificial bem diferente daquela que vimos nos filmes, não é difícil imaginar que, como o próprio Woz acha, teremos amigos digitais nas décadas a seguir.
Minha coluna de ontem no Caderno 2 foi sobre as mudanças de chefia no Google e na Apple.
Terreno movediço
Executivos no mercado digital
A semana passada foi agitada no mundo digital – e nem estou falando da Campus Party, maior evento relacionado à tecnologia do País, que começou segunda e termina hoje – e sim da súbita saída de dois nomes fortes da indústria eletrônica. Primeiro foi Steve Jobs, o pai da Apple, que pediu licença de saúde mais uma vez na segunda-feira, fazendo as ações de sua empresa caírem. E no fim da quinta-feira, o CEO do Google, Eric Schmidt, anunciou que deixaria o cargo que assumiu em 2001, deixando a vaga para um dos criadores do site, Larry Page.
As duas saídas não seriam motivo de alarde caso a área de atuação das duas empresas não fosse um mercado tão novo. Executivos vêm e vão de empresas, essa é a natureza desse tipo de cargo. Mas quando se fala do mercado de computadores e da internet as coisas não são tão certas assim – e o terreno movediço da indústria digital ainda não conhece cabeças aptas a pular de empresa para empresa.
A saída de Jobs é um ótimo exemplo. É a segunda vez que ele deixa o cargo por motivos de saúde. Mas, no início dos anos 1990, ele não saiu da Apple – e sim “foi saído”, como dizem. O conselho da empresa que criou simplesmente o demitiu. Sem emprego, Jobs foi bater na porta da novata Pixar, um estúdio de animação digital que estava tentando fazer seu primeiro longa-metragem. Ajudou o estúdio de John Lasseter a lançar o primeiro Toy Story e a se firmar como a principal grife no cinema de animação. Enquanto isso, sem Jobs, a Apple patinou tanto a ponto de ter de chamá-lo de volta para o cargo, no fim do século passado. Em casa, começou a pôr sua cabeça para funcionar e criou, na sequência, o iPod, a loja iTunes, o iPhone e o iPad. Seus sócios agradecem.
Outro executivo que saiu e não voltou foi Bill Gates, que fundou a Microsoft e a transformou em uma das empresas mais sólidas no mundo digital do século 20. Em 2006, ele anunciou que sairia da empresa para cuidar de sua fundação de caridade. Desde então, a Microsoft – sinônimo de computadores há até dez anos – foi perdendo a importância cada vez mais.
Qual é o problema? Esse mercado é muito novo e os executivos não se guiam por modelos de negócio estabelecidos. Quando entrevistei o escritor e articulista Bruce Sterling no fim do ano passado, conversamos sobre esse assunto. E ele disse que as empresas digitais ainda são muito presas ao culto à personalidade de seus criadores. “Se Steve Jobs morrer, a Apple morre com ele”, alfinetou.
Essas mesmas empresas sofrem com o fato de que seu negócio pode, em anos, deixar de existir. Vide o MySpace, que era o gigante das redes sociais até outro dia e está às vésperas de fechar suas portas. Não duvide se o destino de Google e do Facebook também for parecido. Na economia digital, tudo que parece sólido apenas parece sólido.
E na minha coluna do Caderno 2 ontem continuei falando sobre porque eu acho que o iPad é só uma fase.
O futuro da televisão
E o que o celular tem a ver com isso
Na coluna da semana passada, falei sobre como os tablets dominaram a Consumer Eletronics Show (CES), maior feira de tecnologia para o consumidor do mundo, que acontece sempre em janeiro, em Las Vegas, nos EUA. Dizia que, por mais que o sucesso do iPad abrisse uma nova linha de produtos tecnológicos (lançados às pencas em Las Vegas), não seria o substituto do computador – seja desktop ou notebook – como o conhecemos.
Houve quem discordasse com veemência. Fãs da Apple têm dessa mania: se foi feito por Steve Jobs é o certo, correto e não tem por que discutir. Discuto, pois acho o iPad muito grande para a geração digital que hoje já se comunica mais com o celular do que com o computador. Mas um dos motivos que me fazem crer que o iPad é só um aparelho intermediário e não o computador do futuro parte de outras duas novidades que também foram atrações na CES da primeira semana de 2011.
Além de quase todas as principais empresas de tecnologia lançarem seus tablets, as outras duas atrações da feira foram novos modelos de smartphone e as chamadas “smart TVs”. Os novos celulares foram apelidados de “super smartphones” devido a um novo tipo de processador interno, que permite que esses aparelhos tenham um desempenho que os deixa mais próximos dos computadores atuais do que dos smartphones que estão no mercado.
As TVs inteligentes levam esse adjetivo pois se conectam com a internet e permitem um tipo de interação própria da rede na programação, um recurso que não só é inédito como vai de encontro à natureza da TV.
Explico: por décadas, a televisão se firmou como um dos principais aparelhos na casa das pessoas. Começou a ser desafiada a partir dos anos 80, com a chegada do computador, mas só na década seguinte passou a disputar as atenções familiares. Com a internet, o computador deixou de ser uma estação isolada de entretenimento e trabalho para assumir o papel de meio de comunicação.
E aí a TV começou a ser vilanizada. Enquanto o computador era festejado por permitir a interação, o diálogo, a colaboração e a participação, o televisor era tido como um aparelho que estimulava a passividade, o tédio e a apatia. Até a postura das pessoas frente às duas máquinas foi usada como metáfora para o que ambos faziam com seus usuários: o computador fazia o sujeito se inclinar para frente, como se o puxasse para dentro do monitor; a TV o largava para trás, deitado no sofá.
Isso começa a mudar com essas TVs que se conectam à internet, que ainda estão em sua infância. Online, a televisão corre o risco de recuperar sua posição central na casa – ou pelo menos de tirar esse trunfo do computador. É difícil apostar que ela volte a se tornar o principal aparelho do lar justamente por causa da evolução dos smartphones. São eles que vão fazer a ponte entre o lar e a rua, a TV gigante na sala e o conteúdo que você quer levar no bolso – o celular funcionando como uma espécie de versão em miniatura e acessório inteligente do aparelho principal. E é aí que o tablet – seja da Apple ou não – fica sobrando.