Mallu ao vivo
Blogando vida e obra
“Último dia de mixagem. Terminamos Moreno do Cabelo Enroladinho e fizemos Lonely. Amanhã é o dia de refazer o que falta ou precisa. Temos uma ou duas prioridades, mas estamos contentes com o resto. Acho que estou prestes a sofrer aquela tristeza do pós-disco… Aquele vazio, aquela insegurança… Preciso arrumar o que fazer… Acho que vou inventar de gravar uns clipes.”
Assim Mallu Magalhães chega aos finalmentes de seu terceiro disco, num post em seu blog publicado na sexta passada, resumindo o dia anterior. “Dia 27 de julho de 2011… #54 em estúdio” é o título do post, um dos muitos em que, em seu site, mallumusic.com, descreve o diário da gravação do novo álbum.
Mas não apenas um diário de gravação. É o diário de Mallu. É um blog no sentido mais essencial do formato. Não são notícias, informações que poderiam render notinhas ou análises sobre qualquer conjuntura atual. São pequenas epifanias caseiras, recortes de um cotidiano íntimo, às vezes pessoal demais, que transbordam para a internet. No mesmo post em que comemora e lamenta o fim do processo de gravação, ela divaga: “Enquanto Victor (Rice, técnico de som do disco) timbrava os últimos detalhes de Moreno do Cabelo Enroladinho, eu bordava numa das aquarelas que havia pintado ontem. E um feixe de luz colorido veio banhar minha obrinha. Não demorou, Vic ficou também impressionado e sugeriu novas posições. Fotografei o tal arco-íris nos meus pés, cabeça e à minha volta. Só pode ser um bom e lindo sinal de alegria para o Pitanga.”
Muita gente torce o nariz, acha forçado, acha fake, acha bobo. “Haters gonna hate”, repete o meme-mantra da internet que pode ser traduzido como “sempre vai ter alguém que odeie”. E Mallu, coitada, sempre foi alvo desses ‘haters’. Desde que surgiu empunhando seu violãozinho aos 15 anos, cantando Dylan e Johnny Cash com sua vozinha frágil e virou um dos melhores exemplos brasileiros de uma artista que usou a internet para se estabelecer, ela é alvo de brincadeiras, chacotas, paródias e pragas. As coisas não melhoraram quando ela começou a namorar Marcelo Camelo – outro que, ainda nos Los Hermanos, cansou de ser vítima da fúria de um público xingando tudo confortavelmente nos computadores de casa. Juntos viraram motivo para piadas de toda a sorte – algumas boas, a maioria bobas. Mas não os abalou.
E, mais que isso, não abalou Mallu. Prestes a completar 19 anos, ela deixa o mesmo ar lúdico de suas letras e melodias invadir seu blog, abrindo seu coração e mente sem medo de se expor ao ridículo. Ela não bloga porque ajuda no marketing, porque o empresário pediu ou porque cai bem com o público. Não que esses motivos não existam, mas ela mantém o blog pelo mesmo motivo que faz música: é natural para ela. Portanto, como reza outro mantra online, “deal with it” (“lide com isto”).
A minha coluna no Caderno 2 de ontem foi sobre os três bate-papos que realizei na Expo Y, semana passada.
O papel da opinião
O que é importante na internet
A velocidade e o excesso de informações da era digital tira o prumo de muita gente, tanto de quem começa a correr atrás de qualquer pequena novidade ao menor movimento quanto para quem se fecha completamente para o que se passa entre computadores e celulares. Talvez justamente por isso a opinião se torne um dos valores mais prezados desta época.
Por um lado, parece que todo mundo tem a obrigação de ter opinião sobre qualquer assunto – e, claro, usá-la nas caixas de comentários de blogs, redes sociais e outros ambientes virtuais. Por outro, os assuntos também vão ficando cada vez mais repetitivos e parecidos, caindo no problema indicado pelo escritor norte-americano Eli Pariser em seu livro The Filter Bubble. Ele alega que, à medida que as pessoas só querem falar sobre os mesmos assuntos de sempre, acabam se fechando nos temas de sempre e, aos poucos, fogem dos debates que interessam à sociedade.
Daí a importância de se ter opinião e de valorizá-la. Esse foi o tema debatido nas três entrevistas que fiz, em nome do caderno que edito, o Link, durante o evento Expo Y, que ocorreu na semana passada, no Pavilhão da Bienal, em São Paulo.
Para conversar sobre o assunto, chamei três nomes que já se tornaram referência em suas áreas: Bia Granja, organizadora do festival de internet YouPix, Tiago Dória, do blog que leva seu nome, e Carlos Merigo, editor-chefe do blog Brainstorm9. Cada um deles se tornou autoridade nos assuntos com que lidam diariamente, em seus veículos. O YouPix, de Bia Granja, começou como uma revista e se tornou o maior evento de cultura de internet no Brasil (ela faz questão de frisar a diferença entre “cultura de internet” e “cultura digital”. O Tiagodoria.com era um blog de links interessante que, aos poucos, foi começando a falar de suas principais áreas de interesse – comunicação e tecnologia – e em menos de uma década se tornou uma das principais referências online sobre as transformações que acontecem no jornalismo com a chegada das mídias digitais. Caminho parecido com o traçado por Merigo, que se especializou em publicidade, sua área de atuação.
Os assuntos abordados foram os mais diversos dentro de suas áreas, mas todos chegaram a um mesmo consenso: que não adianta ter opinião sem ter responsabilidade sobre ela, que ser transparente e franco é uma obrigação e que é preciso respeitar o leitor e que isso não necessariamente quer dizer publicar o que ele quer ler, mas também o que ele nem sequer imagina que quer ler. Valores que já tinham sido estabelecidos no mundo offline e que, aos poucos, começam a fazer a diferença também online.
E a minha coluna no Caderno 2 de domingo foi mais sobre o Google +, que ainda foi destrinchado nessa edição tanto pela Tati, quanto pelo Tom Anderson e pelo Asta. A minha parte segue abaixo, a deles, nos links.
Mais uma rede social?
O Google + não é só isso…
“Fulano de Tal te convidou para participar do Serviço Xis.” Esses avisos pintam a toda hora no e-mail. Alguém entrou em alguma novidade da internet, se cadastrou e enviou convite para uns conhecidos. E aí chega o convite na sua caixa postal. No começo era só um Orkut ali, um Last.fm acolá, um MySpace mais adiante, mas depois de alguns anos, os convites para novos serviços – principalmente para novas redes sociais – começaram a se tornar frequentes. Foursquare, Facebook, LinkedIn, Twitter, StumbleUpon e tantos outros sites ou aplicativos para celular ou joguinhos (tanto originais quanto clones brasileiros copiados toscamente) que mandam mensagens robóticas e monotemáticas que, quanto mais chegam, mais parecem meros e-mails de spam, fazendo propaganda de um produto que não queremos comprar – nem de graça, não insista.
Até que, há pouco mais de duas semanas, enquanto desfrutava minhas férias, outro convite apareceu. Chamava para o Google + (Plus), nova tentativa do maior site do planeta de domar a movimentação social da rede.
Não era a primeira vez. Começou antes de todo mundo, inclusive, ao lançar o Orkut, mas os Estados Unidos estavam muito ocupados com a primeira rede social a fazer sucesso por lá (o Friendster) e não deram bola. Os brasileiros não tinham nada parecido e invadiram geral. Em poucos meses, havia mais brasileiros do que norte-americanos por lá. E o Friendster começou a perder audiência para o então novíssimo MySpace, que se tornou a maior rede social daquele país para logo depois se tornar a maior do mundo. Depois veio o Facebook que enterrou o MySpace (que foi vendido, também durante as minhas férias, por US$ 35 milhões, menos de um décimo do preço que custou quando foi comprado pela News Corp. a US$ 580 milhões, em 2005). Mas isso é outra história.
Enquanto MySpace e Facebook dominaram a segunda metade da década passada, o Google tentou comer uma fatia desse mercado, em vão. Lançou o Google Wave, um serviço que transformava o e-mail em um enorme bate-papo contínuo, com uma interface poluída e caótica. Depois correu atrás do Twitter, ao inventar o Google Buzz, e se envolveu em processos de invasão de privacidade. E aí surge esse Google + e todo mundo suspira achando que “putz, lá vem outra tentativa do Google para barrar o Facebook…”.
Mas engana-se quem acha que o Google + s é só uma rede social. Apesar de parecer reunir elementos de sites já estabelecidos (ele tem o fluxo de informações do Facebook, uma área de trending topics como a do Twitter, entre outros), o novo site não é, propriamente, um novo serviço. Ele apenas concatena as diversas arestas do site (Gmail, Google Docs, Agenda, fotos e posts – já anunciou que mudará o nome do Picasa e do Blogger) e cria um ambiente em que seus serviços possam funcionar de forma integrada. É um passo importante para o Google fugir da possibilidade de virar uma nova Microsoft (uma empresa gigante, com muitas áreas diferentes, que mal conversam entre si) e de continuar fazendo sentido num mundo que poderia, aos poucos, deixar de precisar dele. Ao que tudo indica, vai funcionar: em menos de um mês, o novo site já tem 10 milhões de usuários. E correndo o risco de dobrar esse número na semana que vem. Não é pouco.
Minha coluna no Caderno 2 de ontem foi sobre o novo livro de Simon Reynolds.
Cultura reciclada
O pop vai comer a si mesmo?
A história da cultura pop também é a história de uma cultura que se inventa e reinventa a partir de si mesma. Sempre foi assim. Escolha o início desta cultura que lhe convier (não há consenso sobre qual é o começo específico desse tipo de abordagem da cultura) e os conceitos de criação e recriação se misturam constantemente.
Exemplos? Arthur Conan Doyle foi tachado de simplificar os contos de Edgar Allan Poe e transformá-los em uma fórmula ao criar Sherlock Holmes, no final do século retrasado. Matou o personagem em um livro e deixou seus leitores de luto – a ponto de surgir uma campanha pela volta do personagem na forma de bandanas pretas amarradas aos braços.
Outro: quando os EUA entraram em crise após o crash da bolsa de 1929, uma das formas de manter a população entretida foi o incentivo do consumo de itens ou serviços que custavam muito pouco. Foi preciso que toda uma indústria fosse inventada a partir de amostras de manifestações culturais já existentes. Foi assim que o teatro foi mastigado para virar o cinema como o conhecemos hoje; que a música popular tornou-se o principal gênero musical do novíssimo mercado fonográfico (que começou apostando na música erudita); que a literatura pulp, as revistas e os quadrinhos floresceram nas bancas de jornais.
Mais um: quando começaram, os Beatles eram apenas fãs de música norte-americana e não faziam distinção entre soul music, rhythm’n’blues ou country. Consumiam tudo como cultura americana e misturaram todos esses gêneros naquilo a que hoje chamamos de rock. Os próprios Beatles são protagonistas de outro momento tido como marco zero desta cultura, quando conheceram Bob Dylan pessoalmente e a admiração mútua mudou suas carreiras: os Beatles começaram a ficar mais sérios e intelectualizados enquanto Dylan abandonou as canções de protesto e empunhou uma guitarra elétrica.
São inúmeros exemplos que corroboram a tese do novo livro do renomado escritor e ensaísta inglês Simon Reynolds, Retromania: Pop Culture’s Addiction to Its Own Past (sem previsão de lançamento no Brasil). Mas seu foco não é a história da cultura pop, e sim seu passado recente. Ele concentra-se na onipresença da web e na era de consumo desenfreado que vivemos, em que assistimos a filmes sendo refeitos, músicas sendo remixadas, discografias relançadas em caixas suntuosas, artistas tocando discos antigos na íntegra ao vivo e o YouTube se tornando um enorme arquivo com tudo do século passado. E o livro instiga uma reflexão: será que vai chegar uma hora em que a cultura não terá nada novo – e apenas se repetirá? Acho exagero, mas é uma boa pergunta.
Minha coluna no Caderno 2 foi, mais uma vez, sobre Super 8, J.J. Abrams e Spielberg.
J.J. Abrams & Spielberg
…e o futuro do cinema
Super 8, o novo filme de J.J. Abrams, estreou na sexta-feira passada nos EUA. É um momento decisivo tanto para sua carreira quanto para a de Steven Spielberg, que produz o filme. Para Abrams, a expectativa diz respeito à primeira incursão do diretor e produtor no cinema em um título próprio. J.J. é conhecido como Midas da TV graças à sequência de seriados bem-sucedidos que produziu: Felicity, Alias, Lost e Fringe. Mas, no cinema, só dirigiu dois filmes, o terceiro Missão: Impossível e a nova versão para o cinema da série Jornada nas Estrelas. Não havia dirigido nenhum filme cuja ideia original fosse sua, até agora.
Spielberg, por outro lado, tem outro tipo de preocupação. Diretor que se firmou ao reconectar o público de cinema com uma audiência adolescente, à medida que foi se estabelecendo como diretor, começou a ir rumo a assuntos sérios, o que lhe rendeu alguns Oscars que não fossem de efeitos especiais. Mas ao remoer lembranças de guerra e conflitos judeus, deixou de lado a diversão e o entretenimento puros e simples. Tentou retomá0-los ao voltar à ficção científica no início do século, visitando Kubrick (Inteligência Artificial), Philip K. Dick (Minority Report) e H.G. Wells (Guerra dos Mundos), mas sem conseguir vincular-se a um público mais jovem. Só conseguiu recuperar isso ao produzir os filmes de Michael Bay (especialmente Transformers), mas sua marca não era percebida como assinatura.
Até que J.J. Abrams resolveu fazer uma homenagem ao ídolo e o chamou para esse tal Super 8. Abrams, que é conhecido por empilhar referências em suas obras, resolveu transformar o filme em uma grande ode ao cinema de Spielberg, especificamente à sua filmografia nos anos 80.
E, como é do seu feitio, Abrams não deixou barato e levou seu novo filme, mesmo antes do lançamento, a diversas mídias diferentes – colocou gente para montar um curta a partir de pedaços soltos pela web e até a criar uma HQ que seria concluída pelo público.
As primeiras impressões sobre o filme não são suficientes para tentar prever algum sucesso, mas tudo indica que Spielberg e Abrams conseguiram alcançar o que estavam tentando: uma história fantástica, um thriller de ficção científica e uma fábula pré-adolescente.
Mas a premissa inicial de Super 8 – em que uma turma de jovens brinca de fazer cinema e, sem querer, filma algo que não devia – parece ser outra homenagem de Abrams, desta vez a uma previsão de Francis Ford Coppola, em uma entrevista dada nos anos 70: “Um dia, uma gordinha em Ohio será o novo Mozart e fará um lindo filme com a câmera portátil de seu pai e quando isso acontecer todo esse profissionalismo em relação a filmes será destruído para sempre e o cinema se tornará uma arte”. Ainda não chegamos lá, mas será que um dia chegaremos? Super 8 chega ao Brasil apenas em agosto.
Minha coluna no Caderno 2 desse domingo fala sobre o fato da DC ter dado um boot em sua cronologia – pra sobreviver na era digital. Será?
Dilema digital
Quadrinhos no século eletrônico
A encruzilhada digital é implacável. Indústrias estabelecidas no século 20 graças à cultura de massas penam, no novo século, para se adaptar a uma realidade que celebra a cultura do nicho. Mais que isso, numa cultura digital, em que tudo pode ser copiado e reproduzido sem que o autor tenha controle da distribuição, fica cada vez mais complicado gerir um negócio que lide com a produção de conteúdo feita para milhões de pessoas.
A indústria do disco sentiu isso na pele ao servir de boi de piranha digital quando assumiu o papel de primeiro antagonista da web e processou quem baixava MP3 sem pagar. Hollywood sente dolorosamente essa mudança, quando o download de filmes via torrent a obrigou a apostar em superproduções e em novas tecnologias, como as salas Imax e 3D. Emissoras de TV do mundo inteiro veem suas programações escoarem para fora da grade rumo ao YouTube.
Música, cinema e TV estão sempre nas notícias quando se fala nesse assunto, mas uma indústria que é a cara do século 20 e está quase sempre à margem dessa discussão vem penando para retomar sua importância na era digital: os quadrinhos.
E quando se fala em indústria dos quadrinhos, dois nomes se destacam: Marvel e DC, editoras que criaram o conceito de super-herói moderno. A primeira tem se mexido drasticamente para continuar relevante nos dias de hoje, principalmente longe das revistas. Seu principal feito foi se transformar em estúdio de cinema para levar seus personagens para um público que não lê páginas em papel. A Marvel também pulou no iPad na primeira hora, criando um dos aplicativos mais festejados logo que o tablet apareceu. Mas a conta ainda não fechou – e a Marvel continua em busca de alternativas para fazer suas histórias em quadrinhos sobreviverem no século 21.
Sua principal rival, a DC, começou a se mexer de verdade na semana passada, quando anunciou que iria zerar sua linha de super-heróis e recomeçar a contagem de suas revistas, todas com um novo número 1. Não é a primeira vez que a editora que inventou o Super-Homem e o Batman tenta isso. Nos anos 80, conseguiu reiniciar seu universo com a saga Crise nas Infinitas Terras, em que permitiu que seus heróis pudessem fazer sentido no fim do século passado.
O novo reinício mira no digital. Além dos novos números 1, a editora deverá publicar, digitalmente, as mesmas histórias exatamente no dia em que elas chegam às bancas. O preço deverá ser mais barato que o das versões impressas, pois a editora quer que seu novo público volte para o papel uma vez que sentir o gosto dos novos títulos online.
Mas isso pode dar bem errado, já que, assim, eles podem matar um de seus principais redutos, que são as lojas de quadrinho – como a música online fez com as tradicionais lojas de disco. A estratégia trará novos leitores se der certo. Mas se der errado, pode afugentar até os velhos. Ninguém disse que seria fácil.
Minha coluna no Caderno 2 de domingo foi sobre os 20 minutos de Super 8 que assisti na semana passada, mas depois eu esmiuço isso melhor por aqui.
Super 8 vem aí
J.J. Abrams ataca mais uma vez
J.J. Abrams ataca de novo. Nem bem encerrou em grande estilo a terceira temporada de um dos seriados que produz – Fringe – e anunciou o lançamento de nova série no ano que vem – Alcatraz, de novo em uma ilha –, o produtor de Lost começa a concentrar esforços em seu grande projeto de 2011: Super 8. É seu terceiro filme na direção e, mais do que isso, sua primeira parceria com um de seus ídolos, Steven Spielberg, que produz o filme.
Quando lançou o primeiro trailer no ano passado, em um minuto e meio de imagens, fãs de Abrams e Spielberg conseguiram achar pistas que uniam tanto as produções de J.J. quanto as de Steven.
No mês passado, alguns veículos no exterior receberam caixinhas da Kodak com rolos de filmes que continham apenas alguns segundos de um misterioso comunicado confidencial do governo norte-americano. Fazia parte do início da estratégia de divulgação do filme. O curta tinha sido picotado em pedaços minúsculos e espalhado para diferentes lugares, na esperança de que os fãs reunissem esses trechos e chegassem à mensagem final.
E, durante o festival de Cannes deste ano, foram exibidos 20 minutos de Super 8, trecho que foi mostrado para a imprensa brasileira na semana passada – e que tive a oportunidade de assistir.
Em duas longas cenas, vemos uma turma de adolescentes brincando de fazer filme minutos antes de assistirmos ao mais espetacular acidente que já foi registrado no cinema. Se você é desses que reclama do alto barulho dos filmes atuais, essa cena não foi feita para você. Explosões grandiosas e pedaços de trem se retorcendo no ar garantem uma visão de cair o queixo de qualquer um que goste de filme de ação ou de catástrofe.
A outra cena mostra o bicho que fugiu do trem (que viria da mítica Área 51, onde teoricamente o governo dos EUA mantém informações sobre vida alienígena) atacando uma loja de conveniência em um posto de gasolina. Em dado momento, a câmera filma o reflexo do monstro no chão, que lembra o protagonista de Cloverfield, outro filme de J.J. Será que ele vai amarrar todas as pontas de sua obra?
Minha coluna no Caderno 2 desse domingo foi sobre o debate que participei na quinta passada.
Mudança inevitável
Crítica musical e internet
Na quinta-feira da semana passada, participei do 3.º Congresso Internacional de Jornalismo Cultural, evento que ocorreu no Sesc Vila Mariana e trouxe nomes como o cineasta alemão Werner Herzog, o filósofo esloveno Slavoj Zizek, a ensaísta norte-americana Camille Paglia e o escritor cubano Pedro Juan Gutiérrez. Estive em uma mesa cujo tema era A Produção Musical Contemporânea e a Crítica Especializada e, comigo, participavam os jornalistas Pablo Miyazawa, editor da versão brasileira da revista Rolling Stone, e Marcus Preto, do jornal Folha de S. Paulo, e o músico Zeca Baleiro.
Muitos podem estranhar a presença de um editor de um caderno de tecnologia – que é o que faço, caso alguém não saiba (edito o Link, publicado todas as segundas-feiras neste jornal) – em uma mesa que se propunha a discutir produção cultural e crítica musical, mas bastou o papo começar para perceber que não dá para dissociar o que está acontecendo tanto em termos de criação quanto de avaliação – artistas e críticos estão sendo igualmente afetados pelo impacto que as mídias digitais (não só a internet, mas principalmente ela) vêm causando em suas atividades.
Pablo falou da dificuldade em falar de lançamentos de discos numa época em que estes aparecem primeiro na internet e depois nas lojas – antes, até mesmo, de chegar aos jornalistas, que, em outros tempos, recebiam os álbuns previamente para que pudessem publicar suas matérias simultaneamente ao lançamento comercial. Zeca Baleiro concordou e disse que a melhor crítica musical feita no Brasil atualmente – e a pior – vem acontecendo longe dos jornais e sim em blogs.
Citei que tive a felicidade – ou melhor, a sorte – de cobrir música na época em que o Napster apareceu, em 1999. O primeiro programa de trocas de MP3 revolucionou a forma como consumimos música até hoje e em menos de um ano depois de seu lançamento, seus criadores já sentavam em bancos de tribunais sendo acusados de ter facilitado a pirataria.
E ao mesmo tempo em que os autores do software eram processados, o Radiohead lançava seu quarto CD, que vinha sendo aguardado devido ao sucesso de seu antecessor, OK Computer. Só que, pela primeira vez na história, aconteceu um fenômeno novo: o disco apareceu na internet meses antes de ter sido lançado comercialmente. Sem refletir, a indústria cravou que o disco seria um fracasso de vendas, pois muitos dos fãs que comprariam o disco já o teriam em casa, em seus computadores, de graça. Para piorar, Kid A, o disco que havia vazado, era experimental e hermético. Mas a indústria errou – e o álbum foi um dos mais vendidos daquele ano, mesmo tendo aparecido gratuitamente antes de ser lançado.
As mudanças que vêm sendo impostas pela digitalização quase sempre são recebidas com ceticismo ou temor, sem que se pense em como os ouvintes – agentes culturais sem nome, mas tão importantes quanto a indústria, a crítica e o artista – vão recebê-las. Por isso, me sinto felizardo por ter começado a cobrir tecnologia a partir de mudanças que ocorreram na área cultural. E, assim, posso participar de uma mesa sobre crítica musical, mesmo que não exerça essa função.
Minha coluna de ontem no Caderno 2 foi sobre o tal churrascão diferenciado.
Churrascão diferenciado
Política, internet e Brasil
Começou com uma declaração infeliz. Em uma matéria sobre a mudança de uma futura estação do metrô em Higienópolis, na terça passada, 11, uma moradora disse apoiar a transferência da obra para longe do local imaginado originalmente (no coração do bairro de classe alta de São Paulo), pois assim livraria o bairro do que ela chamou de “gente diferenciada” – um eufemismo bisonho para falar que o bairro passaria a ser frequentado por pessoas de baixo poder aquisitivo. Pobres que, com o metrô, “invadiriam” um bairro rico.
A expressão “gente diferenciada” foi eleita como símbolo de um protesto contra a mudança da estação, que, como diversos vídeos engraçadinhos, links bizarros e polêmicas efêmeras, agitou a internet brasileira.
Em questão de horas, o assunto já estava causando discussões acaloradas no Facebook. Até que um dos participantes da maior rede social do mundo resolveu fazer uma gracinha e abriu um evento no site: o Churrascão da Gente Diferenciada. O Facebook permite que você abra páginas para a realização de eventos, assim é possível convidar os contatos virtuais através do site, ter alguma estimativa sobre quantas pessoas vão e encontrar, posteriormente, gente que esteve presente. Mas como nem tudo é sério no mundo das redes sociais no Brasil, uma das modinhas no Feice brasileiro é a criação de eventos fictícios, que servem apenas para brincar com determinadas notícias ou provocar algumas pessoas.
E assim nasceu o Churrascão da Gente Diferenciada, uma piada que programava para a tarde de ontem um enorme encontro farofeiro no coração do bairro grã-fino. Mas a brincadeira acertou em cheio – em pouco mais de 24 horas depois da criação do evento, ele já contava com quase 50 mil participantes. Claro que, sendo um evento fictício, não era preciso muita dedução para saber que os 50 mil inscritos não iriam de verdade. Mas muita gente passou a cogitar uma ação pública de verdade, transformando a brincadeira num protesto que, a caráter, teria um cardápio bem, como poderia dizer…, diferenciado.
E ao perceber que a piada havia tomado um rumo inesperado, os organizadores do “evento”, resolveram ser mais práticos e o transformaram em um ato de protesto com direito a arrecadação de agasalhos e alimentos e a participação de ONGs para a distribuição do que for reunido. O ato seria realizado às 14 h de ontem, na Praça Vilaboim, depois do fechamento desta coluna (na sexta), e pode sequer ter sido realizado. Ou pode ter virado uma festa. Ou uma confusão.
Mas, independentemente do que possa ter ocorrido, uma coisa é fato: aos poucos, e graças à internet, o brasileiro está aprendendo a protestar, se organizar, reivindicar seus direitos. Agora é só esperar a hora em que isso vai começar a funcionar sem que seja preciso uma piada.
E a minha coluna deste domingo no Caderno 2 foi sobre o final da terceira temporada de Fringe – ou melhor, sobre a importância da ficção científica.
Realidades paralelas
Fringe e a ficção científica
Não tenho como falar do final da terceira temporada de Fringe pois esta coluna foi escrita horas antes da exibição de seu último episódio, The Day We Died, que foi ao ar na noite de sexta-feira, nos Estados Unidos. Também não vou entrar em detalhes que possam antecipar alguma revelação para alguém que está começando a assistir à série agora ou que a acompanha através da retransmissão feita no Brasil pelo canal pago Warner. Vou falar sobre Fringe, mas sem entregar o que está acontecendo na série agora. Pois o assunto de hoje não é o roteiro complexo que atordoa até quem cogita o impossível e o inusitado (temas, aliás, recorrentes na história).
Fringe é o seriado mais importante na TV hoje por explorar as fronteiras mais mirabolantes da ciência e da ficção científica. Logo na abertura somos bombardeados por uma nuvem de tags que apresentam termos considerados impossíveis pela ciência tradicional: teletransporte, precognição, psicocinese, clarividência, percepção extrassensorial, projeção astral, criogenia, mutação, universos paralelos. O termo “fringe” indica limite e quando se refere à ciência fala especificamente daquela que é ridicularizada ou desprezada pelo cânone tradicional.
Na série de J.J. Abrams, o mesmo criador de Lost, acompanhamos o cientista Walter Bishop (interpretado magistralmente por John Noble), que foi internado no meio dos anos 80 em uma instituição psiquiátrica e solto em nosso presente por ser a única pessoa que pode saber lidar com fenômenos estranhos que começaram a acontecer sem motivo aparente.
Acontece que alguns episódios se passam nos anos 80, e a abertura do seriado é magistralmente recriada como se ele fosse exibido naquela época. E os termos que surgem na tela são bem mais familiares a nós: computação pessoal, nanotecnologia, clonagem, cirurgia a laser, engenharia genética. Termos que poderiam ser encarados na época como ficção científica, mas que hoje são apenas ciência.
Eis a função do gênero: apontar os rumos para onde a ciência da vida real pode seguir. Não duvide se, em alguns anos, os termos da abertura de Fringe dos anos 10 se tornarem tão comuns quanto os dos episódios que se passam nos anos 80.