Sexta passada, Bob Dylan deu início ao festival em movimento pelos EUA Outlaw Music, turnê que também traz shows de Willie Nelson (que, por motivos de saúde, não pode comparecer aos shows de abertura) e do ex-vocalista do Led Zeppelin Robert Plant – ressuscitando sua parceria com a cantora Alisson Krauss -, além de nomes mais novos (como John Mellencamp e as cantoras Brittney Spencer e Celisse, que tocam em diferentes datas da turnê de trinta datas). As primeiras apresentações ocorreram na cidade de Alpharetta, no estado da Georgia, e Dylan surpreendeu todos ao mudar radicalmente seu repertório: não houve nenhuma música de seu disco mais recente, Rough And Rowdy Ways, e em vez disso preferiu tocar músicas da década de 50 que o inspiraram, fazendo versões para músicas Willie Dixon (“My Babe”), Chuck Berry (“Little Queenie”), dos Fleetwoods (“Mr. Blue”), Hank Williams (“Cold, Cold Heart”) e Sanford Clark (“The Fool”), que nunca havia tocado ao vivo em sua vida. Da própria lavra, preferiu priorizar seu disco de 2012, Tempest, ao tocar “Early Roman Kings”, “Long and Wasted Years”, “Pay in Blood” e “Scarlet Town” (e colocando camisetas da turnê deste disco à venda no dia do show) e ainda puxou “Beyond Here Lies Nothin'”, faixa de abertura de seu disco de 2009, Together Through Life. As únicas faixas próprias do século passado foram “Simple Twist Of Fate” (de 1975), “Under The Red Sky” (de 1990) e “Things Have Changed”, gravada para a trilha sonora do filme Garotos Incríveis, de Curtis Hanson, lançado no ano 2000. Como na turnê que vinha fazendo do disco anterior, Dylan tocou mais piano e gaita do que guitarra e ao ser realizado no formato festival, permitiu que fãs registrassem em vídeo as apresentações (praticamente impossível anteriormente, menos por restrições ao público e mais por tocar na penumbra). Ele também trouxe mudanças na formação da banda, ao chamar o guitarrista Donnie Herron, que não tocava em sua banda há quase 20 anos, e o baterista Jim Keltner, que o acompanhou em sua fase gospel, no século passado. Mesmo octagenário, o velho não para de mudar – e fica aquele fiapo de esperança que ele possa vir ao Brasil em um futuro próximo.
A produção do filme A Complete Unknown sobre os primeiros anos de Bob Dylan (com o menino do Duna no papel principal) parece estar indo um pouco longe demais… Olha o disparate que é a recriação dessa capa do Freewheelin’ Bob Dylan? Qual é a necessidade disso? Acho que isso não se justifica nem se o filme for bom… E reforça a minha sensação de cosplay…
Vazaram as primeiras fotos de Timothée Chalamet fantasiado de Bob Dylan para o próximo filme de James Mangold, A Complete Unknown, que conta a história da chegada de Dylan a Nova York até seu rompimento com a cena folk que o acolheu no primeiro momento. Nem duvido que o filme possa ser bom (Chalamet é bom ator, Mangold bom diretor e é bom que mais gente conheça a história de Dylan), mas quando Hollywood se esforça pra tornar um ator famoso, ela acaba o tornando insuportável pela insistência – e não custa lembrar que o próprio Chalamet irá cantar no filme. Como o projeto começou a ser filmado agora, o filme vai levar um tempinho pra chegar nos cinemas e ainda tem Elle Fanning vivendo o papel de Sylvie Russo, Monica Barbaro como Joan Baez, Nick Offerman vivendo Alan Lomax, Boyd Holbrook fazendo o papel de Johnny Cash e Edward Norton como Pete Seeger (consigo vê-lo com o machado cortando o cabo de energia no festival de Newport).
Chan Marshall começou a colocar seu tributo a Bob Dylan em movimento. Depois de alguns teasers e muita expectativa, ela finalmente lançou o disco ao vivo Cat Power Sings Dylan. The 1966 Royal Albert Hall Concert na sexta passada, repassando o repertório que o mestre tocou num clássico show que tornou-se um de seus discos piratas mais famosos (mesmo não tendo sido gravado no Royal Albert Hall londrino que o batizava e sim no Free Trade Hall de Manchester). E agora começa a apresentar-se ao vivo, primeiro em programas de TV (com nessa participação que fez no programa de Jimmy Fallon tocando nada mais nada menos que “Like A Rolling Stone”) para depois, em fevereiro do ano que vem começar a rodar com o show nos palcos do mundo. Vou fazer duas apostas: ela vem com esse show para o Brasil e em algum momento de 2024 ela dividirá o palco com o próprio Dylan.
Rolou na semana passada, mas só apareceu agora: Bob Dylan segue passeando com a turnê de seu disco mais recente, o soberbo Rough and Rowdy Ways (please com to Brasil!) e no domingo do outro fim de semana foi flagrado reverenciando outro bardo, este canadense, ao passar em sua cidade-natal. No show que fez no Salle Wilfrid-Pelletier, em Montreal, no Canadá, Dylan pinçou “Dance Me to the End of Love”, que Cohen escreveu sobre nazistas tocando música clássica ao mandar judeus para as câmaras de gás nos campos de concentração em seu álbum de 1984, Various Positions. Não é a primeira vez que Dylan faz esse tipo de homenagem nesta turnê. Só no mês de outubro, ele celebrou John Mellencamp (“Longest Days“) ao passar por Indianápolis, tocou uma (“Nadine“) do Chuck Berry quando passou por St. Louis e duas do Muddy Waters (“Every Grain of Sand” e “Forty Days and Forty Nights”) e Howlin’ Wolf (“Killing Floor“) em sua passagem por Chicago, sempre saudando mestres e compadres em suas cidades-natal. Mas essa do Cohen pegpu na veia, ouça abaixo:
Para reforçar a chegada de seu disco ao vivo em tributo a Bob Dylan, nossa querida Cat Power acaba de anunciar que fará o mesmo show no Canergie Hall, em Nova York, no início do ano que vem (os ingressos começam a ser vendidos na próxima sexta neste link). O show original, gravado em novembro do ano passado, aconteceu no Royal Albert Hall londrino, famosa casa de shows em que Bob Dylan teria gravado um de seus shows mais memoráveis de sua primeira turnê elétrica pelo país, em 1966, quando tornou-se alvo de fãs ortodoxos que achavam um absurdo que seu ídolo tocasse guitarra. O show de Dylan tornou-se famoso graças a um disco pirata que identificava a apresentação como sendo na dita casa de shows de Londres quando, na verdade, ele aconteceu no Free Trade Hall, em Manchester. Cat Power preferiu viver a lenda e recriou o disco imortalizado pelo disco não-oficial (que foi oficializado por Dylan no quarto volume de suas Bootleg Series, no final dos anos 90) e recriou aquele show faixa a faixa que, a partir do anúncio sobre o show em Nova York, deve seguir percorrendo outros teatros clássicos pelo mundo. Chan Marshall aproveitou o anúncio para mostrar mais duas músicas do disco ao vivo que será lançado dia 10 de novembro, nada menos que “Mr. Tambourine Man” e “Like a Rolling Stone” (ouça abaixo). E imagina esse show na Sala São Paulo ou no Municipal…
E se os Talking Heads ressuscitaram graças a um dos melhores filmes feitos a partir de um show de todos os tempos (ao relançar o Stop Making Sense dirigido por Jonathan Demme nos cinemas), eis a deixa para falarmos de The Band: afinal a clássica banda canadense também é objeto de um dos melhores shows já filmados, quando decidiu encerrar suas atividades no dia de ação de graças de 1976. A derradeira apresentação aconteceu no Winterland Ballroom, em São Francisco, na Califórnia, quando o grupo chamou um elenco de convidados de cair o queixo: desde os seus primeiros “patrões” (Ronnie Hawkins e Bob Dylan, que acompanharam como banda de apoio em diferentes momentos de sua carreira) a estrelas do panteão do rock como Neil Young, Joni Mitchell, Van Morrison, Ringo Starr, Muddy Waters, Ronnie Wood, Emmylou Harris, Dr. John, Paul Butterfield, Eric Clapton e Neil Diamond. Para registrar este momento ninguém menos que Martin Scorsese na direção e o filme desta última apresentação voltará aos cinemas norte-americanos no mês de novembro, quando completa 45 anos (o filme foi lançado dois anos depois do show). A nova versão traz uma introdução narrada pelo saudoso Robbie Robertson, guitarrista do grupo e trilheiro de Scorsese que nos deixou este ano. Tomara que também venha para o Brasil, porque é um filmaço e um showzaço ao mesmo tempo. Veja só um trechinho abaixo:
O público da edição de 2023 do Farm Aid, festival decano que arrecada fundos para os trabalhadores rurais familiares nos Estados Unidos, esperava que o evento fechasse, como sempre, com uma apresentação final de seu idealizador, o guru country Willie Nelson. Mas qual foi a surpresa deste quando, antes do festival acabar, neste sábado passado, surgem as silhuetas de uma banda liderada por uma figura toda de preto e de cabelos despenteados, sem a bandana vermelha ou barba grisalha que marcam o fundador do evento. Aos poucos o público percebeu que era ninguém menos que Bob Dylan, fazendo uma rara aparição surpresa e, ao contrário do que tem feito na turnê de seu disco mais recente, tocando guitarra e de pé – em vez de estar sentado ao piano. Dylan é o responsável indireto pela existência do festival, pois comentou, durante o festival Live Aid, realizado no meio dos anos 80 para arrecadar fundos para acabar com a fome na Etiópia, que seria interessante se alguém fizesse isso nos EUA pensando na agricultura familiar, que vivia o início de sua decadência com a chegada agressiva do agronegócio. Willie Nelson pinçou a sugestão e uniu-se a Neil Young e John Mellencamp (os dois apresentaram-se na edição deste ano) para criar o evento que, em sua primeira edição, contou com a presença do velho Bob, em 1985. Em sua aparição surpresa, Dylan voltou para clássicos de seus anos mais emblemáticos e enfileirou três hinos: “Maggie’s Farm”, “Positively 4th Street” e “Ballad of a Thin Man” . Acompanhando-o, nada menos que três quintos dos Hearbreakers de Tom Petty: o guitarrista Mike Campbell, o tecladista Benmont Tench e o baterista Steve Ferrone, que não tocam juntos desde que seu líder deixou nosso plano. Dylan chegou a sentar-se numa banqueta quando chegou na última música (82 anos, bicho!), mas manteve o tom apocalíptico que lhe é característico, destruindo os arranjos originais de suas músicas em versões que passam pela gente com um trem de carga ou uma manada de búfalos. Ave, mestre!
No ano passado, nossa querida Chan Marshall, que a maioria das pessoas conhece por Cat Power, fez um show em homenagem ao clássico concerto que Bob Dylan deu em 1966 quando transitava da fase acústica para a elétrica, negando toda a expectativa que o público criava em relação a ele ser considerado a voz de sua geração. Em turnê pela Inglaterra, encarou fãs raivosos com a transição, que culminou com uma apresentação feita em Manchester, no Free Trade Hall, quando um fã levantou a voz antes da última música e gritou “Judas!” ao considerar Dylan um traidor. “Eu não acredito em você”, menosprezou o mestre, “você é um mentiroso!”, gritou antes de virar-se para sua banda – que já havia assumido o novo nome de The Band – e pedir “PLAY FUCKING LOUD” antes de uma das versões mais clássicas de “Like a Rolling Stone”. Esta apresentação tornou-se um dos primeiros discos piratas da história, outra proeza que Dylan carrega consigo, que erroneamente creditou a apresentação como se ela tivesse acontecido no Royal Albert Hall londrino. Dylan levou a lenda consigo quando relançou o álbum oficialmente nos anos 90, colocando “Royal Abert Hall” entre aspas para deixar claro que fazia referência ao disco pirata. Foi justamente esse show que Cat Power recriou no próprio Royal Albert Hall original, em novembro do ano passado, e que ela acaba de anunciar que se tornará um disco ao vivo. Cat Power Sings Dylan: The 1966 Royal Albert Hall Concert será lançado no dia 10 de novembro, já está em pré-venda e ela já liberou duas versões do disco “She Belongs to Me” e “The Ballad of a Thin Man”, que você pode ouvir abaixo, além de ler a ordem das músicas: