Alice Cooper, uma lenda-viva do rock
Aos poucos voltando pro jornalismo industrial, desta vez convocado pelo Toca UOL a escrever sobre o show que Alice Cooper fez neste sábado em São Paulo – e como atesto no final do texto, mais do que pai de toda uma vertente do heavy metal, ele pertence ao cada vez mais seleto grupo de lendas vivas do período clássico.
Em SP, Alice Cooper mostra ao vivo que é mais do que o pai do ‘horrorshow’
Depois de um fim de semana com dois shows consecutivos de Dave Matthews Band e Richard Ashcroft, o festival Best of Blues and Rock, realizado no parque Ibirapuera, em São Paulo, começou sua etapa mais pesada, e o grand finale deste primeiro dia não poderia ser mais dramático do que o show que encerrou a noite, quando Alice Cooper mais uma vez subiu a um palco brasileiro.
Nascido Vincent Furnier, Alice Cooper assumiu há décadas o nome andrógino que antes batizava sua banda e é autor do horrorshow que influenciou boa parte da história do som pesado e atravessa apresentações de artistas posteriores tão diferentes quanto Kiss, Gwar, G.G. Allin, Marilyn Manson, Iron Maiden, White Zombie e Ghost.
E o papa do shock rock, mesmo com 77 anos de idade, mostrou desenvoltura e maestria à altura de sua majestade, intactas desde quando trouxe um dos primeiros shows grandes internacionais ao Brasil, em abril de 1974, quando, em tese, reuniu mais de 100 mil pessoas no Anhembi, em São Paulo, e outros tantos milhares no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro.
Mais de meio século após aquelas apresentações históricas —e depois de outras vindas de Cooper para cá, inclusive com sua banda ao lado do ator Johnny Depp e de Joe Perry, do Aerosmith, os Hollywood Vampires—, o espetáculo de 2025 começou pontualmente às 20h30, quando uma cortina revelou o palco ornado por quatro molduras que pareciam espelhos medievais, mas funcionariam como telões ambientando cada nova canção.
No meio do palco, uma segunda cortina branca mostrava a capa de um jornal anunciando que Alice Cooper havia sido banido no Brasil, com sua clássica maquiagem nos olhos estampada na foto do veículo, que ainda anunciava o julgamento por seus “feitos contra a humanidade”, enquanto uma montagem mostrando páginas de revistas e jornais de diferentes épocas, sempre horrorizadas com o artista, aparecia nos telões.
A banda cerca o tecido impresso como a capa de jornal quando um holofote o ilumina por trás, revelando a silhueta de Alice Cooper (de fraque e cartola) para delírio do público. Um locutor pergunta como ele se declara em relação aos crimes que ele está sendo acusado, no que ele responde: “Culpado!”, rasgando o tecido com uma espada e encarando pela primeira vez o público.
O tecido é rasgado, e de trás dele sai o próprio Cooper, de fraque, cartola e uma espada na mão, e a partir daí a noite transforma-se num grande teatro que mistura pastiche de filmes de terror com a grandiloquência performática do dono da noite. Sua voz nunca foi de grande alcance, e ele se porta mais como um mestre de cerimônias do que como um vocalista, por isso consegue manter-se quase intacto em relação à sua fase clássica, de 50 anos atrás.
É impressionante a desenvoltura de Alice Cooper, que troca de figurinos praticamente a cada nova música, quase sempre usando um objeto cênico de apoio em uma das mãos, seja um cetro, uma muleta ou a já citada espada, regendo a plateia enquanto caminha pelo palco seguido de seus músicos (que se comportam como servos de sua realeza) e canta histórias de paixão e morte em hits emblemáticos.
Depois da introdução com “Lock Me Up” e a saudação “Welcome to My Show”, ele emenda uma sequência de pérolas que mostra sua importância: “No More Mr. Nice Guy”, “I’m Eighteen”, “Under My Wheels”, “Bed of Nails”, “Billion Dollar Babies”, “Snakebite” e “Be My Lover” fizeram o público, quase em sua maioria com mais de 50 anos de idade, convulsionar de felicidade.
E, claro, o show não podia deixar de ter os elementos cênicos que caracterizam suas apresentações, indo desde um Jason Voorhees —da série de filmes “Sexta-Feira 13″— em “He’s Back (The Man Behind The Mask)” ao bonecão gigante em “Feed My Frankenstein”, que encerrou a noite. Mas o auge destes delírios cênicos acontece entre “Ballad of Dwight Fry” e “I Love the Dead”, quando uma guilhotina é trazida ao palco e o próprio Cooper é decapitado em público, apenas para ter sua cabeça cortada exibida para todos por uma atriz logo em seguida.
O ponto alto da noite foi quando puxou seu grande hit, “School’s Out”, (que emendou com “Another Brick in the Wall Part 2”, do Pink Floyd) e apresentou a ótima banda que o acompanha nessa excursão: o baterista Glen Sobel (que teve direito a um longo solo para exibir um virtuosismo que não é percebido no show), o baixista Chuck Garric e os guitarristas Ryan Roxie, Tommy Henriksen e Nita Strauss, esta última ex-integrante da banda cover feminina de Iron Maiden, chamada The Iron Maidens, e que também teve um momento solo de virtuosismo no palco.
Superando as expectativas, Alice Cooper pode mostrar por que é um dos nomes mais importantes dos anos 1970 e que é uma espécie de equivalente norte-americano de David Bowie —mas, enquanto o astro inglês tocou sua carreira entre o excesso de drogas, uma fase eletrônica na Alemanha e uma versão yuppie nos anos 1980, Cooper viu a teatralidade que criou tornar-se tônica do rock pesado e ser aos poucos aprisionado pelo heavy metal, gênero musical que não lhe pertence e que o manteve distante de um público ainda maior.
O que vimos neste sábado no parque Ibirapuera é que Alice Cooper é uma lenda do rock, não apenas pai de mais da metade do heavy metal, mas um titã de uma fase clássica da música pop.
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