Random Access Memories, do Daft Punk, faixa a faixa (agora em português)
E o Victor traduziu para o português a entrevista que a dupla de robôs franceses deu à revista Obsession do Le Nouvel Observateur que comentei aqui noutro dia. No papo, os dois explicam cada uma das faixas do novo disco. Valeu, Victor!
“Give Life Back to Music”
Um dos objetivos desse álbum é apresentar algo leve e elegante. Em “Give Life Back to Music”, John Robinson Jr. toca bateria. Ele estava no Off the Wall, a obra-prima de Michael Jackson. O que é fantástico numa performance como a dele é que são as infinitas possibilidades de nuances, impossíveis de recriar com uma abordagem eletrônica. Todos os hits ou álbuns produzidos por Quincy Jones sempre nos fascinaram na precisão da produção, só alcançável por humanos. É a diferença entre Thriller e Bad. No segundo, as faixas são brilhantes, mas as performances tem menos aura. Menos personalidade.
“The Game of Love”
Nós cantamos com vocoders. Em uma era onde vozes humanas são tratadas para ficar robóticas, achamos empolgante o fato de que você pode fazer o oposto e dar à uma voz robótica a voz mais humana possível. A ideia de uma inteligência artificial que iria assemelhar-se à humana. A emoção de alguma coisa que não é humana, mas tenta muito ser.
“Giorgio by Moroder”
Nos encontramos alguns anos atrás. Ele (Giorgio Moroder) sempre foi uma lenda mítica para nós, um tanto misterioso. Sua vida segue sua música. A ideia por trás da faixa era fazer um tipo de documentário baseado em uma entrevista que fizemos com ele. Sua voz foi gravada com diferentes microfones de diferentes períodos. Nós terminamos com mais de três horas de material aproveitável da entrevista onde ele relembra sua vida como músico. Essa faixa é uma ótima metáfora sobre liberdade musical. Ele sempre nos forçou a quebrar limites entre gêneros musicais, entre gosto bom e mau, hype e não-hype. Giorgio é um modelo nesse campo. É fascinante ouvi-lo dizer, na terna idade de 72 anos: “Ah, eu estava fazendo música eletrônica quarenta anos atrás”.
“Within”
(Chilly) Gonzalez toca piano nessa faixa. É um amigo nosso, e um ótimo músico. Um dos melhores de sua geração, na verdade. “Within” é uma das músicas que nós próprios gravamos. É bastante minimalista, uma pequena seção rítmica, um baixo e um piano. Criar a faixa essencial com o menor número de instrumentos possíveis, essa é a ideia por trás dessa música.
“Instant Crush”
Julian Casablancas, dos Strokes, está nos vocais. Nós somos ambos super fãs da banda, e nós ficamos sabendo que ele queria nos conhecer. Nós tínhamos uma demo sobrando, ele veio, ouviu-a e ficou entusiasmado. Ele tem um dom. Nós, em primeiro lugar, amamos rock e todo o conceito de uma banda de rock. Porém, há tantas coisas poderosas no passado que teria sido difícil inovar. Recentemente, os Strokes e o MGMT – com uma abordagem diferente – alcançaram isso. Julian tem essa atitude punk rock e um lado emocional para as suas melodias. Foi importante para nós ter ele nesse álbum, ser apoiado por um de nossos contemporâneos.
“Lose Yourself to Dance”
Essa faixa é a definição mais simples do nosso desejo. Um álbum bem detalhado na produção, mas muito simples ao mesmo tempo. Focado em baixo, bateria, guitarra, e, claro, robôs. É o oposto de um álbum superproduzido. Nossa fantasia foi voltar à dance music com um kit de bateria. Gravar desse jeito foi muito satisfatório. Estamos tão orgulhosos de haver um baterista de verdade atrás de uma bateria, e não alguma batida. Há dois bateristas no álbum, John Robinson Jr., que tem o recorde de ser o mais gravado no mundo, e Omar Hakin, que começou a tocar aos 16 anos, com ninguém menos que Stevie Wonder…
“Touch”
Essa faixa é o ponto crucial do álbum. É a partida de todo o álbum. Somos nós encontrando Paul Williams (compositor de trilhas sonoras, incluindo a de O Fantasma no Paraíso, e ator). Um engenheiro de som que nós conhecemos nos apresentou. Ele fez uma visita ao estúdio. Dali, algo muito cinematográfico, muito narrativo, surgiu. “Touch” seria a melhor definição do lado psicodélico de “Random Acess Memories”. Essa música tem 250 faixas diferentes. É a mais complexa, a mais maluca do álbum.
“Get Lucky”
Pharrell Williams canta nessa música. Foi natural convidá-lo para o álbum. Ele é um entertainer nato, completo, que transpira elegância. Ele nem sempre teve a oportunidade de mostrar suas habilidades para cantar. E ele pode, como pode. Nós queríamos causar a impressão de estar preso em uma bolha de vidro, completamente isolado do mundo externo. Poderíamos estar em 1978, mas a ideia era fazer a música viajar até o presente e também ao futuro. Veja o que acontece e observe como esse entusiasmo se comunica com as pessoas.
“Beyond”
Outra faixa feita com Paul Williams, que escreveu a letra. É uma canção hiper-cósmica com uma das mais puras, mais poéticas letras. Nós conversamos muito com Paul Williams sobre a direção que deveríamos tomar com o álbum, e foi interessante ouvir que ele poderia escrever nossas ideias.
“Motherboard”
Uma faixa muito futurística. Ela poderia ter sido feita no ano 4000…
“Fragments of Time”
Nosso reencontro com o produtor de house Todd Edwards, desde “Discovery”.
“Doin ‘it Right”
A voz angelical foi feita por Panda Bear (do grupo Animal Collective). Nós amamos o trabalho solo dele, assim como a abordagem da banda para sua música. Essa faixa – a única completamente eletrônica do álbum – foi a última a ser gravada. Ela é tão relaxada. Talvez o nosso esforço mais futurístico e a nossa faixa mais contemporânea.
“Contact”
Uma faixa produzida com o DJ Falcon, e uma voz gravada na última missão Apollo – a número 17 – da Nasa. A voz do capitão Eugene Cernan, o último homem a andar na lua. É uma voz que vem, literalmente, do espaço. E o que ela diz, dispensa comentários…