Por Alexandre Matias - Jornalismo arte desde 1995.

29 anos de Trabalho Sujo

29 anos são mais que uma vida, mas ainda sinto como se estivesse começando. Os 29 anos do Trabalho Sujo, completos oficialmente nesta quarta-feira, também selam 30 anos da minha carreira como jornalista, mas este único ano de diferença entre as duas datas é o que separa minha vida profissional (ênfase em “profissional”) da minha vida profissional (ênfase em “minha”). Ao rotular meu trabalho com um nome que eu havia criado para um fanzine (que acabou virando uma coluna num jornal impresso e depois virou site, blog, conta em redes sociais, podcast, festa, curso, programa de rádio, curadoria, direção e o que mais der na minha telha), sem querer separei o trabalho que não me interessa daquele que eu quero fazer e consegui ressignificar essa atividade sem que ela carregasse o peso profissional – e sempre carregando a minha assinatura, a minha edição, o meu ponto de vista. Carrego trabalho no nome e sempre que falo que meu signo é capricórnio a reação dos que acreditam em astrologia é um olhar arregalado de obviedade devido à minha dedicação à labuta. Mas por mais que canse (e, acredite, cansa), o Trabalho Sujo não é um frila que eu peguei pra fechar as contas, um emprego formal que me cobra horário e prazos, uma tarefa insuportável justificável apenas pelo preço pago. Mais do que isso, nesses 29 anos dou ênfase à palavra “vida” no que diz respeito à minha vida profissional quase três décadas passadas. Meu caráter foi formado antes mesmo de pensar em trabalho, ainda em Brasília, mas a maior parte da minha vida que comemoro agora consolidou o que meus pais, meus irmãos e minha cidade me ensinaram antes de me tornar maior de idade: a importância de fazer o que se quer, de colocar planos logo em prática, respeito e franqueza como principais filtros da vida e a importância da parceria. O Trabalho Sujo é um trabalho solitário sim, mas nunca estive só, mesmo porque sempre contei com pessoas importantes da minha vida próximas ao que faço – e não apenas relações profissionais. Laços que firmei ao longo destes trinta anos que são elos forjados para a vida inteira: não apenas coleguinhas de redação, parceiros de escrita, compadres e comadres com quem já discotequei e apresentei e projetei programas, mas também amigos que se tornaram irmãos, esposas, namoradas, professores, gurus, casos e confidentes, gente foda cuja relação transcende o trabalho e só ajudou a forjar as regras pelas quais pauto minha vida – e estou falando de centenas de pessoas, gente que dividi baias, quartos, redes, espaços virtuais e conexões físicas. O Trabalho Sujo só existe por causa de vocês – e vocês sabem quem vocês são. Amo todos a 29 anos ou menos – e pra que serve tudo isso se não há amor? Seguimos juntos, sempre. Bora que só melhora. ❤️

Não aperta que dói

Ano passado o reverendo Al Green quebrou as pernas emocionais de nós todos ao regravar “Perfect Day” do Lou Reed – e não é que agora ele conseguiu ir ainda mais fundo? Pois saca essa versão inacreditável para “Everybody Hurts” do R.E.M. e nem tenta segurar a emoção…

Ouça abaixo:  

No laboratório

Um dos motivos que pautou minha curadoria no Centro da Terra é entender o quanto o palco é um momento importante para a transição e evolução da carreira de um artista de música – não apenas por ser o lugar em que este se encontra com seu público e por tornar-se a incorporação de uma nova fase de sua carreira (algo que quase sempre é materializado num disco), mas também por permitir que a música guie ela mesma o rumo que o artista está buscando. Tocar algo novo em frente ao público é uma boa forma de fazer que ideias se calcifiquem e consolidem, uma vez que palavras, melodias, harmonias, solos e andamentos são exercitados. Bruna Lucchesi entendeu esta lógica e mais uma vez trouxe um trabalho em progresso para experimentar no palco-laboratório – e como havia feito no início do ano passado em sua homenagem às músicas de Paulo Leminski, no espetáculo Quem Faz Amor Faz Barulho que depois virou o disco de mesmo nome. Ao apresentar um novo trabalho de transição nesta terça com a mesma banda que já a acompanha (Vitor Wutzki na guitarra, Ivan Gomes no baixo e Bianca Godoi na bateria), mostrando a evolução musical do grupo, ela revisitou músicas do disco anterior com composições novas ainda inéditas, além de versões para canções alheias, como “Pissing in a River”, de Patti Smith.

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Bruna Lucchesi: Quem Faz Amor Faz de Tudo

Do mesmo jeito que começou sua homenagem à música feita por Paulo Leminski no Centro da Terra em fevereiro do ano passado, a curitibana Bruna Lucchesi volta mais uma vez ao palco do Sumaré para dar início a uma nova fase de sua carreira – ao mesmo tempo em que despede-se da anterior. Por isso Quem Faz Amor Faz de Tudo lembra o título da homenagem ao poeta paranaense que começou como show e culminou com o disco Quem Faz Amor Faz Barulho, mas desta vez ela prefere expandir a intesecção da poesia com a música para novos autores, passeando por poetas musicais como Patti Smith e Bob Dylan ao mesmo tempo em que mostra composições próprias nesta nova fase que batizou de Faz de Tudo. Nesta terça ela vem acompanhada de Vitor Wutzki (guitarra), Ivan Gomes (baixo) e Bianca Godoi (bateria). O espetáculo começa pontualmente às 20h e os ingressos estão à venda na bilheteria e no site do Centro da Terra.

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A cara do Bacuri

Eis a capa de Bacuri, o disco novo dos Boogarins que sai na próxima semana. A arte é do pernambucano Samuel de Saboia.

Ilessi nos mostra o Atlântico Negro

Eis em primeira mão a capa de Atlântico Negro, quarto disco solo da cantora carioca Ilessi, que será lançado nesta quarta-feira, Dia da Consciência Negra. O disco, gravado originalmente no ano passado, seria lançado no início deste ano, mas problemas de saúde da cantora obrigaram o disco a ser adiado. “Às vezes não entendemos muito as razões das coisas, mas acho que o disco ser lançado agora, neste ano tão importante, faz sentido”, me explica por áudio. “2024 foi difícil em um plano macro, com perdas da natureza, retrocessos políticos e guerra. A força de um disco como esse, lançado no Dia da Consciência Negra, mostra que a vida é sábia, mesmo quando a questionamos.” Criado após uma sessão catártica na Áudio Rebel no final de 2022, o disco reuniu a canotra a Marcelo Galter, Ldson Galter e Reinaldo Boaventura para celebrar os compositores negros brasileiros, algo que foi ganhando outros contornos à medida em que a banda se entrosava no estúdio, “A gente começou um processo tão integrado, algo difícil de explicar, como se acontecesse uma intimidade sem tanto tempo de convivência, uma intimidade que às vezes é mágica mesmo, que a música traz, que é a identificação musical e algo da minha fé, da ordem espiritual mesmo.”, continua a cantora. “Fizemos dois ensaios, cada período de ensaio com mais ou menos uma semana em tempos passados, e eu entendi que era uma coisa muito de grupo.” A capa, fotografada já em 2024, veio justamente fechar o ciclo pessoal de saúde que Ilessi havia atravessado. “Eu passei por uma série de problemas este ano, perdi o útero e isso foi muito difícil para mim”, detalha. “A sensação que tenho é que essas doenças, tumores, são violências acumuladas, até de outras vidas e existe uma simbologia muito forte em relação ao renascimento”. Ela conta que fez as fotos logo no primeiro dia que foi liberada do repouso absoluto, que a deixou em casa por um bom tempo após a cirurgia. “Sair do mar simbolizou nascer de novo, uma purificação”, ela continua, explicando que se inspirou numa imagem que viu num perfil de astrologia, que mostrava uma mulher negra saindo do mar revolto. “Era aquilo que eu queria transmitir. A sensação que tive ao ver a foto foi todo o simbolismo do Atlântico, da travessia e lembrei do livro Escravidão, do Laurentino Gomes, que tem um trecho sobre a travessia e a quantidade de corpos jogados no mar durante séculos. Alguma coisa despertou em mim naquela foto, como se fosse nós emergindo das profundezas e ressignificando tudo.” A foto foi feita às cinco da manhã na Praia Vermelha, no Rio de Janeiro, e Ilessi lembra emocionada: “O céu estava rosa, rosa forte, e foi mudando de cor, ficando laranja. Foi incrível, como se nós estivéssemos ficando da mesma cor da natureza, nos integrando a ela ou ela a nós. Na verdade, somos uma coisa só.” Ouça abaixo o primeiro single do disco “Cativeiro de Iaiá / Evém o Nego Paturi”, lançado nesta segunda:  

Conforto no ruído

Em dado momento de sua terceira apresentação no Centro da Terra deste mês, Jair Naves explicou como aquela temporada lhe ajudava a sair da famigerada zona de conforto ao se autoprovocar a visitar instantes diferentes de sua carreira com parceiros de diferentes fases da vida, visitando velhas canções como quem visita cicatrizes e tatuagens em seu próprio corpo – como havia mencionado na semana passada. Mas referia-se à saída não só por revisitar seu repertório de outros anos como a faze-lo com outras formações musicais, reforçando inclusive laços pessoais com os músicos que lhe acompanharam e citava a formação ali no palco desta terceira noite como sendo sua atual zona de conforto, reforçando que amava poucas pessoas no mundo mais do que o trio formado por Gustavo Nunes, Lucas Melo e Renato Ribeiro. Sozinhos os três são uma usina sônica em forma de power trio, um Crazy Horse misturado com Joy Division que reúne os pré-requisitos básicos de uma banda de pós-punk (guitarra ruidosa, baixo melódico e marcado, bateria mântrica) com traços típicos de uma banda de rock clássico e referências musicais ao indie rock norte-americano e brasileiro, além da força noise e hardcore, que fazem as canções de Jair – meio Nick Cave, meio Ian Curtis – crescerem ainda mais em tensão, tanto lírica quanto musical, extravasando também em sua performance, seja apenas ao microfone, nos teclados, na guitarra ou no violão – todos tocados nesta segunda. E apesar de ter visitado mais músicas de seu disco mais recente (o libelo antibolsonarista Ofuscante A Beleza Que Eu Vejo, de 2022), com o próprio Jair abrindo o show no teclado com a épica “Breu”, cujo crescendo pautou o resto da apresentação, ele também remoeu músicas de seu primeiro disco (as duas partes de Araguari e “De Branquidão Hospitalar”), duas de Trov​õ​es A Me Atingir (de 2015, “Resvala” e “5/4 (Trovões Vêm Me Atingir)”) e fechou a noite com uma das melhores faixas de Rente (2019, que acho seu melhor disco), “Sonhos Se Formam Sem o Meu Consentimento”, sempre deixando a emoção e um desejo de vingança transbordar no palco, cuja quantidade de ruído elétrico compensou as duas noites anteriores, que só não foram introspectivas por picos de impetuosidade do próprio Jair. Talvez tenha sido o melhor show que vi dele.

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Paul McCartney, Jack White e St. Vincent tocando “The End”, dos Beatles, juntos!

O já tradicional festival mexicano Corona Capital encerrou sua edição neste domingo em grande estilo ao reunir, na última música do último show, três gigantes de três gerações diferentes numa jam session guitarreira, quando Jack White e St. Vincent se juntaram ao Sir Paul McCartney na parte instrumental do final da última música do último disco dos Beatles, “The End”, que encerra tanto o disco Abbey Road quanto a atual turnê do eterno beatle. Foi a primeira vez que Jack White, beatlemaníaco daqueles, dividiiu o palco com Paul – depois que o próprio Macca chamou St. Vincent para dividir “Get Back” com ele, minutos antes daquele mesmo show. Que delírio, olha só:  

Beyoncé de Natal

Ela de novo: Beyoncé acaba de anunciar que fará o show no intervalo do jogo de natal da liga de futebol norte-americana, que será transmitido pela Netflix para todo o mundo. E assim ela coroa o ótimo ano que teve com o lançamento do segundo ato de sua trilogia, Cowboy Carter, com uma versão particular da final do campeonato de futebol dos ianques.

Assista ao trailer abaixo:  

Vida Fodona #830: Sem muito papo

Chega mais.

Ouça abaixo: