William Friedkin (1935-2023)

Morreu um dos maiores diretores de sua geração: William Friedkin era da clássica safra norte-americana que apresentou Scorsese, Spielberg e Coppola ao mundo e dirigiu alguns dos maiores filmes daquela leva, como O Exorcista e Operação França. Morreu antes de ver seu filme mais recente, The Caine Mutiny Court-Martial, estrear (no fim deste mês, no festival de Veneza).

True Detective e… William Friedkin?!

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Enquanto estamos esperando pela definição do novo elenco de True Detective, eis que surge uma novidade inesperada no horizonte: um novo diretor – e ninguém menos que William Friedkin! Ou pelo menos foi isso que o mestre que já nos deu O Exorcista, Operação França e Comboio do Medo em entrevista ao blog The Playlist, do site IndieWire:

“Estou considerando a possibilidade. Gosto muito desse autor (Nic Pizzolato). Encontrei com ele, ele é o cara pelo que eu pude perceber. Mas essa nova temporada é completamente diferente, por isso não fechei ainda – a nova temporada não tem nada a ver com a última. Com a exceção dele e de sua sensibilidade, que acho extraordinária. (…) Eu… não posso falar muito por enquanto. Mas eu sou fã do texto dele, mesmo que não seja uma continuação do que foi feito antes com McConaughey e Woody Harrelson. Então o que posso dizer é que sou muito fã do texto dele. Encontrei com ele, gosto dele e gosto do rumo que isso está tomando.”

E antes que você venha com a velha ladainha que o Friedkin perdeu a mão faz tempo, não é mais o mesmo, etc., sugiro que você dê uma olhada no filme mais recente dele, Killer Joe, que só não é o começo dessa nova fase do McConaughey porque pouco antes ele fez um filme com o Richard Linklater (o aparentemente inofensivo Bernie), em que ele já saía do estereótipo de sub-Brad Pitt rumo ao sul dos Estados Unidos. Mas é em Killer Joe que o Friedkin conseguiu fazer que ele soltasse seus bichos…

Quando o rock’n’roll assumiu Hollywood

Arnaldo mandou essa via Twitter, que o documentário A Decade Under The Influence, do sobrinho do Johnattan Demme, Ted Demme, tá inteiro no YouTube.

Ele conta como a geração Spielberg/Coppola/Scorsese/Lucas pegaram os estúdios de Hollywood que estava à beira de um colapso criativo e financeiro e reinventaram a roda desafiando o sistema de dentro dele mesmo com filmes que são, simplesmente, os melhores filmes da história do cinema. Você pode até bater o pé e torcer o nariz, pensando em escolas inteiras como a nouvelle vague, o cinema independente dos anos 90, o cinema asiático da virada do milênio, o neo-realismo italiano, os filmes trash dos anos 60 ou a atual safra de filmes latinos, mas nenhuma dessas gerações produziu um rol de filmes que inclui os dois primeiros Poderoso Chefão, a trilogia Guerra nas Estrelas, Halloween, Taxi Driver, Contatos Imediatos de Terceiro Grau, Easy Rider, Operação França, Um Touro Indomável, Apocalypse Now, American Grafitti, Um Estranho no Ninho, Essa Pequena é uma Parada, Maratona da Morte, Chinatown, O Exorcista, THX 1138, A Última Sessão de Cinema, Bonnie & Clyde, A Conversação, Tubarão e Amargo Pesadelo. Nem precisa incluir os filmes do Kubrick pra esta ser uma lista respeitável de melhores filmes de todos os tempos. O mais perto disso que existe na história do cinema é justamente a geração de europeus que ajudou Hollywood a existir – Chaplin, Hitchcock, Wilder e Capra, que não eram propriamente uma turma.

Nos anos 70, era uma turma. Era a primeira geração de graduados em cursos universitários de cinema (pois isso não existia antes) e amamentada pela televisão, o que garantia a aliança de um know how inato da linguagem audiovisual com a técnica adquirida recém-transformada em método. E saindo da Califórnia no fim da era hippie, eles injetaram adrenalina e insanidade em um cinema que estava produzindo pérolas como Oliver!, Dr. Jivago, My Fair Lady e Noviça Rebelde. O melhor mergulho nessa história que eu conheço é o livro Easy Riders, Raging Bulls, do jornalista Peter Biskind, que também tem uma versão em DVD, mas que eu ainda nao vi. Mas esse A Decade… dá uma boa idéia da reviravolta que uma geração de autores, roteiristas e atores fez em Hollywood, criando a primeira escola de cinema autoral americana com consciência artística e reinventando Hollywood como um novo mercado, que, no fim das contas, desenharam o nosso presente atual, dividido entre Cinemarks e cineclubes.


Partes 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 16

O que me leva a crer que não é difícil que, em pouco tempo, vejamos uma nova renascença cinematográfica, se deixarem de novo os malucos tomarem conta do hospício – nem que seja por alguns anos. E que os melhores filmes de todos os tempos ainda podem nem ter sido feitos.