A volta do Me & the Plant
Quatro anos depois de seu primeiro disco, o grupo Me & the Plant, projeto pessoal do multiinstrumentista carioca Vitor Patalano, ganha corpo e proposta. Seu Mithras Lab, mostrado em primeira mão aqui no Trabalho Sujo, é um álbum duplo conceitual que Patalano dividiu em duas metades. “Um disco com uma temática mística (Mithras), e outro com temática científica (Lab), dois temas aparentemente antagônicos, mas na verdade interdependentes”, explica. “Esse álbum foi meu instrumento de reconciliação entre esses dois universos, porque a música cria atalhos para o absoluto. Na antiguidade, o mesmo homem era capaz de ser tocado pela ciência e pelo misticismo, como Pitágoras, que intuía a música a partir da matemática, e vice-versa. Mas com o tempo o homem se especializou, se polarizou e hoje vejo uma tendência de reunião destes polos, uma catedral e um acelerador de partículas são templos distintos para a adoração dos mesmos deuses, sejam eles sagrados ou pagãos. Em ambos os casos, estamos erguendo uma obra para tentar amplificar nossa pequenez.”
Ainda são canções criadas ao redor do violão, mas que tomam rumos mais ambiciosos, épicos e elétricos que o disco anterior, The Romantic Journeys of Pollen, produzido pelo Kassin, que fez o grupo ser parte da safra de artistas que reuni quando fui curador do Prata da Casa do Sesc Pompeia em 2012. Vitor fala compara a dinâmica musical com a dualidade proposta no disco. “Pra gente, o palco é um local de cerimônia e o estúdio é um laboratório. E nós experimentamos bastante. Fiz muitas demos. Sampleei. Ressampleei. O álbum tem desde um violoncelo com cordas de tripa de carneiro até música programática generativa. Tratei as demos como hipóteses, que ia testando, corrigindo, melhorando. Depois das demos prontas as músicas foram todas regravadas, agora já com a participação dos músicos. e foram muitos colaboradores, em especial o Daniel Ganjaman e o Kassin, mentor da banda desde o início.”
Além dos já citados, Mithras Lab também reúne uma banda de músicos reunidos a partir da nova base de Vitor, em São Paulo (ao contrário do disco de estreia, gravado com outros cariocas). “A nova formação da banda, além do Rocco Bidlovski na bateria, e do Beto Montag no vibraphone, que já tocavam no Me & the Plant, conta com Regis Damasceno, na guitarra e violão, Meno Del Picchia no baixo e três backing vocals, Ana Cigarra, Claudia Noemi e Luana Jones. Houve mais tempo para produção, e isto se reflete no show.”
Tempo é a chave para o novo disco, que Vitor compara ao vegetal que batiza o projeto. “O tempo das plantas é diferente. Vejo a arte como uma semente, que precisa de um terreno propício, de cuidado, depuração, de exposição às intempéries, às estações, ao tempo. O mundo dos homens, tecnológico, de dados processados em milissegundos, está posto para atender às urgências do mercado, mas a floresta não tem pressa. A melhor forma de o artista independente resistir nesse ecossistema de inteligências artificiais é oferecer sua capacidade de contemplação: sua natureza. E entre a contemplação e seus frutos, vai tempo.”
O grupo mostra o novo trabalho nessa sexta-feira, no Sesc Vila Mariana (mais informações aqui), e o show segue a linha da apresentação do grupo no festival catalão Primavera Sound este ano. “Foi bonito. Me and the Plant florindo no Primavera teve um forte apelo simbólico para a banda”, lembra Vitor. “Foi ótimo poder manter contato e dividir o palco com outros artistas brasileiros e do resto do mundo, e se sentir fazendo parte de um movimento.”
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