Entrevistei Fernando Dotta e Rafael Farah para a revista Trip, fundadores da Balaclava Records, núcleo de produção indie que, com a nova edição de seu festival, dá passos firmes para se estabelecer como um dos principais players do mercado independente brasileiro. Um trecho da conversa com os dois:
O selo ainda contou com a sorte ao fechar a vinda de sua primeira turnê com um artista gringo poucos meses antes de seu disco projetá-lo para um público maior: “Foi um choque”, lembra Dotta. “Era uma aposta, a gente fechou o show dele um mês antes do lançamento do disco Salad Days e o disco tinha acabado de vazar na internet. No dia do show todas as pessoas estavam cantando todas as músicas no Sesc Belenzinho”. Farah completa ao lembrar de outro momento emblemático com o indie alto astral. “Um ano depois tínhamos a Audio lotada para ver o show dele e uma turnê que passava por sete cidades do Brasil — e isso só um ano depois do primeiro show. E o mais legal foi que o Mac era o único headliner gringo e o povo chegou cedo, pra ver as outras bandas brasileiras”.
A segunda vinda de DeMarco para o Brasil foi na segunda edição do Balaclava Fest, que o selo lançou em abril de 2015 no Centro Cultural São Paulo, ao trazer o fundador do Superchunk e dono da gravadora Merge para apresentar-se sozinho em São Paulo. Em novembro daquele ano, trouxeram Mac DeMarco acompanhado de artistas como Mahmed, Terno Rei, Séculos Apaixonados, Jovem Palerosi e Nuven. As outras edições do Balaclava Fest trouxeram o Swervedriver (no Cine Joia, em maio de 2016), Mild High Club (no Clash Club, em novembro daquele ano), Slowdive, Clearance e Widowspeak (no Cine Joia, em maio de 2017) e Washed Out e Homeshake (no Tropical Butantã, em novembro do ano passado), além de uma edição em Porto Alegre (com Yuck e Tops, em novembro de 2016). Todas as edições do Balaclava Fest contaram com pelo menos duas bandas brasileiras em cada show, e não apenas bandas que pertenciam ao selo. Além dos artistas do festival, também fizeram shows do Sebadoh e do Tycho, além de levar as bandas Câmera e Terno Rei para tocar no festival espanhol Primavera em 2015.
Mas eles sabem que não conseguiriam fazer o que fazem se não fossem os pioneiros do rock independente brasileiro, como o selo carioca Midsummer Madness, que citam como referência. “Um cara que nos ajudou muito foi o [produtor mineiro Marcos] Boffa, que nos ajudou muito e deu várias consultorias, e também o [produtor sergipano] Bruno Montalvão, que já tinha uma expertise de produção, a gente não sabia como começar uma planilha”, reconhecem. Mas mesmo estando numa fase relativamente estável, sabem que não é fácil. “É mais insistência. A gente sabe que não pode deixar a bola baixar, porque senão acaba”, resume Dotta.
A íntegra pode ser lida aqui.
Entrevistei, para a revista Trip, o mestre produtor Pena Schmidt, que, no início do ano, reuniu as melhores listas de melhores discos do ano passado na #listadaslistas, que chega a uma conclusão surpreendente:
A ausência de artistas pop de grande escala diz o que sobre esta lista e a situação da música brasileira hoje?
Esse é meu ponto exatamente. Na verdade existe um mercado exacerbado, aparentemente dominado por um estilos musicais absolutamente genéricos, de fórmula repetitiva, com artistas de alto poder de atração de público para grandes eventos em estádios, rodeios e festas, personalidades criadas por alto volume de execução em rádios e playlists, resultado de ações promocionais, popularidade comprada. Este mercado “não-criativo” é incentivado por um mecanismo perverso da distribuição do Ecad (entidade arrecadadora de direitos autorais), que favorece exatamente quem frequenta este ambiente de audiência de massa, comprável. Pode ser dito que uma porcentagem muito grande do dinheiro que circula na música no pais, dezenas de bilhões, circula apenas neste mercado tóxico. Para mim, o fato mais importante revelado pela #listadaslistas é a ausencia de artistas ditos comerciais. Para não dizer que os dados são viciados, temos Pabllo Vitar, um artista de altíssima popularidade presente e na vigésima terceira posição – apenas ela. Dá para se afirmar com segurança que ele apesar de ser um artista popular não faz parte deste mercado comercial mencionado, sendo talvez o único artista pop, no sentido de ter um público de massa representado na #listadaslistas. Anitta, outra artista que poderia ter características parecidas não conseguiu dez recomendações, até por não ter disco lançado em 2017, pois, me parece, vive de singles. O grande mercado é formado por artistas que não representam a música brasileira. A #listadaslistas e seus artistas recomendados vem propor que estes são os artistas que nos representam.
A íntegra da entrevista você lê no site da Trip.
Em mais uma colaboração para o site da revista Trip, escrevi sobre a Universal Maurício Orchestra, formada por seis Maurícios da pesada: Fleury, Tagliari, Pereira, Bussab, Badê e Takara:
As gravações aconteceram no final de 2015 e início de 2016. A tônica do som também vinha do sonho de Tagliari. “Foi tudo bem aberto, ninguém trouxe nada pronto, a gente se encontrou e começou a tocar”, lembra Takara. “Tinha essa referência sugestiva ao Miles elétrico, [do álbum] In a Silent Way, e, no fim das contas, a formação, que é bem inusitada pra mim, refletia um pouco isso, a coisa do sax soprano, da percussão”, completa.
“A linha era cada um ficar à vontade naquilo que gosta, sabendo que estávamos inseridos dentro de um coletivo”, completa Badê. “A ideia do Tagliari era fazer uma coisa mais viajandona, instrumental, como o Miles Davis do sonho dele. A gente não ficou discutindo, apertava o rec e saía tocando”, lembra Fleury.
“Não lembro de ter combinado nada. Na real, olhando em retrospecto, foi meio mágico: muito som, muita risada, pouca conversa e a música fluindo. Tanto que quando você escuta o disco todo, vê que cada faixa tem uma onda muito diferente. Foi fruto mesmo de um encontro de vários backgrounds musicais e muita generosidade, um lance bem fraternal”, completa Tagliari. “O disco é isso, música espontânea, sem parar muito pra pensar, sem nada escrito antes, feita muito das influências sonoras que a gente tem, tipo pegar uma ideia que aparecia e brincar em cima dela”, emenda Pereira.
A conexão maurícia — termo cujo significado vem da mesma palavra que dá origem ao termo “mouro” e quer dizer “de pele escura” — não terminou no som. Depois de brincarem com a possibilidade de pedir a capa ao Maurício de Souza, o pai da Mônica e do Cebolinha, lembraram de outro Maurício que não era reconhecido pelo prenome, o DJ e ilustrador MZK, que aceitou prontamente a tarefa de fazer a capa.
A íntegra do texto você lê aqui.
Os rappers Emicida e Tassia Reis, o publicitário Ian Black, o sociólogo Tulio Custodio e a advogada Mayara Souza, do grupo Negras Empoderadas, falam sobre a importância do novo filme da Marvel do ponto de vista da representatividade negra, em uma reportagem que fiz para a revista Trip:
Todos concordam que o filme faz parte de uma tendência maior, que torcem para continuar em voga. “Vai ser incrível poder contar nossas histórias sem os nossos estereótipos, esse peso que o racismo nos coloca para que as pessoas tenham um lugar”, continua Tássia. “Mas falando só de filmes de super-herói, já é muito interessante porque são anos de ausência de representatividade, que pra muita gente pode parecer besteira, porém, só quem cresceu tendo que se enxergar em outros personagens sabe como é. Essa infância que pode ir no cinema e ver essa história, já fica com um pingo de esperança para seguir.”
“Para quem sempre viu seus pares em papéis secundários e toda a sorte de ausência de protagonismo — “black dude dies first”, já dizia o trope —, Pantera Negra aparece como um contêiner de compensações, com um herói e tudo o que o cerca com o mesmo peso só visto em heróis brancos como Thor, Homem-Aranha, Homem de Ferro e Capitão América”, comemora Ian.
Tulio arremata que o filme não é o início de uma fase e, sim, o fim de outra. “O filme — e a importância que vem adquirindo na sua divulgação —, é consequência de um movimento anterior ter fortalecido tanto por outras produções, como a série Luke Cage, debates públicos e o riquíssimo material criado por ‘independentes’, como Issa Rae, na série Insecure, e Donald Glover, na série Atlanta.”
Leia a íntegra aqui.
No fim do ano passado entrevistei o Guilherme Fontes pra Trip sobre o Chatô e, apesar da entrevista ainda não estar disponível na íntegra online (quando estiver eu colo aqui), dá pra ver um trecho dela no programa de TV deles, que já está no YouTube. O programa ainda tem um papo sobre o Rio Pinheiros, entrevistas com a Marjorie Estiano e o Rodrigo Amarante – e a conversa com o Guilherme começa a partir do minuto 14. Veja só::
Uma das capas da edição Trip desta virada de ano é o ator, produtor e diretor Guilherme Fontes, que entrevistei para a seção Páginas Negras que abre a revista. 2015 é o ano que marca os 20 anos do projeto que consagrou a fama de Guilherme, que deixou de ser visto como um galá de novela para ir parar nas páginas de polícia como pária do cinema nacional, ao desviar milhões de reais que deveriam ser gastos na produção de seu filme Chatô – O Rei do Brasil, baseado na biografia do magnata brasileiro das comunicações do meio do século passado Assis Chateubriand. Na entrevista, dada no dia seguinte à decisão judicial que exigia que Fontes devolvesse mais de 80 milhões de reais aos cofres públicos, o ator diz estar tranquilo e que é vítima de uma conspiração por ter querido crescer demais no showbusiness brasileiro. Mas ele disse também que o filme está pronto e deve ser lançado em 2015, quando ele começa a provar que não deve nada a ninguém. Um trecho da entrevista pode ser lido no site da revista:
Que grande lição você tirou dessa história toda, da filmagem do Chatô?
Jamais faria um filme sem o dinheiro todo na conta. Foi meu único problema. O dinheiro tem que estar 100% na conta. A lei permite usar mesmo que você não tenha 100%, isso está errado. Sair pra captar é legal e você envolve outros personagens no processo. Por outro lado, você coloca pessoas que não têm nada a ver com o processo pra decidir sobre o negócio. Tudo bem que você precisa de anunciantes, mas não pode condicionar à existência desses patrocinadores a obra cultural do país. As pessoas já estão começando a usar dinheiro próprio e esquecendo do incentivo.O que podemos esperar do filme?
Estou encantado com o lançamento do Chatô. Acho que fizemos um grande trabalho. Como disse o Cacá Diegues, quando viu o material bruto: “É o último filme tropicalista do cinema brasileiro”. É uma grande homenagem ao cinema novo, ao modernismo, a tudo que admiro. Ao Fernando Morais pelo grande livro que escreveu. Não sei por que os figurões do cinema vieram me satanizar. Eu sou produtor pra brigar por mais espaços, mais empregos para a nossa classe. Fui até o fundo do poço por esse filme. Mas tinha mola lá embaixo. Valeu a pena.
O resto, só na edição impressa.
Entrevistei o Guilherme Fontes para as Páginas Negras da Trip no mesmo dia em que ele voltou ao noticiário – não de cultura -, quando o Tribunal de Contas da União definiu que ele deveria devolver R$ 71 milhões aos cofres públicos. O dinheiro seria relativo aos gastos com o filme Chatô – O Rei do Brasil, um dos maiores épicos da história do cinema brasileiro mesmo sem ainda ter sido lançado. Segundo Guilherme, produtor e diretor do filme, suas contas estão corretas e o filme, finalmente, está pronto para ser lançado, quase 20 anos depois de ter sido idealizado. O inferno do ator/diretor, ele explica, é culpa de uma campanha pessoal contra ele – e dá mais detalhes na edição de fim de ano da revista. Confere lá.
E aos poucos Carol Rocha começa a ser notada, como dá pra ver por esse ensaio na Trip. Cuidado pra não abrir o link no trabalho porque tem peitinho.
E a Trip desse mês traz o ex-presidente na capa com seu novo assunto favorito: a erva.
E o que o senhor descobriu quando começou a estudar o assunto?
Quanto mais eu e os outros líamos, mais chegávamos à conclusão de que a guerra às drogas era falida e que o objetivo de zero droga é inalcançável. E, por isso, era preciso buscar outra abordagem, outra estratégia para tratar do assunto. Nossa comissão latino-americana há uns três anos lançou um documento que teve muita repercussão no mundo. O que dizia era mais ou menos o seguinte: os recursos estão todos concentrados em destruir a produção e combater o tráfico. Mas nada é feito para lidar com os efeitos na sociedade e em quem usa. Nada era feito de fato para reduzir o consumo. Com o cigarro, por exemplo, houve um esforço grande e caiu o consumo. E depois descobri que é preciso reconhecer que as drogas são múltiplas, e os efeitos não são homogêneos. Desde cigarro, álcool, maconha, heroína, cocaína. Vários mitos desabavam diante das pesquisas.Que mitos, por exemplo?
O de que o uso de uma droga leva, necessariamente, a outra. Não é verdade. Vocês podem ver no filme que a ex-presidente da Suíça dá um depoimento mostrando que o que leva de uma droga a outra não é o consumo, mas o mercado. É o traficante que induz. Outro mito que pude verificar pessoalmente em viagens é o de que existem drogas leves e pesadas. Sim, umas são mais pesadas do que outras, mas depende muito mais do tipo de uso que se faz. Se você acorda já fumando maconha é complicado. Se você acorda bebendo cachaça é ainda mais grave. Mas se você toma uma cachaça de vez em quando é bem mais tranquilo. O mesmo se aplica a maconha, heroína, cocaína… Então precisamos ter uma visão mais sofisticada sobre isso se quisermos, de fato, reduzir as consequências negativas. (…)Mas sofisticar a informação não basta sem uma mudança legal na hora de diferenciar uma droga da outra. Como o senhor encara a questão da maconha, especificamente?
Isso não é simples. Primeiro temos que descriminalizar o usuário. Mas mesmo na hora de diagnosticar o que é usuário e traficante é complicado. Porque todo usuário, uma hora ou outra, acaba sendo um pequeno traficante. Como o acesso à boca de fumo é ilegal, alguém que se arrisca aproveita e também pega para os amigos. Então isso cria uma teia de ilegalidade que é melhor acabar. Pelo menos no caso da maconha. Minha opinião é a de que a maconha pode ser tratada de forma diferente. Isto é, regulada como é o álcool e o cigarro.Isso vai bem além de descriminalizar o uso. Regular significa criar formas de produção e venda permitidas por lei, certo?
Uma coisa leva a outra. A opinião pública não aceita as ideias de uma vez. A gente precisa criar efeitos em cadeia. Quando você discute drogas, é fácil convencer uma pessoa de que o usuário não deve ir para a cadeia e que ele precisa de tratamento médico. Com isso quase todos concordam. Mas, no caso da maconha, a pessoa não requer tratamento. Em seguida, você tem que perguntar: e o que fazer agora? Ninguém pensa em liberar totalmente o uso. Mas, quando você vê os fatos, na verdade a maconha é menos danosa do que o álcool e o cigarro. Agora, vamos supor que ela seja colocada na mesma categoria desses dois. Ora, você não vai liberar álcool e tabaco para menores de idade. Em certos países existem restrições mais drásticas em relação às bebidas. Hoje, em São Paulo, se você fuma precisa ir para a rua acender um cigarro. Há 15 anos todo mundo respirava o mesmo ar infecto do cigarro. Antes fumar era sinônimo de glamour, agora não é mais. Isso vem de uma regulação maior. Mas alguém produz o álcool, o cigarro, alguém os vende.Como poderíamos criar um mercado regulado de maconha?
Tem mil caminhos. Não há uma receita. Isso tem que ficar bem claro. Nada resolve. Nada acaba com o uso nem com os malefícios que ela possa causar. Mas precisamos criar maneiras de reduzir os problemas. E tem muitas experiências nas quais podemos nos espelhar. Em Portugal, a descriminalização e, na prática, a não perseguição ao usuário deram certo.Mas Portugal não tem um modelo de produção e venda de maconha. O tráfico continua.
E isso é o que precisa ser discutido aqui. Uma coisa é o uso da droga e o que isso causa no usuário. Outro é o tráfico que gera violência. Em Portugal o tráfico não está atrelado à violência. Na Holanda eles podem vender, cobrar impostos nos coffee shops, mas a maconha entra no país ilegalmente. O Estado fecha os olhos à ilegalidade. Eles dão uma justificativa: “É melhor resolver metade do problema do que nem a metade”. É verdade. Mas vai para o México ou para uma favela carioca. A violência é o problema mais grave e vai continuar sendo. E não podemos realmente deixar o tráfico prosperar. Então não dá para aplicar a mesma receita igualzinha de um país para outro. No Brasil eu iria com cuidado. Faria alguns experimentos. Precisamos discutir e, na hora que descriminalizar o uso, poder perguntar: e quem produz?E, na sua opinião, quem produziria?
Cooperativas, autorizações para produção em pequena escala, jardins particulares para uso pessoal. Alguma coisa assim deveria ser experimentada para ver se a coisa anda. As estatísticas mostram que 80% dos que usam droga usam maconha. E, como ela é a menos daninha, menos que o cigarro, é razoável que a gente a separe das demais, para tirar essa receita do tráfico e concentrar o combate nas outras drogas que são mais perigosas. Essa é a discussão. E há no Brasil certo cinismo quando se discute isso… Porque o acesso à maconha aqui é amplo. E isso é errado. Não tem critério nenhum. Qualquer um consegue.É como se fosse liberado.
Exatamente. Ontem mesmo estava ouvindo no rádio que estavam vendendo livremente maconha em uma escola. E pior, o cara que vende não vende só maconha… Isso é um problema social grave para o qual não podemos mais fechar os olhos.
A entrevista (leia-a na íntegra aqui) foi conduzida pelo Torturra, que aos poucos está virando o porta-voz desse tema, quando comentou, na Twitcam abaixo, a matéria do Fantástico em que Fernando Henrique falou de seu novo affair com a planta proibida em cadeia nacional.
E pra quem ainda não viu a matéria do Fantárdigo…