Foto: Howard Barlow
De todos seus discípulos do Television, o Wilco talvez seja a banda que mais explicitou a importância do grupo liderado pelo falecido Tom Verlaine em sua obra, tanto que o escalou para tocar em uma das edições de seu próprio festival, em 2017. Mas o tributo que o líder do Wilco, Jeff Tweedy, faz para o recém-falecido mestre vai além das palavras que exaltam seu papel como guitarrista e vem na forma de uma versão simples e direta para uma canção incrível, “Venus”, que ele postou em seu blog, Starship Casual. Ouça abaixo:
Dois ícones da cultura do final do século 20, Patti Smith e Tom Verlaine foram pilares da cena independente nova-iorquina que forjou a cultura punk e ajudou a cidade norte-americana a reerguer-se culturalmente nas três últimas décadas do século. Mais do que isso: eram ídolos do rock e heróis da poesia, reverberavam dois cânones aparentemente alheios na mesma frequência e o que era improvável nos anos 70 tornou-se um cânone em si mesmo, dando uma sobrevida ao rock e alimentando corações e mentes de gerações posteriores e em inúmeras cidades pelo planeta. Patti Smith foi convidada pela revista New Yorker para escrever sobre o amigo íntimo que perdeu esta semana e abaixo traduzo o texto que a poeta escreveu para o guitarrista:
Morre um dos pais do punk e um dos maiores nomes norte-americanos da guitarra elétrica. Uma perda gigantesca.
Tudo bem que, fora Jimmy Rip – o segundo guitarrista que assumiu o posto depois que Richard Lloyd deixou a banda em 2007 -, o Television que se apresentou na quarta passada no Beco era o mesmo que havia gravado Marquee Moon. Era o mesmo Billy Ficca de cabelo descolorido e comprido firme na bateria e o mesmo Fred Smith, que a idade transformou num tiozão do churrasco, com o mesmo baixo forte e preciso. Mas o show era – como sempre foi – de Tom Verlaine. É ele quem ergue a banda a um nível extraterreno, que disse o célebre Ahmet Ertegün, da Atlantic, ao se recusar contratá-los por considerá-los música de outro planeta. Seus épicos urbanos são cantados com uma voz ao mesmo tempo doce e resmungona e ele floreia estas composições que remetem a um Bob Dylan indie com uma guitarra magistral, de ângulos improváveis, tocada com o polegar, sem palheta.
No show desta semana, a terceira passagem da banda por São Paulo, não foi diferente. Embora a harmonia entre os quatro seja incandescente e do substituto Jimmy Rip faça jus às frases originais de Richard Lloyd, o holofote naturalmente cai sobre Verlaine. Isso acontece justamente pelo instrumental de sua banda orbitar ao redor da força gravitacional gerada pela alternância dos versos de suas canções mundanas e de seu timbre elétrico ímpar. É a mistura improvável de canções mundanas e solos transcendentais que formam o coração e o cérebro do grupo. E o fato do homem Television ter o dobro da idade da média da platéia do Beco não o torna tão distante daquela realidade – a fauna da rua Augusta em 2013 não é muito diferente da Nova York do final dos anos 70, talvez mais populosa. Mas descer a rua paulistana antes de assistir aos nova-iorquinos foi uma experiência complementar ao show. Grisalho e de cabelo curto, Verlaine parecia mais um velho punk disposto a cantar as glórias de seu tempo, mas bastou a banda começar a tocar e suas duas vozes – a da garganta e a da guitarra – pareciam estar falando sobre a rotina daquele lugar, em São Paulo.
Entre clássicos e músicas menos conhecidas, a banda começou o show pontualmente às 11 da noite e segurou quase duas horas de apresentação, com poucas músicas durando menos que cinco minutos. O grupo até arriscou uma música nova e uma versão de “Persia” com vocal e letra, fazendo jus à sua lenta tradição de moldar canções com o passar das décadas. Afinal, lá vão quase quarenta anos desde o primeiro disco e a discografia oficial do Television, sem contar os discos ao vivo, tem apenas três discos de inéditas. O público, mais velho e mais intenso que o que assistiu ao Toro y Moi duas semanas antes naquele mesmo lugar, pedia músicas da clássica estréia da banda no grito e fechava os olhos em transe durante os longos solos de guitarra. E depois dos doze minutos de “Marquee Moon” ao vivo, a banda ainda voltou para um bis com “Psychotic Reaction” do Count Five, um clássico do protopunk psicodélico, fechando a experiência como se o Television fosse uma banda adolescente.
Fiz uns vídeos, confira abaixo.
WAT digo eu.
Belle & Sebastian – “If You Find Yourself Caught in Love”
George Harrison – “Got My Mind Set On You”
Jorge Du Peixe e Lucio Maia – “Kanibal”
Frank Zappa – “Florentine Pogen”
Olivia Tremor Control – “Jumping Fences”
Supercordas – “E o Sol Brilhou Sobre o Verde”
Syd Barrett – “Baby Lemonade”
Nick Cave & the Bad Seeds – “Get Ready for Love”
Walter Franco – “Cena Maravilhosa”
Serge Gainsbourg – “Cargo Culte”
Van Morrison – “Sweet Thing”
Phoenix – “Lisztomania”
Genesis – “Back in NYC”
Mopho – “O Amor é Feito de Plástico”
Elastica – “S.O.F.T.”
Pavement – “Old to Begin”
Herbert Vianna – “The Scientist Writes A Letter”
Stevie Wonder – “All Day Sucker”