Todo o show: Blur tocando a íntegra do Magic Whip para 300 pessoas

, por Alexandre Matias

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Postei lá no meu blog do UOL a íntegra do show que o Blur fez na sexta-feira para 300 fãs e que transmitiu ontem à tarde pelo YouTube: Blur pega o mundo de surpresa e lança online disco que “só” 300 ouviram.

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Protagonista das guerras do Britpop nos anos 90, o Blur é uma das bandas inglesas mais importantes dos últimos 25 anos. Não só por engalfinhar-se na teatral briga com o Oasis durante a última década do século passado, mas também por fotografar como poucos as mudanças de comportamento e do inconsciente coletivo de seu país. Nascido em plena era indie dance (quando apareceu com o irresistível hino de pista “There’s No Other Way”), o Blur traduziu perfeitamente as alegrias e anseios ingleses dos anos Blair na tríade Modern Life is Rubbish, Parklife e The Great Escape, além de cantar sob à sombra americana em sua tríade final (Blur, 13 e Think Tank). Em 2004 seu guitarrista Graham Coxon abandonou a banda, que manteve-se apenas como pessoa jurídica, sem gravar ou fazer shows até 2009, quando Coxon voltou à formação e a banda voltou a excurisionar e até a gravar duas músicas inéditas.

Mas não havia sinal de discos novos, até agora. 2015 começou com a notícia que a banda já havia gravado um novo disco no ano passado – em Hong Kong! – e que o disco sairia no próximo mês de abril.

O anúncio surpresa não é mais novidade nesta segunda década do século 21. Cada vez mais artistas vêm preparando novos discos completamente na surdina para tomar o mundo de surpresa com sua nova aparição. Uma tendência que começou com o Radiohead em 2007 e continuou mais recentemente com lançamentos de pesos pesados como Daft Punk, David Bowie, My Bloody Valentine, Beyoncé e os Racionais MCs. Quando menos se espera, vem a notícia de que o disco novo de um grande artista não só está pronto como já pode ser ouvido e na íntegra. Foi uma alternativa que diferentes nomes estabelecidos no mercado de música encontraram para conseguir capitalizar a própria reputação em centro das atenções de uma paisagem cultural cada vez mais intensa. Em vez de dourar o título lentamente – anunciando as gravações, o fim das gravações, a masterização, o título, a capa, a data de lançamento, o primeiro single -, estes artistas preferiram juntar o impacto de todas essas informações ao mesmo tempo e pegar o público de surpresa.

Cada um utilizou um método. O Radiohead, com seu In Rainbows em 2007, anunciou que tinha acabado de gravar o disco uma semana antes de colocar o álbum pra download gratuito, lançando a lógica do “pague o quanto quiser” que o grupo abandonaria no disco seguinte. O Daft Punk usou um trecho instrumental da música “Get Lucky” em dois comerciais – um na TV e outro em um festival – para anunciar que estava voltando, revelando, aos poucos, e em menos de um mês, que o disco teria uma série de participações especiais ao mesmo tempo em que iam mostrando a totalidade da primeira música, que tornou-se um dos singles do ano graças a esse conta-gotas. David Bowie saiu da reclusão com um clipe e o anúncio de um novo disco em dois meses. O My Bloody Valentine, sem gravar desde 1991, anunciou o novo disco alguns dias antes de colocá-lo à venda pela internet. Beyoncé esperou listas de melhores do ano saírem no início de dezembro de 2013 para anunciar seu disco homônimo, que além das canções, ainda trazia um clipe para cada música.

No período em que desativou o Blur, seu líder Damon Albarn experimentou diferentes rumos na música. Montou bandas diferentes com músicos improváveis: com o baixista do Clash Paul Simonon, o guitarrista do Verve Simon Tong, o baterista do Fela Kuti Tony Allen criou o The Good the Bad and The Queen; com o mesmo Allen e o baixista do Red Hot Chili Peppers Flea montou o Rocket Juice and the Moon. Além disso gravou discos com músicos africanos, montou três óperas, lançou seu primeiro disco solo sem deixar de lado o projeto Gorillaz, a banda de desenho animado que inventou com o criador da Tank Girl Jamie Hewlett.

Os experimentos pop anteriores de seu líder e o anúncio-surpresa do novo disco indicam que o Blur está experimentando também com o lançamento de The Magic Whip. A gravação do disco em Hong Kong não é o único flerte com o público consumidor oriental – a capa do disco vem escrita em chinês. A banda também começou a liberar músicas aos poucos em vídeo pelo YouTube para o público (outra tendência atual, bem mais aceita entre artistas de menor porte) antes do lançamento oficial do disco, mas no fim de semana passado ousaram com uma novidade que será consagrada nesta quarta-feira, dia 25, quando o grupo mais uma vez usa o YouTube como plataforma de lançamento do disco, que será finalmente conhecido pelo grande público após ser apresentado a um pequeno séquito de fãs na sexta passada.

No último dia 20, o Blur reuniu 300 fãs para um show em que tocaram apenas a íntegra do novo disco. Imagine a felicidade deste fã: ver sua banda favorita tocando músicas que nunca ninguém fora do círculo interno da banda ouviu. Mais do que um teste de mercado é um teste de fidelidade – referendado pelo fato de nenhum vídeo da apresentação de sexta-feira passada ter aparecido online. Não sei se os fãs assinaram um contrato de confidencialidade ou apenas assentiram a um pacto de sigilo informal feito com a banda, mas o fato é que ninguém mais assistiu àquele show. Até amanhã.

Nesta quarta-feira, dia 25, o Blur exibe a íntegra de seu novo disco ao retransmitir o show de sexta-feira através do canal do YouTube do Beats By Dre (sim, aquela marca de headphones do Dr. Dre que foi comprada pela Apple). O show será transmitido às 8 da noite em Londres, cinco da tarde no horário de Brasília.

Quando terminar a quarta-feira, o Blur terá feito o mundo inteiro ouvir seu novo disco sem que ele tenha vazado anteriormente. E tocado ao vivo, em vez de ouvido apenas gravado. Tenho a impressão que é a primeira vez que isso acontece.

Muito esperto, esse Blur… E acho que isso é só o começo desta brincadeira.

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