Vida Fodona #813: Retomada de ritmo

Sem pressa.

Ouça abaixo:  

Eis os melhores de 2023 na categoria Música Popular segundo a APCA

Ludmilla, Jards Macalé, Ana Frango Elétrico, Titãs, Luiza Lian, projeto Relicário e Mateus Fazeno Rock são os vencedores nas categorias de Música Popular da edição de 2023 do prêmio dado pela Associação Paulista dos Críticos de Arte, da qual faço parte. Eis os vencedores de cada categoria:  

Os indicados às categorias de melhor artista, melhor show e artista revelação de 2023 segundo a APCA

Depois de divulgar os 50 indicados a melhor disco do ano na semana passada, o júri da comissão de música popular da Associação Paulista de Críticos de Arte (do qual faço parte ao lado de Marcelo Costa, Adriana de Barros, José Norberto Flesch e Pedro Antunes), é a vez de anunciarmos os indicados a outras três categorias da premiação, artista do ano, show do ano e artista revelação. E eles são:  

Garotas Suecas: rock de arena

E o Garotas Suecas ultrapassa mais uma barreira e representa a cena independente paulistana ao tocar num estádio, abrindo para os Titãs no estádio do Palmeiras nesta quinta-feira. Nada mal, hein?

“Em certas horas isso é o que nos resta…”

Fui no último show da temporada de reencontro que os Titãs originais fizeram no estádio do Palmeiras neste domingo e a sensação da primeira apresentação, na sexta-feira, manteve-se intacta: o grupo é protagonista de um novo paradigma de entretenimento ao vivo no Brasil. A bem-sucedida turnê que o grupo fez neste primeiro semestre ainda não terminou: além de umas datas-extra que surgiram quando estavam fechando as principais capitais (próximos dias 23 em Vitória e 30 em Ribeirão Preto) e três datas no exterior (3 de outubro na Flórida, 6 de outubro em Nova York e 3 de novembro em Lisboa), o grupo ainda volta para mais um show em São Paulo, desta vez no tal do Vibra, o antigo Credicard Hall, em uma apresentação no próximo dia 27. Mas além destas, todas oficiais, Paulo Miklos deixou escapar algo que já é comentado nos bastidores – que o grupo fará outra rodada de shows no segundo semestre pelo Brasil.

O que nos leva a uma questão exatamente ao redor deste novo paradigma estabelecido pelo grupo no Brasil de 2023. Os Titãs surgiram na mesma década em que o mercado de diversão no país começou a se profissionalizar de fato. Clássicos causos envolvendo equipamentos precários, procedimentos amadores e o heroísmo de raros artistas internacionais que se aventuraram por aqui antes daquela época só maquiam o fato de que não havia uma indústria cultural no Brasil até o momento em que as gravadoras tornaram-se empresas multinacionais e provocaram transformações que tornaram aquela década tão memorável. A cena do rock brasileiro daquele período é fruto específico do momento em que as gravadoras estrangeiras começaram a tomar conta de vez do mercado fonográfico brasileiro.

Não por acaso é o mesmo período em que estas gravadoras criaram artistas de escala gigantesca, fazendo os shows em estádio dos anos 60 e os festivais dos anos 70 parecerem brincadeiras. A safra que transforma Michael Jackson, Madonna, George Michael, Prince, Bruce Springsteen e U2 em gigantes numéricos maiores que os Beatles ou o Led Zeppelin foram em seu tempo transforma o mercado da música em palco muito mais amplo que a compra e venda de discos. É o momento em que os shows ganham estaturas cênica e imagética que se contrapunha ao impacto do videoclipe naquela década. É quando os shows internacionais cruzam uma barreira e atingem um outro paradigma de entretenimento ao vivo – o mesmo que os Titãs atingiram nestes shows, só que em escala nacional.

O problema é que estes shows, por mais emocionantes e vivos que possam parecer, são uma enorme peça de teatro. Não que a emoção de seus atores não seja real, mas quem assistiu a mais de um dos shows desta turnês assistiu a shows praticamente idênticos. A única mudança em todo o repertório da turnê foi a inclusão de “Ovelha Negra” de Rita Lee no show de Salvador na semana em que a mãe do rock brasileiro nos deixou e sua repetição, por três vezes, nos shows em São Paulo, e a troca de posição entre “Marvin” e “Família” da primeira para a segunda metade da turnê. Fora isso, os shows tiveram exatamente as mesmas músicas na mesma ordem – bem como o assunto de todos os interlúdios falados, com a mesma mensagem repetida de formas diferente a cada nova apresentação. Isso faz com o que o show seja pontual e preciso, que tudo possa ser lapidado no decorrer da turnê para chegar à excelência da performance, mas tira o elemento-surpresa de uma apresentação ao vivo: era possível acompanhar música a música em cada um dos dias a partir das listas de músicas dos shows anteriores publicadas no site Setlist.fm.

Esta transformação de um show em um parque temático sobre o momento atual daquele artista tem suas vantagens e desvantagens, mas é possível chegar a um equilíbrio, como fazem Paul McCartney e os Rolling Stones (dois mestres dos shows idênticos que surfaram esta onda dos artistas gigantescos dos anos 80) propondo surpresas nas turnês vez ou outra, tocando ao vivo músicas próprias do passado ou versões que nunca foram tocadas nos palcos. Os shows de São Paulo poderiam ter convidados e houve até quem cogitasse que eles poderiam homenagear o recém-falecido tecladista do RPM Luiz Schiavon, que fazia parte da mesma cena musical que revelou os TItãs, mas além da menção à Rita Lee, foi tudo mais do mesmo. A performance catártica, o som perfeito, os telões de cair o queixo, a extensão da noite – tudo perfeito para uma única apresentação. A banda torna-se um relógio que funciona exatamente como se prevê.

(Cabe comentar a reação dos bolsonaristas na plateia ao discurso que Nando Reis – que baixista, pqp – fez lamentando os quatro anos de destruição que atravessamos há pouco ou quando o mesmo músico trocou um dos nomes da letra de “Nome Aos Bois” para incluir o nome do ex-presidente de merda. Houve vaias esparsas – embora os aplausos fossem mais intensos – e dedos em riste, algo que funciona pra lembrar que essa choldra ainda está entre nós.)

Daí o questionamento sobre esta segunda fase da turnê. Será que eles irão manter exatamente o mesmo roteiro dos próximos shows, ou podem prometer shows novos, com novas músicas? Nem tô pedindo para eles tocaram músicas de discos que são simplesmente ignorados pela turnê (toda a discografia da banda a partir dos anos 90, à exceção da fase acústica), mas há canções dos discos clássicos que nem deram as caras, como “Corações e Mentes”, “Insensível”, “Saia de Mim”, “Querem Meu Sangue”, “Mentiras”, “Armas pra Lutar”, “Clitóris”, “Massacre”, “Deus e o Diabo” e até mesmo “A Face do Destruidor”. Há também a possibilidade de chamar novos convidados – e não faltam candidatos para músicas de diferentes fases da banda – e até mesmo de tocar versões de músicas de artistas contemporâneos ou que foram influência para o grupo. Nem precisava mexer na estrutura dos telões (impecável), mas quem sabe mudar as animações – algumas funcionam bem, como as de “Flores”, “Jesus Não Tem Dentes…”, “Sonífera Ilha” e “Televisão”; outras (“AAUU”, “Comida”, “Bichos Escrotos”) são dispensáveis ou superficiais, quando não vergonhosas.

Não sei nem se isso é um esforço extra desnecessário, uma vez que nunca foi intenção do grupo passar mais tempo junto do que as datas que já foram anunciadas da turnê. Mas é uma possibilidade esticar ainda mais esse momento sem que ele caia na mera repetição mecânica do que já foi feito. E mesmo que isso aconteça, é inevitável que o grupo tenha mais datas lotadas em várias cidades do Brasil, mas seria tão mais interessante se eles mudassem um pouco a máquina que afiaram para esse semestre, justamente para seguir rompendo as barreiras atravessadas nessa primeira série de shows e não servir apenas como demarcação de uma nova fase. Depois desta primeira fase, os Titãs têm moral para seguir essa jornada.

Assista aqui:  

“A vida até parece uma festa”

A primeira apresentação da turnê de reencontro dos sete fundadores dos Titãs em São Paulo foi o que deveria ser: um espetáculo impecável de entretenimento pop. O grupo poderia ter optado por inúmeros recursos cênicos e musicais para lapidar ainda mais as expectativas em relação a esta volta histórica aos palcos. Mas preferiu optar pela própria presença e a grande atração para além do grupo no palco era um telão espetacular que esfregava o rosto de qualquer um dos integrantes na cara de todo o público, não importasse se você estivesse na pista vip (e este show ainda tinha uma pista vip da pista vip, acredite) ou na última arquibancada. O impacto audiovisual que as imagens do grupo causavam ao espetáculo acentuavam ainda mais o principal aspecto desta nova leva de shows: a carga emocional do reencontro.

Acompanhados do compadre produtor e mutante Liminha, substituindo a guitarra do saudoso Marcelo Fromer (cuja presença foi celebrada com a participação de sua filha Alice no intervalo acústico do show), os sete Titãs originais estavam visivelmente emocionados e aquilo se traduzia tanto em texto quanto em música. A cada vez que um deles pegava o microfone para comentar essa sensação, praticamente se repetiam – mesmo porque a sensação é única e fazia o grupo voltar a ser a hidra de multicabeças que enfeitiçou os anos 80. Arnaldo Antunes pulava no palco com um sorriso de orelha a orelha, Paulo Miklos suava carisma e Branco Mello encheu os olhos do público de lágrimas ao falar de sua volta por cima.

O repertório foi o mesmí(ssi)ssimo de todos os shows da turnê, sem tirar nem por, o que repete o elemento mecânico de como colocar uma máquina de entretenimento daquelas sem que nada saia do lugar, mas isso não é propriamente um problema. O encadeiamento das músicas repassa quase todos os clássicos dos quatro clássicos da banda, costura hits new wave dos dois primeiros discos, sobrevoa superficialmente o início dos anos 90 para jogar luz na fase acústica – e mais popular – da história do grupo, no fim do século passado. O entrosamento dos caras entre si e com as câmeras que projetam seus corpos no telão é de tirar o fôlego e são quase duas horas e meia com poucos intervalos para todos tomar fôlego. Caberia alguma participação especial diferente ou música inédita pelo fato de estarem tocando em sua cidade-natal, mas pelo menos revisitaram “Ovelha Negra”, que tocaram em Salvador em homenagem a Rita Lee. Mas ainda tem outros dois shows e surpresas podem vir…

Assista aqui:  

E se a inteligência artificial ampliasse capas de discos brasileiras?

No Twitter, o Jéferfon Menezes publicou o resultado das provocações que fez a um programa de inteligência artificial para que este completasse capas de discos clássicos brasileiros para além de suas fronteiras visuais – e como essa tal de IA viaja…

Veja os outros abaixo:  

Titãs ao mesmo tempo agora

Em mais uma colaboração para o caderno Eu& do jornal Valor Econômico, escrevi sobre os bastidores da tão aguardada volta dos Titãs, que começou neste fim de semana. Conversei com os diretores da empresa novata 30E, Pepeu Correa e Gustavo Luveira, que fazem os festivais Knotfest, Ultra, Mita e GPWeek e no último ano trouxeram Jungle, Wu-Tang Clan, Killers, Two Door Cinema Club, Gorillaz, Hot Chip e Kooks para o Brasil, e eles me contaram como conseguiram convencer esse bicho de sete cabeças voltar à ativa.  

É oficial: Os Titãs estão de volta

Estive na coletiva que anunciou a volta dos Titãs em 2023, quando passam por dez cidades com os sete integrantes originais. Falei com o Paulo Miklos e com o Liminha (que toca as guitarras de Marcelo Fromer nessa turnê) em matéria para o site da CNN Brasil.

Leia mais aqui.  

E essa história sobre a volta dos Titãs?

Pode não ser nada, mas é muito suspeito: sete dos oito Titãs originais trocaram suas fotos no Instagram ao mesmo tempo nesta quinta-feira – fotos em preto e branco cuja linguagem visual as faz conversar entre si. O grupo foi reduzido a um trio nestes últimos anos, com Branco Mello, Sergio Britto e Toni Belotto respondendo em nome da banda que já foi um dos maiores fenômenos populares e artísticos do país. Mas no início dos anos 90 Arnaldo Antunes deixou a banda e foi seguido por Nando Reis, que deixou a banda dez anos depois, após a morte de Marcelo Frommer, em 2001. Em 2010 foi a vez do baterista Charles Gavin sair da banda e seis anos depois foi o vocalista Paulo Miklos que largou o grupo. Mas essa movimentação online acentua uma especulação que o grupo estaria armando uma grande turnê de volta no ano que vem. Eu iria nesse show amarradão – e você?