Thiago França saindo da toca

, por Alexandre Matias


Foto: José de Holanda (divulgação)

“A pandemia me paralisou demais no sentido criativo, e criatividade precisa ser exercitada – ficar muito parado dá a sensação que as idéias vão sumindo da cabeça, que você não é mais capaz de criar”, Thiago França me explica, por email, como o confinamento da pandemia acabou funcionando como inspiração para mais um disco solo, este chamado de Bodiado, que chega às plataformas digitais nesta sexta. Como seu outro disco que lançou no início da quarentena, Kd Vcs, este também é um disco só de saxofone, mas bem diferente do anterior, que foi gravado sem efeitos, pós-produção e quase todo no primeiro take. Ele inclusive antecipa uma das faixas, “Uns Poucos Dias Bons”, em primeira mão para o Trabalho Sujo, ouça abaixo.

“Com essa vontade de criar alguma coisa, qualquer coisa, primeiro o disco era um projeto só de exploração do Logic, o programa que eu uso pra gravar em casa, entendendo o melhor ângulo pra tocar, como soa com mais ou menos ganho, sacando os comandos do programa”, ele continua explicando o novo disco, que tem menos de vinte minutos. “Peguei uma música minha que nunca tinha sido gravada pra experimentar, e justamente música se chama ‘Bodiado’, uma parceria minha com o Romulo Fróes e o Clima, de 2010, e isso abriu o caminho pro resto. Estar bodiado foi um sentimento constante durante a pandemia e isso acabou sendo fio condutor da criação, algo que falasse desses sentimentos pandêmicos do ponto de vista dum artista interrompido”, brinca.

Bodiado é curto e direto, mas diferente de Kd Vcs, que foi inclusive gravado antes da pandemia, é menos contemplativo e existencialistas. São faixas curtas que têm uma ambiência quase cinematográfica, com um dinâmica musical bem diferente do que o título do disco parece indicar. “A princípio pode parecer bastante com o Kd Vcs pq só tem saxofone do começo ao fim do disco, mas difere em dois pontos essenciais: não é o disco de um só saxofone, algumas faixas chegaram a 20 instrumentos sobrepostos, e também por chegar num resultado sem a preocupação de ser reproduzível no palco, mais no sentido de experimentos sonoros. O Kd Vcs é um disco construído com composições que funcionassem sendo tocadas por um saxofone solo, no Bodiado não tive a preocupação sequer de criar melodias, só desenvolver os temas mesmo, com melodias soltas, improvisos, etc.” E ele já antecipa que não fará shows desse novo disco.

Aproveitando esse gancho, pergunto sobre como ele está encarando essa nova fase da doença que, à medida em que as pessoas vão sendo imunizadas, aos poucos os shows voltam a acontecer. “É complexo, porque subir no palco e tocar é o que eu faço a minha vida inteira, é onde eu quero sempre estar, tocar lava a alma de qualquer pessoa no palco, essa parte é maravilhosa e eu fico muito à vontade. Mas a parte de se relacionar com as pessoas, com o público ainda não tá totalmente fluida. Tem gente que tá saindo de casa agora pela primeira vez, tem gente que não parou em nenhum estágio da pandemia, então tem quem fique super emocionado num show e outros que não tão muito aí não. E não é que a gente desaprendeu a se relacionar, mas cada pessoa tá de um jeito e o momento demanda uma etiqueta atualizada, por exemplo, esses dias depois de um show, uma pessoa desconhecida veio falar comigo sem máscara, me estendeu a mão e pediu pra tirar uma foto. Eu fiquei em pânico, travei. A foto acabou rolando porque eu fiquei sem reação, mas achei muito sem noção da pessoa.”

E quanto ao carnaval de 2022? Teremos a Charanga do França? “Ao mesmo tempo a gente tem que se readaptar a isso também, porque a não ser que uma nova hecatombe interrompa, a Charanga estará firme e forte no carnaval do ano que vem. Muita gente ainda tá ressabiada e eu acho que a desconfiança vem não da vacina ou da ciência, mas pelo simples fato de alguma coisa no Brasil dar certo sob o comando infeliz do presidente. Mas a real é que esses três meses até o carnaval vão passar voando e logo mais estaremos bem aglomerados, vou acostumando com a idéia porque uma coisa é certa: não existe meio carnaval.”

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