Stop Making Sense no Brasil!

E depois de muita espera, Stop Making Sense, o filme dos Talking Heads que a A24 restaurou e distribuiu nos cinemas chega às salas brasileiras. As sessões acontecem neste mês, a princípio apenas no dia 9, mas como os ingressos se esgotaram muito rápido, foram abertas novas sessões nos dias 27 (22h) e 31 (16h), no IMS de São Paulo, e no dia 27 (20h) no Estação Net Botafogo do Rio de Janeiro. Os ingressos para as novas sessões começam a ser vendidos neste sábado, dia 9, apenas pelo site Ingresso.com.  

O melhor filme de Demme? Stop Making Sense

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Show dos Talking Heads dirigido pelo recém-falecido Jonathan Demme também redefiniu o conceito de música com imagens – escrevi sobre isso no meu blog no UOL.

Jonathan Demme, cuja morte foi anunciada nesta quarta-feira, era um diretor de trajetória única na história do cinema. Foi cult e pop, célebre e desconhecido, comercial e alternativo, embora não tenha uma filmografia robusta para exibir. É autor de filmes importantes como Filadélfia e O Silêncio dos Inocentes ao mesmo tempo em que flerta com o trivial em comédias aparentemente leves (Totalmente Selvagem, Melvin e Howard e O Casamento de Rachel) ou com o meramente comercial (como o remake desnecessário – mas bem executado – de Sob o Domínio do Mal). Do ponto de vista estritamente cinematográfico, ele é um Ridley Scott menos comercial, um Ron Howard com voz própria, um Spielberg menor. Mas sua importância cresce quando vemos que sua relação com a cultura vai além do cinema e que ele é destes raros cineastas que entende tanto de cinema quanto de música.

Demme dirigiu videoclipes no início de sua carreira, como o de “The Perfect Kiss” do New Order, o da versão de “I Got You Babe” que o UB40 fez com a Chrissie Hynde nos anos 80 e o de “Streets of Philadelphia” de Bruce Springsteen, que trouxe para a trilha sonora de seu filme sobre Aids, o primeiro a tratar do assunto. Sua relação com a música seguiu nos anos seguintes, quando dirigiu uma trilogia de documentários com Neil Young (Neil Young: Heart of Gold, Neil Young Trunk Show e Neil Young Journeys), outro sobre o músico inglês Robyn Hitchcock e acompanhando a turnê do disco mais recente de Justin Timberlake, em seu último filme, Justin Timberlake + the Tennessee Kids, do ano passado.

E, claro, sua grande obra, Stop Making Sense, que também é o melhor registro em filme de uma banda ao vivo, gravado com os Talking Heads em 1984. É por O Silêncio dos Inocentes que Demme sempre será lembrado, principalmente por levar o grand slam do cinema comercial norte-americano ao ser dos raros filmes que ganharam os cinco prêmios principais do Oscar (melhor filme, melhor ator, melhor atriz, melhor diretor e melhor roteiro). A sombra da influência do filme que conta a história de um canibal elegante paira sobre nossa cultura pop até hoje – desde a sobriedade firme dos agentes do FBI depois da Clarice Starling de Jodie Foster até a violência gratuita e gráfica que permeia as principais obras norte-americanas deste século.

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Mas Stop Making Sense, o filme em que Demme filma um show dos Talking Heads em seu auge, é mais do que isso: é a obra-prima de Demme. Ele está sim contando uma história, a história não-verbal que é um show de rock. Vai desenvolvendo um crescendo literal ao colocar músico a músico no palco ao mesmo tempo em que mostra um show sendo montado no palco, com os instrumentos entrando pouco a pouco enquanto o palco também vai sendo montado. É como se o show fosse também o making of do show.

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Ele também encontra em David Byrne o ator perfeito para seus delírios visuais. O gestual de Byrne e seu olhar perdido, sua dança robótica e sua interação com o público (“alguém tem alguma pergunta?”, diz após o súbito fim de uma música) acompanhada de um groove pós-punk pesado, em que a edição e a forma como os músicos são mostrados acompanha o ritmo de perto. O ritmo do show é incessante e tanto a banda quanto seus convidados (o tecladista do Parliament-Funkadelic Bernie Worrell, o guitarrista dos Brothers Johnson Alex Weir, o percussionista Steve Scales e as vocalistas Lynn Mabry e Ednah Holt) não param de dançar um minuto. Sem contar os elementos de palco inventados pelo diretor junto com a banda, como os telões monocromáticos, o hoje clássico enorme paletó de David Byrne ou a inclusão de um abajur como objeto cênico – e parceiro de dança.

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Stop Making Sense é como o show reage a era do videoclipe, novidade comercial do mundo da música no início dos anos 80, mas também reposiciona o espectador de volta à plateia. Antes dele, filmes de shows clássicos – como o Last Waltz que Scorsese dirigiu para a The Band ou The Song Remains the Same do Led Zeppelin – colocam o espectador bem próximo da banda, criando uma cumplicidade inexistente em shows daquela proporção. São filmes que mostram o público como a banda o vê, uma situação que, de verdade, a audiência nunca irá passar. Demme posiciona a maioria de suas câmeras no público e assistimos ao show como se estivéssemos na plateia. E assim ele isola uma sensação que a maioria dos diretores de shows tenta recriar até hoje: a que realmente estamos assistindo a um show como se estivéssemos lá. Poucos diretores chegaram perto disso (Scorsese mesmo é um deles, principalmente no Shine a Light que filmou com os Stones), mas nenhum conseguiu de forma tão empolgante quando o falecido Johnathan Demme.

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Veja com seus próprios olhos:

Jonathan Demme (1943-2017)

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Mais do que um grande diretor, Jonathan Demme, que morreu nesta quarta, também foi um dos grandes diretores de vídeos musicais – em especial de um favorito pessoal, o impressionante Stop Making Sense, dos Talking Heads, que pode ser assistido na íntegra neste vídeo abaixo:

Grande perda.

Mais cinema minimal

O designer Brandon Schaefer segue uma linha parecida com a do minimalista espanhol Hexagonall – e ambos pertencem a uma cena global de remixadores visuais do inconsciente coletivo que, através do design, relêem o século 20 e o começo deste 21 com perspectivas bem além dos clichês que os cercam. Nessa mesma linha, vale conferir o Supertrunfo de fontes do Face 37, os livros-game de Olly Moss, os filmes de papel do Spacesick, os pôsteres do polonês Grzegorz Domaradzkis, o Tarantino do canadense Ibraheem Youssef, a filosofia pop do Mico Toledo e os super-heróis pulp de Steve Finch. E estes são apenas alguns dos que republiquei por aqui. Há muito mais.