Pude passear neste domingo pelo fantástico IV Festival Mário de Andrade, realizado pela biblioteca municipal de mesmo nome em suas instalações e redondezas, e é sempre bom ver a rua viva acesa pela arte e cultura. E entre estandes de editoras alternativas bem específicas, leituras de poemas e textos, exposições e exibição de filmes a praça Dom José Gaspar, ao lado da Biblioteca, fervia de gente ávida por cultura – e a edição deste ano do festival tornava tudo ainda mais intenso ao se pautar pelo centenário do movimento surrealista. E entre os shows do domingo – que contavam com apresentações do grupo Rumo e do Noporn em homenagem à Liana Padilha – pude ver a versão que o quarteto Sophia Chablau & Uma Enorme Perda de Tempo fez ao lado de Vítor Araújo para o primeiro disco solo do eterno mutante Arnaldo Baptista, o cinquentenário Lóki?. A celebração começou de trás pra frente, com o disco sendo relido a partir de seu lado B, que abre com a música-tema “Cê Tá Pensando que Eu Sou Lóki?”, e o grupo desmontando a maioria das músicas originais em arranjos que misturavam elementos eletrônicos, hardcore, jazz funk e de música brasileira ao mar de baladas rock do disco de 1974. O clima frio e chuvoso do fim de semana também deu um tempo e abriu um bem-vindo sol, deixando a tarde deste domingo bem agradável, o que ajudou ainda mais a recepção da releitura feita pelo grupo paulistano ao lado do músico pernambucano.
Que maravilha ver esses meninos decolando. Neste fim de semana, a banda Sophia Chablau & Uma Enorme Perda de Tempo fez seu primeiro show internacional ao tocar na escalação do Festival Primavera deste ano, em Barcelona. É o primeiro de uma série de shows que eles fazem na Europa e o jovem maestro Vicente Tassara me contou sobre a experiência, que compartilho abaixo, junto com a íntegra do show, segura!
E essa turnê europeia que a Sophia Chablau e Uma Enrome Perda de Tempo anunciou nesta segunda-feira? São doze apresentações em cinco países (França, Portugal, Espanha, Holanda e Alemanha) entre os meses de junho e julho. Nada mal, hein? Ah moleque!
Fim de semana começou com o reencontro da banda Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo com seu farol artístico, Ana Frango Elétrico, que originalmente aconteceria no início de março mas que, por questões pessoais (Theo Ceccato, o baterista, havia quebrado o pé!), só aconteceu dois meses depois, no mesmo Sesc Bom Retiro em que o primeiro show aconteceria. Era também o primeiro show da Enorme em uma unidade do Sesc após o lançamento de seu segundo álbum e acontecer no Bom Retiro ainda lhes garantiu um ótimo som para mostrar seu Música de Esquecimento na primeira parte do show – que ainda teve o próprio baterista vindo para frente cantar sua ótima balada “O Último Sexo” quase às lágrimas. Mas depois que Ana subiu ao palco, a banda voltou no tempo e Sophia puxou o flashback pra julho de 2019, quando eu havia juntado aquelas duas jovens forças no palco do Centro Cultural São Paulo, fazendo-os voltar ao primeiro disco de Ana, Mormaço Queima, que a vocalista não mediu elogios ao comparar com a lenda urbana do primeiro disco do Velvet Underground, que não vendeu muito, mas todo mundo que o comprou montou uma banda. E assim voltaram ao passado para tocar juntos músicas de seus primeiros discos como “Debaixo do Pano”, “Picles”, “Loteria” e “Delícia Luxúria”, mas também puxaram duas de seus discos recentes, como “Segredo” e “Quem Vai Apagar A Luz?”, em que Ana assumiu a voz do coautor da música, Negro Leo, e o momento mais bonito da noite, a versão que fizeram juntos para “Insista em Mim”. “Não vai embora nunca”, disse Sophia, antes de emendar, quase chorando que, “você é meu melhor amigo, cara”. Foi demais.
Estes são os 50 discos mais importantes lançados em 2023 segundo o júri da comissão de música popular da Associação Paulista dos Críticos de Arte, da qual faço parte ao lado de Adriana de Barros (editora do site da TV Cultura e apresentadora do Mistura Cultural), José Norberto Flesch (Canal do Flesch), Marcelo Costa (Scream & Yell) e Pedro Antunes (Tem um Gato na Minha Vitrola, Popload e Primavera Sound). A amplitude de gêneros, estilos musicais, faixas etárias e localidades destas coleções de canções é uma bela amostra de como a música brasileira conseguiu se reerguer após o período pandêmico com o lançamento de álbuns emblemáticos tanto na carreiras de seus autores quanto no impacto junto ao público. Além dos discos contemporâneos, fizemos menções honrosas para dois álbuns maravilhosos que pertencem a outras décadas, mas que só conseguiram ver a luz do dia neste ano passado, um de João Gilberto e outro dos Tincoãs. Na semana que vem divulgaremos os indicados nas categorias Artista do Ano, Show e Artista Revelação, para, no final de janeiro, finalmente escolhermos os vencedores de cada categoria. Veja os 50 (e dois) discos escolhidos abaixo:
O Primavera Sound São Paulo também divulgou os horários de suas apresentações, além de ter mexido no elenco por conta de problemas pessoais ou de saúde envolvendo algumas atrações confirmadas. saem Grimes, Puerto Candelaria e Twilight Sad para a entrada de Kelela, os queridos Filipe Catto e Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo. Juntando isso aos escalados da tenda eletrônica (DJ Gabriel do Borel e Rebecca, Toccororo, Etcetera, DJ Playero, Vhoor, Carola, Hudson Mohawke, MC Carol, Mu540 e Urias, L_cio, Cherolainne, Hi Tech e DJ Mau Mau), a edição deste ano do Primavera a edição deste ano do Primavera subiu um degrauzinho…
Que maravilha ver o Cine Joia cheiaço neste domingo para assistir ao show de lançamento do segundo disco dos Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, Música de Esquecimento. Com abertura do Jonnata Doll e os Garotos Solventes e participações do próprio Jonnata, Negro Leo, Vítor Araújo e Felipe Vaqueiro (vocalista da banda Tangolo Mangos, tocando gaita em “O Pato Vai Ao Brics”, do Leo), o show mostrou como o grupo está cada vez mais coeso musicalmente e como as músicas novas se contrapõem às antigas de forma radical, embora encarada pelo público como uma enorme saudação coletiva. Foi muito bom vê-los tocar a mesma “Idas e Vindas do Amor” que a Sophia me mostrou quando a banda ainda engatinhava cantada por um público completamente inebriado pela sensação indescritível de estar com sua banda favorita, transformando o grupo e os fãs numa pequena comunidade. Isso infelizmente foi posto à prova num incidente tenso, quando um fã subiu no palco e se atirou de cabeça no chão, sem tempo para alguém pudesse segurá-lo, fazendo-o perder os sentidos em um dos grandes momentos do show, quando tocavam “Delícia Luxúria”, do primeiro disco. E a banda, mesmo abalada (era possível ver nos rostos deles), foi precisa ao lidar com a situação: Sophia parou o show na hora, pediu para o público abrir espaço para que os médicos da casa pudessem retirá-lo e logo todos deixaram o palco avisando que dariam um tempo até saber como estava o fã. A banda voltou minutos depois com a notícia de que o enfermo estava melhor (tanto que até voltou para o público no final do show) e encerrou a apresentação tocando duas músicas além do previsto. Foi um momento crítico que podia comprometer ainda mais o show (e até a carreira do grupo), mas eles souberam lidar com a situação como muitos artistas com mais tempo de carreira talvez não soubessem, embora tenha encerrado uma apresentação que estava com a energia muito pra cima num tom acridoce. Felizmente foi só um susto.