Recuperando reportagens que fiz para outros veículos no passado para cá, eis a matéria que escrevi para a revista da UBC sobre o conceito de mercado midstream, área entre o underground e mainstream que foi devastada pela pandemia e que tenta recuperar-se neste novo momento.
É uma situação inédita que acarreta em um prejuízo sem precedentes: com a epidemia do coronavírus cada vez mais intensa em escala global, o mercado de música ao vivo sofrerá um golpe pesadíssimo que obriga todos seus players a se reinventar – ou quebrar. Escrevi sobre como a pandemia pode mudar completamente a cara do negócio da música hoje em uma matéria para a revista da UBC.
O mercado da música está doente
O impacto da pandemia no mercado de shows, eventos e festivais deve alcançar escala inédita, com prejuízos na casa dos bilhões de dólares só no segmento ao vivo, dizem especialistas
Como tudo relacionado à epidemia do Covid-19, a doença causada pelo coronavírus originário da China, a força de seu impacto total no mercado da música ainda é uma incógnita, mas o prognóstico não é nada bom. Sem expectativa sobre uma possível volta à normalidade — nem mesmo sobre quando alcançaremos o pico das transmissões —, os principais players da música e da cultura em geral cortam na própria carne para conter o alastramento da doença.
A princípio, os cancelamentos começaram na Ásia, pela proximidade com o epicentro da pandemia, e os primeiros “espirros” no resto do mundo foram a conta-gotas: anulações de shows e turnês internacionais que passavam por China e adjacências. Depois foi a vez de Europa, começando pela Itália. Agora, o quadro é grave no mundo todo.
Megafestivais como o SXSW, nos EUA, que aconteceria entre esta sexta-feira (13) e o próximo dia 22, já não serão realizados. O Coachella, que seria em abril, foi adiado para outubro. O Lollapalooza foi cancelado no Chile e na Argentina; no Brasil, foi adiado para dezembro. O Tomorrowland da França foi anulado. A convenção Women’s Music Event, que seria agora no fim de março em São Paulo, foi adiada para 5 a 7 de junho.
Uma cascata de grandes turnês deixará de ocorrer: Bob Dylan, Madonna, Santana, Pearl Jam, Disclosure, Miley Cyrus, Bikini Kill, The Who, Pixies, Cher, entre muitos outros. O DJ brasileiro Alok cancelou duas turnês, na China e nos EUA.
A banda-febre sul-coreana BTS apelou a outro estratagema, assim como o cantor uruguaio Jorge Drexler: transformar turnês em shows ao vivo sem plateia e transmitidos por streaming via redes sociais.
O impacto foi além da música e mexe inevitavelmente com todos os negócios relacionados ao ajuntamento de pessoas. Casas noturnas, museus e campeonatos esportivos inteiros — a começar pela NBA — também suspenderam ou adiaram suas programações, filmes tiveram seus lançamentos adiados, a maior feira de videogames do mundo, a E3, em Los Angeles (EUA), não terá uma edição em 2020, o mítico festival de cinema francês em Cannes e os Jogos Olímpicos de Tóquio ainda não tiveram (oficialmente) o mesmo destino, mas fontes já preveem que não resistirão ao vírus — e ao medo.
Governos de todo o mundo, principalmente na Europa, começaram a restringir aglomerações.
Duas das maiores empresas de shows do mundo, a Live Nation e a AEG, anunciaram também nesta sexta o adiamento sine die de 100% dos seus eventos. Como lembrou o jornalista e produtor cultural Léo Feijó numa coluna publicada no portal Mundo Música, a Live Nation, que tem participação majoritária no Rock in Rio, perdeu mais de US$ 1 bilhão em valor de mercado nos últimos dois dias
“Só no mercado de música ao vivo já se fala em um prejuízo de mais de US$ 5 bilhões”, afirma Juli Baldi, diretora criativa do Bananas Music Branding e do Mapa dos Festivais, citando um número que vem sendo repetido por diversas fontes do mercado, mas ciente de que a cifra deve crescer. “Pelas previsões, se, nas próximas semanas, o vírus se espalhar ainda mais, acredito que outros eventos de grande porte irão aderir aos adiamentos e cancelamentos. Os impactos econômicos são incalculáveis.”
Dentro da música, ela ressalta, o setor de shows e apresentações ao vivo é mesmo o mais obviamente afetado: “Tem toda uma operação por trás, de fornecedores de mão de obra, instrumentos e equipamentos, tecnologia, comunicação… Se não tem show, a casa não abre, o frequentador não consome cerveja, o técnico de som não vai, o equipamento não é alugado, a assessoria não tem o que divulgar. Se não tem festival, não tem venda de passagens, não tem hospedagem em hotel. Vai ser um grande efeito em cascata.”
Ninguém tem uma ideia clara dos custos relacionados ao pagamento de seguros pelos cancelamentos, além da eventual devolução (ou não) de cachês e de ingressos comprados. Os contratos trazem cláusulas variadas relacionadas a isso, e muitos têm recorrido aos conceitos de “catástrofe natural” e “ato de Deus” (comum na legislação de países anglo-saxões) para evitar as polpudas indenizações. As próximas semanas ainda verão uma definição sobre isso no mercado internacional.
Ricardo Rodrigues, da agência Let’s Gig, que cuida das carreiras de artistas como Liniker e Luedji Luna, iria para o SXSW e, depois, para a feira portuguesa MIL, também anulada. Toda a programação do segundo semestre, há bastante tempo planejada, ele diz, agora está em aberto. “É bem preocupante o cenário, coloca empresas em risco. As que não tiverem estruturas para aguentar um ou dois meses mais fracos, com a diminuição grande do volume de faturamento, vão sentir um impacto muito grande. Especialmente em São Paulo, que é a cidade com o principal foco de casos (de coronavírus).”
Ele prevê uma disputa por agendas muito grande no segundo semestre, quando – e se – o pior da pandemia passar. É como se o jogo começasse do zero. “São tempos inéditos para o mercado da música, e é curioso viver isso. É importante que todos os agentes do mercado dialoguem bastante para não termos uma guerra por sobrevivência. Teremos que manter a calma, respirar fundo, ser fortes.”
Para Juli, mesmo com a epidemia contida, haverá uma grave retração na contratação de shows e eventos. “Naturalmente vão surgir outros meios de monetização para artistas e indústria em geral durante os próximos meses de crise. As pessoas não vão parar de consumir música, e acredito que os setores de tecnologia e streaming lucrarão mais neste período. Ainda é preciso levantar dados do tamanho do impacto da epidemia na indústria da música. E que possamos a começar desde já a planejar a retomada.”
Quase no finzinho de 2019, a revista da UBC pediu para que eu conversasse com empresários e produtores sobre o impacto da alta do dólar no mercado da música independente no Brasil – e conversei com Fabrício Nobre, Ana Garcia, Andre Bourgeois, Ricardo Rodrigues, Bruno Boulay e Gabriel Thomaz sobre como este cenário mexe com diferentes camadas do cenário em 2020. Confere lá no site deles.
Fui convidado para fazer a mediação de um debate neste sábado dentro da Feira de Selos e Publicações, que a Balaclava Records organiza no Sesc Bom Retiro. O evento, gratuito, começa às 14h e reúne bancas de selos como EAEO, Rosa Flamingo, Sinewave, Assustado, PWR, Desmonta, Dissenso, Laboratório Fantasma, Risco, Midsummer Madness, entre outros, além de shows da Luiza Lian e da banda curitibana Marrakesh ʘ. Participo da segunda mesa do dia, que começa às 17h20 e fala sobre festivais e cenas musicais no Brasil, com a participação da Anna Penteado (do festival Vento), da Karen Cunha (que faz o Mês da Cultura Independente) e o Ricardo Rodrigues (do festival Contato). Tem mais informações sobre o evento, além da programação completa, lá na página do evento do Facebook.
Mais uma novidade da minha curadoria de música no Centro Cultural São Paulo: o minifestival Invasão Brasileira SXSW 2017, que acontece neste fim de semana e conta com shows dos Autoramas, Max de Castro, FingerFingerrr, Capela, Lista de Lily, Maglore e Liniker e os Caramelows, as sete bandas que irão representar o Brasil na edição deste ano do SXSW. Além dos shows, haverá duas atrações gratuitas: um debate sobre a importância do festival para bandas brasileiras no sábado (com o Ricardo Rodrigues, que cuida da carreira da Liniker; a Amanda Souza, que trabalha com o Maglore e o Leandro Ribeiro da Silva, da BM&A) e um papo com o Gabriel Thomaz, dos Autoramas, sobre mitos e verdades sobre tocar fora do Brasil, em que faço a mediação, no domingo. Os dois debates acontecem a partir das 14h – mais informações sobre o evento aqui.
Comecei ontem minha participação no Sim São Paulo com a palestra inaugural do evento (O Ecossistema da Música no Século 21) e sigo a tarde inteira dessa sexta-feira no Centro de Sâo Paulo, desta vez puxando outras discussões como mediador. As duas primeiras rodadas acontecem no Cine Olido: numa delas, às 14h, falo sobre jornalismo empreendedor ao lado da Bianca Freitas (do Club NME Brasil) e do Marcelo Costa (do Scream & Yell); na seguinte, às 15h30, converso sobre assessoria de imprensa e mídias sociais com Cassio Politi (da Tracto Content), Francine Ramos e Natalia Birkholz (da Inker), Larissa Marques (da Lema) e Piky Candeias (da Batucada). Depois, a partir das 17h é na Praça das Artes, quando converso sobre rádios com Patrick Torquato (Rádio Frei Caneca FM), Ricardo Rodrigues (do Festival Contato) e Roberto Maia (da 89 FM), e, finalmente, termino o dia a partir das 19h, batendo um papo com o China, a Irina Bertolucci (do Garotas Suecas), Karina Buhr, Thiago Pethit e Tim Bernardes (d’O Terno), para falar do ponto de vista do artista sobre essa história toda. Para saber mais informações sobre o Sim São Paulo, basta entrar no site do evento.