Retrospectiva OEsquema 2012: Televisão às tijoladas

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Com terças e sextas comprometidas com saídas de casa semanais, 2012 acabou, por outro lado, sendo um ano bem indoor, em que além de organizar as coisas em casa, consegui dar cabo em várias pendências televisivas que não consegui acompanhar em tempo real. Matei séries inteiras que acabaram faz tempo (My Name is Earl, Arrested Development, Freaks & Geeks, o longo débito com The Wire) e consegui acompanhar hits atuais para acompanhar em tempo real (Sherlock, Parks & Recreation, Homeland, Modern Family, Mad Men, Louie, Ancient Aliens, Breaking Bad, Dexter, Newsroom) – que passaram a acompanhar a única série atual que sigo desde o início, Fringe. Com esse intensivão, comecei a encarar as séries como encaro sagas em quadrinhos – e em vez de acompanhá-las semanalmente, prefiro digeri-las às temporadas (no caso dos quadrinhos, aos volumes dos TPBs). Já havia feito isso em anos passados, assistindo Sopranos, A Sete Palmos e Battlestar Galactica às tijoladas enquanto criava um ranking interior, mas 2012 me ensinou que esteve talvez seja o melhor jeito de consumir estes seriados, que devem estar entre as principais obras de arte pop da atualidade (mesmo que eu não tenha nem conseguido começar a acompanhar coisas como Games of Thrones ou Walking Dead). O que também dá uma sensação ímpar ao final de qualquer série – o ar de dever cumprido e o astral de ser uma pessoa melhor, como Earl ao final de cada episódio em que riscava um item de sua lista.

Retrospectiva OEsquema 2012: A arte do encontro

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O título do post saiu do brinde que o Marvio fez no recente encontro com poucos e bons em Nova York, mas vale para saudar um 2012 de encontros de verdade, olho no olho. Além dos eventos sociais que colocavam semanalmente nestas situações (terças no Sesc, sextas no Alberta), fiz questão de sacramentar os encontros de verdade, tão raros nestes tempos de amizades digitais (ilustram este espaços os encontros com o Cardoso – quebrando finalmente o tabu”nunca na cidade-base”, uma vez que ele mudou-se para São Paulo; e com a Roberta, contados um a um). E pressinto que só o início de uma redescoberta offline que tem a ver com festas, fartos almoços e shows. Um brinde!

As 50 melhores músicas de 2008: 19) Ting Tings – “Great DJ (Calvin Harris Remix)”

Vamos aos fatos: o que salva o Ting Tings é o refrão de “Great DJ”. Sem ele, os hits da banda (“DJ”, “Shut Up and Let Me Go” e “That’s Not My Name”) seriam só a repetição de uma fórmula que o Ting Tings descobriu, que transforma o White Stripes em pomponetes de torcida de futebol americano. Graças a uma vocalista loira e magra que funciona no vídeo, a fórmula vem sendo repetida com tanta insistência que, não fosse o tal refrão, a dupla inglesa conseguiria ser mais chata do que a Peaches. Mas há o refrão de “Great DJ”: “Imagine all the boys/ And the girls/ And the strings/ And the drums, the drums, the drums” com todos seus “a-a-a-a” e “i-i-i-i” que tornam a música memorável. Aí vem o Calvin Harris e sacrifica uma das melhores partes da música (o trecho guitar), distorcendo-o e entortando-o de um jeito que a música ganha um par de quadris até então não utilizados. O remix chacoalha a dupla inglesa formada por Katie White e Jules De Martino de tal forma que se eles insistirem no formato riff-e-bateria por mais um disco, não vão muito longe. Calvin deu a dica – rebolem.

19) Ting Tings – “Great DJ (Calvin Harris Remix)

Os 50 melhores discos de 2008: 19) Momo – Buscador

Marcelo Frota é o contraponto perfeito para os Supercordas. Juntos, ambos fecham todo o espectro de emoções necessário para chamarmos de nova psicodelia carioca. À frente de seu projeto solitário Momo, ele tem as mesmas características do quinteto liderado por Bonifrate e Valentino: carioca, vintage, lisérgico, denso, retrô, chapado, ensolarado e muito sério. Mas enquanto os Supercordas se divertem com os Mutantes e Syd Barrett num chá da tarde no Sítio do Picapau Amarelo, o Momo nos carrega para as profundezas da alma, abismos sentimentais existencialistas em que a solidão é a única opção. E por mais que beba no folk deprê de bardos filhotes de Nick Drake, como Elliott Smith, Bill Calaham e Will Oldham (papas da mesma cena folk que deita-se sobre São Paulo), é no Brasil dos anos 70 que se encontra sua matriz musical. Apesar da primeira referência musical ser o soberbo disco de estréia do Clube da Esquina e os primeiros trabalhos de Lô Borges e Flávio Venturini, o som do Momo bebe tanto do Pessoal do Ceará (Ednardo, Fagner, Belchior) quanto dos momentos mais hippies dos Novos Baianos e de Raul Seixas e dos discos ingleses de Gil e Caetano. E em oposto à festa sorridente dos Supercordas, Marcelo é sempre triste, taciturno, melancólico, mas seu segundo disco consegue erguer a cabeça e, mesmo com um onipresente clima de fim de festa, parece que estamos vendo o fim dos Beatles. É um big bang em câmera lenta, um espelho se espatifando em pedaços musicais tão diferentes quanto Pink Floyd ou Geraldo Azevedo, Love ou Marcos Valle, James Taylor ou Chico Buarque. Buscador em vez de cair na espiral depressiva da Estética do Rabisco (seu primeiro disco) propõe-se deixar a melancolia para trás, nem que, para isso, tenha de fazer canções tristes mas otimistas – o que pode melhor resumir o disco do que uma música chamada “Tristeza” cujo refrão abre a canção sobre o canto de passarinhos, afirmando, firme “e o Sol nascerá”? O Momo já é um dos novos trabalhos mais promissores da música brasileira atual – com disposição para tornar-se um dos nomes mais importantes da próxima década.

19) Momo – Buscador

Momo – “Preciso Ser Pedra

Os 20 melhores mashups de 2008: STV SLV – “Shut Up, American Boy”

O blog de Chicago Hood Internet já é velho conhecido inclusive fora da comunidade mashup, afinal, seus dois DJs Scott Lucas e STV SLV, são conhecidos por colidir indies azedos com rappers da pesada em mashups que praticamente apresentam os dois gêneros um para o outro. A pérola em destaque saiu da cabeça de STV SLV, que emendou o riff insistente de “Shut Up and Let Me Go” com o andamento firme da deliciosa “American Boy”. Deu tão certo que os Ting Tings e Estelle foram parar no Brit Awards como revelações do ano e cantando nada menos que o mashup ao vivo. Tiração de onda…

STV SLV – “Shut Up, American Boy

Os 50 melhores discos de 2008: 18) Metronomy – Nights Out

O começo e o final do segundo disco grupo inglês Metronomy (a dobradinha “Nights Intro/Nights Outro”) pode induzir o ouvinte à entrada num universo de melancolia indie que aproxima a psicodelia rústica do Neutral Milk Hotel ao leste europeu espiritual do Beirut de Zach Condon. Mas logo que “The End of You Too” engata – pouco antes de enganchar nos últimos vinte segundos de seu primeiro minuto – percebemos que estamos em uma pista de dança. Mas acompanhe o balanço quadrado, os timbres bregas de teclado, as guitarras-base meio frouxas e o caminhar torto do ritmo em si – o receituário de indie rock está nos detalhes que tornam o Metronomy uma banda pelo menos inusitada. O susto inicial é só a isca, pois o trio inventado por Joseph Mount (que oficializou a dupla Oscar Cash e Gabriel Stebbing como parte da banda – antes, os dois assinavam como The Food Group e funcionavam como banda de apoio quando Mount tocava ao vivo) pisa firme seus próprios preceitos rítmicos e estéticos, com um aparente orgulho nerd que se torna puro e inocente a cada audição. Compostas sempre sobre um ritmo matriz em que detalhes de produção e samples aleatórios vão sendo sincronizadas, as faixas de Nights Out podem ser entendidas como um enorme videogame sonoro de lógica, uma mistura de Sudoku com Guitar Hero que só pode ser jogado com os ouvidos – quanto mais você se envolver com a música, mais pontos você ganha. Para isso, o grupo propõe uma série de fases, que vão desde o pop fácil (“Heartbreaker”, que sampleia uma porta abrindo) à dance torta (“A Thing for Me”), de uma mistura de krautrock com new wave (“On the Motorway”) a um ritmo caribenho robotizado (“Radio Ladio”) de uma balada composta ao redor de gemido eletrônico (“On Dancefloors”) a uma versão japonesa para o pós-punk (“Back on the Motorway”). E distorcendo vocais em falsete e timbres mecânicos e sintéticos, vão superpondo riffs, refrões, linhas de baixo, viradas de bateria e frases de efeito como se cada faixa fosse um minijogo, o Metronomy faz indie dance para tempos minimalistas, engrossando uma cena que surge debaixo dos confetes da new rave e logo vem assumindo um papel importante na música atual, que são as bandas de rock que tocam música para dançar. Essa nova cena inclui a safra de 2006 – de nomes como Rapture, Klaxons, Digitalism, Crystal Castles, Hot Chip, New Young Pony Club, Friendly Fires, Cansei de Ser Sexy – e a proximidade das cenas australiana e parisiense, além de poder agregar nomes da cena de novo rock do início da década, que começou com os Strokes e terminou com o Franz Ferdinand. Com Nights Out, o Metronomy coloca-se entre este panteão de bandas de médio porte que podem, em pouco tempo, mudar a cara da música ouvida no mundo inteiro. E daí que “My Heart Rate Rapid” lembra Gang 90?

18) Metronomy – Nights Out

Metronomy – “A Thing for Me

As 50 melhores músicas de 2008: 18) Britney Spears – “Womanizer”

A introdução composta por um zunido repetitivo abre a música como se o Daft Punk da fase “Robot Rock” estivesse experimentando uma áudio-hipnose gerada por uma furadeira. E quando Britney começa a cantar – monocórdica, monótona, robótica, mecânica – a faixa ganha ainda mais contornos artificiais, mesmo que sua sensualidade de plástico atice algum vestígio de humanidade. Quando ela entra no refrão – “Womanizer” quer dizer “Mulherengo”, imagina um refrão que repete essa palavra nove vezes seguidas -, Britney já extrapolou as fronteiras entre jingle e o single, o hit e o repeat. Termos como “comercial” e “pop” ganham novas dimensões à medida em que a diva fake dispensa outro jovem popstar que vem bater em sua porta com uma música incrivelmente grudenta, bubblegum para a era eletrônica. “Womanizer” não chega nem aos calcanhares das melhores faixas de Britney (“Toxic”, “Baby One More Time”, “Slave 4 U”, “Gimme More”), mas é boa o suficiente para figurar entre as melhores do ano. E sedimentar a carreira cada vez mais sólida de Britney Spears.

18) Britney Spears – “Womanizer

As 50 melhores músicas de 2008: 21) Supercordas – “Mágica”

Dono de um dos melhores discos nacionais de 2006 (só ficou atrás do Kassin, na minha votação), os Supercordas adiaram seu terceiro disco para 2009, mas não passaram por 2008 sem antes deixá-lo com um doce na boca. “Mágica” afasta o mofo celebrado em Seres Verdes ao Redor em uma canção tanto ensolarada quanto mística, usando guitarras e efeitos sonoros para levar o ouvinte a uma utopia primaveril, de psicodelia brasileira setentista, que mescla, sem preconceito, o Clube da Esquina com os Secos & Molhados, os Mutantes menos engraçadinhos com o Raul Seixas mais sério, reverberando melodia, acordes e solos que poderiam ter saído do Magical Mystery Tour, do Pet Sounds, do Odissey & Oracle ou de qualquer banda da Elephant Six. E o que dizer de uma letra que enfileira o rio São Francisco, a Califórnia, o Peloponeso, igarapés espaciais, cápsulas de sonho, formigas e dragões para culminar em “toda a mágica deriva dos elefantes” e desembocar em uma coda que poderia ser tanto da fase de transição do Pink Floyd quanto do final dos Beatles. Nota 10.


Supercordas – “Mágica

Os 50 melhores discos de 2008: 21) TV on the Radio – Dear Science,

“A era dos milagres/ A era do som/ Há uma era de ouro/ Vindo aí”. Quem diria que, ao descobrir a pista de dança, o TV on the Radio se tornaria uma banda relevante? Ao contrário de outros que abraçam a dance music e batidas eletrônicas como último recurso para fazer sucesso, os nova-iorquinos usaram o ritmo como opção estética, que era exatamente o que faltava para que seu belo trabalho de guitarras pudesse ir além do mimimi indie, que deixava a banda sempre com uma sensação de incompletitude. Pisando na mesma disco music que se espatifou para dar origem tanto ao hip hop quanto à carreira de titãs dos anos 80 como Prince, Madonna e Michael Jackson, o grupo, felizmente, não abandonou a melancolia e a solidão – apenas as adicionou à inconseqüência hedonista dos dias de hoje, limpando-a dos excessos felizes e jogando uma luz sóbria e sombria sobre um universo que parece formado apenas de deleite e transição. E mesmo com metais animados e baixos funky, ainda encontram momento para cordas lânguidas criar uma atmosfera de introspecção. E, mesmo assim, soa otimista e feliz com o futuro próximo – mesmo que isso signifique remar contra a maré.

21) TV on the Radio – Dear Science,

TV on the Radio – “Golden Age

As 50 melhores músicas de 2008: 20) MGMT – “Electric Feel”

Por mais desleixado e relaxado que os dois MGMT pareçam, eles são um projeto – algo entre um minucioso relatório nerd sobre a era psicodélica e suas relações com as ciências ocultas e um estudo fashion sobre o resgate das cores e do despojo durante os anos 60. Usam toda a mitologia sessentista como os góticos se referem aos poetas românticos, os metaleiros do mal se debruçam sobre o satanismo e algumas bandas de música eletrônica deixam-se levar por clássicos da ficção científica. Assim, vêem a década que deu ao mundo o flower power, os mods, o arcadismo hippie, a transgressão política, a esquerda rebelde e o rock como estilo de vida como uma coisa só – e traduzem hinos pop que poderiam ser gravados pelo Cure, pelo Kiss ou pelo Abba sob arranjos descaradamente retrô. “Electric Feel” é sua ode à selva, ao paganismo naturista, de sacrifícios a deuses-animais e confins do planeta. Mas, no fundo, no fundo, é só uma canção de amor. E das boas.


20) MGMT – “Electric Feel