Chris Bell – “I Am the Cosmos”
Cartola – “Corra e Olhe o Céu”
Hurtmold – “Deni”
Bees – “Got to Let Go”
MGMT – “Electric Feel”
The Good, The Bad and the Queen – “Behind the Sun”
Gilberto Gil & Os Mutantes – “Pega a Voga, Cabeludo”
Screaming Trees – “Dying Days”
La Pupuña – “Money”
Los Amigos Invisibles – “Mujer Policia”
Sala Especial – “Interlagos 75″
Pulp – “All Time High”
Olivia Tremor Control v- “A New Day”
Calexico – “Guns of Brixton”
Raul Seixas – “Caminhos II”
Notwist – “Alphabet”
Radiohead – “Down is the New Up”
Nick Cave & the Bad Seeds – “Albert Goes West”
Sonic Youth – “That All I Know (Right Now)”
Portishead – “Nylon Smile”
Essa semana vamos com músicas novas do De Leve, Jamie Lidell, Silver Jews, Curumin e Radiohead, além de velhas do Doobie Brothers, Mitchell Brothers, Ultrasom, Cher, Camisa e Raul, Beatles, Phoenix, Velvet e Ween!
E não esqueça de atualizar seu bookmark: http://fubap.org/vidafodona/?feed=rss2
Ultrasom – “Something Wicked This Way Comes”
Cher – “For What’s Worth”
De Leve – “Pra Ser Feliz”
Silver Jews – “We Could Be Looking for the Same”
Raul Seixas & Camisa de Vênus – “Muita Estrela Pouca Constelação”
Arty Fufkin – “Barrell of a Goo”
Curumin – “Mal Estar Card”
Bad Folks – “Coyote Girl Revisited”
Arctic Monkeys – “Fake Tales of San Francisco”
Walter Franco – “Arte e Manha”
Fantastic Plastic Machine – “Slippin’ On Down”
Doobie Brothers – “What a Fool Believes”
Mitchell Brothers – “Michael Jackson (Calvin Harris Remix)”
Beatles – “Glass Onion (Love Edit)”
Phoenix – “Long Distance Call”
Radiohead – “Bangers’n’Mash”
Velvet Underground – “Hey Mr. Rain (Version I)”
Ween – “What Deaner Was Talking About”
Jamie Lidell – “Little Bit of Feel Good”
Arthur de Faria e Seu Conjunto – “Ouro de Tolo”
Wandula – “Borges”
Rita Lee & Lucia Turnbull – “E Você Ainda Duvida”
Rivers Cuomo – “Lover in the Snow”
Radiohead – “Reckoner”
Gnarls Barkley – “Who’s Gonna Save My Soul”
Olivia Tremor Control – “No Growing (Exegesis)”
Autoramas – “Surtei”
Klaxons – “As Above So Below (Justice Remix)”
Teenagers – “We Are the Teenagers”
Cansei de Ser Sexy – “This Month, Day 10″
Kylie Minogue – “Wow (CSS Remix)”
Black Kids – “I’m Not Gonna Teach Your Boyfriend How to Dance with You (The Twelves Remix)”
Jonny Greenwood – “There Will Be Blood”
!!! – “Yadnus”
Franz Ferdinand – “Turn it On” (ao vivo)
Vampire Weekend – “Exit Music (For a Film)”
Jamie Lidell – ” You Got Me Up”
Júpiter Maçã – “As Mesmas Coisas”
“Soooomewheeeeere ooover the raaaainbooow…”
Fora todo o papo ético, econômico, legal e criativo ao redor do lançamento de In Rainbows, o disco que o Radiohead disponibilizou ao público em versão digital, há uma questão semântica que, pela banda, parece estar mais bem resolvida do que com a gente, os ouvintes. Logo depois que o disco deu as caras era muito comum ouvir as pessoas falarem que “a banda vazou o próprio disco”, como se não só em MP3 não estivesse valendo. O grupo cutucou ainda mais essa ferida ao programar o lançamento de In Rainbows em CD para o primeiro dia de 2008. De que ano é esse disco?
É claro que In Rainbows é de 2007. Mesmo se a versão física lançada pela banda chegasse para os fãs depois de janeiro, o disco tornou-se conhecido e ouvido no ano passado. O próprio Radiohead mais uma vez reforçou a datação de In Rainbows ao tocá-lo na íntegra em um show transmitido na noite de ano novo pela internet – não era uma apresentação ao vivo de um disco que ainda não existia fisicamente e sim a consolidação de um disco que existira até ali sem precisar do CD.
Em matéria de Radiohead, nenhuma novidade. O grupo foi protagonista do primeiro grande incidente envolvendo música digital, quando Kid A apareceu primeiro na internet (no Napster) e depois nas prateleiras de disco, no ano 2000. E o disco em questão não era nenhum arco-íris: Kid A é daqueles álbuns que frustram o fã por pular no abismo do experimentalismo. No holofote da expectativa, o Radiohead conectou-se com as principais vanguardas sonoras da virada do século e, quando apareceu primeiro na internet, parecia pegadinha. Muitos duvidaram se aquele era o disco de verdade, podia ser só uma gozação da banda. Não era. Kid A chocou ortodoxos, revoltou estreitos e encantou uma geração inteira de ouvintes que deixou-se levar pela viagem da banda.
Em 2007 o grupo repetiu a pegadinha, desta vez invertida. Foi indubitavelmente a banda quem avisou que o disco havia saído de sua esfera privada para a pública, algo que inevitavelmente aconteceria em alguma etapa do processo de transformação da música em uma rodela chata prateada. Entre o estúdio e a prateleira da loja, o disco passaria por inúmeras mãos – muitas delas de fãs do grupo, outras recebendo dinheiro para contrabandear o material. Qualquer um – no próprio estúdio, na fábrica de discos, na distribuidora, em qualquer etapa do marketing do novo álbum até na loja. Como sentira na pele há sete anos, o grupo sabia que era questão de o disco ficar pronto para que ele atingisse o ouvido público.
Por isso, o Radiohead foi na contramão. Preferiu ele mesmo dar o disco para os fãs, pois estes, independente de comprarem ou não o disco, iriam baixar qualquer registro inédito do grupo que parecesse ser novo material. Como já estava: todo o In Rainbows era composto por músicas que o Radiohead já trabalhava há anos e logo em que a seleção das faixas foi anunciada já era possível montar o clima do novo disco sem sequer ter o ouvido – apenas enfileirando corretamente vídeos caseiros da banda em turnê. Quando o disco de verdade apareceu (dia 10 do 10, 10 dias depois de ser anunciado, yadda yadda yadda) apenas confirmou a expectativa – e, como um efeito dominó, cópias eram feitas dos arquivos originais para armazenadores online de MP3s espalhados pela internet. Para baixar o disco, o grupo pedia o preenchimento de um minicadastro e, uma martelada doída no caixão da indústria do disco, sugeria que o público pagasse pelo disco. A provocação (ao mercado, à indústria, aos fãs, às outras bandas) era clara: “eu sei que você vai baixar o disco de qualquer jeito, mas se você quiser nos dar uma grana, não vamos achar ruim”. E pela primeira vez, podiam medir os downolads!
E, tanto em Kid A quanto em In Rainbows (mas não em Hail to the Thief, que contou com o marketing tradicional), o resultado do fato do grupo ter se beneficiado graças à internet foi consolidado com a chegada ao topo de algumas das principais paradas de discos mais vendidos pelo planeta.Tanto em 2000 quanto em 2007. Simplificando grosseiramente, os discos foram “testados” pelo consumidor antes de serem comprados. “Dados” ou “roubados”, dependendo do ponto de vista.
A gratuidade da música com a era digital é fato. Basta digitar o nome de qualquer música em programas ou buscadores específicos na internet que você vai encontrar. O mesmo pode ser dito sobre filmes, programas de TV, quadrinhos e livros, mas em escalas menores. Música, eu já disse, é o boi de piranha das transformações. É quem encabeça primeiro os tremores de mudanças sociais e, inevitavelmente, acaba sofrendo com isso. O Radiohead resolveu pagar pra ver – ou pedir pra você pagar, feito o moleque das Casas Bahia – se sentia a dor na pele.
Não sentiu – pelo contrário. Saudado como líder da nova revolução eletrônica, o grupo fez um disco irrepreensível – e idêntico ao disco esperado pelos fãs desapontados com Kid A. Convencional e correto, In Rainbows é orgânico em sua natureza e ousado na medida certa, sem exageros. E a reação dos ouvintes também foi inversa: se Kid A espantava, In Rainbows atraía. Muita gente foi ouvir Radiohead com atenção pela primeira vez graças ao marco autodeterminado pelo grupo. E, além disso, muita gente foi baixar música da internet pela primeira vez graças a In Rainbows.
É sério. Tem muita gente que vive completamente alheia à música digital e que trata o mundo de MP3, iPod e MySpace como uma alucinação coletiva ou uma grave debandada das pessoas para a ilegalidade. Com uma propaganda alarmista para tentar evitar uma crise anunciada desde os anos 90, a indústria de entretenimento conseguiu impregnar no imaginário das pessoas a idéia de que baixar conteúdo pela internet consistia em crime. Meu amigo BNegão não vai ligar se eu roubar uma anedota que aconteceu com ele que ilustra perfeitamente esta situação. Um dos primeiros artistas brasileiros a colocar seu disco inteiro para download (o ótimo Enxugando Gelo, se você não conhece, baixe agora), Bernardo recebeu um email de um fã que, morador de uma cidade pequena, não conseguia achar o tal disco para comprar. Ele nem pestanejou e retrucou o email com o link para o site do Centro de Mídia Independente, onde BNegão hospeda seu disco. Mas o sujeito do outro lado não ia baixar o disco, porque “baixar música da internet é prejudicial ao artista”. Posso estar me esquecendo de algum detalhe, mas a essência da história é essa.
É claro que há hierarquias e perfis entre os que baixam música. Há o que baixa os hits da hora usando um programa de P2P – onde também troca games e filmes – e o que fuça blogs de MP3 em busca de artistas desconhecidos. Gente que, mesmo que o artista não deixe sua música para download; liberando só o streaming, vai lá e consegue extrair o áudio na unha. Junkies por torrent que baixam discografias inteiras ou indies meticulosos que incluem até o PDF da capa na pasta de MP3s onde guarda o disco. Gente que troca arquivos via MSN ou que ripa CDs para mostrar para os amigos. São vários hábitos que já existem em relação à música digital e que, por algum motivo idiota, não os consideramos como fato. Não é mais “o que vai ser” – é o que é.
Se você mora em uma cidade com mais de um milhão de habitantes, tem grandes chances de a maioria das pessoas com fone de ouvido na rua estarem levando seus MP3-players portáteis. Com o computador migrando para o telefone celular de vez, será inevitável o dia em que teremos um só apetrecho que tire fotos, ande na internet, fale com outras pessoas e dê para ouvir música e ver filmes (eu quero o meu com isqueiro embutido). E a propalada “inclusão digital” vai estar bem melhor encaminhada…
Por enquanto, estamos exatamente no meio. E quem não usa a internet para ouvir e conhecer música é como uma pessoa que só pode ouvir rádio, mas não pode comprar discos nem fitas: a quantidade de opções, em comparação, é minúscula e você fica a mercê dos outros para ouvir o que quer.
Mas e a música vai ser de graça? “O artista vai viver do que?”, me pergunta sempre um carinha da MPB ou um roqueiro camisepreta. Perguntas ainda sem resposta, mas se você baixa arquivos por um provedor de internet é provável que este seja quem melhor sabe quem está sendo ouvido, lido, assistido. O U2 já fez a sua parte, tornando-se o Metallica dos provedores de acesso ao ameaçar processar todos os servidores que contivessem material pirata do grupo irlandês. Não me assustaria se o final dessa história viesse com um aumento no preço da assinatura à internet no provedor de qualquer um como desculpa de repassar (aham) o valor para os autores das obras. Mas me espantaria se liberassem tudo de graça – que é o único jeito de dar certo na internet atualmente. Mas aí era bem fácil que as pessoas fizessem festas de computador (as famosas Lan Parties) só pra trocar conteúdo entre si. Ou seja: controle? Esquece.
Por outro lado – e as lojas de disco? E os discos? Quanto tempo os discos durarão? Quem ainda gravará discos? Se há um par de anos o fim do CD deixava de ser uma suposição para ser uma possibilidade, hoje é fácil pensar num mundo sem discos. O artista ainda prensa o CD mesmo com a desculpa – plausível – de que o CD é seu cartão de visitas. Mas até quando? Cartões de visita no fim das contas, acabam ficando empilhados e são consultados raramente, quando não jogados fora.
Suspeito que há mais um fetiche do artista em ver sua obra concretizada em algo sólido do que disposição para vender os discos – sequer fazer com que eles sejam ouvidos. Não por falta de vontade na obra do artista, mas por falta de interesse na mídia escolhida. E se isso é visto como um problema para o artista brasileiro (mais do que para o estrangeiro, onde o disco ainda conta com uma sobrevida), eu vejo como uma solução. Sem ter que prensar, vender ou mostrar o disco, o autor poderá focar-se no que realmente sabe fazer. No caso, música.
E por falar em Radiohead, depois de faturar em cima do lançamento do disco mais recente da banda (quando relançou toda discografia deles num box), agora a EMI quer um pouco da grana da turnê, que começa agora em abril. Por isso, já está planejando uma coletânea em cima do material velho dos caras. E nem dá pra culpar os caras de nada, eles tão num perrengue histórico, inda mais depois que o grupo Terravista assumiu a gravadora.
É issaê. Depois eu ponho vocal. Se liga:
– “Brasil Racional” – Tim Maia
– “Navajo” – Black Lips
– “Big Ideas” – LCD Soundsystem
– “I Get Around (Midnight Juggernauts Remix)” – Dragonette
– “Heart of Hearts (The Brothers Mix)” – !!!
– “Standing in the Way of Connection” – A+D
– “Time to Pretend” – MGMT
– “Brainy” – The National
– “Let’s Dance to Joy Division” – Wombats
– “Run” – Gnarls Barkley
– “1 2 3 4 (Vanshe Technologic Remix)” – Feist
– “Hot as Ice” – Britney Spears
– “Sensual Seduction (Instrumental)” – Snoop Doggy Dogg
– “Wild Thing” – Troggs
– “Minuit Jacuzzi (DatA Remix)” – Tepr
– “Tenderoni (MSTRKRFT Remix)” – Chromeo
– “Out at the Pictures” – Hot Chip
– “Solitária” – Violins
– “Keep Cooler” – Nancy
– “Paranoid Android” – Vítor Araújo
– “Tchubaruba” – Mallu Magalhães
– “Like Dylan in the Movies” – Belle & Sebastian
– “The Levee’s Gonna Break” – Bob Dylan
Durante o fim de semana, o Radiohead instalou um relógio com uma contagem regressiva para o lançamento de seu novo álbum, num site que teoricamente anunciaria o sétimo disco da banda. Um rápido auê durante o finde e logo um monte de gente começou a desmentir a banda – inclusive ela mesma, que disse que o site em questão não tinha nada a ver com eles. Logo depois, o cronômetro apareceria zerado e em seu lugar, uma janela em vídeo começa a iniciar uma transmissão sob o título que batiza este post (O MAIS GIGANTE E MENTIROSO BOATO DE TODOS OS TEMPOS) e, em seguida, a página recarregava para um vídeo do Rick Astley mandando o hit “Never Gonna Give You Up” no YouTube.
Aí você abre o blog da banda no site oficial é eis o que temos, com a data desta segunda (já é segunda, na Inglaterra):
Hello everyone.
Well, the new album is finished, and it’s coming out in 10 days;
We’ve called it In Rainbows.
Love from us all.
Jonny
Detalhe: o link do In Rainbows acima redireciona para o site oficial do grupo. Que, por sua vez, redireciona para o site In Rainbows.com, que anuncia:
Mais um clique e temos uma tela para encomendar o disco.
Num FAQ, eles dizem que vão fazer a entrega do disco antes do dia 3 de dezembro, em todo o planeta e que trabalham com todos os cartões. Olha o bicho aí:
E esse é o tracklist:
CD 1 AND VINYL
15 STEP
BODYSNATCHERS
NUDE
WEIRD FISHES/ARPEGGI
ALL I NEED
FAUST ARP
RECKONER
HOUSE OF CARDS
JIGSAW FALLING INTO PLACE
VIDEOTAPE
CD 2 AND VINYL
MK 1
DOWN IS THE NEW UP
GO SLOWLY
MK 2
LAST FLOWERS
UP ON THE LADDER
BANGERS AND MASH
4 MINUTE WARNING
Detalhe: clique para comprar o disco e o custo dele é de £ 40,00. Clica para comprar só o download e…
Zero libras? Estranhou? Tem um ponto de interrogação ali. Sublinhado, tipo um link. Passe o mouse por cima dele e olha o link que ele indica…
“It’s up to you”. Tipo “você que sabe”.
Será que os caras tão dispostos a, mais uma vez, reescrever a história da música online – se uma vez, vazaram um disco “sem querer” (com Kid A), agora estão perguntando pros fãs quanto eles pagariam apenas no download de um disco.
Isso se não for pegadinha, claro.
Mas eles disseram que o site http://radioheadlp7.com/ (o da contagem regressiva) não era deles e que não tinha nada a ver com a banda. Mas basta clicar nele para cair no site do disco novo.
Ou será que In Rainbows não é o disco novo?
Ou será que eles vão fugir com o dinheiro de todo mundo?
Depois dessa, boa semana…
Senão me engano, essa resenha saiu no Correio Popular em pleno ano 2000, mas a Ana do Whiplash pediu pra republicar e graças a isso, consegui resgatá-la…
***
Como as décadas finais de pelo menos dois séculos anteriores, os anos 1990 foram marcados por uma retrospectiva dos 90 anos anteriores, aglutinando em células compactas de conhecimento tudo aquilo que a centena de anos completa ao final da década quis dizer pausadamente. Mas a década que encerrou-se no final do ano passado foi caracterizada por outros sabores: a ironia e o excesso de informação. Associadas, estas duas qualidades despem a grande verdade sobre a sociedade capitalista às vésperas do novo milênio, um paradoxo em escala planetária que nos emburrece à medida que mais aprendemos. O saber está no ar, mas ninguém está interessado em mostrar como usá-lo.
Na música pop, estas características foram detectadas pela primeira vez pelo U2. Embora ecos destas qualidades já viessem cantando os 1990 por caminhos alternativos na década anterior (como os discos Paul’s Boutique, dos Beastie Boys; Pills’n’Thrills and Bellyaches, dos Happy Mondays; e Into the Dragon, do Bomb the Bass), foi apenas com Achtung Baby que elas se encontraram com o teor que filtrou a década. Ali estão a paixão pelo virtual frente à realidade (“Even Better than the Real Thing”), referências à história do rock (“Who’s Gonna Ride Your Wild Horses?”, “One”), paranóia (“The Fly”) e um misto de expectativa com esperança (“Zoo Station”). “Você? Você estava falando do fim do mundo”, debochava Bono enquanto mudava radicalmente o visual de sua banda, abandonando a pose de sacerdotes do rock e entrando num terreno estranho à sua antiga religião: a música eletrônica, um carnaval de ritmos e cores fundido com o preto e branco ríspido do fotógrafo Anton Corbijn. O disco de 1991, no entanto, não funcionava sozinho. Vinha acompanhado de uma extensa turnê dividida em três fases (Zoo TV, Zooropa – que acabou virando disco – e Zoomerang), que assistia a banda entre dezenas de monitores de TV e automóveis pendurados no palco, numa clara alusão à deselegância burra pré-colapso do capitalismo. Numa fantasia de caubói prateada, Bono rasgava notas de dólar enquanto, como pastor evangélico, anunciava que teve “uma visão”: “TELEVISÃO!”, berrava frente ao câmera que, do palco, registrava tudo pelas telas espalhadas no show. Juntos, a Zoo Tour e Achtung Baby deram o tom “rir pra não chorar” que acentuou-se nos anos 90.
A ironia virava fórmula e todas as mídias passaram a usá-la, primeiro o cinema, depois a TV, caindo no gosto popular e reverberando, assim, por todas as formas de comunicação. Falar a verdade era constrangedor demais – ou melhor, falso demais -, por isso era melhor fingir querer dizer justamente o oposto, finalmente, desta forma, atingindo seu objetivo. Passamos a ler textos que nos fingiam contar o contrário do que realmente queriam dizer, ouvir músicas que ridicularizavam o hábito de ser humano, ver filmes cujo verdadeiro tema só é desvendado da metade para o fim, contradizendo tudo que havia sido visto desde o começo. A propaganda passa a se ridicularizar na tentativa de ganhar crédito com o consumidor. Tudo é muito falso, todo mundo sabe; então porque não assumimos falsamente esta falsidade? Era isso que a ironia nos anos 90 significou: uma espécie de afirmação de identidade cultural às avessas, corrompendo nosso entendimento da realidade numa mão dupla, que ao mesmo tempo que acende uma vela pro sim (afirmando algo), acende outra pro não (ridicularizando aquilo que está sendo afirmado, simultaneamente). Sem um, nem outro, caímos na década do “tanto faz”, em que as pessoas passaram a fazer exatamente o que o capitalismo queria, plugando-se às necessidades consumistas como se estas fossem responsáveis pelo bem estar espiritual – não material. Até Alanis Morrissette, em seu maior hit, perguntou: “Não é irônico?”.
É neste cenário que o Radiohead surge como força disposta ao desequilíbrio. O grupo surgiu na Inglaterra no começo dos anos 90, mas só conseguiu fazer sucesso nos Estados Unidos, graças ao hit “Creep” (do LP Pablo Honey, de 93), ganhando primeiro o público, depois a crítica americana. “Você é tão fucking especial”, sussurrava o vocalista Thom Yorke, “mas eu sou uma coisa, sou um esquisito”. Só ganhou algum reconhecimento em seu país ao se levar mais a sério em The Bends, de 94, onde deixavam de falar de relações cotidianas para contemplar a sociedade moderna como um todo, num dos primeiros discos conceituais da década (tantos viriam depois). O grau de importância do grupo foi crescendo tão logo eles ganhavam intimidade como músicos, contemplando possibilidades diversas a partir do formato três guitarras (Yorke, Jonny Greenwood e Ed O’Brien), baixo (Colin Greenwood) e bateria (Phil Selway). Reinventando o rock clássico como fazia o indie rock americano na metade da década passada (com uma certa dose de ironia, claro), o Radiohead chamava cada vez mais atenção.
Até que atingiu seu auge com o clássico inato OK Computer, ácida descrição da sociedade capitalista sem ironia nenhuma. Ao reproduzir as normas do novo dia-a-dia sem se preocupar com sentido lírico (quase todas as composições do disco de 97 empilhavam referências e situações sem o comprometimento com o sentido), ia nos vestindo com a roupa do andróide paranóico que a vida consumista de hoje nos transformou. O disco também antecipava a invasão techno ao mercado que aconteceria naquele mesmo ano (com os discos Dig Your Own Hole, dos Chemical Brothers; e The Fat of the Land, do Prodigy), mas apenas nas entrelinhas – a produção sci-fi de Nigel Godrich deixava apenas um ar eletrônico no álbum. Sem contar a música em si, as progressões guitarreiras que mudavam a atmosfera das canções, dando uma dinâmica inédita ao som do grupo. Incensado pela crítica, OK Computer tornou-se padrão de excelência do rock dos anos 90.
E o que fazer depois disto? Depois que toca-se o céu, resta outro rumo senão a queda? O grupo passou a dedicar-se a uma turnê em que viu-se condicionado ao máximo do capitalismo que criticavam. Laureados como a mais importante banda de rock do mundo, o Radiohead tentou lançou um EP (Airbag / How Am I Driving?) e dois vídeos (a coletânea de clipes 7 Television Commercials e o homevídeo Meeting People is Easy) na tentativa de esgotar a responsabilidade em torno do próximo álbum. Em vão: cada produto lançado era recebido como prova que o sucessor de OK Computer vinha aí.
A solução seria eliminar os parâmetros conhecidos e assim o grupo começou a trabalhar: Thom Yorke desencantou-se com a melodia e passou a procurar alternativas rítmicas. Ed O’Brien queria um disco curto, enxuto, com canções simples e diretas. Colin preferia um álbum mais aprofundado na eletrônica, mas sem soar “techno”. Kid A (EMI) é o produto das cinco (seis, contando o produtor Nigel) perspectivas de como o grupo fugiria do formato OK Computer.
O resultado é um disco árido, tenso, pós-rock, ermo – adequado para o ano 2000. Enquanto a quantidade de informações contida no álbum anterior dava um aspecto de poluição visual ao disco, o novo álbum elimina recursos visuais em favor de uma música sem rosto, sintética, ciborgue, futurista. Mas enquanto o futuro de OK Computer era hi-tech e bucólico, o de Kid A é vago e ameaçador, como se o espírito de máquinas mortas sobrevoasse por cima de desértica paisagem pós-apocalíptica.
O disco abre com teclados lunares que reverberam ondas eletromagnéticas que funcionam como uma canção de ninar por onde Thom Yorke pode improvisar apaixonadamente a letra. “Tudo está no lugar certo”, ele canta ao começo do disco, repetindo os versos à medida que a canção se robotiza, cada vez mais. Entra a faixa-título, novos teclados (e caixa de música marcando o andamento, ao lado de uma bateria de bebop) descortinam o caminho para a entrada do vocal, um zumbido metálico que com certeza canta algo, mas em idioma indistinguível. A voz de Yorke é distorcida por um aparelho pré-histórico chamado Ondes Martenot (usado na trilha de Star Trek) e remete ao Menino A, o primeiro clone humano, como reza a mitologia radioheadiana.
Esta forma carinhosa que o grupo se refere à pioneira cópia de DNA humano posta em prática num laboratório (que poderia se chamar qualquer coisa mas é reconhecido com uma intimidade familiar) torna possível outro paralelo com Stanley Kubrick, o maestro cineasta cuja pompa e pulso firme à direção, já que OK Computer remetia instintivamente a 2001 (quando a máquina contra-ataca). No novo disco, o Radiohead contempla A.I., a ode não-filmada do cineasta à robótica, em que ele assume que as máquinas são herdeiras do legado humano, nossos descendentes. O grupo vai além e pensa no clone como descendente, a máquina perfeita projetada pela natureza e reprogramada de acordo com nossa vontade. Mas que vontade? Racional ou instintiva? O grupo deixa a resposta em aberto, por enquanto.
“The Nation Anthem” nos apresenta ao baixista da banda, Colin Greenwood, que puxa um groove funk pesado que escurece mais ainda à entrada de um time de metais reverenciando os graves pesos-pesados de John Coltrane. Em falsete, Yorke canta a vontade e a disposição de mudar, que aos poucos impregna o inconsciente coletivo: “Todo mundo por aqui / Todo mundo vai parar aqui / O que está acontecendo? / (…) / Todo mundo vai parar aqui / Todo mundo vai parar o medo / O que está acontecendo?”. Ao citar literalmente o nome do mítico disco político de Marvin Gaye (What’s Going On? – O que está acontecendo?), o grupo nos lembra que os tempos atuais são tão (ou mais) interessante que os anos 60 que inspiraram Gaye a se perguntar sobre a ordem mundial. O grupo prega decisões coletivas como a melhor forma de ir contra o individualismo robótico e passivo de OK Computer. Não é nenhum pouco diferente do que a simbólica luta anti-FMI / OMC / Banco Mundial que já nos deu notórias batalhas como em Seattle (no ano passado) e Praga (semana passada).
“How to Disappear Completely and Not Be Found” finalmente apresenta os violões, enquanto o vocalista nos lembra que o filme Matrix é na verdade uma metáfora da nossa situação atual: “Eu não estou aqui / Isso não está acontecendo”, balbucia Yorke, enquanto o disco vai ficando cada vez mais lento, atingindo seu ponto máximo de estática na instrumental “Treefingers”, entrando vagarosamente no terreno gelado das brancas vibrações eletrônicas de Brian Eno. “Optimistic” poderia ser irônica caso se referisse à sociedade (ainda mais com este título – “otimista”). Mas a paisagem que o grupo vê é pós-civilização e o otimismo a que se referem é um abandono das tecnologias, uma volta à natureza, onde a lei da selva – perfeita – reina soberana: “Os peixes grandes comem os pequenos”, canta a letra sobre guitarras psico-metálicas que poderiam ter saído de Led Zeppelin III, “tente o melhor que você pode / O melhor que você pode é o suficiente”. “In Limbo” parece apenas descritiva, ecos e guitarras dissipando conforme a paisagem é mostrada: “Estou do seu lado / Não há onde me esconder / Estou perdido no mar / Você está vivendo uma fantasia / Não se importe comigo”, num novo ataque ao individualismo.
O ritmo marcial technopop que soa através de “Idioteque”, marcando um compasso eletrônico por onde a sociedade do desperdício é cruelmente descrita, em vocais familiares (mas entrelaçados de uma nova forma) de Thom Yorke: “Deixa eu te dizer que você é o primeiro / Eu vou rir até minha cabeça sair / Eu vou engolir até explodir / Já vi muito / Já vi tudo / A era glacial está vindo”. Descreve os seres humanos como dinossauros às vésperas da extinção, porque já ultrapassaram o limite de consumo de recursos naturais. O sotaque techno (proveniente da atual obsessão do grupo: a gravadora Warp) só ajuda a entender a crítica do grupo, que vai de encontro à letargia e o subsequente estado de automação que o ser humano aos poucos vai se submetendo – o ponto central de OK Computer. Em “Morning Bell”, o grupo volta ao campo da melodia do último álbum (até certo ponto ignorado no novo disco) e como um aparelho de TV ligado durante um bocejo matinal despeja informações de forma vaga e desencontrada – “Eu não conheço o assassino”, “Onde você estacionou o carro?”, “E todo mundo mente para mim”, “Todo mundo mente nas pesquisas” e o golpe final “Todo mundo quer estar lá / Todo mundo quer ser o mesmo / Andando, andando, andando, andando”. A vida moderna é um tédio.
Kid A termina com a melancólica “Motion Picture Soundtrack”: “Pare de mandar cartas / Cartas sempre queimam / Não são como os filmes / Que nos enchem de mentiras brandas”, divaga o vocal triste e tímido do final, que enuncia um clima de felicidade mágica à Walt Disney (orquestras cheias de harpas dedilhadas) por baixo do tremor original do álbum. Estamos no meio de uma cratera, depois da bomba explodir. Esta bomba é o século 20, que se engole cada vez mais à medida que chega ao fim. Quando 2000 passar, zera tudo. É contemplando este futuro que Kid A sorri. É um sorriso estranho, não-humano, pensativo. Mas feliz e esperançoso, como há muito não víamos.
O título não é exagero: tem música antiga regravada por banda nova, remixes, mash-ups, hits recém-saídos, músicas de discos que ainda nem foram pra fábrica, MP3s pra download, hip hop com eletrônico, dubzeira, groove de pista, falação contida, brasileiros na medida, raridades, cruzamentos, intervalos curtos, funk carioca e começa e termina com o Radiohead. Acho que agora acertei a mão (sem trocadilhos e/ou piadinhas, plis).
– “Nobody Does It Better” – Radiohead
– “Cheryl Tweed” – Lily Allen
– “Carnaval Inesquecível na Cidade Alta” – Mundo Livre S/A
– “MTV Makes Me Want to Smoke Crack” – Beck
– “Woman (Mstrkrft Remix)” – Wolfmother
– “This Fire (Playgroup Remix)” – Franz Ferdinand
– “Bring the Seven Nation Army” – White Enemy
– “Tremendo Vacilão” – MC Perla
– “Ela Mama Meu Ganso” – Mr. Catra
– “Só Putaria” – MC Paulão
– “Pasmina” – Rabu Gonzalez
– “Crazy Logic” – Arty Fufkin
– “Smiley Faces Hypnotize” – Gnotorious
– “I Don’t Feel Like Dancing” – Scissor Sisters
– “From Atlantis to Interzone” – Klaxons
– “Take Me Back to Your House” – Basement Jaxx
– “Let Down” – Easy Star All-Stars com Toots and the Maytals
Clap Your Hands Say Yeah, Devendra Banhard, DJ Shadow, Yeah Yeah Yeahs… Tudo 100%. E já rola um papo CocoRosie. Radiohead, nada. Sigo apurando…
Mas, ae, tirando o Shadow…